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Em sintonia com ideais de vanguarda da Fundação Getúlio Vargas, tem-se que o ponto de partida do estudo é um problema real, ao qual o trabalho, atingindo as metas da pesquisa, tem a pretensão de oferecer uma contribuição à resolução do problema, neste caso consistente em propostas no progresso do desenredo de uma regulação adequada para a Norma Geral Antielisiva brasileira. Como se verificará, trata-se de um problema jurídico e, como lente principal de observação, de direito tributário, mas transcende o direito tributário brasileiro, pois também é estrangeiro e, de recente construção, aquele referente a um sistema tributário global.

Reconhece-se e antecipa-se, todavia, que inúmeros pontos cegos podem surgir da pesquisa aplicada, se lida por atores das numerosas áreas tangenciais que entornam a problemática e que seriam tocadas pelas propostas apresentadas, mas não estaria ao alcance serem detectadas previamente em uma pesquisa limitada pela elaboração por apenas um ator, como é imanente a um trabalho de dissertação de mestrado22. Bem verdade, imagina-se que cada ponto cego que se identifique possa desencadear outras pesquisas, capazes de agregar ao tema central do planejamento tributário.

Com relação à bibliografia do trabalho, foi utilizada bibliografia brasileira, mas também estrangeira, uma vez que se coloca o planejamento tributário inserido em um contexto global de negócios e relações transnacionais entre as empresas, entre empresas e fiscos e, atualmente, mesmo entre fiscos de diferentes jurisdições. E não há como regular e tributar adequadamente transações internacionais sem que seja exposta uma rede regulatória que transcenda uma única jurisdição. Assim, a bibliografia, necessariamente, demonstra a                                                                                                                          

22 Afinal, como bem alerta Moeller, “O “fazer sentido” é a interação entre o real e o possível. Aquilo que pensamos faz sentido dentro de um horizonte de possibilidades. Sem um contexto de sentido, pensamentos não podem fazer sentido. Similarmente, a comunicação, sem um contexto de sentido, não consegue fazer sentido. Nossas mentes e comunicações operam em um horizonte de sentidos, tal qual um barco opera em um corpo de água. Estas operações acontecem na base da distinção entre o que é real e o que é possível.” (grifos acrescidos). (Tradução livre do autor para “Sense-making is the interplay between the actual and the possible. What we think makes sense within a horizon of possibilities. Whithout a context of sense, thoughts cannot make sense. Similarly, communication without a context of sense cannot make sense. Our minds and communications operate within a sense-horizon like a ship operates on a body of water. These operations take place on the basis

of a distinction between what is actual and what is possible.”) (MOELLER, Hans-Georg. Luhmann Explained.

inserção do tratamento doméstico do planejamento de acordo com uma coerência internacional. Sendo assim, houve a cautela na referência apenas a pontos que descrevessem negócios, formatassem modelos de instituições e delineassem as normas antielisivas estrangeiras, sem limitações legais ou julgamentos como paradigmas que devam ser copiados. Quanto ao diagnóstico jurisprudencial apresentado, por sua vez, pela cautela acima exposta, não se utilizou jurisprudência estrangeira no presente trabalho. Da mesma forma, não foi realizada uma pesquisa de decisões judiciais em torno do planejamento tributário, por elas não serem capazes de representam uma amostragem, uma vez que o tema enfrenta um processo de desjudicialização, desde a instituição dos programas especiais de parcelamento. Sendo assim, apenas a jurisprudência administrativa é referida no trabalho. E, como já são inúmeros os trabalhos que realizaram pesquisa de julgados no antigo Conselho de Contribuintes e no CARF, que o presente trabalho, como progresso de pesquisa, meramente utilizou-se dos resultados de pesquisa de autores selecionados pela qualidade e referência do estudo, para, em conjunto, formar um diagnóstico do tratamento jurisprudencial administrativo, em âmbito federal, do planejamento tributário.

Por fim, uma perspectiva histórica foi utilizada por meio da construção de cada uma das formulações normativas tendentes a dar um tratamento ao planejamento tributário via regulação da Norma Geral Antielisiva brasileira, não sendo, portanto, uma mera reflexão sobre o tema, mas uma construção da recente trajetória de intuito regulatório, como forma de sedimentação das ideias coerentes subjacentes às propostas e conferência de uma avaliação das nuances positivas e negativas de cada uma delas, para que se as seguintes propostas normativas possam ser construídas a partir de uma acessível perspectiva dos pontos a serem melhor trabalhados, sem repetir falhas e lacunas.

Assim, tendo-se verificado qual o percurso da generalidade de abrangência do tópico do “planejamento tributário” ao tópico de enfoque de uma regulação para a Norma Geral Antielisiva brasileira, como proposta do trabalho, para que o leitor não se perca nas abstrações trazidas e análises conferidas aos dados e informações levantados, faz-se mister que esteja evidenciada uma delimitação objetiva do objeto de estudo, bem como uma identificação do problema e as propostas incrementais de resolução.

Como delimitação do trabalho, tem-se o de tratamento do planejamento tributário elisivo, com potencialidade para ser agressivo, ou, em outros termos, abusivo, aquele que cumpre a letra da lei, mas pode ser abusivo em relação ao seu espírito, ou à política pretendida, isto é, aproveitando as palavras de James Alm, aquele que “consiste em prática que reduz a alíquota efetiva de um tributo sobre um tipo particular de rendimento para um

nível abaixo daquele pretendido pela política tributária para essa renda”23, conforme percentual instituído pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE.

A preocupação não tem enfoque principal na figura ilícita, claramente evasiva do planejamento, embora inerentemente seja tocada, ao passo que os pretensos e atualmente não mais que etéreos limites de permissibilidade fazem com que seja parte do estudo, mas não é o ponto da preocupação, de modo que as penalidades para os casos de evasão não são compreensivamente abordadas. Importa, na verdade, a figura nebulosa da elisão, no limite do permitido e do proibido, passível à desconsideração pelas autoridades administrativas e às eventuais multas, mas que não dispõe atualmente de tratamento adequado, pela falta de regulação.

Diante da introdução do parágrafo único ao artigo 116 do Código Tributário Nacional, mas carente de regulação, para se identificar as nuances e repercussões da figura elisiva, delimitado o objeto de estudo, pretende-se contribuir com perspectivas de contornos e premissas de uma regulação para a Norma Geral Antielisiva brasileira, levando em conta o cenário doméstico, mas sem olvidar que o país, para atingir um melhor nível de desenvolvimento econômico e social, também deve ser visto como player internacional, assim relevando eventuais progressos de medidas internas com coerência global. Afinal, não se trata de um problema exclusivamente interno. Tem-se, diante do estudo, um problema de representatividade global e que não pode ser resolvido se não devidamente levantado neste contexto.

Assim, há uma problemática ampla, consistente no mau funcionamento sistêmico e institucional no tratamento das operações nebulosas de planejamento tributário, em que se identifica grave crise de confiança entre os atores envolvidos, que se colocam nos polos de um ponto de tensão, ao mesmo o não mais funcionamento das estratégias de regulação baseadas nos paradigmas do crime e do serviço não mais atendem às necessidades de impacto regulatório.

Dentro desta problemática ampla, há uma específica, formada pelos entraves diversos que surgem de um labirinto conceitual e uma limitação textualista dos intérpretes e aplicadores do direito que se aproximam do tema, ao prenderem-se a percepções falidas diante da globalização. Além disso, agrega-se uma inclinação a falência institucional, com o                                                                                                                          

23 ALM, James. Um Sistema Tributário transparente desencorajaria o “planejamento tributário agressivo”? Trad. Nara C. Takeda Taga. IN: Transparência Fiscal e Desenvolvimento. Homenagem ao Professor Isaias Coelho. São Paulo: Ed. FIscosoft, 2013, p. 276.

recente desmantelamento do mais importante órgão julgador em matéria técnica do país. Dessa forma, “metonimizado” na causa pelo efeito, o problema pode ser evidenciado não apenas como a falência do sistema e o desarranjo institucional gerado pela incapacidade de tratar o assunto, mas já associando o problema ao próprio planejamento tributário, em sinonímia com o caos instaurado.

As medidas de solução, por sua vez, ainda que influenciadas por um contexto internacional, devem ser tomadas no plano doméstico brasileiro. Por isso, é verificada amplamente a trajetória nacional, seja por meio da evolução do debate na doutrina, o seu tratamento na jurisprudência e, diante de uma carência legislativa, todo o percurso das formulações normativas para regulação do tema desde a introdução do parágrafo único ao artigo 116 do Código Tributário Nacional até o encerramento do presente estudo. Assim, trilhando um percurso descritivo do contexto abrangente, avaliativo em relação às formulações normativas já surgidas para lidar com o problema, perpassa-se também uma etapa prescritiva, ao se ponderarem recomendações como contribuição para uma regulação da uma Norma Geral Antielisiva brasileira. Ou seja, a premissa assumida é de que hipótese de resolução viria por meio de uma regulação para o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, cujos contornos, premissas e política considerados relevantes no processo são apresentados no decurso do trabalho, ao mesmo que, pontual e especificamente, apresenta-se no trabalho os mesmos contornos, premissas e política, vistos ou ressalvados, sob a forma da última e mais madura formulação normativa elaborada até o momento do encerramento da pesquisa.