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A planificação como um dos mecanismos de participação dos trabalhadores em processos de transição ao socialismo

2. A PARTICIPAÇÃO POLÍTICA DOS TRABALHADORES NAS EMPRESAS ESTATAIS EM PROCESSOS DE TRANSIÇÃO AO SOCIALISMO

2.1. A forma política de participação, decisão e controle em processos de transição ao socialismo

2.1.3. A planificação como um dos mecanismos de participação dos trabalhadores em processos de transição ao socialismo

Um dos momentos imprescindíveis de participação é a ocasião do processo de planificação da sociedade em transição ao socialismo, podendo ser utilizados mecanismos diretos e/ou indiretos (representativos) de participação. Em uma sociedade em transição ao socialismo a planificação é uma forma de regulação social da produção e se concretiza em mecanismos de decisão dos indivíduos para a organização da produção. Estes indivíduos, através dos mecanismos de participação política, avaliarão as necessidades imediatas da sociedade, o que se objetiva para um período mais longo e como fazer para alcançar esses objetivos, dentre outros aspectos. A planificação corresponderia à sociedade como um todo, ao se pensar quais os produtos imediatos necessários à população, em que quantidade eles devem ser produzidos, quais as condições materiais concretas para viabilizar essa produção, quem irá consumir (parte da população ou toda ela), que profissionais e em que áreas do saber ou de formação são necessários para garantir essa produção, quais as matérias-primas necessárias, quais os maquinários e tecnologias deverão ser empregados, etc. (ROMEUF, 1956). Mas a elaboração do

plano também irá corresponder a um local específico, por exemplo, as diversas unidades de produção ou fábricas também irão construir seus próprios planos79, os quais devem se vincular ao plano nacional. De acordo com Romeuf (1956, p.09), a planificação relativa a setores e a economia nacional como um todo “[...] exige a existência de regulamentos, de serviços administrativos e de diretivas; isto é, de uma organização econômica cujo conjunto constitui a economia planificada [...]”.

Da mesma maneira que se deve prever o que produzir, para quem produzir, em que quantidade produzir, como produzir, etc. – pensando a produção como um processo que já traz em si a distribuição – outro elemento fundamental da planificação, mesmo em seu estágio inicial de desenvolvimento, é o estabelecimento de prazos para se cumprir o planejado conforme a necessidade da população, de modo também a evitar o desperdício no processo de produção tanto de materiais como do tempo de trabalho humano. Planificar significa também pensar a distribuição do tempo de trabalho humano, no sentido de garantir a produção, mas sem gerar uma sobrecarga de trabalho ou um desperdício do tempo de trabalho (MÉSZÁROS, 2011).

Conforme aponta Bettelheim,

[...] o plano corrente de produção de objetos de consumo elaborado a nível nacional, deve finalmente, levar em conta, muito amplamente, as necessidades expressas pelos consumidores, na medida em que estas sejam fisicamente possíveis (em razão dos recursos disponíveis) e respeitando as exigências de coerência dos planos e, sobretudo, as prioridades sociais [...] (BETTELHEIM, 1966, p. 16, tradução nossa).

A economia planificada não surge e nem se configura a partir de teorias, mas vai sendo constituída através das necessidades concretas, com o objetivo fundamental de atender as necessidades apresentadas pela população, e não da acumulação, conforme ocorre na sociedade capitalista (BETTELHEIM, 1966; ROMEUF, 1956).

A produção da riqueza a ser imediatamente consumida seria ordenada e distribuída ao consumidor através dos fundos sociais de consumo e, o excedente da produção, seria armazenado nos fundos de acumulação, sendo posteriormente disponibilizado à população conforme fosse demandado por outras necessidades.

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A planificação é um dos instrumentos mais importantes a se desenvolver em um processo de transição ao socialismo, através dela é possível iniciar a negação da anarquia capitalista e avançar na construção de novas relações de produção. De acordo com Bettelheim (1966, p.01, tradução nossa), “[...] a planificação, o controle social sobre a produção, não é, a princípio, mais que uma possibilidade abstrata (sendo que sua transformação progressiva em realidade condiciona a consolidação e a expansão da nova ordem social)”. Assim, é o movimento que intenciona concretizar a planificação como um ato coletivo, no qual se evidencia a participação política dos diversos sujeitos da sociedade no sentido de alterar as relações de produção, que caracterizará a sociedade socialista. E só depois disso, se poderá almejar a sociedade comunista, onde o Estado enquanto tal já será inexistente.

Torna-se insuficiente e distanciado da realidade dos trabalhadores a realização do plano apenas mediante mecanismos de participação indireta, ou seja, através de representantes que ocupem as instancias representativas do Estado. É importante vincular mecanismos de participação indireta com mecanismos de participação direta, conforme dito anteriormente.

A planificação em uma transição ao socialismo conta com uma importante atuação do Estado organizado a partir de suas instituições. Este Estado irá deixando de ser necessário à medida que suas funções principais deixam de ser requisitadas. Este é um processo muito longo que se expressa na conformação da transição ao socialismo já com possibilidades de indicar a construção da sociedade comunista, que não se pode prever em termos de prazo. Assim, a planificação progressivamente evoluiria para relações de produção entre trabalhadores associados. Esta relação é citada por Marx em uma perspectiva bastante generalista, sem qualquer intenção de precisar espaço e tempo ou precisar como ela se conformaria concretamente.

Na suposição que Marx (2008a, p.100) realiza em “O Capital” acerca da organização de uma sociedade de homens livres que “[...] trabalham com meios de produção comuns [...]”, a produção é resultado de um trabalho coletivo, pois estes homens “[...] empregam suas múltiplas forças individuais de trabalho, conscientemente, como força de trabalho social [...]”. Quando Marx se refere a

múltiplas forças individuais de trabalho, entende-se que pretende diferenciar da força de trabalho genérica, relativa à troca de mercadorias na sociedade capitalista. Trata-

conjuntamente formam a força de trabalho social, destinada principalmente a produção de valores de uso. Assim, diz Marx (2008a, p.100): “[...] em nossa associação, o produto total é um produto social. Uma parte desse produto é utilizada como novo meio de produção. Continua sendo social. A outra parte é consumida pelos membros da comunidade [...]”. A distribuição dos produtos dependerá da organização da produção na sociedade e do grau de “[...] desenvolvimento histórico dos produtores [...]”. Marx avança em sugerir ainda a organização da distribuição pelo tempo de trabalho, sendo a cota individual na parte do produto global correspondente ao tempo de trabalho empregado por cada indivíduo a serviço da comunidade. O tempo de trabalho deveria ainda ser distribuído através da planificação, de modo a regular “[...] a proporção correta das diversas funções do trabalho para as diversas necessidades [...]”, (MARX, 2008a, p.100). Nessa forma de produção que é social, as condições objetivas da produção voltariam a ser apropriadas pelos próprios produtores.

É importante levar em conta que, essa reflexão presente em “O Capital” é citada como uma “suposição”, conforme denominou Marx, ou seja, o autor não pretendia – como não pretendeu fazer em nenhum dos seus escritos que trazem algum elemento sobre a passagem para uma sociedade pós-capitalista – receitar o caminho que se deve percorrer para a transição a outro modo de produção, onde a produção se desse por produtores associados. O que Marx e Engels se propuseram foi apontar alguns elementos indispensáveis a esse novo modo de produção, quando este já estivesse constituído, especialmente aqueles elementos que negam o modo de ser da produção capitalista, como: a substituição da propriedade privada por formas de propriedade que possibilitem a apropriação da produção por todos trabalhadores e; a eliminação da exploração do trabalho concomitante a construção de uma sociedade sem classes, organizada por produtores associados.

Nessa perspectiva que se constituiriam os denominados conselhos operários ou organizações similares de participação e decisão dentro das diversas unidades de produção e também das empresas estatais, enquanto espaços de decisão dos trabalhadores. Estes se formariam ainda no período de transição ao socialismo e se fortaleceriam na transição até o comunismo, dando base para a constituição da nova sociedade, considerando ser este um processo aberto à construção dos sujeitos históricos e ainda distante de nosso tempo.

2.2. Participação política e controle da produção pelos trabalhadores

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