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Ao finalizar a construção do espaço com os alunos, sentava no chão e começava a rememorar o planejamento para aquele dia. Também escrevia em meu diário de bordo um pouco das inquietações do momento da pesquisa, pois isso me relaxava enquanto aguardava os professores.

Aos poucos eles chegavam e se dirigiam ao chão, com uma infinidade de assuntos sendo trazida, assuntos que pipocavam pela sala: cansaço, família, cursos, ganhar na loteria, desenhos animados e empresas que propõem espaços de relaxamento para os funcionários eram temas das conversações iniciais. Eu deixava que o papo rolasse solto por alguns minutos até que formávamos nossa primeira roda e dávamos início à primeira proposição.

A primeira proposta contemplava uma sequência de doze respirações. Essa proposta foi decorrente das palestras e vivências do Método Abramović, nas quais participei com a artista Marina Abramović, na Exposição Terra Comunal, realizada entre os meses de março e maio de 2015 no Sesc Pompeia/SP. Segundo a artista, após uma sequência de 12 respirações, é possível estar presente no “aqui e agora”.

Mais tarde encontrei em diversas referências ponderações sobre o trabalho com a respiração. Leal (2006, p. 41) discorre sobre a respiração como uma atividade integral do ser humano:

A vida acontece integralmente. Entendemos a respiração como integrada não somente à estrutura física do corpo de cada pessoa, mas à sua estrutura emocional, psíquica, cultural, histórica, social... O corpo que respira para viver é o corpo que se expressa ao se mover.

Em tempos em que pretendemos estar em muitos lugares simultaneamente, dada à vida atribulada da contemporaneidade, estar integralmente nas oficinas práticas na escola era um anseio da sequência de respirações. Conectar aqueles corpos com eles mesmos, com os outros e com o espaço era o almejado na nossa primeira proposição. A autora ainda comenta que o trabalho com a respiração está relacionado com o “fator fluência: controlar e liberar” (ibid, 2006, p. 59); portanto, era um dos quatro fatores do movimento13, propostos por Laban, que adentrava a formação.

A sequência de respirações postulava o diálogo entre os dois polos com relação ao fluxo, à liberdade e ao controle, visto que, para Laban, interessava essa ponte entre os dois polos, ou como define Marques, o “trânsito” (2010, p. 111) entre o fluxo libertário e o fluxo controlado da respiração.

Recorro ao diário de bordo e me deparo com certa passagem em que, por descuido do pesquisador, não foi realizada a respiração. Já estávamos próximos da vigésima oficina, mas acabamos por prosseguir sem a respiração. Uma professora alertou “Fez falta!”. E a professora tinha razão, pois entre expirações e inspirações, nos alocávamos no momento presente; por conseguinte, era uma ação fundamental para buscar a integralidade de cada um, ou seja, na busca de conexões entre pensar, mover e sentir, ações necessárias para cada ser que se propunha a experienciar a dança naquele momento de formação.

As impressões sobre a respiração apareceram também nos registros realizados durante o processo da pesquisa. Pedi em dois momentos que realizassem algum registro sobre as vivências com a dança, o que poderia ser feito por meio de imagens, poemas, vídeos, textos dissertativos, etc. Compartilho um trecho do poema “A vida em movimento”, escrito pela Professora Sílvia, que contempla sua impressão sobre o respirar durante os encontros:

13 Em seus estudos, Rudolf Laban destacou que há no movimento humano a presença de quatro fatores: peso, espaço, tempo e fluência. Alguns deles serão destacados no decorrer das oficinas com os professores.

Mãos soltas, rostos pálidos Pensamento distante Cansaço permanente Respire fundo, Respire, Respire

Conecte-se com o movimento

Nos estudos realizados no LIMS adquiri o livro Everybody is a Body. Primeiramente, o título me parecera muito sugestivo e encontrei nele muitos embasamentos sobre o trabalho corporal. Opto por trazer um trecho sobre a respiração como um ponto de partida para o trabalho prático, além das autoras ressaltarem a importância desse momento:

Ter um momento para respirar e levar à consciência o que estamos fazendo (movendo) nos dá a oportunidade de nos concentrar, de restabelecer, de preparar e nos comunicarmos de forma mais eficaz. Quando nos tornamos mais conscientes, otimizamos a capacidade de viver nossas vidas em toda a extensão. (Cox; Studd, 2013, p. 12, tradução nossa)14

A continuidade da oficina contemplava um momento que intitulamos “acordar o corpo”. Realizávamos uma automassagem, primeiramente com toques nos membros inferiores e, posteriormente, nos membros superiores. A proposição foi construída coletivamente durante o percurso da pesquisa e foi sugestão do grupo a massagem poder ser realizada pelo colega. No decorrer das oficinas incluímos alguns movimentos visando alongar o corpo e vários professores sugeriram movimentos que haviam aprendido em sessões de pilates, yoga ou até em tratamento fonoaudiológico, e as professoras de educação física contribuíram com o grupo no despertar corporal.

14 Texto original: “Taking a moment to breathe, and to bring to conscious awareness what you are doing (moving) gives EveryBody the opportunity to focus, to recuperate, to prepare, and to communicate more effectively. When we become more self aware we optimize our ability to live our lives to the fullest extent.”

Figura 18 - Aquecimento. Fonte: Acervo pessoal.

Miller, ao comentar sobre a importância da presença na dança, pontua: “Não existe dança se não houver primeiro o corpo” (2007, p. 59). Portanto, se o almejado era o trabalho com a dança, era necessário no momento inicial da formação aquecer os corpos e trazê-los para o presente.