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A POLISSEMIA DA RELAÇÃO SEXUAL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO EM ÁFRICA

Capítulo 1: Panorama sobre relacionamento afetivo e/ou sexual entre pessoas do mesmo sexo

1.2 A POLISSEMIA DA RELAÇÃO SEXUAL ENTRE PESSOAS DO MESMO SEXO EM ÁFRICA

Do ponto de vista acadêmico, é também nos anos 90 que surge o primeiro trabalho sobre homossexualidade em África10. Depois de produzirem alguns trabalhos sobre

homossexualidade em diversos contextos, Murray e Roscoe foram os pioneiros em estudos sobre homossexualidade em África. Em 1998 publicam uma pesquisa de referência sobre homossexualidade no continente africano, com título Boy-Wivesand Female Husbands: studies of african homosexualities. Os autores, num primeiro momento, buscam derrubar o mito de que a homossexualidade em África é algo extrínseco às sociedades locais e através de documentos e, principalmente, de relatos de pessoas de vários países do continente, revelam que há uma grande variedade de padrões de relacionamentos afetivo e sexual entre indivíduos do mesmo sexo. De forma geral, Murray e Roscoe concluem que em África não existe uma

9 O termo “homofobia” foi introduzido nos Estados Unidos da América no final dos anos 60, pelo

psicólogo George Weinberg da Universidade da Columbia. Em um contexto em que a homossexualidade era vista como uma doença, Weinberg identificou o preconceito contra gays como uma patologia. Entretanto, neste trabalho utilizarei o termo homofobia como sinônimo de preconceito contra homossexuais de forma sociológica e não médica.

10 No campo dos trabalhos analíticos, após o trabalho de Evans-Pritchard no final dos anos 70, em

que descreve comportamentos homossexuais entre os Azande, quase vinte anos depois, Murray e Roscoe são os primeiros a sistematizarem estudos realizados por uma serie de pesquisadores no continente africano. Entretanto, os acadêmicos não eram os únicos a falarem sobre práticas homossexuais em África. O historiador Wayde Dynes (1990 apud Miguel, 2014) e o pesquisador James Neil (2011 apud Miguel, 2014) publicaram coleções de relatos de viagens, em que são descritas situações de “pederastia”, sobretudo no norte do continente. Esse vácuo de produção acadêmica por quase duas décadas se refere, como disse Epprecht, ao constrangimento em se falar sobre o assunto, uma vez que muitos dos responsáveis por estudar as culturas dos colonizados, eram financiados pelos governos europeus e pelas igrejas cristãs católicas e protestantes.

identidade homossexual como no mundo ocidental11 e que os relacionamentos afetivo-sexuais

entre pessoas do mesmo sexo acontece paralelamente ao casamento heterossexual dos envolvidos. Assim, não existe o gay e nem espaços de sociabilidade para homossexuais.

É importante destacar que o trabalho de Murray e Roscoe sobre homossexualidade em África surge como uma poderosa voz em meio ao silêncio imposto pelos acadêmicos, políticos e elites locais. Essa pesquisa abre caminho para uma série de outros trabalhos que foram realizados em diversos países do continente africano.

Um dos principais contribuintes para o trabalho de Murray e Roscoe foi Marc Epprecht, que teve o seu artigo Good God Almighty, What’s This! : Homosexual “Crime” in Early Colonial Zimbabwe incluído no livro desses autores. Com esse texto, Epprecht dá o primeiro passo para uma frutífera produção sobre homossexualidade em África, com foco no Zimbabwe.

O argumento central dos trabalhos de Epprecht é o de que embora haja discursos contra homossexualidade em África, não devemos, entretanto, rotular esse continente como homofóbico, uma vez que muitos africanos não conhecem esse conceito e a realidade do dia a dia das vidas afetivo-sexuais, em muitos países africanos, é bem mais complexa do que se pode aparentar.

Adapto da teoria queer, que busca analisar homossexualidade relacionando sexualidade, discurso e política econômica, Epprecht acredita, assim como Foucault (1988), que o desenvolvimento cientifico e industrial contribuiu para a transformação das ideias sobre a natureza da sexualidade, das concepções de gênero e das construções das identidades sociais.

11 Trabalhos como o de Carrara e Simões (2007) e de Shana Calixte (s/d) demonstram que o

chamado mundo ocidental não tem uma concepção de homossexualidade homogênia. Os primeiros autores destacam que no Brasil devemos levar em conta que existe um sistema de hierarquização relacionado com os signos de distinção de classe Segundo eles, “tal “hierarquia” mantinha não apenas intocado o estigma e a reprovação social de que já eram objeto privilegiado homens “afeminados” e travestis, mas o aprofundava, marcando todos eles com a pecha de “atrasados”, politicamente incorretos, retrógrados etc.” (2007:75). No Brasil, portanto, vemos uma recusa ao binarismo ocidental de hierarquização da sexualidade. Nossa classificação não se prende ao homo- hetero ou homem-bicha, mas trabalha com categorias mais flexíveis de identidade sexual. Desse modo, podemos dizer que a nossa forma de classificação sexual é não-ocidental. Da mesma forma, Shana Calixte revela que as mulheres da diáspora afro-caribenha apresentam uma gama de identidades (homo) sexuais, em que recriam uma identidade queer à luz de mitos e memórias nostálgicas da diáspora.

De acordo com o autor, antes do período colonial no continente africano, as práticas sexuais entre pessoas do mesmo sexo não tinham destaque na sociedade, assim como as demais formas de relações sexuais.

Segundo Epprecht:

“Individual sexual desire was largely subsumed to the broad interests of the extended family or lineage. Those interests included reputation, political alliance, material production, spiritual health, and ritual protection of the natural environment. Yet people being pleople, individuals could and did sometimes veer from the preferred path through adolescence to fecund and loyal marriage. (2008: 37)

De forma geral, Epprecht verificou que na maior parte das sociedades africanas, o importante era estabelecer as alianças entre famílias e linhagens através do casamento e garantir sua reprodução com a concepção de filhos. Para o autor a África não deve ser entendida como um continente homofóbico, mas antes, tem de ser compreendido que a ideia de prazer sexual e diversidade de práticas sexuais, não é, para o africano, uma temática social, pois a preocupação de um adulto deve ser a de estabelecer uma família. Além disso, a herança cristã do período colonial reforçou a concepção de foco na construção e manutenção de uma família, em que o sexo é apenas para procriação e não para diversão. Assim, o autor afirma que a ressignificação negativa das práticas sexuais fora do propósito de procriação, teve espaço durante o período colonial e sobreviveram após os processos de emancipação dos países colonizados.

No século XVIII, Edward Gibbon em seu livro History of the Decline and Fall of the Roman Empire lançou uma teoria de que os africanos teriam sido contaminados pela homossexualidade dos ocidentais, assim como os primitivos romanos foram influenciados pelos etruscos e gregos, pertencentes às sociedades mais civilizadas na época12. (Citado por

Murray e Roscoe, 1998: XII.)

12 É importante destacar que embora Gibbon tenha colocado a homossexualidade no período da

antiguidade clássica e a praticada no período colonial no mesmo plano, na década de 80 Paul Veyne (1985) detalha as diferenças de significado das práticas homossexuais entre os gregos e romanos e as das sociedades ocidentais do século XIX. Segundo ele, embora haja um senso comum em torno de uma aparente liberalização da vida sexual entre pessoas do mesmo sexo entre os gregos e os romanos na antiguidade, o autor revela que nessa sociedade a homofilia era abolida como relações extraconjugais entre cidadãos. Entre os homens, fazer sexo com outro homem não era por si mal visto, o que era considerado desprezível era um homem livre ser passivo em uma relação homossexual. Já para o escravo era aceito como passivo em relações sexuais com o seu “senhor”. Entre homens livres a passividade na relação sexual era vista como desonra. Veyne diz: “O indivíduo passivo não era lascivo por causa de seu desvio sexual, muito pelo contrário: sua passividade não era senão um dos efeitos de sua falta de virilidade, e essa falha permanecia sendo um vício capital

Durante o período colonial, administradores coloniais e membros de igrejas cristãs, ocultaram as práticas homossexuais dos africanos e estabeleceram a heteronormatividade13 como parâmetro de relacionamentos afetivo-sexuais. Mesmo nos

estudos científicos da época, Epprecht afirma que a homossexualidade em África foi invisibilizada por grande parte dos pesquisadores devido ao desconforto ou repulsa que eles próprios sentiam, devido à formação religiosa da maior parte deles. É somente a partir do século XIX, que passamos a contar com relatos de sexo homossexual entre africanos, particularmente em textos antropológicos. Entre os mais conhecidos estão os trabalhos do antropólogo E. E. Evans-Pritchard (1970) e do missionário e etnógrafo Henri Junod (2009).

Nos anos 70 Evans-Pritchard divulga, em um periódico de circulação restrita, a existência de casamentos homossexuais entre os Azande. Segundo o autor, antes da colonização europeia, a realização de um matrimônio temporário entre homens jovens e homens mais velhos era comum para os Azande. De acordo com os relatos recolhidos pelo pesquisador, essa relação entre homens serviria para evitar o adultério (algo mal visto e punido severamente, resultando inclusive na amputação de partes do corpo do rapaz, inclusive do órgão genital), uma vez que as moças casar-se-iam mais cedo e os rapazes ficariam sem parceiras sexuais. Assim, entre os 11 e os 20 anos, o rapaz poderia se casar com um nobre, em troca de dinheiro para família do jovem. Quando o jovem arrumasse uma moça, seu casamento com o homem mais velho seria desfeito.

Entre as mulheres Azande, Evans-Pritchard também encontrou relatos de práticas homoeróticas antes da chegada dos europeus. Embora proibida socialmente, o lesbianismo era praticado, sobretudo, entre as mulheres que viviam em lares poligâmicos. A falta de exclusividade e atenção do marido para com suas mulheres fazia com que elas procurassem satisfação sexual entre elas mesmas. Para o autor, entretanto, a prática homossexual entre os Azande não deve ser explicada como uma condição social, mas antes como práticas conjecturais, impostas pelos homens.

mesmo na ausência de homofilia” (1985:44). Em suma, entre gregos e romanos da antiguidade, a moral da época condenava não o ato sexual entre dois homens em si, mas o instinto libertino por trás de tal prática. O “pederasta” era visto como um libertino, uma pessoa que só pensava em prazer. Mas é importante destacar que essa reprovação não era do ponto de vista do sagrado, mas antes da moral.

13 Nesse trabalho vamos utilizar a concepção de heteronormatividade conforme os sentidos que

Didier Eribon (2008) faz do termo. Para esse autor, a heteronormatividade é a subjugação da subjetividade homossexual às normas da linguagem heterossexual manifesta nos discursos e nas práticas cotidianas. Esse processo abre espaço para a violência simbólica (e muitas vezes física) como algo “natural” no seio da sociedade.

Em sua pesquisa no sul da África entre o final do século XIX e início do século XX, Junod encontra entre os Tsonga uma prática homossexual semelhante àquela relatada por Evans-Pritchard entre os Azande. Trabalhadores das minas na África do Sul mantinham uma espécie de matrimônio temporário entre homens mais velhos com homens mais jovens. Assim como os Azande, esse casamento era uma forma de os jovens mineiros juntar dinheiro para pagar o lobolo quando voltassem para casa. Segundo Junod, os mais jovens, além de satisfazer sexualmente seus mantenedores mais velhos, deveriam manter a organização do dormitório onde moravam. O autor relata, indignado, que ao cuidar da “casa”, alguns jovens traziam capulanas ao corpo, como se fossem mulheres. Essa discrição de Junod constitui as ultimas linhas do seu trabalho sobre um extenso e detalhado estudo sobre os Tsonga, e parece servir mais como forma de denúncia e crítica aos dirigentes das minas por permitir que esse “vício” de fora adentrasse nesse local sem ser devidamente combatido. Em suas palavras:

“Pode afirmar-se que este vício foi ensinado aos Bantu sul- africanos por homens de outras raças, que penetrou primeiro nas prisões e que agora faz furor nestes grandes agrupamentos de menos indígenas onde deflora a mocidade Bantu, pois se não destrói subitamente a sua força física, esta perversão de uma das funções essenciais do homem corrompe as origens da energia moral e põe em perigo os próprios fundamentos da vida social Bantu (...) A conclusão que se impõe quando se estuda este doloroso assunto é a de que, como a civilização branca é responsável pela introdução e desenvolvimento terrível deste vício entre os indígenas, os brancos não devem ser indiferentes à repressão do flagelo que é uma inequidade que ameaça a própria vida da tribo do sul de África”. (2009:391)14

Anos mais tarde, as pesquisas sobre homossexualidade em África procuraram contextualizar e compreender o significado êmico das relações sexuais mantidas entre pessoas do mesmo sexo antes do período colonial. Através de coletas de relatos entre os mais velhos, alguns pesquisadores verificaram que não existia no continente africano a ideia que fazemos no ocidente sobre homossexualidade. Apesar de haver relações sexuais entre pessoas do

14 Patrick Harries (1990) observa que os missionários religiosos como Junod, faziam visitas rápidas às

minas e ficavam horrorizados com o aspecto do local e com as condições de vida e de trabalho dos mineiros. Para eles, WitWatersrand era uma espécie de Babilônia. Dessa forma, Harries alega que o pouco tempo que Junod passou entre os mineiros na África do Sul, não o permitiu compreender as especificidades das relações homossexuais entre esses trabalhadores. De acordo com o autor, a bukhontxana era mais do que um relacionamento sexual entre pessoas do mesmo sexo, era uma espécie de união entre um jovem mineiro com outro mais velho. Nessa relação, além do sexo, havia cuidado mútuo, proteção e incentivo financeiro dos mais velhos para os mais novos, como forma de poupança para pagar o lobolo no retorno para sua comunidade.

mesmo sexo, não havia o estatuto social do gay. De uma forma geral, as sociedades africanas do sul do continente são fundamentadas na formação da família como base para a reprodução social. Ninguém se torna uma pessoa sem estar associado a uma família. Além disso, em grande parte das culturas africanas, como mostra Izugbara e Undie (2008), a noção de corpo e os cuidados a ele associados merece um trabalho detido.

Em um estudo entre os povos do sudeste nigeriano, Ngwa-Igbo e Ubang, os autores desvendam que o corpo não é de propriedade do individuo, mas sim da comunidade. De forma geral, a existência de práticas homossexuais em África não excluem de suas vidas a relação heterossexual e o desejo de construir uma família. Ainda sobre as sociedades do sul da África, Mikki van Zyl (2011), afirma que para entendermos a África Austral, devemos estudar a filosofia Ubuntu, que não possui a noção de indivíduo, mas antes, a noção de pessoa está atrelada à ideia de comunidade15. Assim, segundo o autor:

“In Ubuntu, the southern African sociocommunal philosophy, individual existence is expressed through communal interdependencies, sharing, reciprocal obligations, and responsibilities. Therefore in Ubuntu freedom is circumscribed by belonging in a community, primarily referenced through kinship”. (2011:337)

Além disso, como já apontara Epprecht sobre o Zimbabwe, na filosofia Ubuntu, há uma separação entre sexo para procriação e sexo para prazer. Van Zyl diz que os colonizadores juntaram as duas formas de fazer sexo sob a rubrica do casamento e o determinou como heterossexual.

15 De forma comparativa e procurando respeitar as especificidades epistemológicas de cada filosofia,

com base nos trabalhos de Mbiti (1992) e Menkiti (1984), pode-se dizer que a noção de pessoa apresenta algumas distinções claras entre a noção dita ocidental e a chamada de africana por esses autores. Segundo eles, na concepção ocidental uma pessoa é um individuo único e essa individualidade lhe confere sua noção de existência. Na filosofia africana, entretanto, uma pessoa só pode ser definida em referência à sua comunidade e não são seus atributos físicos ou psicológicos que importam nesse processo, mas sua percepção de pertencimento a uma sociedade, com língua e regras próprias e, sobretudo, pertencer a uma linhagem e ter ancestrais para lhe guiar. Assim, uma pessoa não é relacionada à sua capacidade racional ou às suas memórias, mas sim ao conjunto de referências que a insere na sua comunidade. Essa inserção não é garantida a priori apenas pelo nascimento de um indivíduo numa sociedade, ele tem que conquistá-la através da participação na comunidade, respeitando as regras definidas pelo coletivo e passando por todos os rituais, de modo a ser considerado apto àquela comunidade. Diferentemente do ocidente, onde a sociedade é organizada em termos de individualismo e garantia dos direitos individuais, nas sociedades africanas, a comunidade é organizada através dos deveres que cada um tem para com a sua sociedade.

Na filosofia Ubuntu, o parentesco é a base dos relacionamentos e a fertilidade é uma ligação espiritual entre passado e futuro. Apesar da forte ligação entre casamento e parentesco, não é raro que se encontre entre os Ubuntu o casamento poligâmico, que em algumas culturas pode se dar entre parceiros do mesmo sexo. Segundo Van Zyl, o prazer sexual entre os Ubuntu não se restringe ao casamento e é comum homens e mulheres terem amantes. Não obstante a essa aparente liberdade sexual, o sexo fora do casamento é invisibilizado, não recebia nome e por isso não era policiado. Assim como Epprecht, Van Zyl alega que foi com a entrada dos colonizadores europeus e com a disseminação do cristianismo que o casamento heterossexual e monogâmico ganhou hegemonia ascendente em África.

Ao analisar de forma mais detida as relações entre pessoas do mesmo sexo na primeira década dos anos dois mil em África, Christophe Broqua (2012), revela que a literatura sobre relações homossexuais em território africano apresenta basicamente três tipos de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo.

O primeiro tipo de relações entre pessoas do mesmo sexo identificado em algumas partes da África é uma diferenciação entre gênero, que cria uma espécie de terceiro gênero que não é nem masculino e nem feminino. Pessoas alinhadas a esse tipo de gênero recebem um lugar na sociedade, sem passar por processos discriminatórios.

Em vários locais do continente africano, é comum um segundo tipo de relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo, que se estabelece entre homens de faixas etárias diferentes, em que homens mais velhos iniciam e mantém um jovem como aprendiz. Esse tipo de relação está dentro do que é esperado nos ritos de iniciação de rapazes. Tal prática é relatada em estudos relativos ao denominado período da antiguidade clássica no continente europeu, em que os mais velhos ensinavam um ofício aos meninos também os iniciavam na vida sexual.

O terceiro tipo de relação entre pessoas do mesmo sexo presente em África é mais atual e é baseado no modelo construído no mundo ocidental durante a década de 60, em que a homossexualidade não está associada a rapazes com trejeitos afeminados e moças masculinizadas, mas antes são duas pessoas do mesmo sexo que mantém uma relação afetivo- sexual. Não há desigualdade de gênero e nem de faixa etária, e cada um vive a sua homossexualidade como forma única de ser e estar no mundo, sem precisar ter uma vida paralela.

Em 2005, Broqua realizou uma pesquisa entre os Bamako, no Mali. Com foco sobre a sexualidade entre esse grupo étnico, o autor observou que a ideia de

homossexualidade não está relacionada com a orientação sexual do sujeito, mas sim pela sua identidade de gênero. Assim, o homem que tem trejeitos femininos é pejorativamente chamado de “serpente”, devido à ondulação do caminhar e, sobretudo, pela associação desse comportamento com a falta de virilidade. Nesse contexto, um homem que se mostra viril, pode ter relações sexuais com outros homens sem ser estigmatizado como “serpente”, pois o que importa é a sua identidade de gênero masculina.

Além desses tipos de relações homossexuais baseadas na diferenciação de gênero entre os Bamako, Broqua também verificou a existência de relações sexuais entre homens de gerações etárias diferentes como forma de iniciação para os mais jovens. Um adulto traz para o seu convívio um jovem da comunidade para lhe ensinar os princípios da sociedade e iniciá- lo na arte do sexo. O autor afirma que esses dois modelos de relações sexuais entre homens não é algo especifico dos Bamako e nem de outra sociedade africana, pois esses dois modelos de homossexualidade já existiam entre os nova-iorquinos.