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6 OBSERVAÇÃO DA SEQUÊNCIA FEDATHI

7.1 Preparação das sessões didáticas

A tese de Sousa (2015) traz a Sequência Fedathi em três níveis: preparação, vivência e análise. Destes, a preparação se refere ao planejamento da sessão didática, que deve considerar a análise do ambiente e a análise teórica, para elaboração do plano de aula. Nos resultados descritos no capítulo 6, a análise teórica se destacou, sendo fundamental para a organização da abordagem do conteúdo com vistas a criar um ambiente de ensino favorável a construção dos conceitos estudados. Assim, todas23 as sessões didáticas foram elaboradas de modo a trazer implicitamente a lógica contida no esquema da figura 23, obtido na primeira etapa deste estudo. Por exemplo, ao planejarmos a sessão didática sobre espaço vetorial, a análise teórica foi organizada conforme a estrutura ilustrada na figura 24.

Figura 24 - Resumo da análise teórica da sessão didática 1

Fonte: Pesquisa direta (2017).

Pela figura 24, temos que a abordagem do conteúdo de espaço vetorial requer, inicialmente, que olhemos para o plateau, entendido como o patamar do qual o ensino deverá partir, considerando os conhecimentos prévios dos alunos e os conteúdos pré-requisitos de espaço vetorial, que, no caso, compreendem “vetores no plano e no espaço”, bem como a “adição e a multiplicação”. Assim, o diagnóstico do plateau foi realizado considerando o perfil dos estudantes, os quais já haviam cursado a disciplina Geometria Analítica Vetorial. Desse modo, antes da tomada de posição, ao iniciar a aula, foi realizada uma explanação breve sobre vetores, de modo a relacionar o que os alunos já sabiam com o básico que precisavam saber para responder acerca do assunto focalizado.

Em seguida, foi identificada a essência do conteúdo, que, no caso, é a “adição vetorial e a multiplicação por escalar”, bem como a manipulação algorítmica, necessárias à compreensão, e que envolveram as operações com vetores como elementos dos espaços vetoriais. Com isso, se pôde relacionar o plateau e os conteúdos que precisariam ser trabalhados nesta sessão didática, para em seguida escolhermos o elemento desafiador ou, simplesmente, o desafio, associado ao objetivo geral da aula, que foi a elaboração dos axiomas de espaço vetorial, pelos alunos, em oposição ao que geralmente acontece em aulas deste conteúdo, cujos axiomas são apresentados pelo professor como uma lista, podendo levar os alunos a apenas memorizá-los.

Após a escolha do elemento desafiador, sondamos quais recursos ou estratégias de ensino poderiam auxiliar na realização do desafio proposto. Assim, foi escolhida a “mediação por meio de perguntas e uso de slides”, na qual a explicação do conteúdo se deu como diálogos, com a participação ativa dos alunos, à medida que eram trazidas informações sobre o assunto por meio dos slides e explanações na lousa.

Por conseguinte, esta análise teórica nos remeteu a delinear os objetivos da sessão didática, uma vez que já tínhamos uma visão geral do que precisaria ser abordado. Desse modo, os objetivos foram:

• compreender o conceito de espaço vetorial a partir das operações de soma e multiplicação por escalar;

• rever a noção de vetor e as operações de soma e multiplicação por escalar; • perceber a aplicabilidade dessas operações a conjuntos matemáticos distintos; • conhecer as propriedades que garantem que um determinado conjunto é um

espaço vetorial; e

• verificar se um conjunto dado é um espaço vetorial.

Ao analisar a preparação de cada sessão didática, observamos que a essência do conteúdo foi determinante na organização das aulas, pois orientou a elaboração dos objetivos e escolha dos desafios a serem propostos. Ela sinalizou que aspecto do conteúdo o aluno precisaria perceber para compreender a teoria, contemplando o significado implícito ao conceito estudado. Na Teoria dos Espaços Vetoriais, se o aluno não perceber o papel das operações de adição e multiplicação escalar, provavelmente, estará fadado à aprendizagem mecânica, limitada ao treino de técnicas de manipulação algorítmica dos conteúdos.

A escolha do desafio ou elemento desafiador foi feita de modo a permitir que os alunos manipulassem as operações de adição e multiplicação por escalar, para então elaborar os axiomas com base em seus conhecimentos prévios. Assim, também levou em consideração a manipulação algorítmica e o plateau, partindo-se de um patamar de conhecimento no qual os conhecimentos prévios do aluno pudessem se tornar pontos de ancoragem do novo saber.

Todas as sessões didáticas foram elaboradas, considerando plateau-essência- manipulação-desafio. Desse modo, no planejamento, pensamos em como o conhecimento prévio/pré-requisito pode ser trabalhado para ajudar o aluno a compreender a essência do conteúdo, sendo esta reforçada pela manipulação, em que o docente pode pensar em como trabalhar com as distintas representações dos conceitos estudados. Na sessão didática 5, por

exemplo, os alunos puderam manipular algébrica e geometricamente vetores dos espaços vetoriais R² e R³, com apoio computacional.

Além disso, vimos pelos resultados obtidos que o plateau está em parte, inserido na Preparação, como integrante da análise teórica, auxiliando na identificação das relações entre saberes antigos e novos. Por outro lado, também o encontramos na Vivência, sendo diagnosticado na prática, à medida que o professor contextualizar e “preparar o terreno”, para que seja apresentada a situação desafiadora na tomada de posição. Assim, na análise teórica, o plateau é presumido considerando os pré-requisitos do conteúdo e/ou informações sobre a turma. Já na vivência este diagnóstico é confirmado ou refutado, para que os conteúdos partam de pontos que os alunos tenham condições de acompanhar. Portanto, o plateau não se limita a identificar o conhecimento prévio do aluno, mas faz uso deste para guiar os rumos da sessão didática.

Podemos dizer, entretanto, que o plateau faz parte da tomada de posição ou é algo que vem antes desta? Consideramos neste trabalho que faz parte da tomada de posição, antecipando-se à apresentação da situação desafiadora. Com exceção da primeira sessão didática, as demais se iniciaram por uma abordagem que considerava os conteúdos importantes estudados na aula anterior, logo o plateau foi utilizado em todas as aulas, auxiliando a criar um ambiente investigativo que parte de um contexto familiar aos discentes.

Considerar o plateau é imprescindível à compreensão e construção dos conceitos estudados, uma vez que ao levar o aluno a lembrar conceitos já estudados, estabelecendo-os como uma ponte ao novo saber, estará favorecendo a ocorrência dos processos de PMA, pois as imagens mentais e procedimentos realizados partem de conhecimento prévio que ajudarão na reorganização do saber antigo a ampliar no contexto do novo saber. Por exemplo, os conjuntos de matrizes, polinômios e funções, já conhecidos dos alunos, foram trabalhados no plateau, de modo que eles foram levados a reorganizar a compreensão que tinham destes, para então, dar conta de seu comportamento como espaços vetoriais. Essa “ponte” que liga o conhecimento prévio ao novo saber pode ajudar na compreensão do caráter unificador e generalizador da Teoria dos Espaços Vetoriais, sendo essa preocupação com o plateau importante para este fim.

Considerar a essência do conteúdo também foi relevante para o desenvolvimento do PMA, pois esta está associada à conceitualização e requer do estudante o estabelecimento de relações entre conceitos diversos e, ainda, interpretação e reformulação de ideias sob variados pontos de vista, levando-o a mobilizar a interação de processos mentais que ajudarão a perceber a estrutura matemática subjacente aos conteúdos.

Já a manipulação algorítmica, também, desempenhou papel importante nesse desenvolvimento, pois o manuseio de vetores, equações vetoriais, sistemas lineares, matrizes e construções geométricas, por exemplo, possibilita o desenvolvimento de processos mentais automáticos (conscientes ou inconscientes) que permitem ao aluno concentrar sua atenção em aspectos relevantes, favorecendo a síntese, a generalização e a abstração.

Assim, inferimos que os elementos identificados como integrantes da análise teórica são interligados, de modo que cada um contribui para dar coerência ao modo como o conteúdo será trabalhado na sessão didática que segue as fases e princípios da Sequência Fedathi. Convém ressaltar que não tratamos aqui de uma “receita” para preparação de aulas usando a SF, mas uma ênfase a tópicos importantes que, implicitamente, podem contribuir para criação de um ambiente de ensino favorável à construção conceitual.