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Políticas de integração em Portugal: uma breve abordagem

CAPÍTULO 2: ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA PROBLEMÁTICA DO ESTÁGIO 2.1 O fenómeno da migração

2.4 Políticas de integração em Portugal: uma breve abordagem

O Plano Estratégico para as Migrações 2015-2020 (ACM, 2015) determinou cinco eixos prioritários de trabalho a serem fortalecidos em Portugal, quais sejam: i) Eixo I – Políticas de integração de imigrantes; ii) Eixo II – Políticas de promoção da integração dos novos nacionais; iii) Eixo III – Políticas de coordenação dos fluxos migratórios; iv) Eixo IV – Políticas de reforço da legalidade migratória e da qualidade dos serviços migratórios e v) Eixo V – Políticas de incentivo, acompanhamento e apoio ao regresso dos cidadãos nacionais emigrantes. Logo, abordaremos brevemente neste tópico de trabalho as principais iniciativas e entidades envolvidas no desempenho destas diretrizes estabelecidas pelo citado plano.

Inicialmente, começamos por dizer que em Portugal a imigração e o asilo são questões de responsabilidade do Ministério da Administração Interna (MAI), com a intervenção mais presente do SEF (Serviço de estrangeiros e fronteiras), atuando em todos os eixos ligados às políticas de imigração e asilo:

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“A implementação e monitorização das políticas de imigração e asilo são da competência do Ministério da Administração Interna (MAI), que tutela a entrada, permanência, saída e afastamento de cidadãos estrangeiros de território nacional. A atuação do MAI, em particular pela intervenção do SEF, incide em todos os eixos da política de imigração e asilo, com primazia para os três primeiros. Para estas políticas concorrem também contributos setoriais, nomeadamente a política de integração a cargo da Presidência do Conselho de Ministros (PCM), a política de representação externa e concessão de vistos pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros (MNE) e as políticas de emprego, qualificação e segurança social pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social (MTSSS).” (SEF, 2019:10)

Particularmente, o SEF é um instrumento que com fulcro na legislação baliza os mecanismos de vivência em território português. É um órgão da polícia criminal e desempenha serviço de segurança, assim o SEF:

“tem por missão assegurar o controlo das pessoas nas fronteiras, dos estrangeiros em território nacional, a prevenção e o combate à criminalidade relacionada com a imigração ilegal e tráfico de seres humanos, gerir os documentos de viagem e de identificação de estrangeiros e proceder à instrução dos processos de pedido de asilo, na salvaguarda da segurança interna e dos direitos e liberdades individuais no contexto global da realidade migratória.” (SEF)4

Para as questões de integração do migrantes na sociedade de destino, falamos do Alto Comissariado para as Migrações, ACM, que é um instituto público de dependência direta da Presidência do Conselho de Ministros responsável pela execução de políticas públicas no âmbito das migrações. Este tem o dever de cuidar das diversas necessidades dos diferentes perfis de migrantes e da sua interação em Portugal, obviamente, sempre obedecendo os princípios e diretrizes europeias.

O Alto Comissariado para as Migrações tem como missão:

“Promover Portugal enquanto destino de migrações;

Acolher, integrar os migrantes, nomeadamente através do desenvolvimento de políticas transversais, de centros e gabinetes de apoio aos migrantes, proporcionando uma resposta integrada dos serviços públicos;

Colaborar, em articulação com outras entidades públicas competentes, na conceção e desenvolvimento das prioridades da política migratória;

Combater todas as formas de discriminação em função da cor, nacionalidade, origem étnica ou religião; Desenvolver programas de inclusão social dos descendentes de imigrantes;

Promover, acompanhar e apoiar o regresso de emigrantes portugueses e o reforço dos seus laços a Portugal.” (ACM)5

Em vista disso, o ACM promove variadas políticas de integração e age também na sua execução e capacitação. Destacaremos neste momento alguns dos principais serviços especializados

4 https://www.sef.pt/pt/pages/conteudo-detalhe.aspx?nID=1 5 www.acm.gov.pt/-/o-que-fazemos

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desenvolvidos pelo instituto, quais sejam: Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM), Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM), Gabinetes de Inserção Profissional (GIP) e Programa Português para Todos (PTT).

O CNAIM foi criado em 2004 e atualmente está presente em Lisboa, no Porto e em Faro. Ele foi criado para dar respostas às diferentes demandas vividas pelos migrantes no seu processo de integração. Assim, em um mesmo local encontram-se vários serviços que trabalham em cooperação:

“Os Centros Nacionais de Apoio à Integração de Migrantes (CNAIM) são compostos por diferentes gabinetes, uns da responsabilidade de instituições públicas, outros da responsabilidade do Alto Comissariado para as Migrações (ACM), criados para dar resposta de âmbito especializado. (...)

Todos os gabinetes e serviços trabalham em estreita colaboração. Concentrados num espaço físico comum visam, de forma completa e integrada, prestar apoio, informação, encaminhamento, aconselhamento e, por vezes, desenvolver atividades de mediação, nas questões/problemas que são colocados pelos clientes.” (ACM)6

Já o CLAIM constitui uma rede de centros locais espalhados pelo país com missão de “ir além da informação, apoiando em todo o processo do acolhimento e integração dos migrantes, articulando com as diversas estruturas locais e promovendo a interculturalidade a nível local.” (ACM)7.

Os primeiros centros locais foram criados em 2003 e atualmente existem 100 CLAIM, resultado de parcerias estabelecidas com diversas entidades da Sociedade Civil, Autarquias, entre outros, que em formato de cooperação realizam atendimento integrado na área das migrações. Na página web do ACM8 consta que “Estes serviços do ACM prestam apoio e informação geral em diversas áreas, tais como, regularização, nacionalidade, reagrupamento familiar, habitação, retorno voluntário, trabalho, saúde, educação, entre outras questões do quotidiano.”

Os Gabinetes de Inserção Professional (GIP) também foram alvo de cuidado pelo ACM. Os gabinetes trabalham com ajuda do centro de emprego dando suporte aos migrantes no que diz respeito a matéria profissional que é uma das mais cruciais quando falamos de integração em uma nova sociedade:

“A Rede GIP Imigrante tem um papel ativo a vários níveis: - Informação profissional para jovens e adultos desempregados; - Apoio na procura ativa de emprego; - Apoio na procura de cursos de formação; - Acompanhamento personalizado dos desempregados em fase de inserção ou reinserção profissional;”(ACM)9

6 https://www.acm.gov.pt/pt/-/cnai-centro-nacional-de-apoio-ao-imigrante

7 https://www.acm.gov.pt/pt/-/rede-claii-centros-locais-de-apoio-a-integracao-de-imigrant-3 8 https://www.acm.gov.pt/pt/-/rede-claii-centros-locais-de-apoio-a-integracao-de-imigrant-3 9 https://www.acm.gov.pt/-/o-que-sao-os-gabinetes-de-insercao-profissional-

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A despeito de Portugal estar caminhando positivamente no desenvolvimento e execução das suas políticas de integração, ainda é insatisfatório a sua estrutura para atender as demandas inerentes a população estrangeira qualificada.

“A insuficiência das estruturas de aconselhamento, a ausência ou limitação de bolsas de formação e de medidas de formação contínua direcionados para este grupo de imigrantes, impede frequentemente o sucesso da integração profissional dos imigrantes qualificados. Mesmo na presença de cursos de requalificação profissional, a insuficiência de bolsas de formação e/ou de estruturas familiares de apoio ao imigrante poderão resultar num aproveitamento deficiente das oportunidades formais de requalificação existentes.” (Góis e Marques, 2014:95)

Por fim, trazemos o Programa Português para Todos (PTT) que é uma iniciativa gerida pelo ACM com objetivo de facilitar o aprendizado da língua portuguesa dos migrantes que possuem outra língua materna. Essa aprendizagem impacta diretamente na inclusão social e profissional dessas pessoas, haja vista que o domínio da língua do país de acolhimento, facilita o aparecimento de oportunidades e o exercício da cidadania.

“A aprendizagem da língua do país de acolhimento por adultos imigrantes é também uma das orientações mais relevantes no âmbito das políticas públicas em matéria de integração, uma vez que assume um efeito mitigador de fatores de vulnerabilidade à integração, nomeadamente na inserção no mercado de trabalho e no acesso à cidadania.” (Oliveira e Gomes, 2018:142)

Conforme a página na web do ACM10 o curso tem destinação às pessoas migrantes e é gratuito:

“O Programa PPT – Português para Todos traduz-se na disponibilização à população imigrante, e sem custos para os participantes, de cursos de formação certificados de português. O conhecimento da língua portuguesa vai permitir o acesso à nacionalidade, à autorização de residência permanente e/ou ao estatuto de residente de longa duração (com o certificado de nível A2).”

E esse programa divide-se em dois cursos, um voltado para o aprendizado da língua portuguesa em si e outro voltado especificamente para o mercado de trabalho:

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“(1) os cursos de português para falantes de outras línguas com certificação para os níveis A2 (utilizador elementar) e B2 (utilizador independente) do Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas, correspondendo ambos os níveis a uma carga horária de 150 horas de formação de acordo com os referenciais de formação; e (2) os cursos de português técnico, orientados para várias atividades económicas com o intuito de facilitar a inserção dos imigrantes no mercado de trabalho em Portugal.” (Oliveira e Gomes, 2018:142)

Saindo da esfera do ACM, outro ponto merecedor de destaque por colaborar com a integração especificamente da comunidade brasileira é a existência de um tratado entre Portugal e Brasil chamado Estatuto de Igualdade de Direitos e Deveres. Como é possível entender pelo próprio nome, permite uma pessoa de nacionalidade brasileira ter os mesmos direitos e deveres que uma pessoa de nacionalidade portuguesa embora seja um estrangeiro. Ele é destinado somente para “Cidadãos de Nacionalidade Brasileira, com Título de Residência Válido, Residentes em Portugal (é necessário ser maior de idade)” (SEF)11.

Para solicitar o Estatuto é preciso preencher alguns requisitos e os direitos e deveres assegurados são os seguintes:

“Permite o gozo, sem limitações diferentes das sofridas pelos portugueses, do direito de exercício de atividades económicas, do direito ao trabalho sem limitação quantitativa, do direito de desempenhar, também sem limitação quantitativa, funções nos órgãos de sociedades ou de quaisquer pessoas coletivas; Acesso à Função Pública podendo ser exercidas funções que não sejam apenas de carácter predominantemente técnico, como acontece com os restantes estrangeiros;

Capacidade eleitoral ativa (direito de voto) nas eleições das autarquias locais (Autorização de residência há mais de dois anos);

Capacidade eleitoral passiva (candidato) nas eleições das autarquias locais (Autorização de residência há mais de quatro anos).” (Idem)

Isto posto, para finalizar, trazemos dois elementos que o relatório do SEF (2019:22) trouxe de ênfase sobre o Estatuto:

“Foram instruídos 3.354 estatutos de igualdade, dos quais 3.336 correspondem a pedidos de igualdade de direitos e deveres, e 18 a pedidos de igualdade de direitos políticos;(...)

Em 2018, registou-se um aumento acentuado do número de cidadãos que requereram estatuto de igualdade (+93,2%), confirmando a tendência verificada desde 2015 e representando o valor mais elevado dos últimos dez anos. Este aumento não pode ser dissociado da vinda para Portugal de estudantes de nacionalidade brasileira para frequência de instituições de ensino superior, procurando, por via da obtenção do Estatuto de Igualdade beneficiar da redução do pagamento de propinas.”

40 2.5 Integração profissional

Por integração profissional é possível considerar como ter um instrumento que lhe dê condições financeiras de viver dignamente. Quer dizer, ter uma actividade em que possa desenvolver uma profissão e ser remunerado financeiramente pelo trabalho desempenhado.

O mundo moderno trouxe grandes mudanças para o mercado de trabalho e as formas de trabalho e emprego. Portugal tem muitas oportunidades de emprego temporário e muito se fala para além do desemprego, em precariedade. Esta seria aquela situação de emprego mal pago, sem benefícios ou respeito ao trabalhador.

A situação de precariedade igualmente como a de desemprego, afeta a vida social e a vida pessoal de quem enfrenta essa situação. O trabalho é uma das maiores preocupações e prioridades de uma pessoa, sem trabalho não há vida social e condições de subsistência.

A teoria de mercado dual divide as dinâmicas laborais entre um “mercado primário”, aquele protegido e estável, e um “mercado secundário”, aquele inseguro e com condições ruins de trabalho. A maioria dos migrantes acaba por se inserir no mercado secundário, como podemos dar o exemplo da área dos serviços e dos operários das fábricas, mas, não exclusivamente. Existe uma parcela que se incorpora no mercado primário, desempenhando o trabalho para qual se formou e outra que, apesar de estar no mercado primário, atua em uma função abaixo da sua qualificação, como apenas um reforço da capacidade de trabalho (Malheiros, 2013).

Deste lado, quando falamos em profissionais com qualificação, falamos também em sociedade do conhecimento que precisa estar em constante desenvolvimento. São as novas formas de trabalho onde a pessoa é o maior capital de uma organização:

“Diversos factores, dos quais se destaca a globalização da economia a nível mundial, proporcionada em grande parte pelos avanços tecnológicos ao nível do tratamento e transferência de informação e ao nível dos transportes e da mobilidade de pessoas e bens, têm vindo a contribuir para uma profunda transformação no interior das organizações. As pessoas tornaram-se gradualmente no seu principal activo; deixaram de ser meros executantes de tarefas decididas e ordenadas pelos decisores de topo da organização, para passarem a constituir parte integrante na tomada de decisões. Avança-se assim gradualmente de uma era dominada pela tecnologia para uma era dominada pelo conhecimento.” (Nunes, 2016)

Independentemente de termos essa evolução, não significa que a integração no mercado de trabalho decorra de maneira de linear, estável e descomplicada após a qualificação profissional:

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“Por sua vez, as mudanças nas relações de trabalho, no estatuto e conteúdo das actividades exercidas, bem como nos modelos técnico-organizacionais de suporte ao desenvolvimento de uma "sociedade do conhecimento" exigem outros paradigmas assentes na aprendizagem ao longo da vida e na necessidade de cada um, individual e colectivamente, se preparar para a gestão da sua carreira” (Marques, 2010:18)

Muito mais do que uma formação de nível superior, é necessário haver aliás, por parte do indivíduo, uma gestão da sua carreira para conseguir se manter inserido no mercado laboral diante de tanta competição e mudanças acontecendo rapidamente. Por isso, existem alguns desafios a serem atingidos, inclusive, pelas instituições de ensino:

“Assim, no quadro da políticas de ensino superior, os principais desafios futuros passam por se concretizar os seguintes objectivos: i) desenvolver e treinar talento humano com bases sólidas de

conhecimento (know-what; know-why; know-how; know-who); ii) aumentar o grau de transferibilidade do

valor das qualificações académicas, competências e orientações culturais de formação técnico- científica; iii) melhorar os processos de transição para o mercado de trabalho com base numa cultura científica e de aprendizagem ao longo da vida; iv) impulsionar uma cultura de iniciativa empresarial e de criação de emprego: promoção do I&D e da cooperação entre empresas e instituições científicas; v) promover a co-responsabilização dos actores sociais, individuais e colectivos.” (Marques, 2010:28-29)

Diante de todos os desafios envolvidos na dinâmica de inserção no mercado de trabalho, os migrantes sofrem uma dificuldade a mais por serem “novos” no país de destino e, como já salientamos antes, ocorre de muitas vezes as suas softs skills e hard skills não serem de fato aproveitadas, consequentemente gerando, a último nível, uma exclusão social:

“a inserção dos imigrantes no mercado de trabalho ocorre, simultaneamente, no mercado de trabalho formal e informal e alguns imigrantes (e.g. provenientes da Europa de Leste) exercem profissões e trabalham em setores para os quais são sobre qualificados, o que conduz a situações de subemprego, emprego mal remunerado e desemprego; (4) os riscos de exclusão social são mais elevados entre a população imigrante, sobretudo, quando os imigrantes são excluídos do mercado de trabalho, tal como são mais difíceis os obstáculos que impedem a sua reinserção no mercado de trabalho.” (Valadas, Góis e Marques, 2014:55)

Portanto, a integração no mercado de trabalho é uma das bases de maior importância para a integração social do migrante no país de acolhimento, ou seja:

“Ter um emprego remunerado e com determinadas regalias sociais constitui um elemento privilegiado de integração dos imigrantes na sociedade. Através da participação ativa no mercado de trabalho é possível aos indivíduos provenientes de outros países ter acesso à cidadania social.” (Góis et al, 2018:60)

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