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5 PERCURSO METODOLÓGICO

5.2 PROCEDIMENTOS DE ANÁLISE DOS DADOS

Os dados desta pesquisa foram construídos a partir de entrevistas com estudantes e docentes de cursos de licenciatura da área de ciências exatas e analisados com base na Análise Textual Discursiva. Para a análise, os procedimentos iniciaram com a transcrição das entrevistas, gravadas em áudio e vídeo com consentimento dos participantes. As gravações foram transcritas pela pesquisadora com o suporte do software Express Scribe12, que permite a configuração de teclas para funções específicas. Foram configuradas as teclas F3 para retroceder, F4 para avançar, F9 para play e F11 para stop. O software possibilita também ajustar volume e velocidade de acordo com a necessidade. Após abrir o arquivo da gravação com o software, realiza-se a transcrição das entrevistas em um documento de texto.

As transcrições das entrevistas resultaram em nove documentos de texto, com uma média de 24 páginas cada, considerando a formatação nas regras da ABNT para trabalhos científicos. Ao longo do texto foram inseridas observações com o recurso Novo Comentário13, ressaltando trechos das entrevistas e indicando possíveis caminhos a seguir na análise dos dados. Foi sinalizada também a contagem do tempo minuto a minuto para facilitar a retomada das gravações ao partir da leitura das transcrições.

Os dados construídos com as entrevistas foram analisados por meio da Análise Textual Discursiva (ATD), constituída essencialmente por três momentos: unitarização, categorização e construção de um metatexto. Há um processo de construção e reconstrução dos textos que constituem os dados da pesquisa, emergindo novas compreensões acerca do tema pesquisado.

Nesses processos há, respectivamente, a desmontagem dos textos, o estabelecimento de relações e a captação do novo emergente (MORAES; GALIAZZI, 2007).

12 Programa com versão gratuita disponível em <http://www.nch.com.au/scribe/index.html>. O Express Scribe é um software reprodutor de áudio e vídeo projetado para ajudar a realizar transcrições.

13 Recurso do processador de texto Microsoft Word®.

A Análise Textual Discursiva, metodologia de análise de dados qualitativos, tem como objetivo a produção de novas compreensões sobre os fenômenos e discursos estudados. Moraes e Galiazzi (2007) explicam que a análise na pesquisa qualitativa procura compreender as informações em profundidade, tendo como material textos ou dados gerados a partir de entrevistas e observações. Os autores destacam que a intenção não é testar e comprovar hipóteses, e sim compreender e reconstruir conhecimentos acerca dos temas investigados.

As interpretações do pesquisador sobre as falas dos entrevistados, juntamente com a fundamentação teórica sobre o tema e as relações empíricas, produzem significados únicos e temporais, que são utilizados para a compreensão do que está em análise (CERTEAU, 2005).

Neste movimento, o pesquisador exercita intensamente a escrita, a interpretação e produção de argumentos, atuando na produção de textos interpretativos.

A Análise Textual Discursiva é uma abordagem em que os caminhos são constantemente reconstruídos em um exercício de produção de metatextos a partir de um conjunto de textos. Com os processos de unitarização e categorização, são realizadas descrições e interpretações na construção de novas maneiras de compreensão dos fenômenos investigados (MORAES; GALIAZZI, 2007).

Na escrita do metatexto, Moraes e Galiazzi (2006) destacam que o pesquisador entrelaça sua fala com a fala de outros sujeitos, inserido no contexto que investiga. Com sua impregnação nos materiais da análise, elabora uma escrita que representa suas compreensões.

Na parte inicial da Análise Textual Discursiva, há a desconstrução dos textos do corpus.

Nesse processo, denominado unitarização, o pesquisador examina detalhadamente os textos e fragmenta-os, obtendo unidades constituintes. Esse momento abarca os passos iniciais da autoria assumida pelo pesquisador ao longo da análise, visto que já assume suas interpretações.

Moraes e Galiazzi (2006) destacam a importância da autoria do pesquisador:

Unitarizar é interpretar e isolar idéias [sic] elementares de sentido sobre os temas investigados. Constitui leitura cuidadosa de vozes de outros sujeitos, processo no qual o pesquisador não pode deixar de assumir suas interpretações. Ao expressar múltiplas vozes, o processo consiste em um diálogo com interlocutores em que participam diversificados pontos de vista, sempre expressos na voz do pesquisador (p. 123).

O pesquisador realiza a desconstrução dos textos submetidos à análise a partir das interlocuções empíricas, teóricas e de suas interpretações pessoais. Tendo em vista sua autoria no processo de análise, outro pesquisador realizaria diferentes desconstruções, posteriormente também formando diferentes agrupamentos e estabelecendo outros argumentos.

Gaskell (2015) relata um acontecimento comum no primeiro olhar às entrevistas, seja ao realizá-las, ao transcrevê-las ou ao ler as transcrições pela primeira vez.

As primeiras [entrevistas] são cheias de surpresas. As diferenças entre as narrativas são chocantes e, às vezes, ficamos imaginando se há ali algumas semelhanças.

Contudo, temas comuns começam a aparecer, e progressivamente sente-se uma confiança crescente na compreensão emergente do fenômeno (p. 71).

A análise busca a compreensão dos dados da pesquisa, compostos pela fala dos entrevistados. São procuradas respostas com conteúdo em comum, cujos significados tanto se complementam quanto se assemelham ou opõem diretamente.

O movimento de desconstrução do corpus é sucedido pelo processo de categorização, que realiza a articulação dos textos fragmentados reunindo as unidades de significado semelhantes e gerando, assim, categorias de análise. Ao contrário da unitarização, em que ocorre a fragmentação das unidades de significado, na categorização são estabelecidas relações, são reunidas unidades semelhantes e construídas categorias.

O processo de categorização estabelece um movimento de relações e sínteses entre os elementos unitários. Buscando apreender e comunicar novos entendimentos, são construídas categorias combinando e classificando as unidades de base. A reunião dos elementos unitários e a formação de conjuntos que os agrupam resultam no sistema de categorias esperado nesta etapa (MORAES; GALIAZZI, 2007).

As categorias resultam do movimento de fragmentação e desconstrução dos materiais da análise e pretendem expressar novas compreensões. De acordo com Moraes e Galiazzi (2006), representam um conceito dentro de uma rede de conceitos, “representam os nós de uma rede” (p. 125). Não há limites delimitados entre elas, podendo haver superposições entre elementos de uma categoria. Este entrelaçamento garante que seja constituído um todo integrado.

As categorias são permanentemente verificadas pelo pesquisador para avaliar sua validade e pertinência. É um momento de desorganização e reorganização, que possibilitará a emergência do novo a partir da autoria do pesquisador. “É no espaço entre caos e ordem, entre desorganização e categorização que surgem novas e criativas interpretações e compreensões”

(MORAES; GALIAZZI, 2006, p. 126).

Partindo do processo de construção de relações entre as unidades, inicia-se a construção da escrita de um metatexto, organizado a partir do processo de análise. Esse terceiro momento da Análise Textual Discursiva permite uma nova compreensão do todo, após a impregnação

densa nos materiais de análise ocorrida nos processos de unitarização e categorização. Essa etapa investe na captação do emergente, sua validação e comunicação. Com a escrita do metatexto, portanto, o último elemento do ciclo de análise é apresentado como produto de uma nova compreensão e combinação dos elementos construídos anteriormente (MORAES;

GALIAZZI, 2007).

Os elementos de organização do metatexto são as categorias, a partir das quais o pesquisador produz as descrições e interpretações que constituirão o novo texto. Descrição, interpretação e argumentação compõem o metatexto, que dialoga com as informações empíricas e teóricas para elaboração dos argumentos e expressão das novas compreensões sobre o fenômeno estudado (GALIAZZI; SOUSA, 2021).

A construção do metatexto parte da categorização, porém não é um retorno aos textos originais. Tem origem neles, mas expressa a compreensão do pesquisador sobre seus significados. Essa interpretação “é um exercício de construir e de expressar uma compreensão mais aprofundada, indo além da expressão de construções obtidas a partir dos textos e de um exercício meramente descritivo” (MORAES; GALIAZZI, 2007, p. 36).

Moraes e Galiazzi (2007) ressaltam que o metatexto não expressa algo já existente no texto, ou seja, as descrições e interpretações não estão nos textos para serem descobertas. O metatexto é uma construção do pesquisador a partir de um esforço intenso de produção de sentidos. Não é também uma montagem a partir das unidades ou das categorias. Como em sistemas complexos, o metatexto é mais do que uma soma de categorias. Mais do que apresentar as categorias que emergiram na análise, o metatexto apresenta as compreensões do pesquisador sobre o fenômeno investigado.