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PARTE II: O estudo

3.3. Procedimentos de Análise

Considerando os objetivos de cada etapa da pesquisa, realizada a partir de instrumentos metodológicos diferentes e contando, nas duas etapas, com a participação de sujeitos com características também distintas, os procedimentos de análise serão apresentados em dois subitens, da mesma forma que os procedimentos de coleta, respeitando-se as propostas desse estudo.

3.3.1. Procedimentos de Análise dos Grupos Focais

Os Grupos Focais têm a especial característica de valorizar as interações humanas, por ser uma ferramenta metodológica que considera o ambiente interacional como locus capaz de promover, ao mesmo tempo, tanto a produção quanto a partilha de significados (Carlini-Cotrim, 1996; Morgan, 1997).

Como é de nosso interesse conhecer quais os conceitos e representações de gênero expressos nos grupos, e, mais especificamente, conhecer qual a opinião dos sujeitos sobre a participação feminina na política a partir de uma situação de interação, optamos por utilizar um formato de análise que tomasse por base a compreensão dos atos da fala, nos moldes propostos por Fávero (Fávero, 2000a). Como diz a autora,

avaliar os atos da fala produzidos nas interações sociais permite que se considerem as contribuições dadas por cada um dos sujeitos, os seus processos de construção e atribuição de significados (Fávero, 2000a, p. 11).

Em sua perspectiva, Fávero defende a tese de que o uso dos atos da fala como instrumento de análise deve buscar a articulação entre dois aspectos: o primeiro é o aspecto da dinâmica das interações e de como os participantes organizam sua inserção no grupo. O segundo aspecto diz respeito à compreensão dos significados produzidos e partilhados pelos interlocutores no momento mesmo da interação. A proposta de Fávero, então, é que a análise das interlocuções a partir da compreensão dos atos da fala sirva à articulação entre

a dinâmica das trocas verbais e o entendimento dos significados produzidos e partilhados, o que pode nos revelar o modo como são interpretados e ressignificados os sentidos de gênero veiculados na nossa cultura.

Para classificar as diferentes ações presentes nas trocas verbais e sua função, são identificadas algumas esferas sob as quais os atos da fala podem ser categorizados, segundo procedimento já utilizado em trabalho anterior (Fávero e Abrão, 2005).

A Esfera da Informação corresponde a todo ato da fala que visa descrever, categorizar, definir, ter em conta os objetos do mundo e sua relação, de maneira não avaliativa. Temos, dentro desta esfera, as categorias assim definidas: Informar (INF); Exemplificar (EXE); Confirmar (CON); Infirmar (INR); Retificar (REC); Exemplificar (EXP); Explicitar (EXR); Citar (CIT).

A Esfera da Avaliação compreende todo ato da fala que marca por uma modalidade, uma ‘atitude’ do locutor, exprimindo um julgamento de valor, ou uma apreciação, sobre os objetos ou estados do mundo. Suas categorias são: Avaliar (AVA); Tomar posição (PPO); Dar um aviso (AVI); Validar (VAL) / Invalidar (INV); Justificar (JUS); Criticar (CRI).

A Esfera da Interação corresponde a todo ato da fala que visa à co-elaboração das identidades dos parceiros e à co-gestão das suas relações, segundo a situação, o contrato de comunicação e os riscos, para melhorá-los ou colocá-los em discussão. As categorias pertencentes a essa esfera são as seguintes: Cumprimentar (CUM)/Desaprovar (DSP); Acusar (ACC); Reconhecer (REE); (Se) Escusar (SES);Complementar (CPL); Conformar (CNF); Desmentir (DES); Desafiar (DFR); Atenuar (ATR)/Acentuar (ACE); Contestar (CNT);

Como Esfera Acional pode-se definir todo ato da fala que visa a propor fazer, incitar afazer, exortar a fazer, se engajar no fazer, declarar (onde e quando fazer é igual a

fazer). Suas categorias são: Propor (PRO); Incitar (INC); Exortar (EXO); Engajar (ENG); Declarar (DEC).

A Esfera Contratual compreende todo ato da fala que tem por função gerar ou regular a comunicação, em função dos objetivos e jogos de ações e do contrato de comunicação.

Portanto, no intuito de articular os dois aspectos de análise antes mencionados, quais sejam, a dinâmica interacional e os significados da produção resultante das trocas verbais nos grupos, conforme proposto por Fávero (2000a), todas as interlocuções foram classificadas e analisadas a partir das categorias acima descritas e dispostas em quadros que identificam as manifestações verbais e suas respectivas categorizações como atos da fala. Apenas as falas da pesquisadora não foram classificadas no quadro, uma vez que não variaram dada sua função no grupo. Suas falas se enquadraram na Esfera Contratual ou na Esfera Acional, dentro da categoria Propor.

No capítulo dedicado à análise dos resultados serão primeiramente apresentadas as discussões dos resultados grupo-a-grupo para depois procedermos a uma discussão geral, alinhavando os elementos de relevância em cada um deles.

3.3.2. Procedimentos de Análise das Entrevistas

A análise das narrativas tomou a perspectiva baseada nos pressupostos trazidos por Zilber, Tuval-Mashiach e Lieblich (2008, apud Fávero, 2009), autoras que consideram importante apreender o contexto em que as estórias de vida se constroem e sugerem a compreensão das três esferas de contexto: a intersubjetividade (que se refere às interações

e relações imediatas narradas pelo sujeito), o contexto social e as metanarrativas (refere-se aos significados e símbolos cultuais evocados na narrativa).

Em nossa análise das entrevistas não perderemos de vista o aspecto da reflexibilidade, apontado por Zilber, Tuval-Mashiach e Lieblich (2008, apud Fávero, 2009) como fundamental para a interpretação do contexto. A reflexibilidade diz respeito à distinção entre o que é trazido pelo narrador e o que é trazido pelo pesquisador, necessária para que a interpretação não resulte distorcida.

Outro ponto destacado por Zilber, Tuval-Mashiach e Lieblich (2008, apud Fávero, 2009) como necessário para esse tipo de investigação é a intertextualidade, que se refere às relações do texto com seus próprios trechos, com outros textos e com outras leituras, o que nos dá a possibilidade de conhecer a estória do ponto de vista de quem narra, ao mesmo tempo em que podemos entrecruzar estórias de narradores diferentes, buscado entender onde os elementos biográficos são comuns e onde se diferenciam.

Para verticalizar as reflexões sobre os resultados obtidos, cada narrativa ensejará uma discussão específica para posteriormente desenvolvermos uma discussão geral, do mesmo modo como procedemos na análise dos grupos focais.

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