• Nenhum resultado encontrado

MOBILIZAÇÃO MILITAR

B. A MOBILIZAÇÃO MILITAR DECORRENTE DA ADESÃO DE PORTUGAL À NATO

1. Plano de mobilização do Exército português

No início da década de 50 Portugal reunia condições que lhe permitiam usufruir de um serviço militar obrigatório formado por cidadãos masculinos com idades compreendidas entre os 20 e os 45 anos podendo concentrar, por mobilização, 826 190 homens [Macedo 1984: 11; EME 1988: 25]122.

A circular nº 1 029/MT de 1951 normalizou o controlo permanente dos efetivos do Exército português através da criação de fichas individuais que permitiam analisar as existências e as faltas em oficiais e sargentos em cada unidade e estabelecimento militar. O sistema criou condições para o comando do Exército poder avaliar as presenças e faltas em dado momento,

122 O efetivo mobilizável agrupava-se em três escalões: tropas ativas até aos 28 anos, tropas licenciadas até aos 40 anos e tropas territoriais até aos 45 anos. Era possível aprontar 250 000 homens em tropas ativas e mais 576 190 em tropas licenciadas e territoriais (557 022 soldados, 10 262 sargentos e 8 906 oficiais). Contabilizando o efetivo nas fileiras mais o mobilizável, o país podia concentrar 826 190 homens. No entanto, o número de oficiais e sargentos era insuficiente para enquadrar o número de praças. O efetivo máximo que o país podia dispor, com tropas comandadas e escalonadas por categorias, correspondia a 300 000 homens.

facilitando as movimentações em pessoal entre unidade ou por mobilização, segundo os critérios de prioridade estabelecidos. O processo permitia também analisar os quantitativos em oficiais e sargentos não arregimentados às unidades, efetivos que estavam disponíveis através de convocação por mobilização para preenchimento das vagas relativas ao quadro orgânico de pessoal [Macedo 1984: 11; EME 1988: 25].

Este processo de controlo estava em sintonia com os compromissos internacionais, ratificados pelos EUA em 15 de novembro de 1951, ficando Portugal com a incumbência de formar a partir 1 de janeiro de 1952 uma divisão tipo português com uma orgânica semelhante à americana de modo obter um grau de prontidão aceitável em 1 de setembro do ano seguinte. Ficou também acordada a existência de outra divisão de tipologia portuguesa com capacidade para entrar em combate a partir de 2 de janeiro de 1952. Levantaram-se sérias dificuldades à instituição castrense, fundamentalmente quanto à criação da divisão tipo americano, pela falta de militares das 3 categorias e de formação adequada às funções atribuídas em quadro orgânico [Macedo 1984: 40- 43].

Em março de 1952 o ministro do exército, em comum acordo com o ministro da defesa nacional, emitiu uma diretiva onde estipulava a prioridade na formação das unidades de tipologia americana através da criação de um corpo de exército com 2 divisões. Dava também indicação sobre a constituição, num espaço de tempo muito curto, de mais outro corpo de exército com tipologia portuguesa formada inicialmente por 2 divisões, ficando a terceira para uma fase posterior. A diretiva definiu as linhas gerais sobre o funcionamento das unidades mobilizadoras quanto os graus de prontidão e o tempo previsto para a sua conclusão123. Dava também indicação sobre a formação em permanência dos QG e a necessidade de manter permanentemente, em

123 Consultar tabela nº 3 p. 78.

tempo de paz, uma determinada percentagem do efetivo das unidades das divisões tipo americano [EME 1988: 52].

O GML e cada RM passaram a assumir responsabilidades na realização das tarefas de mobilização para as divisões tipo português (TP) e tipo americano (TA) entre 1952 e 1954 (tabela nº 18) [Macedo 1984: 55; EME 1988: 54].

TABELA Nº 18 – Responsabilidade faseada na formação de unidades

RM 1952 1953 1954

1ª fase 1ª fase 1ª fase GML 3ª Div TP 3ª Div TP 3ª Div TP 1ª RM 1ª Div TP 1ª Div TP 1ª Div TP

2ª RM 1ª Div TA 1ª Div TA

3ª RM 2ª Div TP 2ª Div TP 2ª Div TP

4ª RM 2ª Div TA 2ª Div TA

Macedo 1984 e EME 1988

Em julho de 1952 o CEME elaborou uma proposta, para aprovação ministerial, atribuindo de prioridade qualitativa à constituição das divisões tipo americano recorrendo aos quadros e especialistas presentes nas unidades e, em último caso, aos que se encontravam na disponibilidade para preenchimento do quadro orgânico de pessoal das unidades prestadoras de serviços. Propunha a continuidade das RM existentes como garante do fornecimento dos efetivos necessários para a realização das manobras militares, mobilização, concentração e transportes

estratégicos. Era seu entendimento que a mobilização de especialistas tinha de ser analisada a nível nacional para rentabilizar os meios existentes [Macedo 1984: 58; EME 1988: 58-59].

A primeira ordem de batalha124, referente à constituição do comando do corpo de exército tipo americano, foi definida em 15 de julho de 1952, por despacho do ministro do exército, através da nomeação dos comandos superiores, ficando cada militar a integrar definitivamente aquela estrutura orgânica [Macedo 1984: 55; EME 1988: 56]. Foi o primeiro documento que atribuiu funções aos militares segundo aquele modelo, sendo o ponto de partida para a efetivação da mobilização relativa ao novo sistema de defesa que Portugal estava a implementar [Macedo 1984: 11; EME 1988: 25].

Em setembro de 1952 a 2ª RM foi incumbida de executar manobras de nível divisionário sendo-lhe atribuída como missão, além de outras, a testagem dos encargos de mobilização. Foram as primeiras manobras realizadas por uma grande unidade no período de transformação que estamos a tratar, em circunstâncias em que a preparação e o enquadramento se encontravam num estado embrionário [Macedo 1984: 62-63; EME 1988: 61-62].

Foi difícil agrupar os efetivos das diversas unidades por as diretivas relativas à concentração e mobilização de pessoal não se encontrarem devidamente detalhadas relativamente à realização deste tipo de exercícios. Os obstáculos iniciais surgiram devido à falta de oficias para a formação dos QG fundamentalmente em relação à 2ª RM que teve de recorrer de outras RM para preencher as funções de chefe se repartição [EME 1988: 62]. Para a constituição dos QG do CE, das 2 divisões tipo americano e das 3 tipo português eram necessários 89 oficiais (tabela nº 19) [Macedo 1984: 56; EME 1988: 55].

124 Entende-se por ordem de batalha a colocação dos militares em cada função na estrutura orgânica de cada unidade.

TABELA Nº 19 – Necessidades em oficiais para um QG das unidades tipo português e tipo americano

Escalão da unidade Necessidades de oficiais em unidades TP Necessidades de oficiais em unidades TA CE 12 10 Divisão 3x13 2x14 TOTAL 51 38 Macedo 1984 e EME 1988

O passo seguinte focou-se na organização dos quartéis que tinham por missão mobilizar os efetivos necessários ao preenchimento do quadro orgânico de pessoal das unidades de campanha, sendo necessário garantir a funcionalidade desses quartéis com percentagens exequíveis de efetivos [Macedo 1984: 71; EME 1988: 86].

Em 7 de maio de 1953 o ministro do exército elaborou um despacho onde atribuiu responsabilidades de mobilização aos diversos escalões desde o CEME aos comandantes de unidade, passando pelos comandantes de RM. Ao CEME foram incumbidas as tarefas referentes à preparação geral do exército. Os generais comandantes das RM ficaram com o encargo de processar o “recrutamento, mobilização e preparação para a guerra de todos os homens aptos para o serviço nas fileiras na área da sua Região”. Aos comandantes de unidade das armas e serviços foi- lhes confiada a missão de recrutamento e mobilização na sua área geográfica. Os comandantes de unidade de escalão inferior a regimento, ficaram responsáveis pela preparação para a guerra das unidades sob seu comando quanto à preparação, comportamento moral e profissional [Macedo 1984: 132].

O EME, em 2 de julho de 1953, elaborou um ofício dirigido ao CEMGFA informando que as unidades orgânicas da divisão tipo americano e os seus órgãos de apoio passavam a ter 33% dos efetivos presentes nas unidades. Em resposta ao ofício, a 27 de julho de 1953, o CEMGFA concordou com a proposta, recomendando a sua apresentação ao ministro da defesa nacional que aprovou o seu conteúdo com data de 12 de dezembro de 1953. Foi um marco decisivo, do ponto de vista da funcionalidade do Exército, o EME ter conseguido constituir organicamente a divisão tipo americano, com parte do seu efetivo, com a atribuição da missão principal de instruir, aprontar as forças e mobilizar efetivos [Macedo 1984: 72-74; EME 1988: 84-85].

Para manter o efetivo de 33% nos regimentos, em tempo de paz, foi determinado que dos 3 batalhões orgânicos 2 ficavam a 50%, garantindo assim a existência permanente de uma estrutura considerável, com capacidade de realizar a mobilização de uma forma mais célere comparativamente com a outra modalidade que permitia só ter um batalhão a 100%. Por razões orçamentais e de alojamento a 2ª RM não tinha capacidade para manter os seus 3 regimentos de infantaria mesmo com a redução em 2/3 dos seus efetivos. Para a constituição da divisão tipo americano foi necessário redistribuir responsabilidades passando a 3ª RM a mobilizar com base em 1/3 dos militares que acabavam a recruta, 1/3 dos que pertenciam à classe anterior e 1/3 da classe que 2 anos antes se encontrava na disponibilidade. Nesta altura o Exército português já só falava na constituição de uma divisão [Macedo 1984: 92, 92A-92-B; EME 1988: 78-80].

No final de 1953 os critérios de mobilização ainda não tinham sido implementados na constituição das unidades, situação que foi comprovada após a realização das manobras desse ano ao não ter sido necessário recorrer aos militares recrutas que se encontravam a frequentar o período de instrução [Macedo 1984: 95-96; EME 1988: 87-88].

Em 6 de maio de 1954 o CEMGFA enviou um ofício ao CEME dando conta das intenções do ministro do exército quanto à satisfação das necessidades inerentes à constituição da

divisão tipo americano. Foi nesta sequência que o EME determinou que cada RM tinha por incumbência mobilizar uma divisão cabendo à 1ª, 3ª, e 4ª a função da defesa da Península Ibérica nos Pirenéus e a 2ª, com reforço da 3ª, responsável da defesa da Europa Central. O fornecimento dos elementos de apoio para as divisões dos Pirenéus passaram a ser assegurados pela GML e 4ª RM enquanto para a divisão da Europa Central ficaram a cargo da 1ª, 2ª e 3ª RM [Macedo 1984: 135-136; EME 1988: 132-133]. A defesa interna era garantida pelo regimento de infantaria nº 9, 10 batalhões de caçadores e 3 de metralhadoras, 1 batalhão de engenharia e o regimento de cavalaria nº 2 [Macedo 1984: 136-139].

Em 14 de maio de 1954, através da circular 19/MT, o EME redefiniu novas percentagens para os efetivos do quadro orgânico em tempo de paz para as unidades combatentes e em alguns órgãos de direção e de apoio da divisão tipo americano (tabela nº 20) [Macedo 1984: 132-134].

TABELA Nº 20 – Percentagens relativas aos quadros orgânicos em tempo de paz das unidades de campanha da divisão tipo americano

Estado maior do QG 66%

Órgãos de transmissões das armas, Un de transmissões e de carros de combate 66%

Companhia de manutenção de material 50%

Órgãos de comando e unidades de engenharia 40%

Banda de música 100%

Restantes elementos 30 a 33%

Macedo 1984 e EME 1988

Verificou-se um aumento significativo nos efetivos exceto nas unidades de manobra e apoio de combate que mantiveram a mesma proporção. A partir daquela data as unidades passaram a dispor um volume de forças em permanência direcionando a sua atividade unicamente na aquisição de competências operacionais. À tropa de defesa interna e às restantes forças foi-lhes

atribuído um efetivo mais reduzido corroborando com a orientação das prioridades para a 2ª divisão (tabela nº 21) [Macedo 1984: 133-134].

TABELA Nº 21 - Percentagens relativas à defesa interna e restantes forças

Tropa de defesa interna 25%

Restantes forças 20%

Macedo 1984 e 1988

O Exército tinha dado mais um passo em frente embora o processo ainda não se encontrasse suficientemente consolidado devido fundamentalmente à carência de algumas especialidades. As unidades passaram a saber quais os militares que deveriam formar anualmente e quais os que teriam de mobilizar para preencher os seus quadros orgânicos. A partir daquela data os encargos relativos à mobilização foram transferidos da 2ª para a 3ª divisão [Macedo 1984: 140].