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Toda pesquisa se baseia em um conjunto ainda que não explícito de pressupostos epistemológicos, isto é, relacionados à natureza do conhecimento e à forma como ele pode ser obtido (MYERS, 1997; HIRSCHHEIM, 1992). Uma forma possível de se classificar a pesquisa de acordo com seus pressupostos epistemológicos

>= é apresentada por Orlikowski e Baroudi (1991), que levam em conta três grandes categorias, ou "perspectivas" de pesquisa: positivista, interpretativista e crítica. Embora a perspectiva positivista seja dominante nos projetos de pesquisa relacionados ao estudo de TI (ORLIKOWSKI e BAROUDI, 1991), a perspectiva interpretativista vem sendo crescentemente aceita na área (WALSHAM, 1995, DE VILLIERS, 2005).

Embora não seja a única existente na literatura26, esta classificação tem sido

considerada bastante útil para a caracterização das pesquisas realizadas na área de TI e de sistemas de informação (CHEN e HIRSCHEIM, 2004; WALSHAM, 1995; DINIZ et al., 2006). Não é objetivo aqui discutir de forma detalhada os fundamentos de cada uma destas três perspectivas – mesmo porque isso já se encontra feito com propriedade por Orlikowski e Baroudi (1991) –, porém podemos resumir assim as características que nos interessam para a discussão deste capítulo:

Pesquisas com perspectiva epistemológica positivista pressupõem a realidade como um dado objetivo, isto é, que pode ser descrito por meio de eventos observáveis e mensuráveis, independentes do pesquisador (MYERS, 1997). Nesse sentido, são características marcantes da postura positivista a suposição de neutralidade do observador e a busca de representações isentas e objetivas, caracterizando uma "separação excludente entre o pesquisador e o objeto de pesquisa" (DINIZ et al., 2006: 5). O conhecimento que a pesquisa positivista pretende construir é, portanto, formado por representações da realidade exatas, objetivas e livres de vieses do pesquisador (DE VILLIERS, 2005).

Já as pesquisas com perspectiva epistemológica interpretativista consideram que os fenômenos devem ser entendidos no seu ambiente social, por meio dos significados subjetivos e intersubjetivos que os indivíduos atribuem a eles

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>: (ORLIKOWSKI e BAROUDI, 1991). Os fenômenos da realidade são construídos pelos indivíduos por meio de suas interpretações, e, nesse sentido, a realidade apreendida pela pesquisa é uma construção do pesquisador, por sua vez produzida a partir das construções dos atores pesquisados (SCHWANDT, 1994). A neutralidade da pesquisa é rejeitada, uma vez que não há dados objetivos a serem coletados, mas sim evidências produzidas no próprio processo de interação do pesquisador com os atores pesquisados. Este processo, ao mesmo tempo em que pode ser influenciado por pré-concepções do pesquisador, pode também alterar as próprias percepções e construção da realidade por parte dos atores (WALSHAM, 1993; KLEIN e MYERS, 1999). "O interpretativismo leva a resultados subjetivos, que podem diferir entre pesquisadores. É uma perspectiva adequada ao estudo de interações humanas complexas e fenômenos sociais" (DE VILLIERS, 2005: 111).

A perspectiva crítica, por fim, compartilha com a interpretativista o pressuposto de que a realidade é construída socialmente e deve ser entendida a partir do ponto de vista dos atores sociais, bem como a não-neutralidade do pesquisador (SCHWANDT, 1994). Diferencia-se, contudo, com relação aos objetivos da investigação. Estudos inseridos na perspectiva crítica "têm por propósito alterar o status quo, expondo aquilo que acreditam ser contradições profundas e estruturais dos sistemas sociais" (ORLIKOWSKI e BAROUDI, 1991: 5- 6). Alguns autores discutem as fronteira entre a pesquisa crítica e a interpretativa, ao argumentar um mesmo estudo pode ser guiado por ambas, e que nesse sentido elas seriam complementares (WALSHAM, 2006).

A postura epistemológica adotada influencia o tipo de método de pesquisa que será privilegiado pelo pesquisador. Como sintetiza De Villiers (2005), "assim como a pesquisa positivista é mais naturalmente operacionalizada através de métodos quantitativos

= (ainda que não exclusivamente), da mesma forma o interpretativismo se presta basicamente (mas não exclusivamente) a estudos qualitativos" (DE VILLIERS, 2005: 111-112). Os métodos usados em pesquisa positivista costumam envolver o teste de proposições formais ou hipóteses, e a generalização de conclusões a partir de uma lógica amostral. Os da pesquisa interpretativista buscam o entendimento dos fenômenos em sua profundidade, mas sem o propósito de generalizar ou prever, mas de informar (ORLIKOWSKI e BAROUDI, 1991).

Para os efeitos deste trabalho, considerou-se mais adequado adotar uma metodologia assentada em pressupostos interpretativistas. A opção é decorrência tanto dos objetivos de pesquisa, postulados no capítulo 1, como do quadro teórico de referência, exposto no capítulo 3. O objetivo do trabalho – que passa por elucidar diferentes usos historicamente construídos para uma dada tecnologia (a tecnologia dos CBs), e o papel desempenhado nesse processo por um dado grupo de agentes (o de gestores) – torna conveniente um posicionamento que privilegie a visão dos indivíduos e permita apreender a diversidade de interpretações dadas ao fenômeno dos CBs pelos diferentes agentes e grupos. O quadro teórico de referência, por sua vez, não nos oferece um conjunto de hipóteses ou proposições formais a serem testadas, mas uma estrutura conceitual orientada a guiar um trabalho empírico indutivo.

Assim definida a postura epistemológica da pesquisa, resta definir como a pesquisa se encontra organizada no que diz respeito aos outros três elementos constitutivos da metodologia, isto é: método, técnicas de coleta de dados, e técnicas de análise de dados.

Conforme exposto no capítulo 1, a pesquisa deste trabalho se encontra organizada em três etapas, associadas a objetivos específicos com focos temporais distintos. Embora evidentemente as três etapas partilhem da mesma perspectiva

= epistemológica, elas apresentam diferenças no que diz respeito ao emprego de métodos, técnicas de coleta e técnicas de análise de dados. O percurso percorrido pela pesquisa quanto a estes aspectos pode ser visto de forma sintética na figura 4.1, e é detalhado nas seções 4.2 a 4.4.

Figura 4.1

Estrutura metodológica da pesquisa

Fonte: elaboração própria