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O canal de CBs e relações de terceirização na sua gestão: explicações iniciais para a diversidade de modelos e para a existência dos gestores

Conforme já mencionado, são escassas na literatura as alusões específicas aos gestores de rede e aos diferentes modelos de gestão de redes de CBs, uma lacuna talvez explicável pelo próprio surgimento recente do canal. As referências disponíveis sobre o tema, resenhadas no capítulo 1, se limitam a registrar a existência do segmento

/ de gestores e a sua atuação na gestão de redes de alguns bancos, sem maiores aprofundamentos.

Apesar disso, duas elaborações propostas respectivamente por Mas (2009) e por Chakravorti e Kobor (2003) podem contribuir conceitualmente para essa discussão, fornecendo uma interpretação inicial para a existência de diferentes modelos de gestão de redes de CBs e para o papel desempenhado por gestores.

Para Mas (2009), a montagem de um canal intermediado de distribuição bancária, ou de branchless banking, embora admita diversas possíveis formas de parceira entre instituições financeiras e outros agentes, envolve sempre uma articulação entre quatro elementos, representados na figura 2.3, a saber:

(i) clientes, normalmente sem acesso ou com acesso restrito aos canais bancários diretos;

(ii) estabelecimentos de varejo, atuando como intermediários entre banco e clientes; (iii) uma rede eletrônica de pagamentos, com a função de coletar dados das

transações originadas pelos intermediários e transmiti-los à instituição financeira para processamento; e

(iv) uma plataforma de contas, sistema de registros responsável por processar as transações originadas nos estabelecimentos e transmitidas pela rede de pagamentos.

/ Figura 2.3

Componentes-chave de um canal de distribuição bancário intermediado

Fonte: Mas (2009)

Entre os elementos representados na figura, a plataforma de contas é necessariamente operada internamente, isto é, dentro das fronteiras organizacionais de uma instituição ofertante de serviços financeiros.19 Os estabelecimentos de varejo, ao

contrário, são obviamente agentes externos, atuando como intermediários entre essa instituição e os clientes. A rede eletrônica de pagamentos, por sua vez, é o único dos componentes-chave do canal que tanto pode ser operado internamente como fornecido por terceiros. Nesse sentido, a montagem e operação de um canal intermediado pode envolver diferentes configurações (ou modelos de gestão de redes de estabelecimentos), conforme este elemento seja fornecido por um agente externo (um gestor de rede) ou pela própria instituição financeira.

Para Mas (2009), a decisão de terceirizar o fornecimento deste elemento (rede eletrônica de pagamentos) envolve um conflito de escolha (trade off) por parte do banco ou instituição ofertante, entre de um lado manter um maior domínio sobre o canal de

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/ distribuição (e portanto maiores barreiras à entrada de concorrentes), e de outro incorrer em menores custos com a utilização de infra-estruturas já montadas. O autor sugere, ainda, que as primeiras instituições a investirem na instalação de canais intermediados (early movers) tendem a se envolver diretamente na montagem de sua própria rede eletrônica de pagamentos, ao passo que entrantes mais tardios tendem a ver-se incentivados a compartilhar soluções operadas por terceiros (MAS, 2009: 63).

A argumentação de Mas pode ser complementada a partir de uma análise conceitual desenvolvida por Chakravorti e Kobor (2003) para a dinâmica dos processos de adoção de inovações bancárias. Diferentemente de Mas, estes autores não se referem especificamente à adoção de canais intermediados de distribuição, mas a inovações em serviços financeiros de pagamentos. Para os autores, a adoção de uma inovação – seja ela um novo serviço, ou um novo canal tecnológico para a distribuição de um serviço existente – costuma obedecer a uma seqüência de três estágios, representada na figura 2.4 e descrita em seguida:

Figura 2.4

Processo evolutivo do investimento em inovações bancárias

/1 O primeiro estágio ocorre quando um banco20, ou um número reduzido deles

("inovadores", ou "first movers"), introduz determinada inovação no mercado, correndo os riscos do pioneirismo e auferindo ganhos que remuneram esses riscos. A posição de pioneiros exige destes bancos o investimento na criação da plataforma tecnológica necessária a oferecer a inovação ao mercado, dado que, pelo seu ineditismo, inexistem soluções prontas disponíveis no mercado. As inovações costumam ser introduzidas, desta forma, com tecnologia proprietária.

Um segundo estágio tem lugar quando novos bancos ("seguidores", ou "imitadores") são atraídos pelo sucesso dos pioneiros. Como resultado, o diferencial competitivo e os ganhos auferidos pelos inovadores começam a decair. À medida em que a inovação se difunde, começam a surgir as primeiras soluções de mercado que tornam possível aos bancos terceirizar a plataforma tecnológica. O terceiro e último estágio se caracteriza quando a tecnologia em questão já está difundida, deixando de constituir uma inovação para tornar-se uma "commodity" largamente adotada pelo mercado (CHAKRAVORTI e KOBOR, 2003: 16). Sua adoção em alta escala incentiva o surgimento de soluções de mercado para a terceirização da plataforma tecnológica, que já haviam começado a surgir no estágio anterior. Bancos buscam a solução mais barata possível para a plataforma, em função do achatamento das margens proporcionadas pela inovação. Com isto, nesta fase o uso de soluções tecnológicas terceirizadas passa a ser a regra.

Dado o exposto, tanto a abordagem de Mas (2009) como a de Chakravorti e Kobor (2003) permitem fazer uma série de conjeturas a respeito da diversidade de

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/< modelos de gestão de redes presentes no canal de CBs, que poderão ser melhor desenvolvidas na pesquisa empírica do presente trabalho. O grupo de gestores de rede pode ser visto como o responsável pelo fornecimento da rede eletrônica de pagamentos, nos termos de Mas, ou da plataforma tecnológica, nos de Chakravorti e Kobor, necessária à operação do canal de CBs.

Sendo assim, em primeiro lugar, as abordagens permitem prever uma dinâmica para o processo histórico de surgimento dos diferentes modelos de gestão: é de esperar-se que primeiramente tenham surgido os modelos envolvendo soluções internas (isto é, integradas verticalmente pelos bancos, sem envolver a participação de gestores), e que à medida que o uso de canal se difundiu, tenha-se configurando o surgimento de modelos com gestor, e um aumento progressivo na participação destes agentes.

Em segundo, uma vez que no canal de CBs parecem coexistir simultaneamente modelos "sem" e "com" gestores – isto é, plataformas proprietárias e terceirizadas de gestão de redes – cabe indagar se os modelos que envolvem as primeiras não tendem a ser suplantados pelos segundos.

Para responder a estas conjeturas, é preciso avançar no entendimento do histórico de formação do canal de CBs no Brasil e compreender melhor os modelos pelas quais a infra-estrutura do canal é fornecida atualmente. A literatura disponível não permite avançar sobre estas questões, que serão objeto da pesquisa empreendida mais adiante no trabalho.

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Capítulo 3 – Quadro teórico de referência

Este capítulo apresenta o quadro teórico adotado pelo trabalho para abordar o objetivo de pesquisa, voltado a investigar de que forma a prática de diferentes modelos de gestão de redes de CBs se relaciona ao perfil dos serviços financeiros distribuídos por meio do canal à população de baixa renda.

Os fundamentos desse quadro teórico são fornecidos por um modelo de análise recentemente desenvolvido por Pozzebon, Diniz e Jayo (2009), capturando alguns elementos de três abordagens conceituais: o social shaping of technology (SST), a visão estruturacionista da tecnologia e o contextualismo. Embora esse modelo já venha sendo aplicado, em estudos recentes (DINIZ et al., 2009a; YOKOMIZO, 2009; LUVIZAN, 2009; DINIZ et al., 2008; DINIZ, 2007), ao estudo de implementações de tecnologia envolvendo relações sociais complexas em diferentes níveis (indivíduos, organizações, sociedade), este capítulo discute alguns desafios relacionados à sua aplicação para os objetivos do presente trabalho, e propõe a aplicação de uma forma expandida do modelo.

Para tanto, o capítulo se organiza da seguinte forma. A seção 3.1, com caráter introdutório, justifica a necessidade de um quadro teórico alinhado com pressupostos teóricos não-deterministas, e mais precisamente social-construtitivas sobre o uso de tecnologia. Na seção 3.2, apresentamos os fundamentos e a formulação do modelo, conforme proposto originalmente por Pozzebon, Diniz e Jayo (2009). A seção 3.3 se refere à maneira como o modelo tem sido aplicado em estudos recentes, discute os limites do modelo para os objetivos do presente trabalho, e propõe uma forma

/; expandida do modelo. A seção 3.4 encerra o capítulo, discutindo a forma como o modelo será operacionalizado no presente trabalho.