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4.4 REGRAMENTO INTERNACIONAL EM FACE DOS INCENTIVOS

4.5.2 Princípios norteadores da OMC

Os acordos da OMC são complexos textos jurídicos que abrangem uma vasta gama de atividades, tais como agricultura, têxteis e vestuário, serviços bancários, telecomunicações, compras governamentais, normas industriais e segurança dos produtos, regulamentos de saneamento de alimentos, propriedade intelectual, dentre outros. Todavia, por mais abrangente que seja o âmbito de atuação da instituição, esta se rege por um pequeno número de princípios fundamentais que norteiam todas as atividades executadas, servindo de base também para os acordos multilaterais e para resolução de disputas. (WTO, 2011, p.10). 4.5.2.1 Princípio da nação mais favorecida

Este é o primeiro desdobramento do princípio geral da não discriminação. De acordo com a OMC, em regra, os países não são autorizados a despender tratamento diferenciado entre seus parceiros comerciais. Logo, caso seja concedido a uma determinada nação, um tratamento mais favorável, como, por exemplo, uma tributação reduzida, o mesmo benefício deverá ser estendido para todos os outros membros signatários do órgão. É um princípio de tamanha importância, que vem descrito no primeiro artigo do GATT59, sendo igualmente prioritário também diante do Acordo sobre o Comércio de Serviços GATS.

Impõe-se, portanto, tratamento isonômico para os produtos e serviços dos países- membros, sem diferenças em face de origem. Esse princípio visa a concretizar a neutralidade da intervenção dos países, evitando a imposição de sistemas, custos e medidas diferentes, garantindo, assim, a livre concorrência. Todavia, muitos dos auxílios fiscais atribuídos por alguns países e até mesmo paraísos fiscais são compatíveis com o GATT e o GATS, na medida em que não são seletivos ou discriminatórios, sendo outorgados a qualquer agente econômico, independentemente da nacionalidade. Compreende-se, então, que somente os subsídios específicos são considerados condenáveis, já que somente eles acarretam distorções

59 Em inglês: “[...] any advantage, favour, privilege, or immunity granted by any contracting party to any product

originating in or destined for any other country shall be accorded immediately and unconditionally to the like product originating in or destined for the territories of all other contracting parties”.

no mercado, segundo entendimento da OMC. Destarte, o princípio da nação mais favorecida somente é afrontado quando o subsídio é restrito a uma nação ou grupo de nações, empresa ou a um grupo de empresas ou a um setor ou grupo específico de setores, ou, ainda, quando é deferido apenas a empresas de determinada região, posto que assim, caracterizaria uma situação discriminatória. (ELALI, 2010, p. 203-206).

Este princípio comporta exceções. Por exemplo, os países podem estabelecer um acordo de livre comércio que só se aplica aos bens comercializados dentro de um determinado grupo. É possível, outrossim, ser dado um tratamento especial aos países em desenvolvimento e ainda é autorizada a criação de barreiras contra produtos que estejam sendo negociados de forma injusta. Conclui-se que, em geral, o princípio da nação mais favorecida significa que cada vez que um país reduz uma barreira comercial ou promove a abertura do seu mercado interno, terá que fazê-lo para os mesmos produtos ou serviços de todos os seus parceiros comerciais - seja rico ou pobre, fraco ou forte. (WTO, 2011, p.10).

4.5.2.2 Princípio do tratamento nacional

De acordo com o princípio do tratamento nacional, descrito no art. III parágrafo 1º60tanto produtos importados quanto produzidos localmente devem ser tratados de maneira igualitária após a entrada das mercadorias estrangeiras no mercado, aplicando-se o mesmo para serviços de estrangeiros e nacionais, e marcas estrangeiras e locais, direitos autorais e patentes. A diferenciação somente poderá ocorrer uma vez, por meio da cobrança do imposto de importação. (WTO, 2011, p. 11).

Considerando que a cláusula de nação mais favorecida estabelece que não pode haver discriminação entre países, ou seja, que toda e qualquer concessão comercial de um país membro deve se estender a todos os demais, o princípio do tratamento nacional estipula que não deve haver discriminação entre produtos estrangeiros e nacionais, de modo que, uma vez no mercado do país importador, o produto importado não pode ficar em posição de desvantagem competitiva. Ou, como a própria denominação do princípio deixa claro, que o tratamento dispensado ao produto importado seja o mesmo dispensado ao produto nacional (LAWSON, 2005).

60 Em inglês: “The contracting parties recognize that internal taxes and other internal charges, and laws,

regulations and requirements affecting the internal sale, offering for sale, purchase, transportation, distribution or use of products, and internal quantitative regulations requiring the mixture, processing or use of products in specified amounts or proportions, should not be applied so as to afford protection to domestic production”.

Assim, princípio do tratamento nacional veda o tratamento diferenciado entre produtos nacionais e importados quando o objetivo for meramente beneficiar o produto interno, comprometendo artificialmente a competição no âmbito internacional. A violação desse princípio caracteriza-se como uma medida protecionista e discriminatória, incompatível com a regular atividade do comércio internacional.

4.5.2.3 Princípio da concorrência leal

A OMC é descrita como uma instituição de "livre comércio", mas isso não é inteiramente verdadeiro. A liberdade não é absoluta. Seria mais preciso afirmar que a OMC é um sistema de regras dedicado a criar um mercado aberto, mas também justo, afastando-se as suas distorções. As regras relativas a não discriminação e ao tratamento nacional, assim como aquelas que vetam o dumping e subsídios, são projetadas exatamente para garantir as condições justas de comércio. Essas regras buscam definir o que é justo ou injusto, e como os governos podem responder, por exemplo, através de medidas de compensação, como a majoração na cobrança de imposto de importação calculados para equilibrar os danos causados por comércio desleal. Muitos dos outros acordos da OMC visam, por seu turno, apoiar a concorrência leal, por exemplo, na agricultura, propriedade intelectual, os serviços, dentre outros. (WTO, 2011, p. 11-12).

A OMC tem por objetivo não apenas estimular a concretização de um comércio mais aberto, mas que este também venha ser mais justo. É com respaldo neste princípio que se coíbem as práticas comerciais desleais como o dumping e os subsídios, que distorcem as condições de comércio entre os países. (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR).

4.5.2.4 Princípio da Previsibilidade

O comprometimento dos estados membros, em se manterem leais aos acordos assumidos é imprescindível, para a harmonização entre os Estados e a manutenção do comércio internacional, uma vez que dá aos agentes econômicos uma maior segurança, através da capacidade de prever suas oportunidades futuras. E assim, com a estabilidade e previsibilidade, a atração de investimentos é incentivada e consequentemente empregos são criados e os consumidores podem desfrutar plenamente os benefícios da concorrência, ao

terem diversas opções e poderem escolher os preços mais baixos. Assim, um país somente poderá alterar seus compromissos, através de novas negociações com seus parceiros comerciais. (WTO, 2011, p. 11-12).

4.5.2.5 Tratamento diferenciado aos países em desenvolvimento

Este princípio está contido no Art. XXVIII e na Parte IV do GATT 1994. Pelo Art. XXVIII do GATT 1994, os países desenvolvidos abrem mão da reciprocidade nas negociações tarifárias. Já a Parte IV do GATT 1994 lista uma série de medidas mais favoráveis aos países em desenvolvimento que os países desenvolvidos devem implementar. (MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA E COMÉRCIO EXTERIOR).

Este princípio reconhece que as nações em desenvolvimento precisam de assistência especial e concessões comerciais, assim como de maior flexibilidade em relação aos prazos para o implemento dos acordos multilaterais do sistema. Esse tratamento diferenciado é necessário, uma vez que mais de três quartos dos membros da OMC são países em desenvolvimento ou em transição para economias de mercado. Durante os sete anos e meio da Rodada Uruguai, mais de 60 desses países implementaram programas de liberalização comercial autonomamente. Ao mesmo tempo, os países em desenvolvimento e economias em transição foram muito mais ativos e influentes nas negociações da Rodada Uruguai do que em qualquer anterior rodada, e eles são ainda mais na atual Agenda de Desenvolvimento de Doha. No final da Rodada Uruguai, os países em desenvolvimento foram preparados para assumir a maior parte das obrigações que são exigidas dos países desenvolvidos, mas concedendo maiores períodos de transição, especialmente para as nações mais pobres e menos desenvolvidas. Ademais, os países em melhor situação também devem participar, por exemplo, auxiliando na implementação dos compromissos de acesso ao mercado de bens exportados pelo os países menos desenvolvidos. (WTO, 2011, p. 12-13).

Depreende-se que os princípios acima têm o escopo de garantir a igualdade de concorrência entre os Estados, para que esta ocorra de forma justa, reconhecendo-se os estágios de desenvolvimento de cada nação, a fim de concretizar a política de não- discriminação, vez que, se diferente fosse, resultaria em uma realidade de desigualdade, exploração e exclusão de nações, vez que especialmente os países subdesenvolvidos sofrem por não serem grandes produtores ou consumidores dos itens negociados no GATT.

A questão dos diferentes estágios de desenvolvimento dos países signatários fez com que desde o início do GATT se buscasse a inclusão de normas que compensassem tais desvantagens. De acordo com dados da própria OMC, seus acordos incluem numerosas disposições que asseguram aos países em desenvolvimento e menos desenvolvidos, o denominado “tratamento especial e diferenciado”. O GATT possui uma seção especial (Parte IV) sobre Comércio e Desenvolvimento, que inclui disposições sobre o conceito de não- reciprocidade nas negociações comerciais entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento, autorizando que concessões comerciais efetuados por países desenvolvidos para países em desenvolvimento não vinculem este a criar concessões equivalentes. Assim, todos os acordos da OMC reconhecem que devem beneficiar e conceder maior flexibilidade possível às nações em desenvolvimento, enquanto os membros mais abastados devem fazer esforços adicionais para reduzir as barreiras de importação sobre as exportações dos países menos desenvolvidos, o que nem sempre é seguido. Entretanto, é passível de crítica a parte IV do GATT, no que concerne a sua falta de especificidade, o que prejudica a aplicabilidade do tratamento especial, que gera uma abertura maior para esta discussão no meio político que no jurídico, comprometendo a segurança jurídica e o uso inadequado dos mecanismos criados. (WTO, 2013-a).