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Processos Educativos Transdisciplinares

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CAPÍTULO 1: SOBREVOANDO A ÁREA

1.4 EXPLORANDO O TERRITÓRIO: bases teóricas da pesquisa

1.4.3 A abordagem transdisciplinar e suas nuances

1.4.3.2 Processos Educativos Transdisciplinares

Platão (apud MORIN, 2013) dizia que era preciso amor pelo que se ensina e para com as pessoas que se ensina. Dizia também que era necessário despertar esse amor, que chamava de eros. Seria através da ressurreição do amor, da missão e da fé que se chegaria à formação de cidadãos e cidadãs do terceiro milênio. A esses cidadãos e cidadãs, acrescentamos as capacidades de perceber a interação entre os diferentes níveis de realidade que colaboram para uma prática pedagógica que seja capaz de utilizar o seu conteúdo disciplinar de forma a potencializar o

diálogo, a intuição, a reflexão e o amor, cujas características pretendem superar a dicotomização dos saberes e promover a articulação desses pares.

Este processo remete-nos ainda ao princípio autopoiético tendo sido empregado por Maturana e Varela (apud SANTOS, 2008; ARAÚJO, [s/d]) que nos leva a recorrer a uma abordagem que seja capaz de estimular os alunos e as alunas a produzirem o próprio conhecimento. Numa prática educativa na qual os participantes são capazes de repensar sua prática, interagir com o conteúdo e dialogar entre seus pares, podemos dizer que estará se promovendo a “capacidade reorganizativa” que é um “processo interminável” (SANTOS, 2008, p. 81). Acrescentamos ainda, conforme discutiu Dermeval Saviani (2012, p. 73) que “A educação, portanto, não transforma de modo direto e imediato e sim de modo indireto e mediato, isto é, agindo sobre os sujeitos da prática”, o que nos remonta a uma ideia de processo.

Afinal, “Aprender é uma construção pessoal, autopoiética”, o que proporciona a interação “com os acontecimentos em volta” (SANTOS, 2008, p. 81), trazendo significados aos conteúdos e resignificando a prática profissional e/ou militante de cada envolvido, mas isso só é possível através da característica transdisciplinar que não dispensa os diferentes níveis de realidade dos envolvidos, utiliza o pensamento complexo para promover seus diálogos e compreender os sujeitos e ainda procura incluir a premissa do terceiro termo, quando não descarta a possibilidade do próprio conteúdo ser ao mesmo tempo produtor como produto da participação.

O processo de ensino-aprendizagem não acontece de forma isolada, como já dissemos antes, ela depende, entre tantas outras coisas, das experiências particulares de cada envolvido, seu ritmo de aprendizagem, habilidades, interesses e motivações que são pessoais e singulares, como discutiu Zabala (1998). Dessa forma, como disse Santos (2008, p. 76), a construção do conhecimento perde sentido de existir se o educador “não trabalhar com o todo e com o sujeito do processo cognitivo” e a isso caracterizaríamos em separar a “parte do todo, dando um tratamento mecânico ao conhecimento”. Assim sendo, atendemos para os pressupostos da transdisciplinaridade e do pensamento complexo que segundo comenta Santos (2008, p. 76), busca maximizar “a aprendizagem ao trabalhar com imagens e conceitos que mobilizam, conjuntamente, as dimensões mentais,

emocionais e corporais, tecendo relações tanto horizontais como verticais do conhecimento.”

A ideia clássica da transmissão de conteúdo e de conhecimento que espera e prima por uma educação em que o educador seja o agente transmissor do conteúdo enquanto o aluno seja apenas o receptor, portanto sujeito passivo dessa dinâmica, não condiz com uma abordagem transdisciplinar, que contemple os diferentes níveis de realidade dos sujeitos. Isso nos dá a certeza de que muito embora na prática transdisciplinar, a metodologia disciplinar não seja desencorajada, é importante dizer que os saberes devem estar conectados, dialogando uns com os outros, pois esses pares binários, que são dicotomizados, “devem ser olhados desde outro prisma, o da articulação”, estão todos conectados e isso se manifesta “no modo de pensar, sentir, agir e viver” dos indivíduos e, ainda é importante que se diga que “Quando se muda o ponto de vista obtém-se uma vista diferente, outro panorama dos fenômenos em observação” (SANTOS, 2008, p. 77), portanto, neste caso sobre as juventudes, suas políticas e tudo o que está envolvido nesta temática.

Saviani (2012), na tentativa de destacar uma “pedagogia revolucionária”, elencou cinco passos na perspectiva de traduzir os métodos de ensino, estes que mantêm vínculo entre educação e sociedade. Diferentemente do modelo metodológico dentro da pedagogia tradicional que se privilegia os “métodos de transmissão dos conhecimentos já obtidos” e na pedagogia nova (escolanovismo) que se privilegiam “os processos de obtenção dos conhecimentos” (p. 46), na pedagogia revolucionária, destaca-se o empenho “em colocar a educação a serviço da referida transformação das relações de produção” (p. 76).

Os cinco passos propostos pelo Saviani (2012) aponta-nos que a educação seja “uma atividade que supõe uma heterogeneidade real e uma homogeneidade possível; uma desigualdade no ponto de partida e uma igualdade no ponto de chegada” (p. 72) ao que reafirmamos o que já dissemos antes que a educação não transforma de forma direta e imediata e sim num processo.

Como primeiro passo Saviani chama de “prática social”, que é comum a educadores e alunos e diz respeito aos posicionamentos desses sujeitos. Destaca- se que alunos e professores possuem compreensões diferentes, portanto posicionamentos diferentes, em relação às práticas sociais e essa diferenciação são

importantes do ponto de vista pedagógico, visto que essa característica potencializa o ponto de partida da prática pedagógica que estes participam.

O segundo passo Saviani chama de “problematização” que vem a ser a necessidade de “detectar que questões precisam ser resolvidas no âmbito da prática social e, em consequência, que conhecimento é necessário dominar” (p.71).

A “instrumentalização” aparece como terceiro passo de uma pedagogia revolucionária e, certamente, não quer dizer de uma pedagogia inscrita em um sentido tecnicista. Essa instrumentalização, no dizer de Saviani se refere a “apropriação pelas camadas populares das ferramentas culturais necessárias à luta social que travam diuturnamente para se libertar das condições de exploração em que vivem” (p. 71).

O quarto passo, por sua vez, é chamado de “catarse” e se inscreve na “efetiva incorporação dos instrumentos culturais, transformados agora em elementos ativos de transformação social” (p. 72), considerado o ponto culminante do processo educativo. Por fim, o quinto passo é denominado, mais uma vez de “prática social” em que, a partir do processo que se seguiu, professores e alunos ascendem para uma compreensão que se torna mais orgânica em relação à realidade observada no ponto de partida, diferente de como se chega ao ponto de chegada (quinto passo).

Dito isso, é correto afirmar que a compreensão da prática social é alterada. A prática social que se refere o primeiro passo é e não é a mesma referida no último passo. Enquanto na realidade inicial (primeiro passo) a prática social se caracterizava enquanto compreensões não orgânicas em ambos, no ponto de chegada (quinto passo) houve uma alteração qualitativa da compreensão da prática social. Citando ainda Saviani (2012, p. 73), faz necessário ressaltar que tal alteração da prática social “só pode dar-se a partir da nossa condição de agentes sociais ativos, reais”.

Essa compreensão, baseada em Saviani (2012), que se parece linear, no entanto, é muito mais retroalimentada que determinista. Sobre o princípio retroalimentador, ou retroativo, um dos princípios-guia constitutivo do pensar complexo, descritos por Morin, cabe dizer que o mesmo rompe com a causalidade linear. Moraes e Valente (2008, p. 39) comentam que neste princípio “toda causa

age sobre o efeito e este retroage informacionalmente sobre a causa em questão, a partir de processos auto-reguladores que acontecem no sistema”. Comentam ainda, os mesmos autores, também conhecido como feedback, este princípio retroativo é reflexo de uma causalidade circular fechada, não espiralada. Assim, os cinco pontos citados por Saviani (2012) como possibilidades para uma pedagogia revolucionária tem seu caráter circular, “onde causas e efeitos transformam-se mutuamente” (MORAES & VALENTE, 2008, p. 39).

A proposta de uma pedagogia que seja revolucionária nos remete a uma prática pedagógica que possibilite a construção de identidades e da cidadania do sujeito. Esses espaços precisam levar em consideração a complexidade das relações sociais, a diversidade juvenil e a fluidez dos processos identitários. Para tanto, é recomendado que se utilize estratégias no processo de ensino aprendizagem, que sejam

(...) permeadas por experiências que envolvam a corporeidade, desde um simples exercício respiratório, práticas meditativas, bem como uso de imagens, sons, músicas, situações para sentipensar, provocadas de sentipensamentos agradáveis, criativos e positivos que favoreçam a reflexão e os pensamentos interdisciplinar e transdisciplinar em relação ao conhecimento e à aprendizagem (MORAES, 2010, p. 56, grifos da autora).

Dessa forma, entendemos que em um espaço de ensino aprendizagem, o diálogo é o maior instrumento de mediação na construção do conhecimento. É a partir da dinâmica entre a fala e a escuta que se consegue construir um espaço de conversação, convivência e de transformação capazes de criar situações no processo de ensino e aprendizagem que sejam “(...) desafiadoras, permeadas por estratégias inovadoras, instigadoras, ao mesmo tempo, apaixonante e emocionalmente saudáveis e acolhedoras” e, que ainda sejam capazes de ser “(...) geradoras de climas propícios às reflexões, à aprendizagem, ao desenvolvimento individual e coletivo e às transformações necessárias” (MORAES, 2010, p. 55).

Como dissemos no início deste tópico, este é um tipo de processo formativo de natureza autopoiética que significa dizer de “(...) natureza autoformadora, ecoformadora e heteroformadora, aberta, fundada na solidariedade, no questionamento constante e nas reflexões sobre as ações desenvolvidas”

(MORAES, 2010, p. 54). No dizer de Moraes (2010), esse tipo de compreensão reforça a ideia de que o espaço da aula é um lugar de convivência e transformação mediante a “autoeco-heteroformação” o que quer dizer que “(...) todo observador está comprometido com o seu ato de observação, do qual é partícipe constitutivo e ativo, indicando, portanto, a inexistência de uma realidade totalmente objetiva” (MORAES & VALENTE, 2008, p. 43).

Para a construção de processos educativos transdisciplinares do IPJ, alguns pontos são importantes de serem destacados, são eles: a questão da formação docente e do currículo utilizado no processo de ensino aprendizagem. Como nosso objetivo com essa pesquisa não é esgotar a discussão a respeito desses processos citados e sim discutir a partir da mediação das práticas educativas do IPJ, como é possível construir identidades plurais nas juventudes, iremos destacar alguns pontos importantes referentes aos dois elementos que destacamos acima, como importantes nesta dinâmica formativa. Ao longo do segundo capítulo, iremos abordar como a formação docente e o currículo são realizados no IPJ, a partir de sua prática educativa.

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