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2 AGENTES EXTERNOS E SUAS INTERVENÇÕES NO ESPAÇO EM

3.7 UM ATO POLÍTICO: AUDIÊNCIA PÚBLICA

Após o processo enfrentado pelas comunidades com a Fundação Garcia D’Ávila sobre o estatuto, no final de 2004, alguns moradores, percebendo a gravidade do momento, resolveram buscar ajuda fora da comunidade. Formando uma comissão de moradores ― Elias Evangelista, Casimiro Julião, Felipe Rodrigues e Crispim de Jesus ― procuraram a Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa que os encaminhou ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).

No INCRA, foram recebidos pelo superintendente, Marcelino Galo, que pessoalmente contatou o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Renováveis (IBAMA) para saber qual era a situação da reserva Sapiranga. Esse último respondeu, via fax, que havia documento encaminhando pedido de duas RPPN’s (Reserva Particular do Patrimônio Natural) para a Sapiranga e Camurujipe. E que o processo só seria barrado se houvesse um outro processo, a pedido das comunidades em conflitos. O INCRA, mesmo assim, marcou visita para conhecer a problemática dessas comunidades in

loco.

Nesta visita, vieram o superintendente do INCRA e Ouvidoria, representantes do IBAMA (Paulo Henrique), Comissão de Meio Ambiente da Assembléia Legislativa Estadual, Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa Estadual, Movimento Negro Unificado (MNU). Essas entidades ouviram as denúncias feitas pelos moradores das comunidades e, na ocasião, o INCRA esclareceu que não poderia tomar a frente do processo, que apenas executa a demarcação do território de propriedades envolvidas em conflitos, através de uma solicitação de outro órgão, como, por exemplo, da Procuradoria Geral da República, da Fundação Cultural Palmares, da Fundação Nacional do Índio.

O representante do IBAMA justificou que não era de sua competência, pois esta se trata de uma questão agrária, ficando resolvido que a comissão de moradores voltaria ao INCRA, na tentativa de encontrar uma saída para essa problemática.

Voltando várias vezes àquele órgão, a comissão de moradores é encaminhada pelo superintendente, à Comissão de Meio Ambiente, que em audiência pública, seção especial sobre o dia internacional da água, recebe solicitação da associação de moradores. Nessa seção, foi colocada a problemática das comunidades pelo superintendente do INCRA e feito o pedido de audiência pública, pelo presidente da associação de moradores Tupinambá e registrado pela mesa daquele dia. Um mês depois foi dada uma resposta de que a Comissão de Meio Ambiente organizaria a audiência pública.

Essa comissão de moradores das comunidades esteve por várias vezes com a Comissão de Meio Ambiente (CMA), com a finalidade de organizar a audiência pública e com o objetivo de expor os conflitos entre as comunidades e a Fundação Garcia D’Ávila, procurando solucionar o problema dos moradores, sem que eles perdessem a propriedade da terra.

Várias outras entidades foram convidadas para a discussão, como a Associação dos Advogados dos Trabalhadores Rurais (AATR), Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Fundação Cultural Palmares (FCP), Comissão Pastoral da Terra (CPT), o Projeto GEOGRAFAR (UFBA), Movimento Negro Unificado (MNU), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Companhia de Desenvolvimento Urbano do Estado da Bahia (CONDER), Conselho Regional de Administração da Bahia (CRA), IBAMA, INCRA, FGD, CDH, CMA, Câmara de Vereadores de Mata de São João, Centro de Educação Popular Milton Santos (CEPMS), Comissão de Justiça e Paz (CJP), Procuradoria Geral da República, Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SEMARH), Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia (COELBA), Empresa Baiana de Água e Saneamento (EMBASA), entre outros.

Um dos problemas enfrentado pelas comunidades no dia da audiência pública foi o transporte para chegar até a Assembléia Legislativa do Estado, onde esta foi realizada.

4 VISIBILIDADE AO MOVIMENTO DE RESISTÊNCIA E INTERVENÇÃO

Conforme se observou no capítulo 3 (subitem 3.7, p. 113-14), as entidades envolvidas no ato público tiveram significativa participação em nível político, representativo e de encaminhamento. A CMA deu uma grande colaboração quando viabiliza uma audiência pública, junto à Assembléia Legistativa da Bahia, além de mobilizar outras entidades para estarem presentes, entre elas IBAMA, OAB-BA, INCRA, CPT e outras; foi via CRA que se obteve informações acerca do conceito gestor do Litoral Norte que estava em mãos de grandes empresários da construção civil e do turismo; a Associação de Moradores Tupinabá tornou público a invisibilidade das comunidades de Tapera, Barreiro e Pau Grande diante dos investimentos feitos pelas imobiliárias, prefeitura e grupos econômicos ligados ao turismo; a Fundação Cultural Palmares foi de extrema importância porque deixou claro que as comunidades tradicionais, como as do caso em estudo, teriam encaminhamentos próprios para o problema da terra e a resolução do conflito.

A intervenção dessas entidades dar-se-á no decorrer desse capítulo.

A partir da audiência pública realizada no dia 11 de maio de 2005, a problemática das comunidades se transforma em ato político de extrema relevância, não só para as comunidades Tapera, Pau Grande e Barreiro, mas também para chamar atenção para os problemas nacionais desse momento, conforme pode-se ver na Foto 14.

A mesa dessa audiência pública foi composta pelo presidente da associação Tupinambá, um representante da Fundação Garcia D’Ávila, o presidente da Comissão de Meio Ambiente, a Comissão dos Direitos Humanos. O representante da Imobiliária Açu da Torre não compareceu, nem justificou sua ausência.

Esses problemas nacionais são referentes a conflitos com os povos indígenas e comunidades tradicionais (ligadas a garimpos, madeireiras e avanço das grandes propriedades), ocupando florestas e outros espaços de interesse nacional e internacional, com relação às riquezas naturais do país que estão em pauta no processo de desenvolvimento sustentado.

O caso Sapiranga é colocado em audiência pública porque requer uma discussão mais profunda acerca da história das ocupações do Litoral Norte Baiano que tem se utilizado da mídia para manter a imagem de preservação ambiental. Sabendo-se da história de dominação e expropriação, se faz necessário um acompanhamento por parte da

sociedade para que as comunidades tradicionais, ainda existentes no espaço, não sofram danos ou mesmo desapareçam, verificando-se, portanto, a possibilidade de que seja feita uma ocupação respeitosa do espaço e que favoreça a permanência dessas comunidades sem uma visão voltada apenas para o desenvolvimento econômico, mas interação entre comunidades, poder público e empreendedores.

Fala-se ainda da interação necessária e que esta seja feita com ética e transparência, para preservar as comunidades tradicionais como Tapera, Pau Grande e Barreiro. Lembra- se que é conhecida a dinâmica permeada com o vínculo de exclusão indireta, fazendo com que essas comunidades não tenham qualquer infra-estrutura e, conseqüentemente, vendam seus patrimônios a baixo custo, busquem saídas na migração para os centros urbanos mais próximos.

Precisa-se refletir em um processo que é comum no Brasil: o Estado relegou ao abandono absoluto certos locais, fazendo com que financiamentos internacionais comprem, a baixo custos, os imóveis dessas áreas. E, mais tarde, vão aparecer empreendimentos sem nenhum compromisso com a identidade local, visando apenas lucros.

Os agravantes desses problemas no Estado são: os órgãos ligados ao movimento ecológicos estão sendo dilapidados pela politicagem e malandragem, conforme pontua o presidente da Comissão de Meio Ambiente em 11/05/2005 e acrescenta que é necessário um movimento social, indo às ruas para anular os braços do poder esdrúxulos. Ainda argumenta que é preciso uma melhor estruturação para, em conjunto com o movimento social, tornar a capacidade de enfrentamento essencial para buscar um posicionamento dos órgãos estaduais, municipais e federais, sobre questões como a abordada por esta audiência pública.

Continua enfatizando o representante que a presença do CRA, nesta audiência, é um exemplo de interlocução com as estruturas públicas, que devem ser acompanhadas do enfrentamento jurídico. Este intercâmbio deve ser com os órgãos, de forma harmônica, pois o modelo de desenvolvimento que se quer, busca preservar a vida do povo e não do capital internacional. Na defesa do povo, acrescenta, ainda, que não se quer um país bonito para os que vêm de fora, mas um país digno com aqueles que vivem aqui. E, para concluir a abertura dessa audiência, reafirma que o maior patrimônio é o povo, mas com cidadania e dignidade.