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3. A PRISÃO CAUTELAR

3.4. As espécies de medidas cautelares privativas de liberdade

3.4.2. Prisão preventiva

A prisão cautelar por excelência é a prisão preventiva.

A prisão preventiva exige a presença de pressupostos e requisitos legais, a teor do artigo 312, caput, do Código de Processo Penal, traduzidos no fumus commissi delicti e no periculum libertatis.184

O fumus commissi delicti, aparência do delito, consiste na prova de existência do crime e na existência de indícios suficientes de autoria.

Com efeito, a lei exige prova acerca existência de um fato típico, não bastando mera probabilidade de sua ocorrência, devendo estar comprovada a materialidade delitiva.

Com relação aos indícios suficientes de autoria, a lei exige demonstração da probabilidade de que o indivíduo seja o autor, com base em elementos colhidos no curso do procedimento investigatório ou no transcorrer da instrução penal.

183 FREITAS, Jayme Walmer de. Op. cit., p. 111.

184 Artigo 312, caput, do Código de Processo Penal: “A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da

ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.”

O periculum libertatis traduz o risco à efetividade do processo penal, causado pela liberdade plena do agente, diante da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal.

Trata-se de medida excepcional, aplicada nos casos e de acordo com a lei, não podendo jamais ser generalizada e devendo ser sempre fundamentada, nos termos do artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal de 1988 e do artigo 315 do Código de Processo Penal.185

Afigura-se notar que tal medida não deverá ser imposta, no âmbito da cognição do processo penal, como forma de execução antecipada da pena, em face do princípio da presunção de inocência, máxime porque indiciado e acusado não são indivíduos assimilados a condenado.

Desse modo, tem-se que a prisão preventiva pode ser decretada em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, não sendo cabível no âmbito de outros procedimentos, tais como comissões parlamentares de inquérito, processos administrativos, sindicâncias, inquéritos civis etc.

No que tange à legitimidade para imposição da prisão preventiva, convém transcrever o conteúdo inserto no artigo 311 do Código de Processo Penal:

Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial.

Da dicção do dispositivo legal, podem ser extraídas as seguintes conclusões: a) o magistrado não possui legitimidade para decretar medidas cautelares de ofício, no curso das investigações policiais, mas somente por meio de representação da autoridade policial ou a requerimento do Ministério Público; b) o juiz pode decretar as medidas cautelares de ofício, a requerimento do Ministério Público, do querelante e do assistente de acusação, no curso do processo judicial.186

185 Art. 315 do CPP: “O despacho que decretar ou denegar a prisão preventiva será sempre fundamentado.” 186 Há divergências doutrinárias a respeito da constitucionalidade do dispositivo legal, no que tange à

possibilidade da decretação da prisão preventiva ex officio, por força da imparcialidade judicial. Tendo em vista o sistema penal brasileiro, em que são consagradas as funções de acusar, defender e julgar, a permissão legal de o juiz decretar de ofício a preventiva poderia abrir espaço para convicções condenatórias prévias. Nesse sentido: CÂMARA, Luiz Antonio. Medidas cautelares pessoais. Prisão e Liberdade Provisória. 2. ed.

Inovou a Lei nº 12.403/2011 ao prever a legitimidade ativa do assistente de acusação para requerimento da prisão preventiva, ampliando, assim, a participação do ofendido, vítima do crime, no processo penal, com vistas à promoção do andamento e deslinde da causa, assegurando também eventual indenização civil.

Traço marcante da prisão preventiva cinge-se à sua excepcionalidade. A característica da excepcionalidade, já analisada, pode ser vislumbrada sob dois ângulos distintos: a) geral; b) restritivo.

Sob o prisma geral, a excepcionalidade acena no sentido de que a prisão preventiva deve ser decretada se e quando amparada pelos requisitos legais, diante do princípio constitucional da presunção de inocência.

Sob o vértice restritivo, a excepcionalidade diz respeito à determinação da preventiva tão somente quando não se mostrar cabível sua substituição por outra medida cautelar, nos termos do artigo 282, parágrafo 6º, do Código de Processo Penal.

A prisão preventiva não será admitida nas seguintes hipóteses: a) contravenções penais; b) quando houver provas de ter o agente praticado o fato sob a égide de excludentes de ilicitude.

No que concerne às contravenções penais, nítida é a situação de impossibilidade de decretação da prisão preventiva, de acordo com a redação da parte final do artigo 312 do Código de Processo Penal, ao referir-se à prova da existência do crime.

Da exegese do artigo 314 do Código de Processo Penal, extrai-se que a prisão preventiva não será imposta se o juiz verificar pelas provas constantes dos autos que o agente tenha praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II, e III, do ‘caput’, do artigo 23 do Código Penal, referindo-se à legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento do dever legal e exercício regular de direito.187

De valia indagar se a prisão preventiva justifica-se nas hipóteses de excludentes de culpabilidade.

Curitiba: Juruá, 2011, pp. 125-126; NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 8. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, p. 607.

187 Artigo 314 do Código de Processo Penal: “A prisão preventiva em nenhum caso será decretada se o juiz

verificar pelas provas constantes dos autos ter o agente praticado o fato nas condições previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 23 do Decreto-lei 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal.”

Por analogia in bonam partem, entendemos que a prisão preventiva, nos casos de embriaguez fortuita completa, coação moral irresistível, erro de proibição e inexigibilidade de conduta diversa, não pode ser decretada, em que pese não incluídas no artigo 314 do Código de Processo Penal.

No que tange especificamente à inimputabilidade por doença mental, excludente de culpabilidade, pode haver incidência da prisão preventiva, diante da periculosidade do agente, aferida no caso concreto pelos critérios da proporcionalidade, não podendo ser olvidado que, apesar de isento de pena, com fulcro no artigo 26, caput, do Código Penal, está sujeito à medida de segurança ao término do processo, nos termos do artigo 386, parágrafo único, III, do Código de Processo Penal e no artigo 97 do Código Penal, possuindo natureza de medida privativa de liberdade, quando cumprida sob a forma de internação.

Apesar de o artigo 317 do Código de Processo Penal ter sido revogado pela Lei nº 12.403/2011, a apresentação espontânea do agente não impede a decretação da preventiva, desde que presentes os pressupostos e requisitos que a autorizam.

No entanto, não é demasiado pontificar que a apresentação espontânea revela que o investigado ou acusado tem a intenção de cumprir com suas obrigações de cunho processual, bem como de não se evadir do distrito da culpa, questões estas que deverão ser ponderadas pelo magistrado, em face do princípio do livre convencimento motivado.

A prisão preventiva deverá ser revogada pelo magistrado se, no transcorrer do processo, seja verificada a falta de motivo para que subsista, podendo ser decretada novamente, caso sobrevenha razões justificadoras, conforme artigos 282, parágrafo 5º, e artigo 316 do Código de Processo Penal.188

De notar-se que a expressão poderá revogar, contida em ambos os artigos acima mencionados, não sugere faculdade judicial, devendo o juiz revogar a prisão preventiva se ausentes fundamentos para que subsista, diante de sua excepcionalidade,

188 Artigo 316 do Código de Processo Penal: “O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no correr do

processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.”

bem como dos princípios constitucionais da proporcionalidade e da presunção de inocência, não podendo a providência cautelar significar execução antecipada da pena.