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2. REVISÃO DA LITERATURA

2.2 HUMANIZAÇÃO EM SAÚDE

2.2.1 PRESTAÇÃO DE CUIDADOS DE SAÚDE

2.2.1.1 Cuidados centrados no cidadão

A nível nacional, dá-se ênfase aos cuidados centrados no cidadão, utilizando-se, com frequência, a expressão ‘compromisso com o cidadão’.

Conforme afirma Nunes (2014), “o referencial maior de funcionamento dos serviços de saúde é, sem qualquer dúvida, o cidadão – doente ou saudável –, sendo a humanização da saúde o paradigma da reforma por que todos os portugueses anseiam” (p.76).

De acordo com o PNS 2020, o cidadão deve ser capaz de assumir a responsabilidade de defender a sua saúde e a dos outros (DGS, 2015).

Segundo a OMS (2016c), o compromisso com o cidadão define-se pelo grau de envolvimento activo das pessoas ao cuidarem da sua própria saúde e moldarem os sistemas de saúde.

O compromisso com o cidadão, no que concerne à saúde, significa oferecer, à comunidade, oportunidades que permitam responsabilizar as estruturas de saúde e capacitar as pessoas para cuidarem melhor de si (Kickbusch & Behrendt, 2013).

Deste modo, o compromisso implica o envolvimento das pessoas nos seus próprios cuidados de saúde e no planeamento, implementação e avaliação das políticas e serviços de saúde (Kickbusch & Behrendt, 2013). Aliás, os próprios valores e princípios do ‘PNS 2020’ salientam o envolvimento e participação de todos os intervenientes nos processos de criação de saúde (DGS, 2015).

Na verdade, a melhoria ao nível da qualidade dos resultados de saúde não provém apenas dos profissionais de saúde, pois os próprios cidadãos são também co-produtores de saúde, na medida em que têm papéis e responsabilidades cruciais na identificação das suas próprias necessidades e preferências e na gestão da sua própria saúde, com o apoio adequado dos profissionais de saúde (OMS, 2006), pelo que a co-produção ou a co-criação de valor pode ser definida como as actividades conjuntas de cidadãos e prestadores de serviços, de forma a contribuir para o valor que emerge para ambas as partes (Zhanga et al., 2015).

A co-criação de valor nos serviços de saúde está, assim, subjacente ao conceito de ‘cidadania em saúde’, preconizada pelo ‘PNS 2020’, em que o cidadão assume vários papéis: o de doente com necessidades específicas, o de consumidor com expectativas e o de contribuinte do SNS (DGS, 2015).

Baker (2013) também salienta a importância de atribuir poder aos cidadãos, no entanto afirma que esse poder deverá ser orientado para a manutenção dos sistemas de saúde e para a responsabilização dos seus gestores.

Zhanga et al. (2015) desenvolveram um modelo para a aplicação da co-criação de valor nos serviços de saúde, uma vez que aplicava-se apenas às indústrias, tendo demonstrado que a recolha e análise, sistemática,

do feedback dos cidadãos, permite envolvê-los na co-criação de valor para os serviços de saúde.

Neste sentido, a ‘co-criação de valor’ e a ‘cidadania em saúde’ implicam a participação do cidadão, no entanto, essa participação, muitas vezes, parece limitar-se ao direito à informação e ao consentimento informado.

Em suma, pode afirmar-se que a chave para o sucesso da co-criação de valor depende da qualidade das interacções entre os profissionais de saúde e os cidadãos, uma vez que estes, na qualidade de utentes, podem influenciar um serviço ao procurarem e partilharem informação, ao fornecerem feedback e ao interagirem com os processos (Zhanga et al., 2015).

De acordo com Nunes (2014), a promoção da saúde deve advir do próprio indivíduo e da sua família, auxiliado pela sociedade, que deve organizar-se de modo a promover estratégias educativas para o exercício pleno de uma cidadania responsável.

De acordo com Groene et al. (2014b), o actual envolvimento dos doentes e dos seus representantes nas funções de gestão da qualidade ainda é muito baixo e centra-se, principalmente, em questões menos técnicas de cuidados (como é o caso da literacia em saúde), nas quais os doentes podem fazer contribuições construtivas, mas que não são necessariamente colocadas em prática.

Groene et al. (2014b) salientam, ainda, o facto de, nos últimos anos, ter aumentado, substancialmente, a participação dos cidadãos ao nível da concepção e da avaliação dos serviços de saúde. Nesse sentido, a

criação do Movimento da Segurança do Doente22 veio provar a necessidade de envolver mais o doente e de

aprender com as suas experiências, a fim de garantir cuidados centrados no doente, que sejam seguros e de elevada qualidade (Groene et al., 2014b). Daí que o envolvimento do doente, na concepção e avaliação dos cuidados, seja visto como uma estratégia para promover os cuidados centrados no doente, sendo uma dimensão integral da qualidade nos hospitais (Groene et al., 2014b).

2.2.1.2 Cuidados centrados no doente

Os cuidados centrados no doente referem-se aos cuidados de saúde que estabelecem uma parceria entre os profissionais e os doentes, de forma a garantir que as decisões respeitam os desejos, as necessidades e as preferências destes, bem como garantir que tenham o acesso à informação e ao apoio de que precisam para tomar decisões e participar nos seus próprios cuidados (Groene, Kringos & Suñol, 2014a).

De acordo com Luxford et al. (2015), um componente-chave dos ‘cuidados centrados no doente’ é a ênfase nas preferências dos cuidados.

A ênfase dada às preferências dos cuidados impulsionou o desenvolvimento da Estratégia ‘TOP 5’23, que envolve o pessoal médico num processo estruturado com cuidadores, visando obter e registar estratégias de gestão para ajudar a comunicação e o apoio personalizado (Luxford et al., 2015).

A Estratégia ‘TOP 5’ foi inicialmente pensada para doentes com deficiência cognitiva, seguindo-se

outras estratégias, para melhorar a comunicação médico-cuidador, como é caso da abordagem “This is Me”24 (Luxford et al., 2015).

22 O Movimento da Segurança do Doente, de âmbito internacional, foi criado, em 2005, pela OMS. Este Movimento é liderado pela

World Alliance for Patient Safety, que foi criada, em 2004, na sequência da publicação, em 1999, do Relatório "To Err is Human", realizado pelo Instituto de Medicina Americano, que divulgou que os eventos adversos constituíam a 8.ª causa principal de morte.

23 TOP 5 é uma estratégia que foi desenvolvida, em 2014, pela Comissão de Excelência Clínica da Austrália, inicialmente, para os

doentes com deficiência cognitiva, como é o caso da demência. Esta estratégia surgiu na sequência da publicação, em 2012, do Relatório

"Demência - Uma Prioridade de Saúde Pública", da OMS, que demonstrou que o continente australiano era o quarto maior ao nível da

prevalência de demência para pessoas com idade igual ou superior a 60 anos, sendo a 3.ª causa principal de morte.

24 A ferramenta “This is Me” foi lançada, em 2010, pela “Alzheimer's Society” (Associação Alzheimer), sediada em Londres, com o

objectivo de informar os profissionais de saúde sobre as necessidades, os interesses, as preferências e os gostos das pessoas com demência, nomeadamente com a doença de Alzheimer.

Luxford et al. (2015) afirmam que o uso de uma estratégia de comunicação simples e de baixo custo está associado a melhorias na relação Médico-Cuidador, com potenciais benefícios para a segurança do doente e para a redução de custos nos serviços de saúde. Deste modo, a Estratégia TOP 5 representa, no mínimo, 'boas práticas' e tem potencial para uma aplicação, mais ampla, por parte dos serviços de saúde que visem prestar cuidados centrados no doente (Luxford et al., 2015).

Segundo os dados divulgados pela OCDE, a prestação de cuidados de saúde responsável e centrada no doente desempenha um papel cada vez mais importante na política dos cuidados de saúde dos países que a integram (OCDE, 2015a). Nesses países, o uso do doente como fonte directa de informações é, cada vez mais, recorrente para a monitorização, o planeamento e a tomada de decisões ao nível do sistema de saúde, uma vez que os esforços para avaliar e monitorizar as experiências dos doentes tem levado a melhorias na qualidade dos cuidados de saúde (OCDE, 2015a).

De acordo com Frampton et al. (2008), há trinta anos, quando surgiu pela primeira vez a expressão ‘cuidados centrados no doente’, a ideia da parceria com o doente/família (e do respectivo envolvimento destes), do seu acolhimento e da personalização dos cuidados, de forma a preservar, tanto quanto possível, as rotinas normais dos doentes, era vista, na altura, como uma ameaça ao sistema de saúde, onde os profissionais de saúde eram tidos como peritos, a família era considerada mera visita e os doentes tratados como simples partes do corpo a intervencionar.

Em termos gerais, os cuidados centrados no doente são cuidados organizados em torno do indivíduo, sendo um modelo em que os prestadores de cuidados se associam aos doentes e família, de forma a identificar e satisfazer a gama completa das suas necessidades e preferências (Frampton et al., 2008).

Na definição dos cuidados centrados no doente não deve ser negligenciado o foco simultâneo nos profissionais de saúde (Frampton et al., 2008).

Na verdade, a abordagem centrada no doente, para ser bem-sucedida, deve considerar a experiência dos profissionais, que poderá ficar incontestavelmente comprometida se estes não cuidarem de si próprios, uma vez que a prestação de cuidados centrados no doente e família exige que os profissionais de saúde dêem o máximo de si, quer física quer emocionalmente (Frampton et al., 2008).

As pessoas que prestam serviços nos hospitais são quem mais influencia a experiência do doente, seja à sua cabeceira ou por detrás de um balcão, pelo que cada interacção é uma oportunidade para cuidar, apoiar e ter compaixão (Frampton et al., 2008). No entanto, as exigências incríveis que os profissionais de saúde estão a enfrentar, diariamente, desafiam à prestação de cuidados eficientes e eficazes, sem que, para tal, possam dignar-se conceder a compaixão que os doentes esperam e merecem (Frampton et al., 2008).

Segundo Groene et al. (2015), os cuidados centrados no doente proporcionam dignidade, compaixão e respeito, oferecem cuidados, apoio ou tratamentos coordenados e personalizados e ajudam os doentes a reconhecerem e desenvolverem as suas próprias forças e capacidades para viverem uma vida independente e gratificante.

Pelo exposto, pode concluir-se que os cuidados centrados no doente contribuem para alcançar os resultados desejáveis ao nível da eficiência clínica e da segurança do doente (Groene et al., 2015), o que requer sistemas de saúde que sejam financeiramente viáveis, aptos para o que se propõem, centrados nas pessoas e baseados em evidências (OMS, 2013).

2.2.1.3 Cuidados centrados na pessoa

De acordo com a OMS (2016c), os sistemas de saúde centrados na pessoa priorizam as necessidades dos indivíduos, das suas famílias e comunidade, envolvendo as pessoas como parceiros na tomada de decisão.

Os Estados-Membros da OMS acordaram melhorar significativamente a saúde e o bem-estar das populações, reduzir as desigualdades na saúde, reforçar a saúde pública e assegurar sistemas de saúde centrados nas pessoas, que sejam universais, equitativos, sustentáveis e de elevada qualidade (OMS, 2013).

A visão apresentada pela ‘Saúde 2020’, para os sistemas de saúde centrados nas pessoas, estende-se aos mesmos princípios de equidade, justiça social, participação comunitária, promoção da saúde, uso apropriado de recursos e acção intersectorial, conforme preconizado pela Declaração de Alma-Ata de 197825 (OMS, 2016e).

Segundo a OMS (2015), a concepção e orientação dos sistemas de saúde centrados na pessoa inclui uma parceria com os doentes, não só para compreender, mas também para definir a qualidade dos sistemas de saúde, o que implica envolver as pessoas nos seus próprios cuidados e informar os sistemas de saúde com base em evidências. Desta forma, os sistemas de saúde centrados na pessoa organizam-se em torno das necessidades e expectativas de saúde dos indivíduos ao longo da sua vida e não em torno de doenças episódicas e, bem assim, não se limitam a dar voz à maioria, mas também têm em consideração a voz dos mais vulneráveis, o que pressupõe um investimento em literacia em saúde (OMS, 2015).

Este envolvimento das pessoas é determinante para a literacia em saúde, uma vez que, esta, se refere “aos níveis de competência em que as pessoas se encontram para lidar com questões de saúde e que pressupõe a necessidade do desenvolvimento dessas competências para escolhas esclarecidas e responsáveis em relação à sua saúde e à dos outros” (Carvalho & Jourdan, 2014, p.114). Daí a importância dada ao “contexto em que as pessoas vivem para que as intervenções de educação para a saúde sejam efectivas para o aumento da literacia em saúde” (Carvalho & Jourdan, 2014, p.115).

A literacia em saúde remete, assim, para as competências e os conhecimentos necessários, para que os cidadãos possam aceder, compreender, avaliar e utilizar informação sobre saúde, “que lhes permita tomar decisões sobre cuidados de saúde, prevenção da doença e modos de promoção de uma vida saudável” (Espanha, Ávila & Veloso Mendes, 2016, p.5).

Conforme os dados divulgados no ‘Relatório Síntese da Literacia em Saúde em Portugal’, elaborado por Espanha et al. (2016), constata-se que, em 2014, 49% dos portugueses obtiveram um nível de literacia ‘inadequado’ ou ‘problemático’.

O referido Relatório demonstra que os cidadãos, mesmo os indivíduos com elevados níveis de literacia em saúde, têm “uma baixa percepção da complexidade envolvida nos processos de análise e descodificação da informação sobre saúde que circula nas sociedades actuais, em múltiplos suportes e produzida por diversas fontes” (Espanha et al., 2016, p.14) e, por conseguinte, a literacia em saúde não pode ser dissociada da literacia em geral. As mesmas autoras concluem, também que, em Portugal, ainda predomina “de forma inequívoca, o contacto interpessoal, preferencialmente com especialistas, enquanto modo de obtenção de informação sobre saúde” (Espanha et al., 2016, p.13), sendo de salientar o elevado nível de confiança na informação prestada pelos profissionais de saúde.

25 Trata-se da primeira declaração internacional que despertou e enfatizou a importância da promoção da saúde de carácter universal, que

Em suma, para promover a literacia em saúde é necessário implementar “acções específicas para incrementar a autonomia dos cidadãos e as qualificações e competências dos profissionais e decisores nesta matéria” (Espanha et al., 2016, p.14), daí que o MS tenha definido a literacia em saúde como uma das prioridades da ‘Estratégia Nacional para a Qualidade na Saúde 2015-2020’.

Neste sentido, os sistemas de saúde centrados na pessoa dependem dos seus profissionais, uma vez que a melhoria dos seus resultados depende da disponibilidade, acessibilidade, aceitabilidade e qualidade da força de trabalho da saúde (OMS, 2015). Daí que seja necessário, entre outros, melhorar o desempenho dos profissionais de saúde, promovendo práticas inovadoras e rentáveis, o que implica a concepção de sistemas de gestão e recompensa mais eficazes, tornando, assim, o ambiente de trabalho mais atractivo, bem como estabelecer políticas para assegurar que a força de trabalho da saúde seja sustentável e em número suficiente OMS (2015). De salientar que os cuidados de saúde centrados na pessoa consistem na prestação de serviços que, conscientemente, consideram e, propositadamente, adoptam uma perspectiva focada no indivíduo, o que implica a prestação de serviços que são adaptados às necessidades de cada um, proporcionando um cuidado que é contínuo, apropriado, responsável e aceitável sob o ponto de vista das populações (OMS, 2014b). Ter a perspectiva das pessoas significa, portanto, que os prestadores dos serviços de saúde devem ver a pessoa como um todo e, também, compreendê-la ao nível da sua saúde, dos seus objectivos de vida e do seu nível de satisfação com a vida e, assim, tentarem, juntos, criar algumas capacidades de autocuidado, de tal forma que os indivíduos possam desfrutar de uma vida melhor e prevenir doenças (OMS, 2016e). Desta forma, os ‘cuidados centrados na pessoa’ significam que a prestação dos serviços é realizada tendo em conta as necessidades individuais de cada um e o seu envolvimento na tomada de decisões, o que pressupõe mecanismos de gestão e de melhoria que proporcionam resultados de saúde óptimos (OMS, 2016d).

Pelo exposto, os serviços de saúde devem comprometer-se com os indivíduos no seu papel de doentes, consumidores/cidadãos (Kickbusch & Behrendt, 2013), bem como no seu papel de pessoas (conforme Tabela 6), na medida em que todas as pessoas devem merecer uma atenção humanizada por parte dos profissionais de saúde (Nunes, 2014).

Tabela 6: Síntese dos tipos de prestação de cuidados de saúde

CUIDADOS: CENTRADOS NO CIDADÃO CENTRADOS NO DOENTE CENTRADOS NA PESSOA

OBJECTIVOS

Visam respeitar o cidadão nos seus vários papéis: utente com necessidades específicas; consumidor com expectativas e

contribuinte do SNS3.

Visam estabelecer uma parceria entre os profissionais e os doentes

e/ou família1.

Visam atender às necessidades individuais dos doentes e ao seu

envolvimento na tomada de decisões5.

VANTAGENS PR O FI SS IO N AI S Permitem oferecer à comunidade oportunidades que possibilitem capacitar os

cidadãos para cuidarem melhor de si4. Permitem identificar e satisfazer a gama completa de necessidades e preferências dos doentes1.

Permitem prestar serviços que são adaptados às necessidades de cada um,

proporcionando um cuidado contínuo, apropriado, responsável e aceitável do

ponto de vista das populações6.

UT

EN

TE

S Permitem pugnar pela defesa

da saúde individual e da saúde colectiva3.

Permitem aceder à informação necessára para

tomar decisões e participar nos cuidados1.

Permitem que sejam vistos como um todo, possibilitando o desfrute de uma

vida melhor e a prevenção de doenças7.

LIMITAÇÕES Realizam-se dando voz,

apenas, à maioria2.

Realizam-se em torno de doenças episódicas2.

Realizam-se em torno de necessidades e expectativas de saúde da pessoa ao longo da sua vida, considerando os mais

vulneráveis2.

Fonte: Adaptado de Groene et al. (2014a)1, OMS (2015)2, DGS (2015)3, Kickbusch & Behrendt (2013)4, OMS (2016c)5, OMS (2014b)6 e OMS (2016d)7.

Independentemente do tipo de prestação de serviços, os utentes precisam de compreender o que lhes está a acontecer e a única maneira de o conseguir é através de uma comunicação regular com as equipas de saúde (Picker, 2003a).

Na verdade, os utentes devem receber as informações no momento certo (numa altura em que sejam úteis e possam ser absorvidas), com uma linguagem compreensível (evitando-se os termos técnicos) e consistente (isto é, com toda a equipa a falar a uma só voz), utilizando-se a linguagem verbal aliada à linguagem escrita (Picker, 2003a). Sobre esta matéria, Boerebach et al. (2014) salientam que o desempenho clínico não depende apenas dos conhecimentos e capacidades técnicas, mas também da capacidade de comunicar e de gerir a prestação de cuidados de forma eficaz, eficiente e focada no utente. Aliás, há vários estudos que exploram o impacto dos comportamentos interpessoais na qualidade dos cuidados de saúde e nos resultados dos tratamentos (Boerebach et al., 2014).

Pelo exposto, a ‘centralização da pessoa’ coloca o foco no indivíduo e, por conseguinte, enquanto os ‘sistemas de saúde centrados na pessoa’ asseguram que os serviços sejam orientados para as necessidades individuais e da população, os ‘cuidados centrados na pessoa’ garantem que, na prática, a prestação dos serviços adopte conscientemente uma perspectiva voltada para o indivíduo (Tello & Barbazza, 2015), perspectiva, essa, que proporciona a verdadeira humanização em saúde.

2.2.2 DEFINIÇÃO

Uma análise cuidada aos dicionários e enciclopédias (resumida no Anexo 4) permite constatar que o termo ‘humanização’ está, fortemente, associado à compassividade e, por conseguinte, pressupõe uma atitude de benevolência, tolerância, afabilidade e compreensão para com as outras pessoas (conforme Figura 4).

Figura 4: Esquema-resumo do significado do termo “humanização”

Fonte: Elaboração própria.

Um Hospital humanizado é, pois, aquele que, na sua estrutura física, tecnológica, humana e administrativa, valoriza e respeita a pessoa, colocando-se ao serviço da mesma, de forma a garantir-lhe um atendimento de qualidade.

Caprara, Lins & Franco (1999), referem que a personalização da assistência, a humanização do atendimento e o direito à informação são os principais componentes para a MCQ nos serviços de saúde.

Considerando que a melhor forma de compreender o verdadeiro sentido da humanização é reflectindo sobre a desumanização, Simões (2008) afirma que a falta de humanização (ou seja, a desumanização) resulta, entre outros factores, da indiferença relativa às necessidades emocionais dos doentes, da despersonalização dos profissionais de saúde, da falta de respeito perante a autonomia e a capacidade de decisão das pessoas, ou seja, da transformação do indivíduo num objecto (da sua ‘coisificação’).

Há, também, desumanização quando os profissionais de saúde optam pela distância afectiva e quando negam aos doentes as suas últimas vontades, em virtude dos hospitais serem concebidos para prolongar a vida das pessoas e, por conseguinte, os seus profissionais não estarem preparados para “ajudar a morrer” (Simões, 2008), ou seja, para aceitarem a morte como um desfecho natural e não como um fracasso profissional.

De acordo com Howard (1979), citado por Simões (2008), há cinco factores que reflectem a tendência para a desumanização, que são:

1. a centralização das instituições e do pessoal, que levou à construção de hospitais gigantescos e com características impessoais;

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