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PRINCÍPIO DA INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

No documento Regime disciplinar diferenciado (páginas 33-36)

Individualizar a pena significa tornar individual a situação do condenado segundo suas características e crime praticado, ou seja, particularizar o que está previsto de forma genérica, buscando especificar o estabelecido em abstrato para cada caso concreto.

Nesse sentido, os ensinamentos de Nucci:

A individualização da pena tem o significado de eleger a justa e adequada sanção penal, quanto ao montante, ao perfil e aos efeitos pendentes sobre o sentenciado, tornando-o único e distinto dos demais infratores, ainda que co-autores ou mesmo co-réus. Sua finalidade e importância é a fuga da padronização da pena, da “mecanizada” ou “computadorizada” aplicação da sanção penal, que prescinda da figura do juiz, com ser pensante, adotando-se em seu lugar qualquer programa ou método que leve à pena pré-estabelecida, segundo um modelo unificado, empobrecido e, sem dúvida, injusto.11 (grifo do autor).

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BRASIL. Decreto-lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940: institui o código penal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil/decreto-lei/del2848.htm>. Acesso em: 2 set. 2010.

10

SILVA, 2009, p. 55. 11

Segundo Silva, a individualização da pena deve ocorrer na cominação, na aplicação e na execução da pena, com a devida adequação à realidade do condenado, isto é, às suas condições pessoais, à necessidade da medida punitiva e os fins de sua aplicação.12

Sobre o referido princípio, estabelece a Constituição Federal de 1988:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade;

b) perda de bens; c) multa;

d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos;

XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado.13

Nessa esteira de pensamento, pode-se afirmar que a individualização da pena divide-se em três etapas diferentes, ou seja, nos momentos legislativo (cominação da pena), judicial (aplicação da pena) e executivo (execução da pena).

De acordo com esse sistema, primeiramente, cabe ao legislador definir os tipos penais e estabelecer as penas a eles cominadas, em qualidade e quantidade, observando a relevância do bem jurídico protegido e gravidade da ofensa ao respectivo bem.14

Outro aspecto importante que deve ser ressaltado, diz respeito ao rol de sanções previsto no art. 5°, inciso XLVI, da Constituição Federal. Tal rol é meramente exemplificativo, permitindo-se ao legislador a criação de outras sanções, desde que compatíveis com as finalidades da pena e de aplicação permitida no Estado Democrático de Direito. Além disso, devem ser observadas as vedações constitucionais estabelecidas pelo art. 5°, inciso XLVII, que não permite a existência de penas de morte, de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e de penas cruéis.15

No segundo momento, verifica-se o caráter judicial da individualização da pena, assim lecionado por Silva:

A segunda particularização da pena é a sua fixação pelo julgador, nos termos do disposto no art. 59 do Código Penal, numa primeira fase, a pena-base, após análise individualizada das circunstâncias judiciais que são: a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade do infrator, os motivos, as circunstâncias e consequências do fato criminoso e o comportamento da vítima. Após estabelecida a pena-base, o magistrado deve verificar se existem circunstâncias

12

SILVA, 2009, p. 85. 13

BRASIL, Constituição (1988). Loc. cit. 14

SILVA, op. cit., p. 85. 15

atenuantes e agravantes e, em seguida, a presença de causas especiais de diminuição da pena e de aumento, chegando à pena definitiva e ao regime inicial de seu cumprimento.16

Assim, pode-se afirmar que para o mesmo crime, cometido por duas pessoas, as penas poderão ser diferentes, em face da análise individualizada das circunstâncias objetivas e subjetivas que envolvam os fatos e sujeito ativo do crime, devendo o Estado sempre aplicar a pena de forma proporcional à gravidade do crime.

Finalizando, deve-se observar a aplicação de tal princípio na fase de execução da pena. Nessa fase, o condenado deverá receber tratamento específico inerente à sua idade e sexo, e de acordo com a natureza do crime praticado, pois seria inadmissível submeter à convivência diuturna, condenados por pequenos furtos juntos aos condenados por homicídios qualificados e com detalhes de crueldade.17

O problema da individualização da pena na fase de execução é que ela, em regra, somente existe na teoria, não se aplicando à realidade dos estabelecimentos prisionais, conforme ensinamentos de Côrrea Junior e Shecaira:

Empiricamente, o que ocorre é uma mistura dos mais diferentes tipos de deliquentes, que acabam por influenciar a maioria daqueles que são condenados ao cárcere. Na linguagem popular é a ‘escola do crime’, que muito contribui para o fracasso da pena como instrumento de reinserção social, criando inclusive as condições adequadas para que o condenado retorne à delinqüência.18

Além disso, outra prática verificada na rotina carcerária brasileira é a colocação de presos condenados e provisórios no mesmo estabelecimento e no mesmo regime de convivência interna, o que comprova que, em regra, o princípio da individualização na execução da pena somente existe na teoria, sendo utilizado em raríssimos casos.

Sobre a individualização da pena na execução, oportunas as palavras de Silva:

Individualizar a pena na execução determina o ajustamento da pena ao indivíduo, preservando sua dignidade e buscando a não-dessocialização e que sejam o menos deseducadoras possível, favorecendo a redução ou ampliação do prazo de cumprimento da pena, do regime, do modo de execução, de acordo com as características pessoais de cada reeducando e com base nos princípios norteadores do Estado Democrático de Direito.19

Destarte, após o que foi demonstrado sobre o princípio da individualização da pena, é evidente o objetivo de se buscar uma adequação da pena ao delito praticado, utilizando de um meio individualizador, para que o condenado não sofra mais do que o

16

SILVA, 2009, p. 85. 17

CORRÊA JUNIOR; SHECAIRA, 2002, p. 84. 18

Ibid., p. 84. 19

prescrito em lei e decorrente da sanção aplicada, visando também contribuir para sua reinserção social.

No entanto, o que se aplica na fase de execução da pena é muito diferente do que está previsto em lei, devido à crise do sistema prisional brasileiro. Em decorrência disso, não raras vezes são criadas leis que estabelecem medidas para resolver determinado problema.

É o caso da medida disciplinar de regime disciplinar diferenciado, criado para combater líderes de organizações criminosas, comandantes de suas ações do interior de estabelecimentos prisionais, que acabam isolados para a manutenção da ordem pública e da disciplina carcerária. De forma imediata, até pode resolver o problema, porém, o que se verifica é uma camuflagem ao problema verdadeiro, ou seja, a ausência da efetiva aplicação do princípio da individualização na fase da execução penal.

No documento Regime disciplinar diferenciado (páginas 33-36)

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