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Capítulo 2: Deveres do altar: aproximação religiosa e neutralidade política

8. Preconização dos novos bispos para a Colômbia

Ao ser informado da nova política pontifícia, em setembro de 1826, Tejada mostrou-se bastante moderado ao apresentar os nomes dos prelados para Colômbia. Apresentou uma lista com nomes que estavam de acordo com as indicações do seu governo, mas que coincidiam com os nomes apresentados por Lasso de la Vega ao antigo papa Pio VII. Ainda mostrou a carta de um candidato a prelado, Terrazas, que prestava fidelidade ao papa e elogiava Bolívar, que teria facilitado o preenchimento das paróquias vacantes e incentivando Terrazas a escrever para o papa.

Todavia, paralela aos avanços de Tejada, eclodiu na Colômbia a ameaça de instruções cismáticas23 do vice-presidente Santander, enquanto Bolívar se encontrava no “Relações diplomáticas entre Santa Sé e República do México”. Osservatore Romano. nº. 40, p. 484 (4). Outubro. 1992.

22 LETURIA, Pedro. Relaciones entre la Santa Sede e Hispanoamérica. v. II. Caracas: Sociedad Bolivariana

de Venezuela, 1959. p. 301.

23 Criação de um patriarca em cada Estado que cuidasse das dioceses e sujeição dos regulares aos seculares da

Entre o trono e o altar: política pendular da S. Sé no reconhecimento das independências hispano-americanas

Equador e no Peru. Urgia a necessidade de se tomarem medidas que pudessem impedir o cisma na Colômbia. O governo colombiano, em nota a Tejada, exigiu não mais a simples preconização de todos os bispos apresentados como também a imediata criação de uma instituição papal (como uma nunciatura apostólica) em Bogotá, com a faculdade de criar novas dioceses e confirmar os bispos designados sem ter que recorrer a Roma. Caso o papa não se manifestasse, Tejada havia sido instruído a retirar-se de Roma. Tejada, de maneira muito habilidosa e demonstrando saber agir a favor dos interesses colombianos, utilizou o documento mostrando apenas a parte que pede sua retirada do Vaticano. Quanto ao resto, preferiu comunicar-se com o papa a fim de lhe pôr a par das circunstâncias especiais, com perigo de cisma, a qual enfrentava a Colômbia naquele período.

Leão XII, assustado e preocupado em conter a ameaça cismática que se vinha expandindo desde a América Central, decidiu, como foi dito, a tomar uma atitude mais decisiva, consultando a Capellari quanto à nomeação de bispos proprietários para a Grã-Colômbia. Capellari era favorável à nomeação de seis bispos e mais um bispo adjunto pedidos por Tejada. Insistia que a nomeação deveria ser feita motu proprio a fim de evitar, por um lado, reconhecer o padroado ao governo colombiano e, por outro, ferir os direitos patronais da coroa espanhola.

O secretário de Estado de Leão XII, della Somaglia, opôs-se a essa solução temendo conseqüências maiores. Para o cardeal, a melhor solução seria a nomeação de bispos in partibus, com a administração pontifícia das dioceses, que atenderia às necessidades espirituais hispano-americanas sem romper com a Espanha. O que della Somaglia estava tentando resguardar era a neutralidade política da Santa Sé, uma vez que lhe parecia que tais preconizações seriam um passo explícito a favor da independência.

Capítulo 3: Reação legitimista e posterior volta à neutralidade: configuração da política pendular

Conforme Leturia24, o papa não aceitou as instruções de della Somaglia e

resolveu acatar a decisão de Capellari e dos cardeais, por dois motivos, que convergiam para uma só preocupação: a possibilidade de uma ruptura. Primeiro, a Colômbia estava firme em seu pedido de bispos proprietários e não aceitaria outro tipo de solução, o que poderia atrasar ainda mais a questão e aumentar o perigo de cisma. Segundo, se não houvesse a nomeação de bispos proprietários, as sedes continuariam vacantes, mesmo que administradas por bispos in partibus, o que continuaria deixando a Igreja colombiana fragilizada e propensa a um cisma.

A ameaça de cisma preocupava tanto o sumo pontífice que aceitou os nomes enviados por Lasso de la Vega em 1823, confiando na lealdade do colombiano e desejando resolver a situação de forma rápida. Assim, a 21 de maio de 1827, o papa procedia às preconizações da Grã-Colômbia e Peru como forma eficaz de conter a onda cismática que vinha baixando da América Central para o sul.

Bolívar, que ainda não havia tomado a iniciativa de escrever diretamente para o sumo pontífice25, escreveu-lhe em 1828, agradecendo Leão XII pelo enorme

benefício das provisões episcopais de 1827. Pediu ainda, nessa carta que é escrita pelo ministro de Estado, Vergara, que o papa se dignasse a conceder benefício semelhante às Igrejas de Quito e Guiana, ainda vacantes. Entretanto, não se sabe se Leão XII recebeu essa carta.

24 LETURIA, Pedro. Relaciones entre la Santa Sede e Hispanoamérica. v. II. Caracas: Sociedad Bolivariana

de Venezuela, 1959. p. 310-311.

25 Conferir carta de Bolívar a Leão XII no Anexo 1, Documento 11, p. 169. Talvez não porque, como afirma

Leturia em Relaciones entre la Santa Sede e Hispanoamérica. v. II, p. 315: “entendia poco el lenguaje santísimo”, mas porque ainda não havia encontrado momento propício. Bolívar não sabia como o papa reagiria à chegada de uma carta de um presidente das novas repúblicas pelas vias não religiosas. É provável que tenha percebido que tal atitude faria com que o papa não lhe desse resposta pois afetaria sua neutralidade política ao se comunicar com um chefe de Estado e reconhecendo-o como tal. É possível, também, que tenha percebido que o caminho mais seguro e eficaz de comunicação com a Santa Sé seria por meio da via religiosa.

Entre o trono e o altar: política pendular da S. Sé no reconhecimento das independências hispano-americanas

Na América Central, as esperanças do papa em conter o perigo de cisma, por meio do bom exemplo colombiano, não se confirmaram. O cisma foi inevitável quando os liberais assumiram o poder na Guatemala e exilaram o arcebispo Casaus y Torres, principal autoridade pontifícia da América Central. Com esse governo liberal, reafirmou-se o desejo de confirmar a construção e provisão da diocese guatemalteca sem recorrer a Roma, ao mesmo tempo que se criticava o controle do padroado pelo papa.

No México, contudo, o papa teve um pouco mais de êxito em seu intento. Apesar de não ter conseguido a preconização de bispos para o México – mesmo contando com a ajuda francesa naquele país – e de ter enfrentado a resistência do governo mexicano, ainda ressentidos com a encíclica de 1824, Leão XII conseguiu evitar o cisma que temia. Muitos deputados mexicanos eram contra o que chamavam de “usurpações da Santa Sé” e, em 1828, o México enfrentava outra mudança radical no governo. Mas, mesmo assim, foram rechaçados os intentos cismáticos que pairavam sobre a república mexicana.