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Princípios, regras e direitos fundamentais

No documento Thiago Buschinelli Sorrentino.pdf (páginas 46-49)

1. CONCEITOS FUNDAMENTAIS

1.1. NORMA JURÍDICA E NORMA JURÍDICA TRIBUTÁRIA

1.1.11. Princípios, regras e direitos fundamentais

A definição sobre o que são “princípios” e “direitos fundamentais” é imprescindível ao corte que nos propomos a fazer, dado que, como veremos, a regra de proporcionalidade é um dos parâmetros mais importantes para o controle de atribuição de responsabilidade tributária.

Os textos jurídicos – dogmáticos, jurisdicionais, forenses etc. – registram o uso plurívoco da palavra “princípio”.

Há, por exemplo, o uso erístico de “princípio”, para estabelecer relação de superioridade, governança, prevalência, preferência ou prioridade. Quando se fala que “o tributo fere de morte o princípio da legalidade”, quer-se dizer, nas entrelinhas, que o princípio da legalidade tem prioridade de aplicação, e, portanto, a norma não deve ser aplicada em deferência.

Em termos mais rigorosos, Virgilio Afonso da Silva75 expõe três formas de abordar a questão dos princípios. Alguns, como Ronald Dworkin e Robert Alexy, entendem que há diferença de estrutura sintática entre regras e princípios. Outros consideram que há apenas distinção de grau entre uns e outros; princípios são regras mais gerais, mais abstratas ou mais fundamentais. Terceiros consideram ainda impossível ou inútil a distinção.

75 Princípio e regras: Mitos e equívocos acerca de uma distinção. Revista latino-americana de

Paulo de Barros Carvalho76 divisa quatro âmbitos de uso da palavra “princípio” no discurso jurídico: “norma jurídica de posição privilegiada e portadora de valor expressivo”, “norma jurídica de posição privilegiada que estipula limites objetivos”, “valores insertos em regras jurídicas de posição privilegiada, mas considerados independentemente das estruturas normativas” e “limite objetivo estipulado em regra de forte hierarquia, tomado, porém, sem levar em conta a estrutura da norma”.

Vamos tomar “princípio” em acepção próxima àquela de Robert Alexy, tal como refletida na obra de Virgilio Afonso da Silva77.

Para Alexy, princípios são “comandos de otimização”. São “normas que determinam que algo seja realizado no mais alto grau que seja efetiva e juridicamente possível”78. Podem ser confirmadas no todo, em parte ou em nenhuma

medida. Seu grau de efetividade depende tanto do quadro fático quanto do quadro jurídico. Normas-regra contraditórias não podem ser aplicadas simultaneamente, e uma delas terá de ser tida por inválida ou não-aplicável. Conflitos entre princípios, por outro lado, se resolvem por juízos de ponderação ou calibração, em que prioridades ou precedências são estabelecidas. Entram aqui as sub-regras da adequação, da necessidade e da proporcionalidade em sentido estrito. Em especial, a proporcionalidade em sentido estrito pode ser enunciada nos termos da lei da ponderação: “Quanto mais intensa interferência em um princípio, mais importante é a realização do outro princípio.”79

Concebemos que a colisão entre princípios pode afetar o sentido das normas jurídicas. Vale dizer, o princípio da proporcionalidade imbrica-se às técnicas de decisão constitucional80 para definir um ou mais dentre os sentidos possíveis para um mesmo texto de direito positivo. Se um dos sentidos possíveis para a norma N1 não atender à regra de proporcionalidade, em razão da colisão de princípios,

esse sentido será inconstitucional. Por outro lado, o resultado do jogo de calibração

76 Curso de Direito Tributário, p. 145.

77 Entre outros, A constitucionalização do Direito: Os direitos fundamentais nas relações entre

particulares. São Paulo: Malheiros, 2005.

78 ALEXY, Robert. Sobre a estrutura dos princípios jurídicos. Revista de direito tributário

internacional. Belo Horizonte: Del Rey, 2005, v. 3, p. 156.

79 ALEXY, Robert. Sobre a estrutura dos princípios jurídicos..., p. 160.

80 Interpretação conforme a Constituição, declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto,

declaração da norma ainda constitucional e a modulação temporal dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade (efeitos prospectivos).

ou ponderação poderá indicar um sentido possível para N1 que a torne compatível

com o sistema.

Nem todos os princípios são direitos fundamentais, e há direitos fundamentais que não são princípios. Não é nosso objetivo esgotar a temática sobre direitos fundamentais, mas precisaremos ao menos de uma noção sobre eles na medida em que operarão como parâmetro do jogo de ponderação do controle da responsabilidade tributária. Como veremos, a principal guarida à responsabilidade tributária é dada pelo dever fundamental de pagar tributos. Este funciona como direito fundamental da coletividade em ao menos dois níveis: o da garantia de que a propriedade será preservada durante a busca do Estado por recursos para prover seus fins (tensão propriedade/outros direitos fundamentais) e o da livre concorrência e desempenho de atividade econômica lícita (para não tornar a sonegação obstinada instrumento de vantagem competitiva).

Durante o controle da atribuição de responsabilidade tributária, o dever fundamental de pagar tributos entra em choque com diversos outros direitos fundamentais, inclusive com aqueles que ele também deveria proteger, como a propriedade.

Vamos adotar conceito de direitos fundamentais próximo ao sugerido por

Jorge Miranda81:

[...] os direitos fundamentais podem ser entendidos prima fascie como direitos inerentes à própria noção de pessoa, como direitos básicos da pessoa, como os direitos que constituem a base jurídica da vida humana no seu nível actual de dignidade, como as bases principais da situação jurídica de cada pessoa, eles dependem das filosofias políticas, sociais e económicas e das circunstâncias de cada época e lugar.

Vamos adotar conceito próximo do exposto em razão de seu caráter relacional. Com efeito, a definição do que sejam os direitos imanentes da pessoa depende tanto da normatização constitucional quanto das circunstâncias sociais, políticas e econômicas que informam os critérios de uso para os enunciados que compõem o direito positivo.

81 Manual de Direito Constitucional. Tomo IV: Direitos Fundamentais. 3. ed. Coimbra: Coimbra,

No documento Thiago Buschinelli Sorrentino.pdf (páginas 46-49)

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