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3. PRINCÍPIOS PROCESSUAIS PENAIS APLICADOS À ATUAÇÃO JURISDICIONAL DA IMPARCIALIDADE COMO FUNDAMENTO PRECÍPUO DA

3.1. PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL

O princípio do juiz natural não é mero atributo do juiz. Perfaz, a bem da verdade, pressuposto para a sua própria existência. Consiste no direito que cada cidadão tem de saber, antecipadamente, a autoridade que irá processá-lo, qual o juiz ou tribunal que irá julgá-lo caso pratique uma conduta tipificada.

Sua garantia nasce no momento da prática do delito, e não do início do processo. Não se podem manipular os critérios de competência e tampouco definir posteriormente ao fato qual será o juiz da causa. Elementar que essa definição posterior afetaria, também, a garantia de imparcialidade do julgador44.

O princípio do juiz natural, do juiz constitucional, do juiz legal, ou da naturalidade do juiz encontra-se insculpido no artigo 5º, LIII, da Constituição. Significa que ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, independente, imparcial, e investido de jurisdição, a quem as normas constitucionais e legais, explícita ou implicitamente, atribuírem a competência45.

Professora Ada Pellegrini46 diz que “mais do que direito subjetivo da parte e para além do conteúdo individualista dos direitos processuais, o princípio do juiz natural é garantia da própria jurisdição, seu elemento essencial, sua qualificação substancial”, certificando que “sem o juiz natural, não há função jurisdicional possível”. Vê-se, assim, este princípio como pressuposto de existência do processo. A própria relação processual não poderia nascer sendo apenas aparente. Não estando presente não se tratará apenas de nulidade da relação processual, antes, esta inexistirá.

Falar sobre esse princípio é associar a ideia de juiz com competência material definida em lei e de forma prévia. É pensar nos órgãos jurisdicionais existentes a partir de determinação da estrutura judicial desenhada na Constituição da República e por ordem legal decorrente de mandamento constitucional. No ordenamento brasileiro, revela-se nomeadamente no órgão constitucionalmente competente, ou

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LOPES JR, Aury. Direito processual penal. 10. ed. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 443 45

PACHECO, Denilson Feitoza. Direito processual penal: teoria, crítica e práxis. 5 ed. Niterói, RJ: Impetus, 2008, p. 284

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GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As nulidades no processo penal. 6 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999. p. 44

seja, aquele cujo poder de julgar derive de fontes constitucionais. Assim, não será juiz natural o juiz constitucionalmente incompetente, isto numa visão clássica do princípio.

No entanto trata-se de uma visão diminuta, deveras simples, sendo, o mandamento do juiz natural mais importante e abrangente do que isso. O juízo natural decorre de uma estruturação sistêmica do poder judiciário brasileiro, que está estruturado e delimitado, como dito, nos artigos da Constituição. Não é simplesmente juízo competente, e sim uma obediência à estrutura judicante brasileira. Veda-se o juízo de exceção, aquele criado após o fato e para o fato.

Dessa forma, reafirma-se a necessidade, para garantia do juízo natural, da fixação prévia e legal da competência, da imparcialidade do juiz, de forma a afastar qualquer tipo de julgamento baseado na pessoalidade. A associação de todas essas questões leva à garantia de um juízo natural.

Significa que as regras de determinação de competência devem ser instituídas previamente aos fatos e de maneira geral e abstrata de modo a impedir a interferência autoritária externa. Não se admite a escolha do magistrado para determinado caso, nem a exclusão ou afastamento do magistrado competente. Quando ocorre determinado fato, as regras de competência já apontam o juízo adequado, utilizando-se o sistema aleatório do sorteio para que não haja interferência na escolha47.

Quando o Estado, por intermédio do Poder Legislativo, elabora leis penais, cominando sanções àqueles que vierem a praticar a conduta delituosa, surge para ele o direito de punir os infratores em um plano abstrato48.

Quando determinado indivíduo pratica a conduta delituosa disposta no tipo penal incriminador, o citado direito de punir do Estado, que até então estava em um plano abstrato, desce, materializa-se, e transforma-se no direito de punir em uma perspectiva concreta.

Há outro aspecto a ser retratado do princípio do juiz natural. Além do aspecto institucional da garantia do juiz natural existe, ainda, o aspecto voltado à pessoa do juiz, e que está ligado à sua imparcialidade. Juiz natural é, também, juiz imparcial.

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FERNANDES, Antônio Scarance. Processo Penal Constitucional. 6. ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 126

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Esta garantia do devido processo possibilita a lisura do julgamento, sem vícios de parcialidade que deturpam a ampla defesa.

“O fundamento da legitimidade da jurisdição e da independência do poder judiciário está no reconhecimento da sua função de garantidor dos direitos fundamentais49”. Neste quadro, a função do juiz é atuar como garantidor da eficácia do sistema de direitos e garantias fundamentais do acusado no processo penal. No Estado Democrático de Direito, deve, o juízo, atuar constantemente preservando a proteção dos direitos fundamentais de todos e de cada um, ainda que para isso tenha que adotar uma posição contrária à opinião da maioria. Tem a obrigação de tutelar o indivíduo e reparar as injustiças cometidas, absolvendo sempre que não existirem provas plenas e legais da responsabilidade penal daquele que compõe o polo passivo. “O objetivo justificador do processo penal é a garantia das liberdades dos cidadãos50”.

O Juiz natural tem por pressuposto a imparcialidade no exercício da jurisdição. Órgão jurisdicional criado previamente afasta a ideia de juízo de exceção. Assegura- se a impessoalidade na atuação da jurisdição.