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Resgate, Reabilitação e Soltura Parte

3. Primeiros socorros O manuseio de animais

de grande porte, como é o caso das baleias, é extremamente difícil. Ao se deparar com um cetáceo encalhado, a primeira providência é determinar se o animal está vivo ou não. Isso pode ser feito verificando-se a existência de movimentos respiratórios ou testando-se o reflexo palpebral, colocando-

se delicadamente o dedo em seu globo ocular (Figura 2) e verificando se há reação.

Uma vez determinado que o animal está vivo, os cuidados básicos para qualquer cetáceo encalhado vivo são o controle da temperatura corporal e a proteção contra a radiação solar.

Tendo-se adaptado a passar toda sua vida em um meio onde a troca de calor ocorre 25 vezes mais rápido que no ar, as baleias possuem uma espessa camada de gordura que as protege do frio, podendo chegar até meio metro de espessura. Os cetáceos não possuem glândulas sudoríparas. Quando uma baleia encalha, corre o risco de morrer de hipertermia.

Sempre que possível, deve-se manter o animal dentro d’água, com o orifício respiratório voltado para cima. Um abrigo improvisado

Figura 2: Olho de baleia encalhada (notar que se encontra fechado) (Foto: Acervo Aquário de Ubatuba)

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Figura 3: Resgate de M. novaeangliae em Arembepe/BA (Proteção contra o sol) (Foto: Acervo IBJ)

pode servir para proteger o animal do sol (Figura 3). Coloca-se uma lona sobre estacas e, se isso não for possível, cubrir o animal com panos claros. Deve-se procurar manter o animal numa posição estável, com a barriga voltada para baixo e com as nadadeiras peitorais livres, não permitindo que elas fiquem dobradas. Deve-se molhar o dorso do animal constantemente com água do mar, mas tomando cuidado para não jogar água no orifício respiratório nem nos olhos.

Se possível, deve-se cavar um buraco em volta das nadadeiras de modo que o animal não fique apoiado nelas, pois facilitará a dissipação de calor. Deve-se colocar sacos com gelo nessas regiões durante alguns minutos de cada vez, protegendo a pele do animal com um pano. Não colocar o gelo diretamente sobre a pele.

Se o terreno permitir, deve-se cavar valetas de modo a levar água do mar até o animal encalhado, para formar “piscinas” rasas. Isso também irá facilitar a dissipação de calor.

A exposição ao sol pode ocasionar também queimaduras de pele. O abrigo ou os panos ajudarão a proteger a pele do animal. Pode-se usar ainda pomadas à base de óxido de Zinco para proteger a pele. Não se devem utilizar filtros e protetores solares.

É necessário verificar se o animal tem ferimentos pelo corpo e sinais de hemorragia, que podem ter sido produzidos por predadores naturais (orcas, tubarões), arpões, colisão com embarcações e suas hélices e redes de pesca, ou até por terceiros após o encalhe. Caso haja hemorragias, deve-se tentar estancar o sangramento utilizando- se panos limpos para comprimir o local.

33 É importante lembrar que o animal se encontra fora de seu

ambiente natural. Deve-se fazer todo o possível para não aumentar o seu estresse. Trabalhar sempre em silêncio, evitando gritos, gestos bruscos e a presença de animais e curiosos. Não usar flash para fotografar o animal.

Deve-se tomar cuidado principalmente com a cauda do ani- mal, pois, se ele estiver agitado, pode mexê-la e machucar quem estiver por perto.

Durante o manuseio com o animal, devem-se usar luvas de borracha como precaução contra zoonoses, caso haja a necessidade de lidar com ferimentos ou secreções. Usar também máscaras de proteção. Deve-se tomar cuidado para não aspirar o ar exalado pelo animal durante suas respirações.

A avaliação do estado geral do animal e a possível prescrição de medicamentos devem ser feitas pelo médico veterinário da equipe. Durante essa fase, devem ser coletadas amostras de sangue, pele e outros materiais que possam ser úteis para aumentar nossa compreensão sobre estes animais.

4. Resgate

São raras as ocasiões em que um grande cetáceo sobrevive a um encalhe. O peso de seu próprio corpo comprime os pulmões, dificultando a respiração e a circulação do sangue. Também é grande a chance de ocorrer hipertermia.

Em 1990, uma baleia jubarte, que ficou conhecida por Humphrey, encalhou em São Francisco (EUA). O peso era um problema sério para Humphrey, principalmente na maré baixa, pois dificultava sua respiração. Formou-se uma sucção (vácuo) entre a

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baleia e a areia. Foi necessário bombear ar sob Humphrey para libertá- lo. Após conseguirem soltá-lo, ele foi recolocado no mar tendo sido reavistado em 1992 e 1993 (Marilyn Koski, com. pess.).

No Brasil, o primeiro caso conhecido de um grande Misticeto que foi devolvido ao mar com vida e sobreviveu, após três dias de tentativas frustadas, ocorreu em Saquarema-RJ, em 1991. Essa baleia jubarte, subadulta, medindo aproximadamente 11 metros de comprimento total, encalhou viva e aparentemente em bom estado de saúde. Foi inicialmente empurrada em direção ao mar com o auxílio de uma retroescavadeira. Este procedimento não obteve sucesso e provocou ferimentos no animal.

Na segunda tentativa, a baleia foi envolvida em rede de pesca e puxada ao mar por um navio rebocador da Petrobrás. Assim que se sentiu dentro d’água, a baleia jubarte passou a nadar ativamente em direção ao mar aberto. Como não encalhou novamente nos dias subseqüentes, presume-se que tenha sobrevivido.

Mais recentemente, ocorreu um caso semelhante em Florianópolis-SC, quando em 1998, outra baleia jubarte com 9,3 m encalhou com pedaços de rede presos ao corpo. Após várias tentativas, o animal foi recolocado no mar (Paulo Flores, com. pess). Esses casos mostram que, embora difícil, é possível resgatar baleias de grande porte sendo, no entanto, necessários equipamentos e coordenação dos esforços.

Na região de Abrolhos, filhotes de baleia jubarte costumam encalhar com freqüência e são mais facilmente devolvidos ao mar, devido ao seu menor peso, mas suas chances de sobrevivência são pequenas. A presença de adultos nas proximidades raramente é observada, e o animal pode voltar a encalhar.

Um outro caso de resgate seria o de baleias que não encalharam, mas que foram observadas no mar com pedaços de

35 rede presos ao corpo. Nesse caso, faz-se necessário uma equipe de

resgate que conheça os riscos e saiba como agir em relação a uma situação dessas. É importante se aproximar da baleia em um pequeno bote inflável, preferencialmente sem o uso de motor. Havendo condições, deve-se mergulhar para se fazer uma avaliação do grau de emalhamento da baleia ou pelo menos usar uma máscara e se debruçar sobre a borda do barco para uma visualização da situação. Deve-se evitar o impulso natural de começar a cortar logo a rede na superfície, pois ela poderá afundar e continuar presa no ani- mal, ficando fora do alcance da equipe de resgate. Após a avaliação, será decidida qual a melhor estratégia para a soltura do animal. Não se deve esquecer que a baleia pode se debater nesses momentos, o que é sempre um risco para a equipe de resgate. Nos Estados Unidos, utilizam-se transmissores de sinais de satélite que são presos à rede antes de se iniciar os trabalhos. Assim, se a baleia resolver fugir ela poderá ser monitorada e novamente localizada para uma segunda tentativa.

Recomenda-se o uso de coletes salva-vidas e de capacetes.