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A problemática do termo vídeo-dança

No documento ISBOA F ACULDADE DE M OTRICIDADEH UMANA (páginas 46-50)

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Encontramos na bibliografia uma ampla diversidade de termos para nomear esta classe de obras, alguns mais populares do que outros.

Na capa do livro Dança em Foco - Ensaios Contemporâneos de Videodança (2012)21, aparece, de forma curiosa, uma listagem de nomes usados para denominar a

21 O livro Dança em Foco - Ensaios Contemporâneos de Videodança foi organizado por Paulo Caldas e lançado no Brasil em 2012 pela Aeroplano no Rio de Janeiro. Vários dos autores deste livro foram citados durante a dissertação, os quais podem ser encontrados na bibliografia.

prática. São no total 22 diferentes designações, em diversos idiomas, nomeadamente: Vídeo-dança, Performance da tela, Coreocinema, Screen choreography, Vídeocoreografia, Coreocine, Vídeodance, Dance for the camera, Screen dance, Coreografia da câmera, Cine dance, Performance para a tela, Dança na tela, Dança para a tela, Screendance, Screen performance, Dancine, Videodanza, Camera Choreography, Videotanz, Coreoedição, Cinedança. Além destes 22 nomes, conta também com o termo videodança incorporado no título da obra. A capa do livro mostra como não existe ainda uma definição universal para o género, evidenciando a falta de acordo quanto ao assunto.

De todos estes termos, vídeo-dança (ou, em inglês, video dance) é utilizado com bastante frequência nas diversas programações e publicações sobre o tema. “The term ‘video dance’ is one of the most commonly used of these expressions and is employed throughout the remaining” (Dodds, 2001, p. 69).

O termo video dance foi utilizado pela primeira vez na década de 70, como explica Brum:

Acreditava-se que o termo tivesse sido utilizado pela primeira vez, em 1988, em um catálogo de vídeo do centro Georges Pompidou, em Paris, quando a curadora Michele Bargues precisou identificar uma certa programação que não cabia na categoria “video de dança”. Porém, foi encontrado recentemente um texto norte americano intitulado “videodance”, escrito no ano de 1975, fato que remota a criação do termo ao período das primeiras aproximações entre estas duas artes. (Brum, 2012, p. 108).

O termo faz referência ao medium utilizado naquela época. Como a prática se propagou a partir desse período, passou a estar mais ligada ao uso do vídeo e das suas diversas linguagens.

Seria, portanto, a terminologia vídeo-dança a mais correta para representar a prática? Analisando o termo, e separando-o em dois, começaremos por entender o seu prefixo, a palavra “vídeo”. Dubois (2004, p. 72) explica que o termo vídeo “(...) é usado mais frequentemente como um complemento nominal (ou como uma partícula de algum

modo associada a um nome) do que como um substantivo propriamente dito”. Como por exemplo, os termos: câmara de vídeo, video cassete, sinal de vídeo, vídeoclip, vídeo instalação, vídeo-arte, vídeo experimental e, também, vídeo-dança.

Mais do que um nome, próprio ou comum, que designaria uma entidade intrínseca, um objeto dotado de consistência própria e identidade firme, a palavra “vídeo” nos aparece inicialmente como uma simples modalidade, um termo que podemos qualificar de anexo, algo que intervém na linguagem tecnológica ou estética como uma simples fórmula de complemento, trazendo apenas uma precisão (um qualificativo) a algo outro já dado (...). O termo “vídeo” acaba funcionando, em suma, como espécie de sufixo - ou de prefixo (sua posição sintática flutua) -, aparecendo antes ou depois do nome. (Dubois, 2004, p. 71).

Mas por que deveríamos usar a palavra vídeo para designar esta classe de obras? Ora, como Dubois, (2004, p. 71) salienta, uma vez que a palavra vídeo vem do latim videre, que significa “eu vejo”, pode-se dizer que vídeo é o ato de olhar. Estando, portanto, presente em todas as artes da imagem. Na lógica de Dubois, faz sentido usarmos este termo como prefixo da palavra dança, passando a significar: “eu vejo dança”.

O termo tem vindo a ser escrito com as duas palavras juntas, separadas, ou com hífen no meio. As opções seriam então: vídeodança, vídeo-dança e vídeo dança. Qual está correta? Aparentemente todas são aceites, já que não há acordos formalizados que definam como o termo deve ser usado.

Analisemos agora o sufixo do termo. Segundo Gil (2001, p. 81), a palavra “dança” significa “um conjunto concebido ou imaginado de certos movimentos deliberados”. Quando se trata de uma coreografia, “é um conjunto de movimentos que possui um nexo”, ou seja, que tem uma lógica de movimento próprio. Esta definição abrangente afasta-nos da ideia de que a dança tem de possuir uma dialética restrita, como as mais convencionais, que possuem uma técnica e traços estabelecidos (ballet, dança moderna, jazz, etc.). No contexto de uma obra de vídeo-dança, a dança poderá ter inúmeras formas, abarcando diversos estilos.

McPherson (2006, p. xxx ou 31), no seu livro Making video dance, utiliza o termo video dance, opondo-se ao termos dance film ou screen dance. Ao fazer isso, reconhece que a maioria das pessoas usa a tecnologia digital do vídeo para produzir esta classe de obras e, simultaneamente, não exclui os trabalhos produzidos em outros mídias, mesmo aqueles em filme. “It is rather a catch-all term to describe this relatively new art form that fuses avant-garde approaches to dance-making with innovation in video art, film and television-making practices”. (McPherson, p. xxx ou 31).

No livro Dance on Screen, Dodds (2001, pp. 68-69) nomeia uma série de rubricas utilizadas para nomear este tipo de obras, entre elas: screen choreography, dance video creation, camera choreography, dance for the camera e video dance. Dodds explica que o termo dance vídeo é um dos mais usados, mas que possui um problema de medium, uma vez que a dança pode relacionar-se com o cinema, assim como com a mídia televisiva.

De facto, como se pode definir uma videodança? Se o cinema pode ainda e apesar de tudo, no actual panorama de contágio de linguagens, reivindicar a sua especificidade de linguagens, da sua poética própria, como pode o vídeo diferenciar-se, depois de ao longo de trinta anos de experiência não ter ainda conseguido inscrever a sua poética e a sua gramática própria, vagueando entre o múltiplo uso que é feito pelos vídeo-artistas e por um outro uso domestico que a sua forma e a sua tecnologia permitem?! (Ribeiro, 1994, p. 33).

Justamente pela prática poder ser influenciada tanto pelo cinema como pela poética de áreas experimentais, vídeo-arte, e outras, Brannigan (2011, p. 9) prefere utilizar o termo dancefilm. Porque abarca diversos conceitos de linguagem e porque a prática de filmar dança é muito mais antiga do que o vídeo, tendo surgido com as primeiras experiências do cinema e não podendo, portanto, ser associada unicamente ao vídeo:

In using the term dancefilm I do not mean to negate work made using video or digital technologies, but to include these newer formats in a term that recognizes a continuity between the earliest screen practices and the most current. This is in response to some writing on screen dance that uses terms such as dance video to suggest that recent work constitutes an entirely new and autonomous genre. (Brannigan, 2011, p. 9)

Numa prática em que as relações mediáticas e artísticas mudam constantemente, torna-se ainda mais complexo definir as fronteiras que a limitam. O importante é não restringir os conceitos e perceber que a história da dança na tela tem um percurso logo e de influências diversas. Para Caldas (2012, p. 254), a variedade de nomes utilizados “(...) poderia eventualmente ensinar algo sobre as muitas nuances poéticas e estéticas que atravessam esta produção”.

No documento ISBOA F ACULDADE DE M OTRICIDADEH UMANA (páginas 46-50)