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4.2 Composição do corpus

4.2.2 Procedimentos adotados nas conexões multitelas de Netflix

Para empreender a observação direta e descritiva de como é realizada a distribuição e a circulação de um produto em Netflix, precisaríamos ter acesso à interface de seu sistema. Este acesso se dá por meio de perfis de usuários. Como nos propormos a averiguar se os processos de distribuição e circulação se dão de maneiras distintas para assinantes com preferências diversas, optamos pela criação de perfis com hábitos de uso diferentes, conforme procedimentos de construção de corpus e de amostra aleatória mencionados anteriormente.

De acordo com Mayer-Schönberger e Cukier (2013), em sistemas algorítmicos marcados por grande volume de dados, quanto maior a aleatoriedade, e não a quantidade, melhor a amostra. Segundo os autores:

Os estatísticos demonstraram que a precisão da amostragem melhora drasticamente com a aleatoriedade, e não com o aumento do tamanho da amostra. […] uma amostra aleatória de 1.100 pessoas com uma pergunta binária (sim ou não, com a mesma probabilidade) é incrivelmente representativa da população geral. […]. A explicação é uma questão matemática complexa, mas em resumo: depois de certo ponto, à medida que os números aumentam, a quantidade marginal de novas informações que obtemos da observação diminui. (MAYER-SCHÖNBERGER; CUKIER, 2013, p. 15).

Considerando Netflix como sistema informacional composto por vasta quantidade de dados baseados em combinações algorítmicas, abranger sua rede por completo é inexequível. Assim, seguimos a perspectiva de amostra reduzida e probabilística (aleatória), apresentada por Mayer-Schönberger e Cukier (2013), para acompanhar o lançamento de House of Cards nas conexões de Netflix. Segundo os autores, tal amostragem, em ambientes compostos de grande volume de dados, consegue evidenciar aspectos gerais do universo investigado, uma vez que o aumento da amostra não implica na obtenção de novas informações nesses sistemas.

Ademais, ambientes informacionais são projetados com base em eventos aleatórios (DÁVALOS, 2001) como tempo de navegação, hiperlinks clicados, duração de acesso e período de falhas. Dessa maneira, o uso de uma amostra aleatória se enquadraria ao contexto de nossa investigação.

Para a construção de amostras probabilísticas, há três subtipos de procedimentos: amostra aleatória simples, aleatória sistemática e aleatória estratificada. No primeiro subtipo, a seleção prevê que cada elemento do universo investigado tenha chances idênticas e diferentes de zero de ser selecionado e compor a amostra (MATTAR, 2005). Já no segundo (amostra aleatória sistemática), “a seleção é direcionada por conhecimentos sobre a proporção de ocorrência de cada tipo de elemento do universo da pesquisa, com o intuito de que as ocorrências na amostra e no universo de pesquisa sejam proporcionais” (FRAGOSO; RECUERO; AMARAL, 2011, p. 77). Por fim, o terceiro subtipo (amostra aleatória estratificada) consiste em dividir a população, ou o “objeto de estudo”, em estratos ou subgrupos distintos, de modo que um elemento do universo investigado pode fazer parte somente de um único

grupo. A seleção para que cada elemento componha um grupo é realizada por meio das técnicas de amostra aleatória simples ou por procedimentos de amostra sistemática, conforme as especificidades do universo a ser dividido (OCHOA, 2015).

Tendo em vista o contexto de nossa investigação – observar como House of Cards se dispõe no sistema de Netflix, cujo acesso se dá por perfis – nos inspiramos na perspectiva metodológica da amostra estratificada. Criamos, em Netflix, uma conta específica para a pesquisa e optamos pela construção de quatro perfis fictícios com preferências distintas – ou, em termos estatísticos, quatro estratos compostos por elementos diferentes. Quatro é o número padrão de possibilidades de perfis que se pode construir em Netflix sem editar a quinta opção de perfil, dedicada ao público infantil63 (ver figura 10).

Figura 10 - Perfis fictícios criados para a investigação

Fonte: Captura da interface da conta criada em Netflix para esta pesquisa.

Conforme explicamos, na amostra estratificada, a população é dividida em grupos mutualmente excludentes (em nossa pesquisa, perfis que assistiram a conteúdos que não foram consumidos pelos outros perfis) e os elementos que compõem esses estratos são sorteados para cada grupo utilizando técnicas de amostra aleatória simples ou procedimentos de amostra sistemática. Como, durante o cadastro dos perfis, é apresentada uma listagem padrão/fixa com conteúdos de preferência (ou seja, cada elemento dessa lista tem as mesmas chances de ser

63 Ressaltamos que a opção de cinco perfis é referente ao contexto do ano em que nossa pesquisa foi realizada, no caso, o período de 2015-2017. Futuramente, a opção de cinco perfis possa ser modificada por Netflix.

selecionado em relação a outro), escolhemos títulos distintos empregando a técnica de amostra aleatória simples para cada perfil/estrato. Decidimos por simular essas preferências randômicas nesses perfis a partir do seguinte critério: os primeiros títulos que aparecessem nas três primeiras fileiras (da esquerda para direita) do menu padrão (ver figura 11). Consideramos a quantidade de três fileiras porque essa é a média que aparece na interface de Netflix quando acessada via Site, Tablet ou Smartphone.

Figura 11 - Listagem padrão de conteúdos durante o cadastro de Netflix e sinalização de como as preferências para cada perfil foram elencadas

Fonte: Captura da interface da conta criada em Netflix para esta pesquisa.

 Perfil 1 - gosta de House, The Walking Dead e American Horror Story;

 Perfil 2 - gosta de Revenge, Adventure Time e How I Met Your Mother;

 Perfil 3 - gosta de Velozes e Furiosos, Grey’s Anatomy e Friends;

 Perfil 4 - gosta de Meu malvado favorito, Operações especiais e Jessica Jones;

Posteriormente ao cadastro dos usuários fictícios, simulamos o consumo de cada perfil no decorrer dos dias da coleta, assistindo também a outros títulos distintos desses listados acima, a fim de ampliar o leque de preferências dos perfis e estimular diferentes recomendações pelo sistema de Netflix. Selecionamos também produtos diversificados e de modo aleatório simples a partir do mesmo critério adotado durante

o cadastro dos perfis: os três primeiros títulos que apareciam nas três primeiras listas do menu de Netflix em cada perfil:

 Perfil 1: assistiu a parte de Better Call Saul (T1E1),64 Os Indomáveis (filme), Os Vingadores (filme), Sense8 (T1E9), Batman Begins (filme) e Breaking Bad (T3E8).

 Perfil 2: assistiu a parte de Scandal, (T2E5), How I Met Your Mother (T5E4), Criminal Minds (T9E20); Orgulho e Preconceito (filme), Jogo da Imitação (filme) e Blackfish (filme documentário).

 Perfil 3: assistiu a parte de Histórias Cruzadas (filme), A Origem (filme), Glee (T2E4), O Espetacular Homem Aranha (filme); RuPaul Drag’s Race (T6E10) e Orange is The New Black (T2E5).

 Perfil 4: assistiu a parte de Narcos (T1E1), A Hora da Aventura (T2E3), O Menino do Pijama Listrado (filme); Comer, Rezar e Amar (filme); Gotham (T1E11) e Lost (T4E9).

Com o propósito de registrar a disposição da série investigada – House of Cards – nos quatro perfis fictícios, realizamos a coleta por meio de capturas de tela (screenshots/printscreens)65 durante um mês, e foi criado um relatório de acompanhamento diário. Esse procedimento foi relevante para observar, comparativamente, como os sistemas de recomendação de Netflix operavam em cada perfil a partir das preferências simuladas e como a série House of Cards era inserida para esses usuários fictícios. Buscamos observar se o consumo de determinados títulos serviria como uma espécie de “gatilho” para que os sistemas de recomendação sugerissem House of Cards – ou se, independentemente das séries consumidas, o título iria se destacar na interface da companhia após o período de lançamento de sua quarta temporada.

64 A abreviação “T” se refere ao termo “temporada”, enquanto “E” faz referência ao termo “episódio”. Assim, T1E1 indica 1ª temporada, episódio 1.

65 Apenas na SmartTV, em vez de printscreens, foram tiradas fotografias da tela do aparelho, dada a impossibilidade de se realizar screenshots da interface.

No relatório de acompanhamento (anexado ao final desta dissertação), registrou-se, diariamente, se havia eventualidades na disposição de House of Cards no sistema como, por exemplo, a ausência da série no menu inicial, o que tornaria necessário o uso de setas para localizá-la. De acordo com Carlos Gomez-Uribe, vice-presidente de novos produtos de Netflix, em vídeo institucional publicado no YouTube, quando um título não se encontra nas primeiras listas da interface do serviço e há necessidade do uso de setas (ver figura 12), as chances de um usuário acessá-lo se tornam menores, pois ele precisa procurar no menu o conteúdo que deseja assistir, o que diminui as chances deste último de ser descoberto (VANDERBILT, 2013). Gomez-Uribe declara ainda que os mecanismos são capazes de gerar listas personalizadas no menu dos usuários, usando milhares de características de filmes e séries, incluindo atores, enredos e, até mesmo, personagens.66 Diante disso, nos atentamos também para as categorias das listagens (títulos das listas) às quais House of Cards seria relacionada, se haveria distinções de classificações em prol de hábitos de consumo diferentes. Assim, a coleta foi dividida por data, ambiente (Smartphone, Tablet, Site, SmartTV) e perfis – 1, 2, 3 e 4.

Figura 12 - Sinalização (em branco) das primeiras listas do menu de Netflix e de conteúdos cuja posição é de destaque, pois não precisam do uso de setas laterais ou

verticais para serem encontrados.

Fonte: Captura do menu de Netflix acessado via tablet.

4.2.3 Procedimentos adotados nas contas oficiais de Netflix no Facebook e no