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PRIMEIROS PASSOS: Ideias introdutórias

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CAPÍTULO 3: ADENTRANDO EM LUGARES DESCONHECIDOS

3.1 PRIMEIROS PASSOS: Ideias introdutórias

Acreditamos, como disse Nicolescu (1999, 2000), Ferreira (2007), Moraes (2010, 2015) entre outros, que a transdisciplinaridade não nega a disciplinaridade, pelo contrário, no dizer de Ferreira (2007, p. 249) “A transdisciplinaridade faz bem a disciplinaridade, posto que a amplia em termos epistemológicos e metodológicos”. Dessa forma, as disciplinas são importantes no processo de ensino-aprendizagem. Portanto, cada uma delas tem seus limites, tanto no campo metodológico como no epistemológico, porém quando se deixam atravessar pela atitude transdisciplinar é possível transformá-las e fazê-las alcançar níveis elevados de compreensão sobre seus objetos de estudos e sobre aquilo que está além de suas epistemes (FERREIRA, 2007).

O que faz a transdisciplinaridade é ampliar a capacidade de interação de uma disciplina com a outra. Aquilo que antes não tinha nenhuma, ou quase nenhuma ligação, passa a fazer parte de um todo organizado. Numa abordagem transdisciplinar, a disciplina X tem seu campo de ação ampliado perceptivelmente e aquilo que era do campo da disciplina Y torna-se parte importante para a compreensão dos fenômenos na disciplina X (FERREIRA, 2007). Neste ponto, voltamos ao que Morin (2013) comenta em que o todo pode ser maior ou menor que a soma das partes, portanto cada disciplina, isolada, sozinha, possui um campo de atuação específico, limitado, mas quando há uma interação complexa entre elas, seu campo de atuação se expande passando a fazer parte não apenas elementos que estavam entre ou através das disciplinas, mas, inclusive os que se encontram além.

A transdisciplinaridade também é responsável por levar em consideração, no processo de construção do conhecimento, outras dimensões do ser humano, não apenas a cognitiva. Enquanto a disciplinaridade reforça a importância da cognição, a transdisciplinaridade busca integrar “(...) as dimensões corporais, psicológicas, sentimentais e espirituais do ser humano, com as dimensões sociais, econômicas, tecnológicas e culturais oferecidas pelo contexto em que se vive (...)” (MORAES, 2015, p. 20). Não se pode pensar numa educação de qualidade se não formos capazes de resgatar a inteireza do ser humano e sua consciência planetária.

Sobre a natureza complexa da educação, Moraes comenta a respeito de uma prática pedagógica que tenha duplo compromisso:

De um lado, requer-se uma nova proposta educacional capaz de colaborar para que o sujeito aprendente supere e transforme as condições materiais de sua existência, condições essas que impedem seu pleno desenvolvimento como seres acoplados a um contexto, a uma realidade sociocultural que o engloba e, ao mesmo tempo, o restringe. Uma educação que atue, portanto, no âmbito do estar, para que ele possa sair da opressão em que vive. E de outro lado, necessitamos de uma educação que seja transformadora de suas condições psicológicas, cognitivas, afetivas e espirituais e que favoreça seu pleno desenvolvimento humano, atuando, portanto, no âmbito do ser (MORAES, 2015, pp. 19-20).

Tais dimensões são inseparáveis e complementares da natureza da condição humana (MORAES, 2015). Numa educação com o modelo de um paradigma sustentado pela lógica clássica, portanto, tradicional, moderno, deixaria de considerar essas dimensões na dinâmica educacional, pois o conhecimento seria resultado de uma dinâmica construída fora da escola e atestado cientificamente. A escola, portanto, teria o papel de transmitir os conhecimentos ditos científicos e os professores seriam os instrumentos ideais para essa transmissão. Paulo Freire (2005) chamou esse modelo de educação de “educação bancária” e propunha um novo modelo, uma educação que fosse transformadora.

Como uma instituição que se propõe educativa, o Instituto de Protagonismo Juvenil (IPJ) deve ser um espaço de construção de conhecimentos. Mas não um tipo de conhecimento bancário. O conhecimento que deve ser construído sob mediação do IPJ deve ser um conhecimento aberto, vivo, em movimento, pois o conhecimento está sempre se movendo, de forma ininterrupta (MORAES, 2015). Os jovens do IPJ devem ser sujeitos capazes de perceberem sua posição diante do universo. Devem ser sujeitos integrais, que não se considerem criaturas superiores em detrimento a todas as outras vidas no Planeta.

Em seus documentos oficiais, em especial o Projeto Político Pedagógico (PPP) o IPJ deixa claro sua filiação a abordagem transdisciplinar, muito embora não cite, em nenhum dos documentos o termo. Com discurso de uma pedagogia que envolva todas as dimensões do sujeito; de uma educação que seja integral e

contemple a inteireza do ser humano; de uma educação que consiga sair dos muros da sala de aula e consiga conquistar a vida dos sujeitos; da compreensão de que é necessário contemplar o contexto em que o sujeito está envolvido, ou seja, também sua cultura, entre outros discursos (IPJ, 2010a, 2010b), o IPJ, claramente, se propõe a uma educação transdisciplinar.

Sua compreensão estatutária a respeito das juventudes considera o recorte etário juvenil, disposto no Estatuto da Juventude, muito embora os documentos do IPJ foram publicados anos antes da promulgação da Lei Federal. Mesmo sem a menção ao recorte etário, assim como disposto no Estatuto da Juventude, o IPJ reconhece que ser jovem está ligado a um ciclo da vida, a um período, uma faixa etária, mas deixa claro também, que considera, como elemento construtor da juventude, outras dimensões que estão além da dimensão biológica, sendo elas a psicológica, social, cultural, demográfica, social, espiritual, entre outras.

O IPJ se propõe a ser canal na promoção da cidadania e do protagonismo juvenil utilizando, para isto, as habilidades dos próprios jovens, acreditando em seu potencial criativo e inovador e oportunizando os mesmos a participarem do processo de tomada de decisão a respeito dos assuntos que lhe dizem respeito, em todas as esferas sociais. Esta atitude, em nossa compreensão, possibilita a construção de identidades mais sólidas, embora não rígidas e imóveis, visto que o jovem constrói confiança em si mesmo e se dá conta que ao longo do tempo e de suas experiências será possível desenvolver outras identidades. Como já dissemos várias vezes, uma identidade não dura para sempre sequer vive sozinha, como se fosse única no sujeito. Ao passar do tempo é possível “trocar” de identidades, adquirir identidades novas, ou simplesmente abandonar algumas. Este processo, portanto, não é automático – assim como as identidades também não o são – e nem simples. Algumas mudanças e/ou adaptações identitárias causam incômodo ou retaliação social.

Já demos vários exemplos a respeito da possibilidade ininterrupta das mudanças identitárias nos sujeitos. Os jovens, por sua vez, que são considerados sujeitos transitórios por natureza, participam dessa dinâmica identitária de forma fluída, mas nem sempre leve. Por sua condição de sujeito em desenvolvimento – assim como as crianças e adolescentes, os jovens ainda dependem, em sua grande

maioria, da aprovação dos adultos, que podem ser seus pais, algum familiar, o chefe do trabalho, a professora na escola etc. Assumir uma determinada identidade, na fase juvenil, nem sempre é tranquila, levando em consideração essa dependência de aprovação adulta. Isso nos leva a refletir que podemos ter, entre tantas outras possibilidades, dois tipos de atitude. De um lado jovens que retardam assumir uma identidade específica e até lá, negam a mesma ou se “escondem” em outra. E de outro lado, temos jovens que resolvem “assumir” suas identidades, independente de aprovação adulta e assumem as consequências dessa escolha. Em qualquer uma dessas possibilidades, assumir uma posição envolve sacrifícios.

Neste último capítulo, depois de já ter apresentado o aporte teórico a que esta pesquisa se fundamenta e de ter tecido análises a respeito dos processos educativos do IPJ e de como os jovens são “transformados” por eles, iremos abordar as diferentes possibilidades de uma educação que se propõe transdisciplinar. Discutiremos sobre as crises que existe no universo juvenil em relação ao universo adulto; as exigências de uma geração que deixou de ser jovem à atual geração juvenil; o que espera a sociedade dos jovens hoje em dia. Abordaremos ainda a respeito da importância da escola compreender que seus sujeitos aprendentes são plurais, portanto sua prática educativa não deve ser redutora além de discutir, mais uma vez, a respeito da riqueza da diversidade identitária juvenil.

3.2 EXPLORANDO O DESCONHECIDO: Desvelando práticas educativas

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