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A precaridade do exercício da profissão

Os professores do 1

o

Ciclo estarão integrados numa carreira "única"?

Condições do exercício da profissão

"A minha filha quer ser assim professora como você, minha senhora, enquanto não arranjar mais nada"

(Uma professora, em Out.94)

Será possível realizar formação, se forem ignoradas as condições do exercício da profissão em que a mesma se integra?

«A realidade e complexidade da escola primária e da sua transformação são mal conhecidas entre nós»71. Da realidade da escola primária, ou das realidades que

encerra, somente foram divulgados números e de forma incompleta. São números que explicam, mas que não apontam perspectivas de intervenção. «Temos que admitir que se sabia pouco sobre os processos de transformação da escola e sobre as práticas dos seus actores. [As análises] mantêm-se a nível macrossocial que não responde às nossas interrogações»72.

Nesta perspectiva, os estudos concluíram, por exemplo, que aos professores do 1o Ciclo não é reconhecida a posse de um saber e de uma prática específica?

Relegados para os níveis inferiores de reconhecimento de estatuto social (e de estatuto remuneratório!...) são submetidos a uma administração autocrática que sistematicamente os desapossa dos instrumentos de resistência à dominação.

71 Benavente, A. (1990), p.60 72Benavente, A. (1990), p.73

Os estudos perguntaram:

1. porque existe redução da componente lectiva no 2o e 3o Ciclos e Ensino

Secundário e não existe essa redução no 1o Ciclo do E.B.? O argumento da

monodocência é sofismático para quem aprofundar esta questão. Será o trabalho nos restantes ciclos mais desgastante que no primeiro?

2. porque se prescreve 25 horas de componente lectiva para o 1o Ciclo, se

para o 2o se prescreve 22 horas e para o Secundário apenas 20?

3. porque, nos organismos centrais e regionais do ME, é raro haver professores do 1o Ciclo nas equipas de coordenação do trabalho no 1o

Ciclo?

Não haverá professores primários com o perfil adequado a essas funções? E se professores primários coordenassem o trabalho dos colegas dos outros ciclos?

Se não são desvendados estes pormenores de somenos importância, quando se chegará à compreensão de fenómenos mais complexos?

O 1o Ciclo do Ensino Básico no limiar da sobrevivência

Ainda que convicto da sua utilidade, hesitei em organizar esta síntese descritiva, dada a noção de limite que o trabalho impõe face à vastidão de rumos que o assunto sugere. Procuro lograr o mínimo de palavras para o máximo esclarecimento possível, porque o considero indispensável para aceder à compreensão das condições do exercício da formação.

Sumariamente e propondo potenciais exaustivas para cada um dos aspectos aqui relatados exponho um conjunto de referências habitualmente ignoradas quando se

trata de traçar o quadro das condições do exercício da profissão no 1o Ciclo do

Ensino Básico. Refiro-me nomeadamente:

1. a um modelo de gestão original numa carreira "única";

2. aos programas de formação no 1o Cicio e, em particular, três exempios

paradigmáticos das tentativas de disseminação de inovações do centro para a periferia:

. a introdução da fase de escolaridade . o projecto das escolas de área-aberta P3

. as "reciclagens" dos professores para novos programas (1979/80; 19S0/91).

"Não pode nascer uma Universidade como nasce uma escola primária ou uma tasca "73

(Couto dos Santos)

O Ensino Primário foi o sector sujeito à maior degradação, de forma assumida e sistemática, pelo Estado Novo. O processo de democratização promoveu, desde há vinte anos, alterações significativas no estatuto social dos professores, mas relativamente aos professores primários as excepções pecaram por defeito. Os estigmas de desprestígio social e as múltiplas dependências não se apagaram com a mudança de regime. Às situações antigas não resolvidas juntam-se exigências decorrentes de transformações sociais que a ausência de participação não resolve e que uma gestão original contribui para agudizar.

Um modelo original de gestão

A Primeira Conferência Nacional do Ensino Primário74 realçou que «o sector

administrativo submerge por completo o pegagógico» e que a hegemonia administrativa «mata toda a inovação tentada e vive da mediocridade». Acrescenta «ser urgente e prioritária e democratização da gestão a nível concelhio e distrital» que assegure «o primados dos objectivos pedagógicos e educativos na gestão democrática». Antecipando a Lei de Bases do Sistema Educativo (1986) e o Estatuto da Carreira Docente (1990), a denúncia do intervencionismo administrativo como factor de desarme cultural, técnico e ideológico, permanece tão actual como há uma década.

Num encontro de formação realizado em Outubro de 1994, comentava-se o atraso na colocação de professores. Ainda não tinham chegado todos os professores às escolas. Escolas havia ainda sem qualquer professor. Alguém se lembrou de perguntar se havia sido feito algo concreto, nos últimos vinte anos, para obstar à repetição deste problema no início de cada ano lectivo. Apenas uma escola havia protestado, por escrito, junto da Delegação Escolar, a qual, entretanto, fez chegar ao conhecimento do Director Escolar, que, por sua vez, a dirigiu para o Director-Regional de Educação, que, eventualmente a terá feito chegar aos organismos centrais do Ministério. Digo "eventualmente" porque não foi recebida qualquer resposta às questões que (respeitosamente) se colocava no ofício.

"As pessoas são comodistas. Gostam de ser dirigidas. Nós fomos sempre tratados abaixo de cão". "Não há um mínimo de união, nem de dignidade - Senhor Delegado, podemos?

Os professores primários acomodam-se na incomodidade. Tudo parece ser mais importante que o 1o Ciclo. "

Para os legisladores no domínio da gestão, o 1o Ciclo é um apêndice incómodo a

montante da escolaridade básica obrigatória. Os normativos referem, indiscriminadamente, "estabelecimentos de ensino", mas a legislação produzida exclui da aplicabilidade os "estabelecimentos de ensino" do 1o Ciclo75. «Mesmo a

adaptação local exigida por certos normativos carece frequentemente de paracer ou ractificação, quando não é mesmo decidida por entidades exteriores (Inspecção, Delegação e Direcção Escolares, DGEBS, etc.)»76.

Na Conferência Nacional de 1985, denunciou-se a dependência do pedagógico face ao administrativo, que «corta toda a inovação tentada e vive da mediocridade e do estabelecimento de teias de favores e dependências», para se avançar um conjunto de propostas onde se releva «o desenvolvimento de uma gestão democrática» e a revisão dos «métodos de actuação dos serviços de inspecção e de outros serviços de Administração». Ana Benavente identifica alguns "problemas da profissão"77: «da formação e das dificuldades do trabalho

quotidiano, das relações com o Ministério, da política educativa, das relações com os pais e entre colegas». Os depoimentos citados aproximam-se de outros que pude colher: «devia haver mais união entre os professores, mais ligação, trocar ideias, cada um fecha-se na sua concha ... eu não ... mas as colegas, é muito

75Veja-se, a propósito o Dec.-Lei n° 376/80; de 12.Set. 76GEP(1988) policopiado, p.82

difícil»; «é uma classe velha, há pessoas que querem evoluir mas a maneira como viveram para a profissão, no tempo do salazarismo, marcou-as muito»78. A

influência das várias décadas de Estado Novo não justifica, por si, a situação. À herança recebida junta-se idêntica atitude dos professores formados após 1974, mas socializados numa escola dependente e ensimesmada.

Alguns exemplos:

. Nas décadas de 70 e 80, chegavam à Delegação Escolar projectores de diapositivos e outro material mais sofisticado. A Delegação escolhia escolas "amigas" para a distribuição. No princípio da década de 90, estes recursos estavam como novos. Melhor dizendo, estavam novos, intactos dentro das suas embalagens de origem ainda por abrir.

. Nos anos 90, o Ministério envia "faxes" às escolas que não têm aparelho para os receber e disketes para trabalho informático em computadores que as escolas não possuem. Entretanto, não há verba para giz, nem para os selos.

O subsídio de almoço dos alunos e o pagamento que o Ministério processa aos funcionários das cantinas do 2o e 3o Ciclo, do Secundário (ou do Superior) não

existe no 1o Ciclo. O subsídio por aluno e as remunerações são asseguradas pela

contribuição (dupla) dos encarregados de educação, ou pelos professores.Os sucessivos orçamentos-gerais do Estado registam aumentos de despesas no capítulo da Acção Social Escolar. Mas, na prática, esta não existe no 1o Ciclo.

. O Despacho 134/77 aboliu o cargo de coordenador pedagógico e da Acção Social Escolar. O Decreto-Lei n° 211/81, de 13 de Julho, ao reformular as atribuições e competências das delegações escolares, completou a

subalternização do 1o Ciclo. A partir daí, a admissão de novos delegados

escolares, passou a proceder-se por escolha-proposta do superior que na escala hierárquica imediatamente se lhe segue. Os cargos, providos em regime de comissão de serviço por um período de três anos prorrogáveis por iguais períodos, sempre foram exercidos com a docilidade que se imagina. A prorrogação do mandato dependia (e depende ainda hoje) das boas graças junto dos superiores de quem se depende.

. Para tornar mais agradável a função foi-lhe atribuída uma gratificação mensal pecuniária. Em contrapartida, os directores de escola viram o seu trabalho ser reconhecido como digno de gratificação no Despacho 40/75. Neste se lia:"no prazo de sessenta dias (estávamos em Outubro de 1975) a contar deste Despacho, serão definidos em Decreto-Lei os quantitativos das gratificações a atribuir aos elementos eleitos para os cargos neles previstos, quando exercidos cumulativamente com funções lectivas". São passados vinte anos. O decreto não saiu. Entretanto, foram atribuídas as gratificações aos gestores das escolas de todos os outros ciclos e aos do Secundário.

. Com a publicação de Decreto-Lei n° 172/91, de 10 de Maio perspectiva-se alguma democraticidade para a gestão no 1o Ciclo. O decreto continua sem

concretização. Os directores escolares e outros professores (funcionários escolhidos por simpatia de superiores hierárquicos) vão abandonando as estruturas que o Decreto-Lei n° 172791 extingue. Mas não regressam às escolas de origem. São professores, mas têm o seu próprio sindicato de Directores, Delegados e Sub-delegados. Não detêm quaisquer competências pedagógicas tão prolongado foi o seu afastamento do trabalho com crianças, mas alguns ocupam agora lugares de decisão pedagógica nos organismos regionais do ministério. «Não haverá grande diferença entre o conceito de direcção da escola que actualmente se pratica e o que existia antes do modelo de gestão em vigor

(...) Em termos de direcção de um projecto pedagógico, uma organização escolar integrada numa comunidade mais vasta alterada por força do movimento de democratização da sociedade portuguesa, não se verificou o "salto necessário"»79.

. O Decreto-Lei n° 45/84, de 3 de Fevereiro promulga medidas de incentivo à fixação na periferia de agentes de "desenvolvimento social das regiões", motivações que são retomadas no próprio ECD, em 1990. Haverá trabalhadores da função pública sujeitos a piores condições de isolamento que os professores do 1o Ciclo? Também esta intenção legislativa está por cumprir.

. Continua por se perceber também por que razão o professor do 1o Ciclo tem uma

componente lectiva semanal de vinte e cinco horas, enquanto os outros seus colegas do 2o ou de 3o Ciclo cumprem vinte e duas e os professores do

Secundário apenas vinte. O grave equívoco da monodocência absoluta consagrado na LBSE, por sua vez, impede qualquer redução da componente lectiva, ainda que os professores do 1o Ciclo colocados nas equipas de Ensino

Especial dela beneficiem (o que também não se percebe).

. Sem gestão participada é também dispensado o projecto educativo da escola. Não sendo "obrigatório" o projecto, também não é obrigatório um orçamento. Logo a legislação que estabelece obrigações das Câmaras e de outras instituições perante as escolas do 1o Ciclo também ficam por cumprir. As despesas com o

expediente, higiene, saúde e aquisição de materiais e equipamentos vão sendo mitigados pela generosidade de terceiros80.

79GEP (1988) policopiado, p. 85

80No decurso do ano lectivo de 1985-1986, o poder central e demais entidades responsáveis, só

na Região Centro, em limpeza e expediente das escolas do Ensino Primário, gastaram cerca de 27 872 000$00 e "arrecadaram" à custa dos profissionais que diariamente trabalham nessas escolas 62 528 000$00 (de um estudo efectuado pelo SPRC)

. Os Encontros Regionais e as Conferências Nacionais dos professores do 1o

Ciclo, que tiveram lugar na década de 80, reclamaram a gestão democrática que contemple o direito à plena e responsável participação destes professores na orientação e decisão da vida da sua escola. Pediram que acabassem as discriminações relativamente aos seus colegas (de carreira única!) dos outros sectores de ensino. Mas em 1994, os relatórios críticos que, por lei, deverão ser arquivados nas escolas, só no 1o Ciclo foram, por imposição dos superiores

hierárquicos, enviados às delegações escolares. Depositados nestas estruturas não-democráticas, os relatórios foram ainda objecto de devassa por parte de funcionários e inspectores81.

. O Decreto-Lei n° 384/93 instituiu os "quadros de zona pedagógica" e anuncia que esses quadros "serão regulamentados por portaria do Ministério da Educação, a partir do ano lectivo de 1994-95". A portaria 276/94, de 9 de Maio ignora, talvez por coincidência, apenas o 1o Ciclo.

. O Despacho Normativo 185/92 estabelece que a dispensa de serviço docente para a participação em acções de formação «é solicitada ao órgão de gestão do estabelecimento de educação ou de ensino onde o docente exerce funções»82 e

que a dispensa é autorizada peio mesmo órgão de gestão.

No caso particular do 1o Ciclo, o "órgão de gestão do estabelecimento de

educação" é o Director da Escola. Sete meses decorridos sobre a publicação do Despacho, um ofício-circular da Delegação Escolar transcreve um ofício da

81Os inspectores são ainda considerados "orientadores", mas não detêm qualquer competência

pedagógica. Agem, frequentemente, como obstáculos à mudança e à inovação. A Inspecção é uma estrutura merecedora de uma análise em capítulo próprio (impossível...), por oscilar entre a desresponsabilização face aos problemas existentes e o "policiamento" que agrava ainda mais os sentimentos de "menoridade" profissional dos professores.

Direcção Escolar do Porto83 que, por sua vez estabelece que «nos termos da

alínea e) do art0 44° do Dec-Lei 249/92 (RJFCP) «a competência para autorizar a

dispensa de serviço docente (...) é do Senhor Director Regional de Educação, pelo que os requerimentos lhe devem ser dirigidos». Para que não reste qualquer dúvida da direcção e do trânsito dos requerimentos, o ofício determina que a Delegação Escolar, ao enviar os requerimentos, deve informar a Direcção Escolar sobre a formação e o formando.

A ambiguidade dos normativos, ou as suas contradições, são interpretadas sempre no sentido de sujeitar as escolas do 1o Ciclo aos ditames de delegações e

direcções escolares que, no espírito e na letra do Decreto que introduz a gestão democrática neste ciclo, foram extintas84. As delegações escolares e as direcções

escolares apenas funcionam em regime transitório, a partir de 1991, mas permanecem como esteios de uma gestão por nomeação arbitária, uma gestão que continua a perverter e a comprometer a democratização da gestão no 1o Ciclo

do Ensino Básico.

. Relativamente aos restantes sectores do ensino, verifica-se sub- -representatividade do 1o Ciclo nos secretariados sindicais. Nas equipas que

coordenaram a formação contínua no primário (desde os anos 70). Nem sequer estão representados e o exemplo da DREN denota claramente a inversão de valores-é de competências neste domínio85.

. Impedidos estão também os professores primários de escolher os seus horários, i. é, os horários que melhor se adaptem às características da região, da escola e, em particular, dos alunos frequentemente obrigados a grandes deslocações. O

83Ofício 5021-1° C, de 31.03.93 84Decreto 172/91, de 10 de Maio

85A extensão as descrições que deveria aqui inserir impede a sua concretização no âmbito

regime normal é o aconselhado. Mas, porque não há cantina, opta-se pelo regime de desdobramento. Depois de provisoriamente instalado, o regime de desdobramento, por sua vez, dispensa a cantina, numa lógica circular.

Horários de funcionamento

"Para os inspectores os professores são todos maus, não trabalham, não cumprem os horários. Alguns professores já foram apanhados, os outros ainda não!..."

(Daniel Espain)86

Verifica-se a fuga, sob qualquer pretexto, do horário de regime normal. Ou porque não havendo cantina, não há tempo para que os alunos vão almoçar às suas casas, ou porque não havendo regime normal, as cantinas não se justificam. E há mesmo situações nas quais não se verifica este círculo vicioso da fuga. mas onde a pressão da escola sobre os pais dos alunos força à passagem a regime de curso duplo. Nestes casos, há escolas que apenas funcionam no período da manhã. Na outra metade do dia estão fechadas.

«A questão dos horários não nos parece menor na vida escolar pois a organização do tempo (e, neste caso, a sua concentração numa parte do dia^-pe-sa-no trabalho dos professores, nas condições de trabalho das crianças (...) e, finalmente, pesam no papel social e educativo da escola»87. Com "falta de tempo" não sobra o tempo

para a participação activa dos alunos, para os contributos pessoais das crianças, para espaços de individualização que, na mesma argumentação, "faz perder o

86Encontro "Conviver a Profissão", Faculdade de Economia, Fevereiro.95 87Benavente, A. (1990), p. 126

pouco tempo" de que os professores dispõem. «Pensamos que este horário concentrado reforça a rigidez do modelo pedagógico dos professores e os seus comportamentos autocentrados; aliás, qualquer estatuto de experiência pedagógica oficial prevê o horário normal como condições de base para desenvolver novas práticas na escola primária»88.

Nos últimos dez anos e apesar do esforço autárquico de construção de novos edifícios escolares, ou da redução do número de alunos matriculados, o regime de horário normal continua a ser preterido ao menor pretexto. As estratégias são diversas, desde a viciação de alunos matriculados89, à escolarização de alunos

classificados de "deficientes" (ainda que o estigma não corresponda à realidade) que limite, automaticamente, ao máximo de vinte o máximo de alunos por turma. Os normativos90 avisam que a criação de novos lugares docentes se destina ao

apoio a alunos portadores de deficiência e/ou com dificuldades de aprendizagem e "não com vista à formação de mais turmas", que inviabilizem o regime normal91.

Realça-se, aliás, que o apoio não visa desintegrar os alunos das respectivas turmas. E persistente a recomendação de que deverá «proceder-se de forma a assegurar tanto quanto possível a manutenção do regime normal, que é obrigatório»92 e que «deverá o Conselho Escolar tomar em consideração o

prejuízo que advém para os alunos do funcionamento em regime duplo»93.

88Benavente, A. (1990).. p. 126

S9Um procedimento frequente consiste em manipuiar o sistema de transferência de alunos, de

modo a conseguir o número de alunos suficiente para curso duplo.

90É exemplo concreto o n° 8 do Art0 4o do Dec-Lei 35/88

91Numa escola do Concelho da Maia, no ano lectivo de 1994/95 uma -forma expedita de

conseguir assegurar o regime de curso duplo foi a aorganização de uma turma de "deficientes" que ocupasse uma sala de aula. Não é um caso isolado.

92N° 22 do cap. V do Despacho n° 25/SERE/SEAM/88. 93N° 2 do Art0 4o de Dec-Lei n° 35/88

Aconselha-se a constituição de equipas de professores que possam trabalhar na mesma sala em co-responsabilização.

Um outro modo de assegurar o regime de curso duplo é o de estruturar a progressão dos alunos em referência aos anos de escolaridade (vulgo "classe"). O sistema de fase, se praticado, permitiria uma distribuição mais flexível de alunos pela turmas. O sistema de "classe" separa os níveis de "aproveitamento" e inviabiliza a organização de grupos heterogéneos, reduzindo o número de alunos por turma e as possibilidades de trabalho em equipa de professores.

No ano lectivo de 1994/1995, no concelho de Santo Tirso: . o número de alunos por professor é de 18;

. o número de alunos por sala é de 23.

Ainda assim, das trezentas e dez turmas existentes, 117 continuam em horário de regime de curso duplo. Também é significativo verificar que destas, 65 turmas funcionam da parte da manhã e apenas 52 da parte da tarde94.

Omissões

Persistem ainda outros fenómenos de involuntária ocultação de realidades que urge relevar, por mais absurdas ou chocantes que possam ser.

Os estudos também podem pecar por omissões: nas realidades que não contemplam, nas perguntas que não levantam, nas indignidades que não denunciam. Um estudo de Ana Benavente reflecte enviezamentos idênticos aos de outros estudos. Confunde, por exemplo intenções legislativas com a sua operacionalização. Refere «medidas concretas no sentido-de democratização da-=

escola»95 e aponta como mais significativas a introdução de novos programas, a

estruturação das quatro classes em duas fases, a revisão da avaliação, as dotações de material escolar, a gestão democrática das escolas e a redefinição do papel do inspector36. Quem se quede por uma leitura menos avisada desse estudo

poderá retirar ilações erradas. A autora recorre a expressões como: «esta medida (da estruturação em fases) visava», «a avaliação foi revista», «tentou-se a