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2.2 – Política: revolução socialista, cristianismo e movimento espírita A política liga-se diretamente ao mote do progressismo, tanto pela crítica ao

dogmatismo e à religião (justamente pelo seu caráter dogmático), que impediriam a politização do movimento espírita, quanto pela importância do marxismo como elemento a ser agregado ao Espiritismo (levando-o a progredir) e como motivador principal da inflexão dos jovens universitários espíritas para a discussão política. A política no MUE significou a presença da revolução socialista como horizonte fundamental da ação espírita. O amalgama do socialismo com o cristianismo – estabelecido a partir da Doutrina Espírita – traz à tona problemas como a violência, a tensa relação entre política e religião, e o próprio sentido do Espiritismo no mundo. Como a atuação do MUE se restringiu quase que completamente ao interior do movimento espírita brasileiro, um dos resultados principais da presença da política foi provocar um grande conflito que opunha os jovens universitários - espíritas, politizados e socialistas – às antigas gerações, aos dirigentes que permaneciam fincados na exigência religiosa do “apolitismo” (ideologicamente seletivo). Daí o conteúdo político do conflito “jovens VS. velhos” e da crítica do MUE à organização institucional do movimento espírita brasileiro.

Atuar no mundo, em diálogo com o conhecimento “do mundo” – eis a tábua de salvação do Espiritismo, para os jovens universitários espíritas. E é a política, horizonte típico de intervenção social, de militância, de engajamento, que será colocada em destaque pelo MUE, diante de uma ideia de neutralidade, de isenção política, bastante corrente no movimento espírita. Assim, o número quatro d’A Fagulha dedica-se a abordar o espinhoso tema.

De início, em “Espiritismo e participação”94, artigo já publicado na Revista Paz e

Terra, n° 4, de 1967, dedicada ao ecumenismo, Osmar Noronha Filho fala de militância

social, conclamando os espíritas a atuar “dentro do mundo”, contra a tendência de focar no

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“além”, pois, ainda que o reino de Deus não seja deste mundo, “é através deste mundo que o Homem alcança o reino de Deus”, isto é, “só progride trabalhando, lutando, amando e sofrendo, dentro do mundo, ‘com os pés na terra’ e peregrinando na escalada dos planetas, na dura conquista de uma liberdade cada vez maior” (A Fagulha, n° 4, mar - abr, 1968, p. 2; grifo no original).

Situar o homem como co-criador, tendo uma função central a desempenhar na obra da criação divina, é importante para justificar a militância terrena do cristão, do espírita. Por isso Noronha Filho traça paralelos entre a visão de Teilhard de Chardin e a ideia espírita: se, segundo Teilhard, “‘o homem se tornou responsável pela terra’ (...) e ‘o nosso universo surge... como um divino empreendimento ao qual Deus quer associar o homem’”, no Espiritismo lemos que

‘tem ainda a encarnação outro objetivo, que é o de fazer o espírito realizar a sua parte na obra da criação. E, para a cumprir, em cada mundo ele toma um aparelho em harmonia com a matéria essencial desse mundo, para nele executar, sob esse ponto de vista, as ordens de Deus. Deste modo progride, à medida que concorre para a obra geral’ (Allan Kardec, O Livro dos Espíritos, cap. II, n° 132). (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 3).

O cristão não pode “lavar as mãos”, recusando “o apelo da situação política”. O articulista é peremptório, destacando em letras maiúsculas: “Esta é a afirmação a um tempo óbvia e revolucionária: nos dias de hoje, só há uma forma conseqüente e eficiente de apostolado cristão – o engajamento político, a favor da libertação do homem contra a injustiça capitalista e o imperialismo corruptor da dignidade humana” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 3-4).

Diante dessa exigência dos tempos, o autor passa a lamentar o atraso dos espíritas que, apesar de representar “o primeiro escalão nas hostes cristãs a empunhar, em teoria, a bandeira da libertação social, econômica e política do Homem”, deixou-se “ultrapassar, na prática, pelos nossos irmãos católicos e protestantes” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 4).

A questão do atraso dos espíritas é outra constante no discurso do MUE. Entende-se que o Espiritismo, “aparecido no mundo numa época em que o clericalismo reacionário mantinha na estagnação os postulados cristãos”, nasceu “como doutrina verdadeiramente

revolucionária e destinada a dinamizar os conceitos do Cristianismo” (A Fagulha, n° 4, p. mar – abr, 1968, p. 4). Portanto, caberia aos espíritas renovar a Doutrina em suas potencialidades revolucionárias, mantendo-a em diálogo com cada tempo histórico. Se o momento presente traz à tona, com toda a força, a questão social, cabe aos espíritas responder a questão posta, à luz da Doutrina Espírita.

Não obstante a identificação do “atraso dos espíritas”, o autor faz referência a outras obras espíritas que, já há tempos, advertiram para a necessidade de militância social. Faz citações de Grandes e pequenos problemas, de Angel Aguarod, d’A Grande Síntese, de Pietro Ubaldi e de Cumprindo-se Profecias, de Julio Abreu Fiho. Noronha Filho destaca, por exemplo, que o capítulo “O problema Social”, do livro de Angel Aguarod, “é todo dedicado à participação ativa dos cristãos espíritas na obra de reforma social do planeta” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 4). Rebate a crítica dos “absenteístas” que usam da “parábola da moeda” para afirmar

que não devemos participar das coisas do mundo, porque Jesus mandou “dar a César o que é de Cesar e a Deus o que é de Deus”, esquecidos de que a parte “Dar a César” está implícita a participação nas coisas do Estado, do contrário Cristo nos teria mandado dar tudo a Deus, subtraindo o tributo a César. (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 6-7)

E é com A Grande Síntese que o articulista quer convencer o leitor da importância do Estado, do seu aperfeiçoamento e do seu papel na renovação social. Citando a obra de Pietro Ubaldi: “(...) à frente desta renovação não pode estar senão o órgão máximo da consciência coletiva: o Estado”, Noronha Filho pretende dos espíritas um posicionamento e uma atuação efetivamente política no objetivo de promover profundas transformações sociais (A Fagulha, n° 4, p. mar – abr, 1968, p. 7). E, nessa atuação, o papel da Doutrina Espírita seria central: “nossa doutrina filosófica, lastreada no conceito dinâmico de evolução, tem de ser a base de todas as concepções políticas modernas, em consonância e paralelismo com a visão cosmogenética de Chardin e o conceito dialético de Marx” (A Fagulha, n° 4, p. mar – abr, 1968, p. 8).

É interessante notar que as obras utilizadas como apoio ao seu argumento não parecem ter uma afinidade ideológica tão grande quanto a princípio poderíamos imaginar.

2009b), é uma obra que assume, por vezes, posições até mesmo ditatoriais (UBALDI, 1937, p. 407). A concepção de Estado é organicista e corporativista (UBALDI, 1937, p. 394), é defendida a harmonia entre capital e trabalho (UBALDI, 1937, p. 375-376), criticando-se o comunismo pelo seu objetivo de nivelamento econômico (UBALDI, 1937, p. 376-377) e condenando a luta de classes com um discurso explicitamente elitista, considerando o proletariado “supremamente inapto, em sua inconsciência, para qualquer função diretora” (UBALDI, 1937, p. 403).

Percebe-se assim, uma boa distância entre o “espírito” que anima a obra ubaldiana e o que se encontra nas linhas e entrelinhas d’A Fagulha. Não obstante, A Grande Síntese é fonte de alguns escritos do MUE. No primeiro número d’A Fagulha, a obra comparece citada por Armando Oliveira Lima, que conclama os espíritas à luta “em nós” e “fora de nós”:

“Se a luta foi outrora física, hoje é econômica e nervosa; amanhã será psíquica e ideal, muito mais digna de ser travada. É a luta que hoje eu empreendo, com antecipação, para elevar o homem até a lei social do Evangelho. Não creiais que a vossa luta possa ser suprimida. Que outra coisa contribuiria para os fins da seleção e evitaria o abastardamento do homem?” (pág. 386) (A Fagulha, n° 1, out, 1967, p. 10)

Armando cita ainda A Nova Civilização do Terceiro Milênio de Ubaldi:

“O único sistema perfeito é o socialismo convicto e espontâneo de Cristo, que não agrava a situação, pondo em choque os interesses egoístas, mas começa pela afirmação e tomada de consciência da unidade espiritual; que não parte, como o socialismo humano dos direitos e da luta, mas dos deveres e da paz.” (Ubaldi, “A Nova Civilização”... pág. 217). (A Fagulha, n° 1, out, 1967, p. 16)

Antes de tentarmos explicar a questão colocada, vejamos ainda outra obra citada por Noronha Filho: Grandes e pequenos problemas, de Angel Aguarod.

O oitavo capítulo do livro, dedicado ao “problema social”, divide-se em quatro partes: I. Desigualdades sociais; II. O problema social é um problema de ética; III. Os principais fatores do problema e IV. A solução. Na primeira, afirma-se que as desigualdades sociais são necessárias para a evolução dos Espíritos, tornando-se desnecessárias quando o progresso moral da humanidade delas prescindir. Para Angel Aguarod, “(...) as diferenças sociais não obedecem a nenhum arbítrio, mas a taxativas

expressões da evolução dos seres, à lei de causa e efeito (...)” (AGUAROD, 1976, p. 173). Em outro capítulo, dedicado ao “problema da caridade”, o autor afirma que

é preciso haja pobres, porque os pobres são os que, em tempos passados, não havendo feito o uso devido das riquezas que lhes confiaram, forjaram para si a situação atual, de que ninguém os pode livrar, senão eles próprios, uma vez que tenham sofrido o caudal de conseqüências que seus atos anteriores geraram. (AGUAROD, 1976, p. 158)

Portanto, não há injustiça nas desigualdades sociais: elas são resultado direto das más ações do passado, configurando-se, ao contrário, em processo justo de retificação através da expiação dos Espíritos em evolução.

Na segunda parte, Aguarod desenvolve a ideia de que o problema social é um problema de ética, afirmando a necessidade do amor para que as soluções se efetivem. O autor faz menção ao fim das desigualdades existentes (AGUAROD, 1976, p. 177), porém em seu exemplo de resolução do problema, pela via moral, desenha um quadro hierárquico entre patrão e operários, no qual o primeiro “se converteria em pai de seus operários e estes se considerariam filhos do patrão”. Com isso, não haveria entre eles qualquer conflito, pois considerariam “que as diferenças existentes são condições precisas para o desenvolvimento do plano divino, para a realização da obra a todos confiada, se conformariam com o ocupar o posto que lhes correspondesse e não invejariam o lugar que ocupasse o irmão” (AGUAROD, 1976, p. 178-179).

Assim, para Aguarod, as diferenças de posições sociais não implicam em desigualdades sociais. A solução para o conflito entre as classes é a harmonia entre capital e trabalho. Entretanto, o resultado da aplicação do amor nas relações sociais seria o fim das classes, conforme afirma na terceira parte, sobre “os principais fatores do problema”. Nesse caso,

desaparecerão as atuais classes sociais, fundidas numa só, criada pelo amor e pelo trabalho. Então, ninguém quererá colocar-se acima de seu irmão; considerar-se-á indigno o possuir sem produzir; a evolução conduzirá os homens a pôr-se nos níveis mais elevados, e a não querer nenhum possuir mais do que os seus companheiros. Assim, naturalmente, ir-se-ão colocando os fatores nos lugares convenientes à harmonia e ao bem geral, para atuarem de forma tal que, sem protestos nem violências, tudo seja solucionado. (AGUAROD, 1976, p. 184)

Para não enxergarmos contradição entre este trecho e a sugestão anterior de harmonização entre patrão e operários, é preciso deduzir que as posições de mando e execução do trabalho não implicariam em diferenças de posse e que o patrão também produz ou produziria, de algum modo. Ao ponto em que chegamos da análise, já é possível notar que o texto de Angel Aguarod não condiz com proposições fundamentais do MUE, como a ideia de que os pobres de hoje não são os maus ricos de ontem, conferindo autenticidade às injustiças sociais, e ainda a afirmação do socialismo com o trabalho cooperativista, sem a divisão entre patrões e empregados.

Do capítulo analisado da obra de Aguarod, resta apenas a parte quarta, destinada à solução do problema social. E é aí que encontramos o elemento de proximidade discursiva com o MUE. Trata-se de uma pregação pela ação, um “não” enfático à omissão: “(...) não se deve cruzar os braços ante a convulsão universal, no que respeita aos assuntos sociais”; arrematando: “Responsabilidade grande pesará sobre os Espíritos progressistas, encarnados na Terra, se se mostrarem indiferentes aos magnos problemas de ordem coletiva e social, que os tempos oferecem” (AGUAROD, 1976, p. 186-187). E, finalmente, legitima a militância por reformas jurídicas, mesmo que se criem leis prematuras, pois os Espíritos “se adaptam facilmente ao que é bom, mesmo que venha antes do tempo” (AGUAROD, 1976, p. 190). A busca por atuação social, para além da “reforma íntima”, é uma das principais frentes de reivindicação do MUE.

Para respondermos então à questão da distância que separa o pensamento exprimido em algumas obras utilizadas pelo MUE e as suas próprias formulações e posicionamentos, é preciso identificar o que foi aproveitado destas obras. Tanto n’A Grande Síntese, quanto em

Grandes e pequenos problemas, dois elementos atraem o MUE: o fato de serem discutidos

explicitamente os chamados problemas sociais e a mensagem de ativismo encaminhada aos “Espíritos progressistas”, de um modo geral, ou aos espíritas, em particular. E, mesmo que a ideia de um “socialismo cristão” apareça com um sentido distinto (mais vago, mais conformista) do que foi produzido pelo MUE, já se torna interessante citá-la com vistas a passar a noção de ser “corriqueiro” falar e defender o socialismo no meio espírita. Parece- nos, sobretudo, que a escassez de literatura espírita favorável às propostas do MUE levou

este movimento a valer-se de materiais até mesmo incongruentes com algumas de suas mais importantes posições.

Retornando agora à análise dos artigos do número quatro d’A Fagulha, vamos nos deter no texto de Armando Oliveira Lima, “Espiritismo, Espíritas e Política”. Em primeiro lugar, vale dizer que este, parece-nos, é o artigo que melhor resume o posicionamento do MUE diante da questão política, tocando nos diversos elementos do debate que perpassa o movimento espírita antes e durante a época em foco. De início, Armando Oliveira situa o Espiritismo como filosofia, dedicado assim ao genérico, a “formular uma explicação de todas as coisas por suas razões mais profundas e mais gerais” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 10). Entretanto, por não ser apenas uma filosofia contemplativa, tendo a finalidade prática de servir ao ser humano como instrumento de progresso, cabe aos espíritas, penetrados pela Doutrina, aplicá-la aos casos particulares (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 11-12). Em seguida, segue-se o argumento da reciprocidade do relacionamento homem-sociedade, regulado por leis que visam o estabelecimento do bem comum, com base no equilíbrio entre direitos e deveres. Para o bem comum estabelecer-se é que surge a necessidade de uma autoridade que o possa garantir – esta autoridade é exercida pelo Estado. Este somente é legitimado pela livre escolha do povo daqueles que constituirão o governo. E, no objetivo de guiar o Estado, evitando abusos, excessos e enganos, estrutura- se a Política (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 13-14), assim definida:

“o governo da Sociedade pelo Estado”, ou ainda, “a ciência e a arte do bem comum” (Alceu Amoroso Lima). É especulativa e prática. Ciência, deve estar na base do governo; arte, deve guiar os governantes ao porem em prática o que a observação dos fatos e as exigências dos princípios determinam. (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 14)

Contudo, apesar de ser idealmente assim definida, a Política sofre a degeneração em razão da imperfeição dos homens, tornando-se “uma imoral luta pelo poder, condição sine- qua-non para a mantença de privilégios de grupos, de castas, de classes. Daí porque, antes arte de servir, transformou-se a Política em arte de servir-se...” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 15; grifos no original). A partir desta constatação, Armando Oliveira cita diversos exemplos que a ilustram: a desigualdade entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos, o

imperialismo, as leis elaboradas para privilegiar classes, a própria Constituição Brasileira e por fim a Guerra do Vietnam.

Daí em diante o articulista trata de argumentar pela não omissão dos espíritas na Política, evidenciando sempre um sentido altruísta para o pretendido envolvimento político, por exigência ética frente ao momento histórico vivido, considerando tal militância uma verdadeira provação e não uma busca egoísta de evidência para si mesmo.

A acusação de que o MUE seria um movimento político-partidário95, ainda hoje presente nos depoimentos de seus antigos opositores, é peremptoriamente refutada: “Fique claro, de início, que quando nos referimos a política, estaremos falando da política-maior e, jamais, da política partidária” (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 16; grifo no original). Entende-se que o homem, sendo um animal social por excelência, é um ser político96 imerso na sociedade – regida por leis políticas -, sofrendo e exercendo influência sobre ela, de várias formas – dentre elas, a política. E, o mais importante: depende dos homens a orientação das leis para o bem comum.

Nesse esforço argumentativo, são imprescindíveis, na cultura espírita, o manejar com as opiniões de celebrados Espíritos desencarnados ou reconhecidas lideranças do movimento espírita. Conquanto Armando Oliveira lance mão de autores católicos, como o Padre Lebret e Alceu Amoroso Lima, ou ainda citando socialistas e espiritualistas, como o vereador Cid Franco97e o teólogo Huberto Rodhen, é fundamental para o efetivo diálogo com a tradição dos espíritas a utilização de determinados autores, tais como Emmanuel, André Luiz e, certamente, Allan Kardec.

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A questão será tratada com atenção no terceiro capítulo. 96

Conforme Edson Silva Coelho, o MUE entendia a política “como algo inerente ao ser humano, parte de sua integralidade, da mesma forma que seu aspecto cultural, psíquico e social” (depoimento recebido por e-mail dia 19/10/2011).

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Cid Franco era vereador pelo Partido Socialista Brasileiro. “Segundo ele mesmo dizia, na Câmara dos Vereadores, ‘sou hoje um espiritualista convicto que luta pelo socialismo, luta contra a ganância capitalista, por meios legais, parlamentares, democráticos. Ideologicamente e praticamente não aceito nenhuma espécie de ditadura. Oponho-me à ditadura proletária dos russos, que surgiu como provisória e se tornou definitiva. Prezando acima de tudo a liberdade de pensamento e palavra, considero um erro e um perigo, a política de perseguições e prisões por idéias. As idéias combatem-se com idéias e não com a força, não com a violência’” (fonte: http://bernardoschmidt.blogspot.com/2010/04/janio-quadros-cid-franco-e-vila-maria.html). Ary Lex refere-se a ele do seguinte modo: “Este nosso grande confrade, deputado estadual reeleito várias vezes, foi personagem de destaque, pelo desassombro com que enfrentava os problemas mais difíceis e delicados. Denunciava os abusos da ditadura de Getúlio Vargas e, mais ainda, os crimes de Salazar (ditador de Portugal)” (LEX, 1996, p. 58).

A grande novidade é que o MUE dialoga polemicamente com estes autores. Assim, vejamos como se dá, neste artigo de Armando Oliveira, o relacionamento com o pensamento de André Luíz, de Emmanuel e de Allan Kardec. Com André Luiz, o diálogo explora claramente as possibilidades de controvérsia. O articulista resume o que é dito por André Luiz no capítulo 10, “Nos embates políticos”, da obra Conduta Espírita, publicada em 1960 pela FEB e psicografada por Waldo Vieira:

(...) alinha uma série de conselhos, condenando o partidarismo extremado, a propaganda política nas tribunas espíritas, os acordos políticos unilaterais, a comercialização dos votos, palestras e discussões de ordem política nas sedes das instituições doutrinárias, etc. (A Fagulha, n° 4, mar – abr, 1968, p. 17)

Armando Oliveira afirma:

Não temos reparo algum a fazer a tais manifestações ou conselhos, se os encaramos da maneira devida: a condenação a que transformemos os Centros e as Tribunas, em meios de propaganda política, especialmente a propaganda político-partidária. (A Fagulha, n° 4, mar-abr, 1968, p. 17)

Para Armando, não teria cabimento, num centro ou numa tribuna espírita, o debate dos estatutos da ARENA e do MDB, sugerindo “aos confrades a filiação a esta ou aquela grei”, mas não haveria problema no caso de alguém profligar a ditadura, “ensejando, de parte dos presentes, uma aceitação de um regime mais humano, mais cristão!”. Não admite “um proselitismo direto ao comunismo ou à União Soviética”, mas aceitaria aquele que “condenasse o capitalismo, o imperialismo, origens indiscutíveis da fome e da miséria de milhares de seres humanos!” (A Fagulha, n° 4, mar-abr, 1968, p. 17).

Após prevenir-se de possíveis óbices com base no texto de André Luiz, conclui com seu raciocínio crítico:

Estamos com A. Luiz, enquanto admitimos suas palavras como um alerta à nossa tendência ao exagero, aos extremismos. Estaremos, porém, contrários a ele, assim que nos convençamos de que nos sugere ele uma posição omissa, medrosa, quiçá covarde, diante dos problemas políticos que nos envolvem. (A Fagulha, n° 4, mar-abri, 1968, p. 18)

Após dialogar com André Luiz, grande expoente da literatura espírita, Armando Oliveira volta-se para Emmanuel, outro Espírito que é constantemente chamado a comparecer no debate acerca da questão política. Em O Consolador, Emmanuel afirma:

O sincero discípulo de Jesus está investido de missão mais sublime, em face da tarefa política saturada de lutas materiais. Essa é a razão porque não deve provocar uma situação de evidência para si