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Potencialidades e Limitações da RM no contexto da produção de fala

A RM é um dos métodos de imagem que poderá representar uma alternativa viável aos métodos de imagem com recurso a radiações ionizantes, tendo sido amplamente utilizada nesta área, nos últimos anos, como já foi referido. A RM tem demonstrado ser uma ferramenta poderosa e atractiva nos estudos de fala uma vez que permite obter informação relativa à geometria do tracto vocal sem os riscos associados às radiações ionizantes. A ausência de radiações é importante uma vez que na maior parte destes estudos há necessidade de adquirir um grande número de imagens no mesmo sujeito (Baer, Gore, Gracco, & Nye, 1991; Engwall, 2003b; Engwall & Badin, 1999; Narayanan, Alwan, & Haker, 1995b, 1997; Narayanan, Nayak, Lee, & Byrd, 2004; Story, Titze, & Hoffman, 1996). Outras vantagens da RM incluem a sua capacidade multiplanar, excelente resolução de contraste e boa relação sinal-ruído permitindo excelente descriminação

das estruturas anatómicas, particularmente dos tecidos moles (Baer, Gore, Gracco, & Nye, 1991; Crary, Gorham, Burton, Kotzur, & Gauer, 1996; Moore, 1992; Shadle, Mohammad, Carter, & Jackson, 1999). Permite modelação 3D e cálculo de áreas e volumes do tracto vocal e nasal de forma directa (Narayanan, Alwan, & Haker, 1995b, 1997; Narayanan, Nayak, Lee, & Byrd, 2004). Outra vantagem apresentada pela RM é permitir o estudo das estruturas internas sem necessidade de colocação de eléctrodos ou outro tipo de materiais (palatos artificiais) como acontece com a EMA e EPG e que podem de alguma forma interferir com a articulação (Mohammad, 1999).

No entanto, o tempo de aquisição longo, com a maior parte das sequências utilizadas nos primeiros estudos com RM limitou a sua utilização ao estudo de configurações estáticas do tracto vocal, durante a produção de sons passíveis de serem sustidos por um período de tempo relativamente longo, minutos nos primeiros estudos (Alwan, Narayanan, & Haker, 1997; Baer, Gore, Gracco, & Nye, 1991; Narayanan, Alwan, & Haker, 1995b; Story, Titze, & Hoffman, 1996) a alguns segundos em estudos mais recentes (Demolin, Metens, & Soquet, 1996; Gick, Kang, & Whalen, 2000, 2002; Kröger, Winkler, Mooshammer, & Pompino-Marschall, 2000; Yang, 1999). De salientar, que as articulações produzidas de forma sustida tendem a ser hiperarticuladas e mais difíceis de manter se o tempo de aquisição for demasiado longo (Engwall, 2003b). Ainda que com estas limitações em termos de resolução temporal, foi possível investigar a configuração do tracto vocal durante a produção de vogais (orais e nasais) e algumas consoantes (nasais, fricativas, laterais) e tem sido permitido gerar funções de área do tracto vocal, o que representa um passo importante no estudo da relação entre a geometria do tracto vocal e a acústica na produção de fala (Demolin et al., 1997; Demolin, Metens, & Soquet, 2000).

Recentemente, algumas inovações técnicas ao nível de soft e hardware têm permitido alargar a aplicação da RM, nos estudos de produção de fala. O desenvolvimento de técnicas de aquisição ultra-rápidas, com resolução temporal da ordem dos 110 ms tem permitido monitorizar em “tempo real” alguns fenómenos dinâmicos envolvidos na produção de fala, como alterações no posicionamento da língua, lábios, e posicionamento do velo ao longo do tempo, mas ainda não suficiente para observar algumas características dinâmicas do movimento da língua, que exige amostragens mínimas da ordem dos 20 Hz (Narayanan, Nayak, Lee, & Byrd, 2004). A utilização da RM com o intuito de evidenciar aspectos dinâmicos da articulação durante a produção das consoantes oclusivas, por exemplo, é também bastante mais exigente devido às características temporais das oclusivas (Mathiak et al., 2000).

Outra das limitações da RM frequentemente referida neste tipo de estudos está relacionada com os elevados índices de ruído durante a aquisição. Se com as sequências utilizadas classicamente nos estudos estáticos ainda é possível a obtenção de um sinal acústico (de má qualidade, é certo) obtido por gravação através do intercomunicador (Mohammad, 1999; Shadle, Mohammad, Carter, & Jackson, 1999) com as sequências em tempo real, dado o ainda maior índice de ruído, isso é completamente inviável, com equipamento comum. Recentemente, essa limitação está a ser

ultrapassada, mediante o recurso a sistemas de microfones ópticos, com sistema de cancelamento de ruído, que por um lado não degradam a qualidade de imagem nem representam um risco para falante, e por outro, permitem a obtenção de um sinal acústico referente à produção efectuada, com uma qualidade aceitável (Bresch, Nielsen, Nayak, & Narayanan, 2006; NessAiver et al., 2006). A obtenção do sinal acústico pode servir vários objectivos: (1) comparar as produções naturais do falante com as obtidas através de processo de síntese, (2) fazer a sincronização das imagens com o sinal acústico e (3) verificar se o falante produziu exactamente o que lhe foi solicitado.

Outro factor também apontado como uma desvantagem da RM reside no facto de, na maior parte dos equipamentos a aquisição ser feita com o falante deitado o que pode causar alguma interferência na produção. Alguns estudos (Engwall, 2003b; Tiede, Masaki, & Vatikiotis-Bateson, 2000; Whalen, Kang, Magen, Fulbright, & Gore, 1999) revelam que a posição deitada pode influenciar a posição e configuração da língua, podendo diminuir a passagem a nível faríngeo, sendo este efeito, mais observável nas articulações sustidas artificialmente do que nas articulações obtidas em tempo real. Contudo, alguns autores referem que essas alterações gravitacionais são negligíveis podendo ser efectuadas compensações (Magen, Kang, Tiede, & Whalen, 2003).

O facto de estruturas calcificadas, como os dentes, serem mal observadas, em qualquer ponderação nas imagens RM, acarretando dificuldades acrescidas na segmentação a nível da cavidade oral, tem conduzido ao desenvolvimento de estratégias que permitem, através de co- registo introduzir essa informação, quer a partir de outras aquisições RM (Engwall & Badin, 1999; Takemoto, Kitamura, Nishimoto, & Honda, 2004) para as arcadas dentárias, quer a partir de informação adquirida por TC (Serrurier & Badin, 2005ab) ou EBCT (Story, Titze, & Hoffman, 1996).