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6. SUPRIMENTO DE GNL FLEXÍVEL PARA ATENDIMENTO À GERAÇÃO

6.3. Posicionamento do Mercado Brasileiro no Mercado de GNL

Em vista do exposto nos itens anteriores, se pode efetuar uma avaliação do posicionamento do mercado brasileiro em relação à sua entrada no mercado de GNL, analisando suas vantagens e desvantagens.

Podem ser consideradas vantagens apresentadas pelo mercado brasileiro:

1) O suporte governamental para a implantação da infra-estrutura necessária à importação de GNL, bem como a tomada da “Decisão Final de Investimento” (FID – Final

Investment Decision), pela Petrobras, com o afretamento dos 2 navios tipo FSRV.

Essas ações colocaram o Brasil em um patamar mais destacado em relação a vários outros projetos de importação de GNL, os quais se encontram em diferentes fases de desenvolvimento, mas não podem ser considerados como um acesso definitivo aos seus mercados, por não terem tomado uma decisão de investimento que torne sua implantação irreversível. Isto também proporcionou um maior respaldo às negociações da Petrobras em busca de suprimento de GNL, que tem se apresentado como uma oferta fundamental para o país em um horizonte de curto e médio prazo.

Deste ponto se destaca também a atuação articulada do governo brasileiro e da Petrobras junto às Companhias Estatais de Petróleo, o chamado “NOC approach”, tendo em vista que as principais empresas supridoras de GNL e detentoras de reservas de gás natural

43 Onde VR significa o valor de referência, definido no Decreto 5.163/2004 e PMED significa o PLD médio mensal do SIN, ponderado pela carga dos submercados.

são companhias estatais como a Petrobras, com controle ativo dos seus respectivos governos. Isto não significa que se deve destacar a “politização” da ação empresarial esperada de agentes supridores de GNL e gás natural, mas sim, a busca de um alinhamento estratégico que permita ao Brasil se apresentar como um mercado atrativo e competitivo.

Aqui cabe destacar também todo o trabalho que vem sendo realizado pelo governo na integração entre os mercados de gás natural e de energia elétrica, bem como no estabelecimento de bases que permitam à geração termelétrica a gás natural, via GNL, se tornar uma alternativa competitiva. Entretanto, é preciso reconhecer que ainda resta uma agenda de discussão fundamental para que se possa atingir o objetivo proposto.

2) A complementaridade de demanda para geração termelétrica do mercado brasileiro, durante o período seco (de maio a outubro), em relação à demanda para aquecimento dos mercados do hemisfério norte, durante o inverno (novembro a abril), que se apresenta como uma característica quase que única no mundo. O mercado brasileiro tem uma oportunidade ímpar de desenvolver um modelo de suprimento que possa se apropriar da perspectiva de preços de gás natural mais baixos durante o período de maior probabilidade do despacho termelétrico. Porém, é fundamental se avaliar as condições para estabelecer uma “sazonalidade” para nossa demanda termelétrica que permita capturar tal oportunidade.

3) A logística de suprimento ao Brasil é compatível e, na maioria dos casos, vantajosa, com a maioria das fontes supridoras em relação ao mercado americano, sendo que o mercado brasileiro tem condições de se apresentar também como um mercado atrativo na formação do preço net back, garantindo o repasse da variação do preço do gás natural (e do GNL) com base no mesmo indexador do mercado americano (Henry Hub).

Entretanto, quando analisada a hipótese de compartilhar a flexibilidade com outros mercados, notadamente o europeu e o asiático, essas questões carecem de uma análise mais detalhada. De uma forma simples, a logística de atendimento pode ser vantajosa, para Trinidad e Oeste Africano em relação ao caso europeu e inclui também o Mediterrâneo para o caso asiático. Cabe ainda um estudo mais detalhado de aproveitar a complementaridade entre mercados que sejam relativamente eqüidistantes da fonte supridora, como é o caso do atendimento ao Brasil e à Península Ibérica, a partir do Oeste Africano. Nessa hipótese, a logística de atendimento aos dois mercados seria muito semelhante, gerando uma baixa ociosidade decorrente do arranjo de compartilhamento sazonal do suprimento.

Porém, se o compartilhamento das cargas com esses mercados (europeu e/ou asiático) for limitado apenas ao período seco (verão desses mercados), é bastante possível que estes volumes fossem, originalmente, redirecionados ao mercado norte-americano (o swing

market). Dessa forma, as considerações feitas em relação ao mercado americano, tanto para a

logística, quanto para a referência de preços, deverão ser aplicáveis ao compartilhamento com os outros mercados, pois o mercado americano representaria o custo de oportunidade e regularia a arbitragem dos mercados.

4) A utilização de terminais flutuantes, com conversão de navios existentes em FSRV, efetuando a armazenagem e a regaseificação do GNL, mantendo as características de navegação e de transporte de GNL do navio, permite uma maior flexibilidade nos arranjos de suprimento. Desta forma, a possibilidade de otimização do uso do terminal flutuante como o navio que efetuará o transporte do GNL (ou seja, recebendo as cargas na modalidade FOB), permite a diminuição do custo fixo do terminal, pela alocação de uma parcela significante de seus custos no transporte e diminuindo o seu tempo de permanência nos terminais, bem como sua taxa de ociosidade. Além disso, um arranjo em que os navios permaneçam transportando GNL de forma contínua, seja para o Brasil ou para um mercado alternativo, aumenta a confiabilidade do suprimento, pois o redirecionamento das cargas pode ser efetuado de forma mais rápida e controlada.

Outro ponto relevante é a possibilidade de realocação do terminal flutuante para outros pontos de acesso ao mercado, o que se aplica muito bem ao caso brasileiro, pois a sua malha de transporte e o seu mercado consumidor se desenvolveram ao longo da costa brasileira. Desta forma, a medida da evolução do mercado, os pontos de acesso do suprimento de GNL à malha de transporte de gás natural podem ser redefinidos mais rapidamente e a custos menores que as adaptações da malha44. Outra possibilidade é a utilização desses terminais em outros países, tendo em vista a tendência de desenvolvimento de projetos com concepção semelhante em diversos locais.

O menor prazo para implementação desses tipos de terminais, de 2 a 3 anos desde a concepção, também é um grande atrativo desta solução, devendo, todavia, ter bastante atenção aos valores dos investimentos, para evitar o pagamento de “taxas de emergência” desnecessárias ou que não tragam contrapartidas econômicas ao projeto.

44 Um dos motivos que suportaram a implantação do terminal de recebimento de GNL em Pecém foi o cancelamento dos investimentos de US$ 800 milhões para a duplicação dos gasodutos Gasfor e Nordestão, no trecho de Pilar até Pecém, visando o atendimento das duas UTEs instaladas em Pecém (Termoceará e Termofortaleza).

Como nem tudo são flores, também devem ser consideradas algumas desvantagens apresentadas pelo mercado brasileiro:

1) A flexibilidade requerida pelo mercado brasileiro, apesar de se configurar também como uma oportunidade, representa um grande desafio, uma vez que a flexibilidade do mercado de GNL ainda é limitada e se encontra em fase de desenvolvimento. Como o mercado de GNL tradicionalmente era um mercado “ponto-a-ponto”, funcionando quase como uma espécie de gasoduto virtual, as empresas ainda possuem limitações na capacidade de prover flexibilidade no suprimento de GNL, ainda que seja notável a rapidez com que esse mercado vem evoluindo.

Além disso, o desenvolvimento de um portifólio de ativos para prover maior flexibilidade leva um longo tempo, dado o prazo de implantação dos projetos, devendo também ser muito bem formatado, de maneira a evitar a desotimização no uso dos ativos, incrementando os custos fixos (indesejáveis à manutenção da competitividade da geração termelétrica).

Cabe ainda ressaltar a expectativa de que essa flexibilidade seja provida a um custo. Caso o mecanismo possa ser formatado de maneira que esse custo fique embutido no preço do GNL, sendo pago somente quando a carga for efetivamente recebida, será possível efetuar o repasse desse custo. Se, ao contrário, esse custo for tratado como um prêmio a ser pago pela opção quando esta não for exercida (cancelamento da carga), o gerador acabará arcando com esse custo ou então irá incluí-lo na Receita Fixa, reduzindo sua competitividade.

2) A utilização exclusiva de arranjos de suprimento de GNL de curto prazo e spot de forma a suportar a incerteza do despacho termelétrico pode trazer dificuldade em garantir o suprimento na hipótese de requerimento durante o período de inverno do hemisfério norte (dezembro a março). Nesse período, os preços têm forte influência da arbitragem, levando ao pagamento de elevados prêmios para conseguir atrair volumes, havendo ainda uma possibilidade de falha pequena (porém muito mais elevada do que no período de verão). Desta forma, é recomendável formar um portifólio de contratos de suprimento que dê um mínimo de garantia, sem expor o fornecedor a uma necessidade de desvio constante de cargas, minimizando as ineficiências e os custos fixos. O desenvolvimento das condições para permitir uma maior “sazonalidade” da demanda termelétrica também ajuda a mitigar estes riscos.