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Posição sistemática e circunscrição filogenética

Uma revisão do grupo Ocotea indecora (Lauraceae) *

5.3. Posição sistemática e circunscrição filogenética

Rohwer (1986) circunscreveu o grupo O. indecora, com sete espécies, pela presença de papilas em toda a antera, enquanto outros grupos possuiriam papilas apenas no ápice das anteras. Todavia, essa caracterização nem sempre é eficaz, pois O. lanata, incluída no grupo O.

indecora, pode ter papilas apenas no ápice das anteras e O. lobbii e O. porosa, posicionadas em

outros grupos, têm papilas dispostas esparsamente em toda extensão das anteras.

No contexto da sistemática moderna, análises filogenéticas moleculares (Chanderbali

et al., 2001, (Li & Christophel, 2000; Rohwer, 2000; Chanderbali et al., 2001; Li et al.,

2004; Rohwer & Rudolph, 2005) e combinadas (morfologia e moléculas) (vide Capítulo 3) foram simuladas para reavaliar as circunscrições genéricas de Lauraceae. Em ambas as abordagens, Ocotea emerge como polifilético. As espécies dióicas do gênero, entre as quais a espécie-tipo, O. guianensis Aubl., aparecem relacionadas às espécies de Endlicheria Nees e Rhodostemonodaphne Rohwer & Kubitzki, e as espécies hermafroditas, como aquelas do grupo O. indecora, aparecem próximas de gêneros tais como Aniba Aubl., Dicypellium Nees & Mart., Licaria Aubl., Paraia Rohwer, Richter & van der Werff e Urbanodendron Mez. No entanto, mais evidências e amostragem de táxons são necessários antes que uma circunscrição filogenética possa ser providenciada (vide Capítulo 3).

O grupo O. indecora foi representado em Chanderbali et al. (2001) por um único espécime,

Lorea 5578, identificado como O. odorifera, mas agora considerado uma espécie nova, O. callyscipha (Assis & Mello-Silva, dados não publicados c). Subseqüentemente, cinco espécies, O. callyscipha, O. indecora, O. odorifera, O. prolifera e O. ramosissima, taxonomicamente

posicionadas dentro do grupo O. indecora (Rohwer, 1986; Assis et al., 2005; Assis & Mello- Silva, dados não publicados a, b, c) foram amostradas (vide Capítulo 3). Na análise morfológica, o grupo é parafilético, e a inclusão de duas espécies de Ocotea subgen. Dendrodaphne Beurl. torna-o monofilético (vide Capítulo 3; Fig. 2). Na análise da rnITS, o grupo não é monofilético e uma politomia obscurece a relação de O. indecora com as outras espécies do grupo. Todavia, essas outras espécies estão dentro de um clado mais inclusivo, irmão de Ocotea insularis (Meisn.) Mez (vide Capítulo 3; Fig. 3). Finalmente, o grupo emerge como parafilético na análise simultânea, mas a inclusão de O. porosa torna-o monofilético (vide Capítulo 3; Fig. 4) Entre essas hipóteses conflitantes, o monofiletismo do grupo é sustentado e justificado pela análise combinada, seguindo assim o princípio de evidência total (Rieppel, 2009; vide Capítulos 3 e 4).

plesiomórfico e ‘presente’ como apomórfico. Papilas nas anteras tiveram origens múltiplas no complexo Ocotea e não definem o grupo O. indecora. Ao invés disso, papilas em anteras e tépalas (Fig. 1 A-E) é sinapomorfia de um nível mais inclusivo de universalidade, que inclui o grupo O.

indecora. Em uma classificação filogenética, esse clado com flores papilosas corresponderia a

um novo gênero (vide Capítulo 3).

Nesse clado, a sinapomorfia morfológica que define o grupo O. indecora é o crescimento rítmico dos ramos (Fig. 1F), que está associado com a presença de catafilos e com a distribuição agrupada das folhas no ápice dos ramos. Todavia, a otimização do crescimento dos ramos é ambígua e esse crescimento pode ter aparecido independentemente em O. indecora e no clado constituído por O. callyscipha, O. odorifera, O. prolifera e O. ramosissima, ou se originado uma vez e ter sido perdido em O. porosa. Diferentes argumentos priorizam reversões ou convergências de caracteres ambíguos. Pinna (1991) defende que reversões mantêm a hipótese de homologia primária. Agnarsson & Miller (2008) preferem relativizar a opção por convergência ou reversão, segundo a complexidade do caráter. Tem sido assumido que estruturas complexas são mais fáceis de serem perdidas do que obtidas (Agnarsson & Miller, 2008), mas o crescimento rítmico é uma condição que apareceu e desapareceu múltiplas vezes em Lauraceae. Uma única origem dessa disposição de crescimento dentro do clado com flores papilosas, no entanto, sustentaria o monofiletismo e a circunscrição do grupo O. indecora, com reversão em O. porosa que, embora membro do grupo, não apresenta o estado de caráter que o definiria. Por esse motivo, Meissner (1864, 1866) jamais inclui O. porosa como um membro de Verticillatae, que abrigava espécies do grupo O. indecora e era definido pela filotaxia “verticilada”, na verdade um arranjo de folhas alternas e agrupadas no ápice devido ao crescimento rítmico (Hallé et al., 1978; vide Capítulo 3).

Convergências também oferecem problemas. O grupo O. indecora apresenta anteras e tépalas papilosas. Entretanto, papilas nas anteras e tépalas ocorrem também no clado Ocotea subgen. Dendrodaphne, e crescimento rítmico ocorre independentemente no clado Paraia / Ocotea subgen. Dendrodaphne. A ocorrência dessas convergências gera dificuldades de posicionamento de espécies não incluídas nas análises filogenéticas. As similaridades entre esses grupos foram previamente discutidas (Rohwer, 1986; Baitello, 1993). No entanto,

Ocotea subgen. Dendrodaphne tem estames ligulados como sinapomorfia, enquanto o grupo O. indecora tem estames estipitados, uma plesiomorfia dentro do complexo Ocotea. Além disso, Ocotea subgen. Dendrodaphne, Dicypellium, Paraia, Systemonodaphne e Urbanodendron

(Rohwer, 1988) constituem um clado com cúpulas de margem dupla como uma de suas sinapomorfias, enquanto a maioria das espécies do grupo O. indecora tem cúpulas com uma única margem, uma condição plesiomórfica.

Juntamente com as seis espécies incluídas na análise filogenética (vide Capítulo 4), mais 14 espécies, não incluídas nas análises e todas com crescimento rítmico dos ramos, são aqui tratadas indutivamente como pertencentes ao grupo. Nessa sua primeira circunscrição filogenética, o grupo O. indecora compreende 20 espécies desde a Colômbia e Trindade e Tobago até o Paraguai, com centro de diversidade na floresta atlântica do sudeste do Brasil (Fig. 2).

Figura 1. Ocotea porosa – A. Anteras papilosas no ciclo I; Ocotea lobbii – B. Anteras papilosas no ciclo I; Ocotea

odorifera – C. Anteras papilosas no ciclo I – D. Detalhe das papilas nas anteras do ciclo I; Ocotea complicata – E.

Papilas nas anteras do ciclo I; Ocotea sassafras – F. Crescimento rítmico dos ramos. Coleções – A. Ribas & Luz

1546 (MBM); B. Hatschbach 48361 (MBM); C-D. Assis et al. 1167 (SPF); E. Assis et al. 1185 (SPF); F. Assis et al. 1157 (SPF). Barra de escalas – A-C. 100 Mm – D. 25 Mm – E. 50 Mm – F. 3 cm.