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Apêndice 4 – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 255 Apêndice 5 – Carta anexada às devolutivas individuais

6 Situação laboral no segundo encontro

4.2. Procedimentos da área de vigilância

Neste tópico buscou-se descrever e analisar algumas especificidades do segmento. A abertura de uma vaga de vigilância ocorria sempre por duas razões: (1) na aquisição de um novo cliente ou (2) via departamento operacional, pela rescisão de um contrato de trabalho. O primeiro procedimento a ser tomado era observar se algum/a vigilante do próprio quadro funcional poderia suprir aquela necessidade. Frequentemente se buscava remanejar horistas para mensalistas como recompensa pelos bons serviços prestados; esta mudança era vantajosa porque o/a vigilante ficaria fixo/a em um posto e saberia antemão seu salário. “Eu vou promovê-lo se eu conheço o serviço dele, se é um bom profissional e se é pra ele ter uma carga horária maior, ter um ganho maior” (E4). Caso não houvesse um/a vigilante disponível, o departamento operacional geraria uma requisição de vaga para o departamento de recursos humanos contendo o local de trabalho, a escala, as especificidades técnicas do posto e o sexo do/a vigilante. “As

empresas especializadas trabalham o perfil do cliente. Quando se fecha o negócio com um cliente, ele pede: ‘eu quero um vigilante desta forma’. Então se procura atender este perfil” (E10).

O sexo do/a profissional a ser contratado era determinado pelo cliente ou pela chefia operacional, de qualquer forma o departamento de recursos humanos tinha pouca margem de manobra neste quesito. Quando eventualmente este campo não vinha estipulado na requisição de vaga, ficava a cargo do departamento de recursos humanos contratar um homem ou uma mulher. Neste caso, duas psicólogas afirmaram espontaneamente dar preferência às mulheres, pois seria uma oportunidade de contribuir com aquelas com menor chance de conseguir uma vaga na vigilância. “Como elas não têm muita oportunidade [...] eu acabo preferindo mulheres. Por ser mulher também [risos], alguma coisa tenho que favorecer, né?” (E1).

O volume de R&S era “sazonal” (E3, E5, E8), variando em função da região do estado, dos contratos e da época do ano. Na região de Florianópolis, cidade litorânea atrativa aos turistas na alta temporada, foi narrado acréscimo nas contratações temporárias vinculadas aos postos de verão (E1, E5); na região Nordeste de Santa Catarina um gestor descreveu elevado turn over devido à abundância de oportunidades de trabalho na indústria local (E7).

Os/as candidatos/as entregavam currículos ou preenchiam requisições de emprego nas EPS, assim o departamento de recursos humanos sempre iniciava o recrutamento pelo banco de dados. Caso não fosse encontrado um/a profissional que atendesse à demanda, realizava- se um processo de recrutamento externo (por meio de anúncios em jornais, rádios, cartazes em lugares estratégicos etc.). As psicólogas narraram entrevistar de três a quatro pessoas por vaga para escolher o/a candidato/a adequado/a ao “perfil” do cliente. “É diferente contratar um vigilante para uma secretaria [serviço público estadual], um vigilante de condomínio, um vigilante de shopping, que é um perfil muito [ênfase] exigente, e contratar um vigilante para um colégio” (E3). Os/as gestores/as relataram ocorrer eventualmente ingerência dos clientes no processo de R&S, principalmente no setor público, pela indicação de pessoas para ocupar as vagas; contudo o departamento de recursos humanos poderia reprovar o/a candidato/a e justificar sua não contratação. “Eu justifico formalmente e eles [departamento operacional] não contratam; só se o cliente público exigir [ênfase]” (E3).

Todos/as gestores/as narraram almejar excelência no atendimento aos clientes. “O cliente é a nossa razão de existir” (E4). Segundo Kusther et al. (2010) as EPS de vigilância enfrentam acirrada competitividade e precisam investir constantemente em tecnologia para facilitar os processos de gestão e agregar valor aos serviços prestados. Na contemporaneidade a competitividade empresarial passou a ser considerada “natural”, sendo preciso adaptar-se, superar-se sempre e, principalmente, fazer melhor que as outras empresas (Gaulejac, 2007).

O discurso voltado para a competitividade e satisfação total dos clientes pautou as falas dos/as entrevistados/as. Eles/as narraram tentar atender as diferentes demandas, distinguindo, principalmente, clientes públicos e privados. Pode-se inferir que desenvolver perfis singulares para cada contrato se encaixaria numa estratégia para fidelizar os clientes atuais, conquistar novos contratos e, consequentemente, aumentar a competitividade da EPS.

Esse conjunto de sujeitos representava a empresa, decidia os destinos organizacionais e/ou selecionava seus novos integrantes. A homogeneidade de seus discursos estava atrelada a uma visão gerencialista (Gaulejac, 2007, 2011a) pautada no pragmatismo, na racionalidade instrumental e na excelência no atendimento ao cliente; lógica que considera os/as trabalhadores/as recursos, tornando o humano objeto e isolando-o em visões utilitaristas. Esta perspectiva pode ser exemplificada em trecho retirado da entrevista de E3 ao comentar os critérios de seleção por ela utilizados para contratar uma auxiliar para o departamento de recursos humanos: “A gente buscava uma pessoa que olhasse realmente o perfil, que não tivesse contratando [o/a candidato/a] por pena”.

As informações para averiguar se o/a vigilante se encaixava no “perfil” do cliente eram levantadas na entrevista e na análise dos testes psicotécnicos. “Na entrevista ou na avaliação [...] você consegue perceber dissimulações, mentiras e até transtornos” (E1). Foi possível apreender que no processo de R&S as psicólogas buscavam avaliar as qualificações e as qualidades dos/as candidatos/as. As primeiras englobavam a escolarização, os cursos, as experiências laborais, o conhecimento de informática, os conceitos obtidos no CFV; as segundas reuniam características como inteligência, “jogo de cintura” (E5), subordinação, comprometimento, responsabilidade, comunicação verbal entre outros. Nos quesitos comprometimento e responsabilidade avaliava-se a rotatividade do/a candidato/a nos empregos anteriores. Outros aspectos importantes seriam atenção e perspicácia para avaliar e agir no contexto de trabalho: os criminosos se especializaram, passaram

a realizar análises e levantamentos antes da ação delituosa, fotografando o local, conquistando a confiança e/ou aliciando funcionários (E2, E4, E6). Assim, o/a vigilante deveria ser capaz de realizar um trabalho preventivo, com “atenção redobrada, triplicada [...] para poder diminuir ações de criminalidade” (E3). Por fim, foi considerado importante avaliar a aparência do/a candidato/a: ele/a não poderia chegar “cheio de anel, brinco ou usando boné pro lado” (E3), teria que ser zeloso pela sua “apresentação, postura, como senta” (E3) e “como olha nos olhos” (E1) do/a entrevistador/a, respondendo com firmeza e clareza as perguntas.

Quanto ao tipo físico, 1,60 metro foi a altura mínima considerada aceitável para um/a vigilante (idealmente era demandado profissionais com cerca de 1,80 metro); este/a não poderia estar com sobrepeso, nem ser considerado/a muito magro; também não poderia apresentar tatuagens aparentes. “Querendo ou não, o vigilante que não tem uma boa apresentação pessoal, que é um vigilante muito magro ou uma pessoa muito gorda ... como eu vou botar num cliente?” (E4). Quanto à idade, somente um entrevistado disse preferir candidatos/as “maduros”, entre 30 e 45 anos. “Esse perfil é porque a pessoa após os 30 até os 45 anos, a gente entende que ela está focada no mercado, escolheu e definiu essa profissão” (E7). Os/as demais entrevistados/as não mencionaram a idade como um fator determinante no R&S.

Quanto à escolaridade, os/as entrevistados/as exigiam, no mínimo, Ensino Fundamental completo74; algumas EPS rejeitavam os currículos dos/as candidatos/as com a escolaridade mínima legal (quarta série do Ensino Fundamental). Estas pessoas enfrentariam fortes restrições e somente conseguiriam colocação em postos considerados difíceis (expostos às condições climáticas, isolados, de difícil acesso, perigosos, noturnos etc.): “onde tem mais tecnologia, tem que colocar uma pessoa melhorada; quando tem menos tecnologia, não tem controle acesso, informática, controle de câmeras, cartões, essas coisas mais difíceis, daí eles entram” (E10). Cabe enfatizar um aspecto da fala de E10: a área tem buscado cada vez mais “pessoas melhoradas”, preocupando-se com os quesitos escolaridade e qualificação técnica dos/as candidatos/as. Este aspecto foi mais bem abordado no próximo subitem.

74 Conforme análise de Pochmann (2004, 2005), cabe enfatizar que a demanda por maior

escolarização e/ou qualificação não é exclusiva deste segmento, mas repercute em todo mercado de trabalho brasileiro.

Uma vez aprovado/a, o/a candidato/a deveria entregar para sua admissão fotocópia dos documentos exigidos na Portaria nº 387/2006. Essa era uma preocupação adicional para as psicólogas do departamento de recursos humanos, pois, além de ser aprovado na entrevista e nos testes psicotécnicos, o/a vigilante deveria apresentar idoneidade em todos os documentos (não poderia estar sendo processado/a por nenhuma razão).

Em síntese, as principais características observadas no R&S de vigilantes seriam escolaridade, trabalhos anteriores, estabilidade laboral, comunicação, atenção, subordinação, postura, aparência, entre outras. Além disso, seria importante que o/a vigilante se apresentasse “aberto para pegar o que a empresa puder lhe oferecer” (E9), ou seja, tivesse disponibilidade para trabalhar em qualquer escala, horário, posto ou vaga. Em geral, os/as gestores/as criticavam os/as vigilantes que estabeleciam muitas limitações.