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Por que as políticas de integração de migrantes são importantes?

CAPÍTULO 2: ENQUADRAMENTO TEÓRICO DA PROBLEMÁTICA DO ESTÁGIO 2.1 O fenómeno da migração

2.3 Por que as políticas de integração de migrantes são importantes?

As políticas migratórias devem assentar em estratégias com foco na integração e combate à discriminação dos migrantes e grupos étnicos afim de se beneficiar “(...) do seu talento e competências, a valorização da diversidade cultural e religiosa, o reforço da mobilidade social, da descentralização das políticas de integração e uma melhor articulação com a política de emprego e o acesso a uma cidadania comum” (ACM, 2015:28).

Podemos dizer que ocorre um contraste perigoso quando temos comunidades distintas vivendo em um mesmo território, no entanto, sem estarem de verdade integradas. Este fato pode abrir caminho para uma falta de interconhecimento e geração de conflitos. A este propósito parece-nos oportuno apresentar duas definições presentes na literatura em torno da migração, trata-se das definições de multiculturalismo e interculturalismo.

O multiculturalismo, como é o exemplo do Canadá, “(...) parte da ideia de que os valores partilhados pelas minorias étnicas devem integrar o espaço público, sendo-lhes garantidos direitos específicos associados à sua condição de minoria, para além dos direitos universais comuns a todos os indivíduos” (Costa, 2004:187). Uma cautela provocada por este modelo é o risco dos indivíduos não serem capazes de notar a cultura do outro. Rocha-Trindade (2011:24) chama atenção para este aspeto em:

“(...) Veio a reconhecer-se que existe uma contradição intrínseca entre a intenção de manter aproximadamente intactas as diversas culturas provindas de distintos fluxos imigratórios e o risco da sua «guetização». Isto é, de manter as respectivas comunidades em situação de quase total separação em relação à sociedade maioritária, tanto no que toca a concentrações habitacionais (o que é o caso das Chinatowns), como no que respeite à manutenção de usos, regras e normas de procedimento próprios”

Por outro lado, o interculturalismo significa uma “estratégia que associa a manutenção da identidade da minoria e a sua adoção de valores nucleares da comunidade de acolhimento” (Malheiros, 2013:179). Rocha-Trindade (2011:25) realça precisamente que essa filosofia nasceu no Conselho da Europa (Estrasburgo) e serve como um guia para as políticas de migração na maioria dos países europeus e que:

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“(...) a «Filosofia Intercultural» constitui uma das formas doutrinárias mais aperfeiçoadas na procura do respeito dos princípios do pluralismo cultural. Baseia-se na intenção de promover a igualdade de direitos e de oportunidades, através do estabelecimento de um diálogo permanente, tendo por base o conhecimento mútuo entre as diversas comunidades e culturas que devem coexistir, sem separação entre elas, num dado espaço nacional.”

Face ao fenómeno da migração, destacamos aqui um trecho que valida a ideia de ser imperioso o desenvolvimento de políticas com intuito de cuidar da integração dos migrantes que chegam ao país de destino e, com isso, garantir a interculturalidade:

“«Quanto mais vos impregnardes da cultura do país de acolhimento, mais o podereis impregnar com a vossa»; e de seguida aos «outros»: «Quanto mais um imigrante sentir que a sua cultura de origem é respeitada, mais ele se abrirá à cultura do país de acolhimento»” (Maalouf, 2002:53)

Ratificando que a integração é um assunto merecedor de atenção e cuidado, escolhemos mais uma fonte, qual seja, o Papa Francisco em “Mensagem do Papa Francisco para o dia mundial do migrante e do refugiado 2018”:

“O último verbo, integrar, situa-se no plano das oportunidades de enriquecimento intercultural geradas pela presença de migrantes e refugiados. A integração não é «uma assimilação, que leva a suprimir ou a esquecer a própria identidade cultural. O contacto com o outro leva sobretudo a descobrir o seu “segredo”, a abrir-se para ele, a fim de acolher os seus aspetos válidos e contribuir assim para um maior conhecimento de cada um. Trata-se de um processo prolongado que tem em vista formar sociedades e culturas, tornando-as cada vez mais um reflexo das dádivas multiformes de Deus aos homens». Este processo pode ser acelerado pela oferta de cidadania, independentemente de requisitos económicos e linguísticos, e por percursos de regularização extraordinária para migrantes que possuam uma longa permanência no país. Insisto mais uma vez na necessidade de favorecer em todos os sentidos a cultura do encontro, multiplicando as oportunidades de intercâmbio cultural, documentando e difundindo as «boas práticas» de integração e desenvolvendo programas tendentes a preparar as comunidades locais para os processos de integração.”

Neste sentido, e fazendo o foco deste trabalho na relação migrante qualificado e mercado laboral, importa referirmos que se os migrantes estiverem dispersos em todas as camadas do mercado de trabalho, o risco de conflito é atenuado. Por outro lado, se estão, na sua maioria, exclusivamente em ocupações não qualificadas, quando detentores de habilitações superiores, como é o caso dos trabalhadores domésticos (maioritariamente mulheres), da restauração ou da construção civil, podem dar origem a tensões sociais, bem como a perdas quando resta deficiência no aproveitamento das competências destes profissionais. Para confirmar essa ideia frisamos as passagens a seguir:

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“Ainda que persista alguma segmentação do mercado de trabalho português em função da nacionalidade e que os trabalhadores estrangeiros continuem sobre representados nos trabalhos menos atraentes do mercado de trabalho português, de mais baixas ou nulas qualificações com condições de trabalho mais duras e com elevados níveis de insegurança, nos últimos anos observa-se uma ligeira diluição desta concentração, em especial no grupo profissional de base 7 (Trabalhadores qualificados da indústria, construção e artífices).” (Oliveira e Gomes, 2018:13)

“fenómenos de discriminação no acesso ao emprego que, por sua vez, têm implicações na integração dos imigrantes no domínio laboral, e que podem gerar eventuais tensões sociais e inclusive perdas (e.g., de competitividade, recursos humanos) por parte das próprias empresas e/ou de outras entidades, quando estas não sabem ou não podem aproveitar as competências e/ou qualificações de potenciais colaboradores por falta de (re)conhecimento ou mesmo de atitudes discriminatórias.” (Góis

et al, 2018:60)

Importante refletirmos sobre isso, visto que não é um desejo da população migrante ou da população local, uma explosão de tensões e, em razão disso, a importância das políticas de integração, uma vez que “A política de integração dos imigrantes tem como objetivo principal promover a coesão social, no sentido de assegurar que todos os residentes num mesmo território possam beneficiar das mesmas oportunidades e condições de vida” (Costa, 2016:68).

Dessa maneira, é necessária ação para mudar essa realidade. A diversidade precisa ser vista como fator positivo, ser aceita e, com isso, desenvolveremos uma sociedade plural. É claro que para tanto, ambos devem estar abertos para o outro. Migrante e local a assumir a sua parcela de corresponsabilidade. E mais, a abordagem deve ser global, tal como refere Costa (2016:68):

“Deste modo, a política de integração terá de ser multidimensional, incidindo sobre as esferas económica, política e sociocultural e não poderá visar exclusivamente a promoção da igualdade, da inclusão e da participação, pois deverá também procurar gerar um sentimento de pertença e de identificação entre os residentes, nomeadamente pelo desenvolvimento de laços de união resultantes da partilha de valores e práticas comuns.”

A noção de integração surge justamente do momento:

“(...) em que se instalam, os imigrantes vêem-se obrigados a assegurar um lugar na nova sociedade, não só no sentido físico (uma casa, um emprego e um ordenado, acesso aos equipamentos de educação e saúde) como também no sentido social e cultural. Os recém-chegados podem aspirar ao reconhecimento na nova sociedade e à aceitação com base nas suas diferenças ou apesar delas, sobretudo nos casos em que se vêem a si mesmo como diferentes e são vistos pela sociedade de acolhimento como física, cultural e/ou religiosamente “diferentes”.” (Penninx e Martiniello, 2010:129- 130)

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Por isso, a importância de existirem políticas de integração desenhadas quer a nível local, quer a nacional, envolvendo igualmente diversos parceiros e combinando elementos de iniciativa top-down com ações de mobilização bottom-up.

“O processo de integração deve ser considerado “aberto”, no quadro das regras das sociedades democráticas liberais, proporcionando espaço para o desenvolvimento de uma sociedade mais diversa mas mais coesa, também, mercê dessa abertura. A diversidade obtida por esta via não é predeterminada nem estática - é negociada, partilhada e dinâmica.” (Penninx e Martiniello, 2010:139)

Face às políticas públicas criadas para guiar o processo social, torna-se fundamental conhecer todos os detalhes de um processo de integração para que seja possível elaborar e implementar de forma eficaz as políticas. Ressaltamos, neste momento, dois pontos. Primeiro que é preciso ter aprovação e apoio político contínuo para o trabalho perdurar. E, segundo, que não se deve negligenciar os problemas que necessitam de real solução, isto é, dedicar-se a pensar numa estratégia para se evitar a crise, o estabelecimento da promoção da coesão social e a permissão aos Estados de colherem frutos do movimento migratório.

Para estas políticas serem viáveis a longo prazo é essencial, obviamente, objetivos realistas e também levar em consideração uma análise pragmática “(...) com a participação activa dos imigrantes e das suas organizações, pode não só conseguir evitar reacções negativas da parte da maioria da população, como também pode desenvolver uma prática mediante a qual os imigrantes são envolvidos e se sentem reconhecidos.” (Penninx e Martiniello, 2010:145).

Contudo, de outro lado, é relevante salientarmos que o migrante (lembramos que aqui falamos de migrante, aquele que se movimenta voluntariamente e não dos casos como dos refugiados e dos requerentes de asilo) precisa respeitar as regras para a migração no país escolhido como destino, tal como, fazer a sua parte na preparação para a sua nova vida. Admitido uma vez que migrar não é algo simples, integrar-se em um novo país exige planeamento e preparação, como podemos constatar em:

“(...) há um primeiro nível de contacto que abrange quer os casos em que a chegada pode ser objecto de uma preparação prévia, a partir do país de origem (que, contudo, constituem hoje, ainda, um número de casos mínimo), quer os casos em que a inserção física na sociedade de destino coloca questões fundamentais de conhecimento da língua, dos modos de vida, das oportunidades de trabalho, das condições de alojamento; e um segundo nível, continuado ao longo do tempo, assente numa interactividade entre os imigrantes e as sociedades de acolhimento, um processo sequencial de adaptação mútua que exige esforços de compatibilização aos diferentes níveis territoriais e a cargo de várias entidades, seja do Estado, seja da própria sociedade civil.” (Vitorino, 2007:30).

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No caso dos migrantes qualificados, é valioso conhecer o mercado de trabalho do país de destino, perceber quais são suas necessidades, as oportunidades e os caminhos possíveis. E ainda, compreender como funcionam as regras para ter a documentação necessária. Do contrário, o sonho de migrar pode gerar frustrações e não será necessariamente “culpa” do país de acolhimento. Com isso, é imprescindível o migrante ter consciência da sua responsabilidade.

Dessa forma, se os dois lados cumprem os seus respetivos papéis, continuamos a ter um país como um território com limites geográficos que abraça em seu corpo um grupo da população e de recursos naturais. Isso, pois, essa população se caracteriza pelo compartilhamento de diversos componentes, sejam culturais, políticos ou sociais, tornando esse país um local único. Nesta perspectiva, destacamos novamente Rocha-Trindade (2011:19):

“Dito de outro modo: só o respeito pela diferença e a existência de um sentimento de solidariedade, alicerçados nos valores universais dos Direitos do Homem, da democracia, da liberdade e da justiça social podem conduzir à coexistência de culturas diversas, sendo garantes da sobrevivência eunómica dos Estados multiétnicos e pluriculturais.”