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Inúmeros são os princípios constitucionais que influenciam, direta ou indiretamente, na aplicação da pena no Brasil. Estes princípios devem nortear a aplicação do direito material ao caso concreto, motivo pelo qual se pretende analisar, neste capítulo, mormente os que devem nortear a execução da pena privativa de liberdade. (SILVA, M., 2007).

3.3.1 Princípio da humanização da pena

Segundo Zaffaroni (2002, p. 256), o princípio da humanização da pena é o reconhecimento do condenado como pessoa humana. Este princípio surgiu a partir do movimento de humanização do direito penal conhecido como iluminismo, e da ideologia revolucionária do século XVIII, da qual derivou o constitucionalismo. Com o surgimento do Estado de Direito e a proibição expressa da pena de morte, das penas de caráter perpétuo, das desumanas e cruéis, consolidou-se, em boa parte do ordenamento jurídico mundial e brasileiro, o princípio da humanização da pena.

A Constituição Federal consagrou, em inúmeros dispositivos, o princípio da humanidade da pena. No artigo 5º, inciso XLIX, dispõe que é “assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”. Sobre as presidiárias, tem-se no inciso XLX, do mesmo artigo, que as presidiárias terão o direito de permanecer com seus filhos durante o período de amamentação. (BRASIL, 1988).

A Organização das Nações Unidas prevê regras mínimas para o tratamento de reclusos, constantes na Resolução 45/110, de 14 de dezembro de 1990, e consagra a igualdade como princípio básico no tratamento dos presos, ao afirmar que “as presentes regras aplicam- se sem discriminação de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional ou social, meios de fortuna, nascimento ou outra condição”. (ONU, 1990).

No mesmo sentido, a Lei de Execução Penal assegura aos condenados tratamento humanitário e respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana, mas inúmeras normas infraconstitucionais não respeitam o princípio da humanidade das penas.

Nessa linha de raciocínio preceitua M. Silva (2007, p. 81):

O caminho para a redução da criminalidade passa por transformações sociais e pela certeza da punição, sempre observando os direitos humanos, com o objetivo de recuperação do agente infrator. Nesse viés, não se pode descartar a possibilidade de que o reeducando pode e deve retornar ao convívio em sociedade.

3.3.2 Princípio da individualização da pena

A individualização da pena dá-se pelo estabelecimento de pena para cada agente condenado, observando suas particularidades, características próprias, subjetivas, bem como o fato praticado e o contexto no qual foi perpetrado.

Levando em consideração o que se diz no artigo 5º da Lei de Execução Penal, “os condenados serão classificados, segundo os seus antecedentes e personalidade, para orientar a individualização da execução penal”. Observa-se que a lei garante que não haverá individualização apenas na aplicação da pena, mas também no processo de execução, para que se alcance o grande objetivo, que é a ressocialização. Deve-se, portanto, analisar as características do preso, de modo que, para haver o sucesso da ressocialização, devem ser observadas as características pessoais do preso, de modo que se alcance maior aproveitamento deste processo. (BRASIL, 1984).

O inciso XLVI, do artigo 5º da Constituição Federal, dispõe que “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: (...)”. (BRASIL, 1988).

Segundo Silva (2007, p. 89) “o princípio da individualização da pena, fundado no sistema garantista, refere-se à individualização da pena no momento da cominação, aplicação e execução, com a adequação da pena à realidade do condenado, às suas condições pessoais, à necessidade da medida e aos fins de sua aplicação”.

Zaffaroni (apud BARROS, 2001, p. 222) preceitua sobre o tema:

A efetiva aplicação do princípio da individualização da pena privativa de liberdade, especialmente no regime fechado, exige do magistrado que atua na vara de execuções penais coragem para, com fundamento nos princípios constitucionais, deixar de executar a pena que se mostre desnecessária.

Assim sendo, a punição deve ser suficiente para combater o crime, mas também para que haja a possibilidade, de acordo com as características e condições do preso, de reeducação, prevenindo a reincidência.

3.3.3 Princípio da legalidade

De acordo com M. Silva (2007, p. 56), o princípio da legalidade se tornou conhecido com o enunciado de Anselm Von Fuerbach, o qual prevê que “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Ainda, o mesmo texto está previsto no artigo 5º, inciso XXXIX, da Constituição Federal de 1988, bem como no artigo 1º do Código Penal.

Em atenção ao princípio da legalidade, ainda conforme M. Silva (2007), alguém somente pode receber uma resposta penal quando o fato praticado tenha sido anteriormente definido como crime. Assim, apenas condutas tipificadas podem ensejar condenação, garantindo também a individualização da pena nas três fases: elaboração da norma, aplicação da pena e sua execução.

Franco (2000, p. 53) destaca que o princípio da legalidade, além de interferir na intervenção da lei penal, proíbe a analogia in malam partem, a retroatividade da lei penal incriminadora, e garante a adequada definição do tipo penal, fornecendo ao cidadão garantias penal e processual, e, na fase de execução da pena, por sua vez, assegura sua individualização, fazendo com que o condenado continue sujeito de direitos e deveres.

3.3.4 Princípio da proporcionalidade ou razoabilidade

O princípio da proporcionalidade ou da razoabilidade, para Barroso (2003, p. 314- 315), abriga valores como a justiça, medida adequada, bom senso e rejeição a atos arbitrários, razão pela qual podem ser empregados, de modo fungível, devido à proximidade dos conceitos, embora os termos não sejam sinônimos. Tais princípios não se encontram previstos expressamente na Carta Magna, mas têm seu fundamento na justiça e no devido processo legal. Barroso (1999, apud COSTA, 2001, p. 61) explica os conceitos da proporcionalidade e razoabilidade e diz que são empregados indistintamente. Define o autor que a razoabilidade:

É um parâmetro de valoração dos atos do Poder Público para aferir se eles estão informados pelo valor superior inerente a todo ordenamento jurídico: a justiça. Sendo mais fácil de ser sentido que conceituado, o princípio se dilui em um conjunto de proporções que não libertam de uma dimensão excessivamente subjetiva. É razoável o que seja conforme à razão, supondo equilíbrio, moderação e harmonia; o que não seja arbitrário e caprichoso; o que corresponda ao senso comum, aos valores vigentes em dado momento ou lugar.

Conforme lição de Bizzotto (2003, p. 170-171), relevante é o papel desse princípio como elo de intermediação e interpretação, quando ocorre confronto entre bens jurídicos de dignidade constitucional, permitindo a melhor aplicação possível da tutela jurisdicional ao caso concreto.

Quando o indivíduo comete um delito, a violação da norma gera uma punição. Contudo, deve haver proporcionalidade entre o delito que foi praticado e a pena aplicada, para que haja a reprovação do crime, e que não haja exageros na aplicação. Sendo assim, deve existir

a suficiente reprovação do crime, mas ao mesmo tempo deve haver sua reeducação. (ROIG, 2017; BRITO et al., 2017).

Segundo Roig (2017, p. 85):

Parte do esforço da proporcionalidade consiste em trazer, para o âmbito do Direito de Execução Penal, diversos institutos benéficos do Direito Penal (ex.: atenuantes, causas de atipicidade ou extinção da ilicitude ou culpabilidade etc.) e Processual Penal (ex.: suspensão condicional do processo etc.), pois não se justifica que sejam consagrados nestes dois mundos e alijados do primeiro.

É, portanto, relevante destacar que o princípio da proporcionalidade ou razoabilidade constitui importante mecanismo a ser utilizado pelos operadores do direito, para sopesar os direitos assegurados e aplicar justiça ao caso concreto.

3.3.5 Princípios do devido processo legal, ampla defesa e contraditório

Este princípio constitui uma garantia constitucional de que “ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”, conforme está previsto no artigo 5º, inciso LIV, da Constituição Federal de 1988. (BRASIL, 1988).

Seguindo esta linha de pensamento, o artigo XI, nº 1, da Declaração Universal dos Direitos dos Homens traz o seguinte texto:

Todo homem acusado de um ato delituoso tem o direito de ser presumido inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa. (ONU, 1948).

Segundo M. Silva (2007), o devido processo legal configura dupla proteção ao indivíduo, atuando no âmbito material de proteção ao direito de liberdade, e formal, ao assegurar o direito à defesa técnica, à publicidade do processo, à produção de provas, de ser julgado por juiz competente, aos recursos, à decisão imutável, à revisão criminal e ao duplo grau de jurisdição.

Conforme Silva (2005, p. 431-432), o princípio do devido processo legal, combinado com o contraditório e a ampla defesa, fecha o ciclo das garantias processuais. Assim, garante-se o processo com as formas instrumentais adequadas, de forma que, a prestação jurisdicional, quando entregue pelo Estado, dê a cada um aquilo que lhe pertence.

Pode-se dizer, então, que o direito ao devido processo legal significa que a administração da justiça pelo Poder Judiciário é regulada por normas e regras, que obrigatoriamente devem ser observadas, garantindo aos acusados direitos e garantias, a fim de prevenir eventuais arbitrariedades.

Diante do que foi trazido sobre os princípios da execução penal, passar-se-á para o estudo dos direitos e deveres dos presos, os quais estão relacionados ao objeto desta pesquisa.

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