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CAPÍTULO III OS CAMINHOS PERCORRIDOS EM BUSCA DE

3.1 Pressupostos acerca do método

Entendemos que o conhecimento científico se produz pela busca de articulação entre teoria e realidade empírica. Desse modo, é papel do pesquisador utilizar um acurado instrumental teórico-metodológico que o municie na aproximação e na interpretação da realidade. Assim, consegue manter ao mesmo tempo, não só a crítica sobre as condições de compreensão do objeto, como também de seus próprios procedimentos (MINAYO, 2008).

Neste sentido, faz-se necessária uma discussão epistemológica acerca do caminho trilhado pelo objeto de investigação, ou seja, sua metodologia. Contudo, adentrar na discussão metodológica é pisar em solos instáveis, tendo em vista que seu próprio conceito já é, em si, um assunto controverso, polissêmico por natureza.

De acordo com Minayo (2002), há quem a iguale aos métodos e técnicas de pesquisa, além daqueles que a colocam no campo da epistemologia, separando- a de sua operacionalização. Contudo, uma certeza une as duas concepções: não é possível fazer ciência sem metodologia.

Concordamos, porém, que teoria e metodologia devem caminhar juntas, indissociadas, pois “enquanto conjunto de técnicas, a metodologia deve dispor de instrumental claro, coerente, elaborado, capaz de encaminhar os impasses teóricos para o desafio da prática” (MINAYO, 2010, p.15). A teoria por sua vez, funciona como uma lente que permite a aproximação com o mundo empírico, acessado através de metodologias. Teoria é, portanto, não só o conhecimento que se produz, como o modo como se produz.

Neste estudo, empreendemos esforços para que teoria e metodologia permanecessem indissociadas e articuladas. Como método, propomos o Estudo de Caso que segundo Minayo (2008, p.164), “utiliza estratégias de investigação qualitativa para mapear, descrever e analisar o contexto, as relações e as percepções a respeito da situação, fenômeno ou episódio em questão”. Faz-se,

portanto, útil por gerar conhecimento sobre características significativas de eventos vivenciados, no nosso caso, a experiência de produção, sistematização e comunicação advindas da pesquisa “Estudo epidemiológico da população da região do Baixo Jaguaribe exposta à contaminação ambiental em área de uso de agrotóxicos”.

Ainda segundo Minayo (2008, p.165), “os estudos de caso evidenciam ligações entre intervenções e situações da vida real”. Este fato fortalece nossa escolha, uma vez que a pesquisa acima referida reuniu em seu acervo um extenso material que contribuiu para o desvelamento de situações que permaneceram durante anos ocultadas, ou mesmo negligenciadas18.

Stake (1994) apud Esteban (2010) identifica três classificações de Estudo de Caso: o Instrumental, o Coletivo e o Intrínseco, que acreditamos ser o que melhor se aplica aos nossos objetivos. Para o autor (Op cit), o Estudo Intrínseco de Caso é a melhor escolha quando o pesquisador:

[...] quer alcançar uma maior compreensão desse caso em particular. Não se seleciona o caso porque represente a outros ou porque represente um aspecto ou problema em particular, mas porque o caso em si mesmo é o que nos interessa. Precisamos aprender sobre esse caso concreto. Temos um interesse intrínseco nele (STAKE,1995, apud ESTEBAN, 2010, p. 182).

Nesse contexto, interessa-nos compreender como os sujeitos participantes da pesquisa avaliaram suas diferentes etapas e processos, desde o delineamento do objeto à destinação dos conhecimentos produzidos em conjunto com diversos atores sociais. Também faz parte desta investigação uma análise na dimensão praxiológica acerca dos pressupostos teórico-metodológicos e sociopolíticos da referida pesquisa, à luz do paradigma emergente de ciência.

Entendemos que como qualquer outro método de pesquisa, o Estudo de Caso apresenta vantagens e desvantagens. De acordo com Mazzotti (2006), uma das fragilidades inerentes a esta abordagem reside no fato de focalizar o interesse de estudo apenas em uma situação determinada, em um “caso” específico e nas suas circunstâncias singulares, sendo, portanto, de difícil replicação em outros

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Neste projeto nos reportamos a alguns trabalhos desenvolvidos pela equipe do Núcleo Tramas. Para um maior aprofundamento nas bibliografias citadas, consultar a lista de referências.

contextos. Acreditamos, porém, já termos demarcado epistemologicamente nosso posicionamento em relação à reprodução de fenômenos sociais quando comparados aos moldes do postulado positivista.

Ainda em relação às fragilidades do método escolhido, Minayo (2008) traz outros elementos que devem ser foco de atenção por parte do pesquisador, como “a falta de rigor e a existência de muitos vieses do investigador se a investigação não for corretamente conduzida”(MINAYO, 2008, p.166).

Yin (2010) nos alerta para o cuidado necessário que o pesquisador deve ter em relação à intencionalidade presente no Estudo de Caso. Consideramos esta contribuição valorosa, principalmente nesta pesquisa, tendo em vista a relação intrínseca do pesquisador como parte também do objeto de investigação, o que certamente aumenta a possibilidade de vieses.

Contudo, como forma de contornarmos tais riscos, adotamos algumas medidas precaucionarias, como por exemplo, nos guiarmos com o máximo de rigor possível nos referenciais teóricos, em postura constante de vigilância epistemológica; a escuta de diferentes atores, tanto internos quanto externos ao grupo, bem como o diálogo com outros grupos de pesquisadores que desenvolvem pesquisas neste mesmo tema; o cuidado auto reflexivo nas análises dos discursos, utilizando para tal, referenciais metodológicos apropriados para este desafio.

Além do diálogo com o campo empírico propriamente dito, reside nesse projeto um importante e denso desafio no âmbito reflexivo-analítico: estamos trabalhando na dimensão da produção do conhecimento que foi apropriado por sujeitos sociais, inserindo-se assim, num contexto político, resultando em transformações materiais. Desse modo, a complexidade deste objeto exigiu-nos um denso esforço hermenêutico para a construção de mediações “transconceituais” entre os campos da Filosofia, Ciências Sociais e Saúde Coletiva.

Isto fez com que reuníssemos nos referenciais teóricos mais amplos, desde o idealismo de Hegel, passando pelo materialismo histórico de Marx, até as contribuições de pensadores da Escola de Frankfurt como Habermas e no pós- modernismo de oposição de Boaventura de Sousa Santos, as contribuições necessárias para sucessivas aproximações com o objeto estudado.