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CAPÍTULO 1 APROXIMAÇÕES ENTRE POLÍTICAS SOCIAIS E

1.3 SÉCULO XX: DA MERITOCRACIA À UNIVERSALIZAÇÃO DAS

1.3.3 Políticas sociais

A política social é uma política que surge a partir do capitalismo burguês, nas relações econômicas e sociais, entre a classe dominante e a classe dominada. Está diretamente relacionada às necessidades básicas dos sujeitos versus o modo de produção capitalista.

Atua como política de mediação, entre a acumulação do capital e a manutenção da força de trabalho. Assim, o Estado tem o papel gerencialista, entre a força de trabalho e o preço da mesma, tal como as condições para sua manutenção (MACHADO, 2006).

De acordo com Pereira (1999, p. 63), a política social é:

[...] uma política que, por privilegiar o status de cidadania como uma prerrogativa de todos, ultrapassa a visão contratualista de proteção social e vai englobar e proteger, como um dever do Estado, o pobre, o incapacitado para o trabalho, o desempregado e o redundante (expulso em definitivo do mercado de trabalho).

O Estado implementa políticas sociais de acordo com as exigências da classe trabalhadora (demanda social), mas condicionado aos interesses do capital. Estas políticas têm caráter de regulamentação do proletariado, evitando que os conflitos sociais aconteçam, ou seja, evitar que ocorra a moderna luta de todos contra todos (HOBBES, 2009). “Entende-se que as políticas sociais do Estado, enquanto políticas

públicas, têm origem na dinâmica determinada pelas mudanças ocorridas na organização da produção e nas relações de poder nas esferas nacionais e global” (BONETI, 2011, p. 35).

Por meio das políticas sociais é possível controlar a classe trabalhadora, utilizando-se de leis que regulamentam e regulam as atividades laborais. Há ações concretas sobre a organização dos trabalhadores, com limitações financeiras e políticas. A manutenção da força de trabalho está diretamente relacionada às necessidades do capital, o que representa a subordinação direta da classe trabalhadora. Embora haja atendimento parcial de reivindicações e acesso em relação a alguns bens e serviços, a fragmentação da classe trabalhadora a enfraquece, levando ao não reconhecimento enquanto classe e a livre concorrência entre os trabalhadores (MACHADO, 2006).

Para Machado (2006, p. 28), a política social representa a moderna Lei dos Pobres, pois “seu objetivo último não é a proteção do trabalhador, mas do capitalista – e seu objetivo primeiro é transformar os legítimos direitos de vida, trabalho e proteção social da classe trabalhadora em capital privado lucrativo”.

Neste contexto, as políticas sociais representam a relação capital e trabalho. Apesar das contradições postas, a classe trabalhadora por muitas vezes se mantém estagnada, pois a atuação da classe dominante para alienação dos trabalhadores é eficaz e ao mesmo tempo cruel.

A classe dominante, detentora do poder político do Estado, se utiliza de todos os meios disponíveis (educação, mídia) para manter sua posição. A conquista de direitos sociais não representa que a classe trabalhadora está evoluindo e que se chegará a emancipação humana, mas sim representa ideologicamente a face do Estado “bom” o qual controla, seja por meio da formação ou da repressão, sua classe dominada.

Segundo Goldani (2004, p. 219),

[...] inspirada no modelo de proteção social neoliberal, a política social é reduzida a uma simples questão de combate à pobreza. O argumento central é de que a promoção do crescimento econômico com base em mercados competitivos é a única forma de melhorar o padrão de vida dos mais pobres.

A política social representa a relação entre o Estado e a sociedade, que se materializa por meio de serviços e benefícios provenientes de programas sociais, seguros ou ações protecionistas.

A proteção social visa diminuir os conflitos entre as classes e harmonizar as lutas sociais, principalmente às questões ligadas ao trabalhador e seus direitos. De acordo com Anunciação (2012, p. 28), esta proteção “[…] traduz um pacto assegurado e regulado de responsabilidade pública para com a população em determinado período histórico, a ser concretizado através de políticas sociais públicas, que se organizam no sentido de satisfazer certas necessidades sociais reconhecidas”.

No entanto, pauta-se num princípio de igualdade mínima, enquanto condição universalizada, em consonância com a ideologia dominante. Logo, tanto o sucesso quanto o fracasso são individuais, uma vez que a política social redentora “possibilita” as mesmas oportunidades a todos.

Nos meandros desta perspectiva, a política social da classe dominante apresenta a face humanista do Estado. Ela busca a manutenção do capitalismo por meio de uma ordem social estabelecida, evitando disputas. Ressalta a importância do vínculo ao trabalho, considerando a cessão de benefícios para aqueles que se enquadram nos critérios a partir das demandas (renda mínima, situação de miséria, pouca escolaridade, entre outros). Neste sentido, a igualdade na política social não significa alteração na distribuição de renda e na discrepância entre as classes sociais (FALEIROS, 2008, 2011).

Com a implementação de políticas sociais e sua devida operacionalização, torna-se possível controlar os movimentos contraditórios, integrando-os às perspectivas da ideologia dominante. Neste sentido, Althusser (2008) explica que o explorado pelo sistema capitalista acredita que a exploração é positiva.

Embora as políticas sociais venham atender as demandas provenientes da necessidade pela sobrevivência e desenvolvimento mínimo da população, estas se desenvolvem e se retraem de acordo com a conjuntura política e econômica, ou seja, o ajuste fiscal. Assim, mais do que uma adaptação à ideologia, também é necessário o ajuste às questões econômicas e de mercado (sistema capitalista). Sobre este contexto, Faleiros (2008) alerta que uma medida social enquanto política governamental representa que é positiva à população, colocando o governo como um defensor dos pobres, porém ao mesmo tempo em que aponta prioridades humanas, oculta o vínculo destas com a economia e a acumulação de capital.

Este processo de articulação promove a obtenção de consentimento da população, que aceita a manutenção da ordem social vigente. Em alguns casos, para não serem excluídos do mercado de trabalho ou do recebimento de benefícios, alguns

indivíduos optam pela não-participação evitando assim a demissão ou a perda de direitos adquiridos (FALEIROS, 2006).

Diante deste quadro, surge a emergência da organização da classe dominada, por meio de ações conjuntas, evitando que os conflitos sejam harmonizados, mas sim discutidos e equacionados, salvaguardando os direitos sociais adquiridos. Boneti (2011), explica que os movimentos sociais (que não podem ser isolados) devem se configurar como movimentos contestatórios e na busca de garantias, atuando no processo de negociação nesta correlação entre classes (repressão e ideologia). Assim, mais do que aquisição de direitos, deve-se buscar sua garantia e manutenção.

Os direitos sociais permitem uma participação mínima na riqueza material e espiritual existente na sociedade (COUTINHO, 2005). Neste sentido, o indivíduo tem como garantia questões fundamentais para a sua existência e sobrevivência (trabalho, moradia, saúde, previdência, segurança, alimentação e educação).

Todavia, a garantia dos direitos, como benefícios e serviços, não significa que o Estado tenha substituído a família. Há a articulação entre as condições econômicas e sociais, as quais modificam profundamente a vida do trabalhador. Reforça-se o discurso da igualdade e do término das discriminações, com a proteção dos fracos e oprimidos. Considera-se uma genérica ampliação dos direitos e o acesso à cidadania, mas a igualdade e a equidade social não foram atingidas (FALEIROS, 2006, 2008, 2011).

Desta forma, as políticas sociais objetivam

[...] garantir um certo mínimo para todos os indivíduos, que são considerados iguais perante a lei, mas que devem também ser desiguais em relação aos rendimentos, à habitação, à justiça para poderem ter acesso a esses direitos. A universalidade protetora revela-se discriminatória, pois vale também para os favorecidos (FALEIROS, 2008, p. 49-50).

Esta situação revela a necessidade de critérios para acesso a determinados direitos, o que reforça o individualismo frente a universalização. Os direitos sociais são para todos, desde que estes enquadrem-se nas categorias e delimitações de acesso a tais direitos. Neste sentido, os direitos universais possuem mecanismos de inclusão, mas ao mesmo tempo, também são excludentes.

Frente a esta situação, Faleiros (2011, p. 196), explica que “O véu da ignorância que perpassa as relações entre os usuários e programas só pode ser desvelado com o aprofundamento do conhecimento dessas relações, tornando a exclusão uma chaga visível no tratamento diário da mesma”.

Para que se alcance acesso aos direitos de forma equitativa e com entendimento às questões econômicas e sociais, presenciadas na sociedade capitalista, é fundamental que haja um processo crítico em relação à exclusão, que se desenvolve por meio da estigmatização e da etiquetagem social, vivenciado no capitalismo, principalmente no contexto neoliberal, das décadas finais do século XX.