• Nenhum resultado encontrado

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.10 – PROCEDIMENTOS DE REDE PRODIST

Ao longo desta dissertação e até este ponto não foi efetuada qualquer menção ao documento denominado Procedimentos de Distribuição (PRODIST), porquanto se entendeu mais adequado comentar e alinhar conclusões nesta etapa. Registra-se, entretanto que, em alguns pontos, como nos subitens 63, 66 e 73 as citações de que os indicadores são reconhecidos e aceitos referem-se ao PRODIST.

Importante registrar, de exórdio, que o PRODIST é, indiscutivelmente, um excelente trabalho, qualidade esta constatável por meio da leitura acurada do texto. Entretanto, é preciso assumir a consciência de que o PRODIST não é uma norma e, destarte, não é um veículo adequado para regular as relações entre a concessionária e o consumidor, especialmente do consumidor “cativo”.

No contexto desta dissertação, no meio regulatório e no jurídico, uma norma deve, COMPULSORIAMENTE, ser elaborada e formatada em estrita consonância com o que dispõe a Lei Complementar nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, conforme pode ser verificado pelo teor de seu art. 1º:

“Art. 1o A elaboração, a redação, a alteração e a consolidação das leis

obedecerão ao disposto nesta Lei Complementar.

Parágrafo único. As disposições desta Lei Complementar aplicam-se, ainda, às medidas provisórias e demais atos normativos referidos no art. 59 da Constituição Federal, bem como, no que couber, aos decretos e aos demais atos de regulamentação

expedidos por órgãos do Poder Executivo.” (Grifo nosso).

Em complemento, deve-se registrar que a ANEEL tem assimilado o texto dessa Lei, inclusive denominado suas resoluções de normativas, nos casos em que o ato regulatório visa o estabelecimento de critérios e procedimentos a serem observados pelos entes regulados, fixando deveres e direitos das partes.

Mas, afinal, se o PRODIST não é uma norma, como pode ser definido esse documento? O PRODIST é um manual de operação do sistema elétrico, é um “veículo” adequado para a concessionária desenvolver as atividades para as quais tem o dever de fazer, em função da concessão federal.

Outro ponto merecedor de destaque no que se refere ao PRODIST consiste na verificação, demonstrada por meio de análise nos próximos parágrafos, de que, embora os seus autores demonstrem grande experiência na área de manutenção e operação de sistemas elétricos de potência, o mesmo desempenho não ocorre quando o texto propõe tratar de critérios e procedimentos regulados nas Condições Gerais de Fornecimento, atualmente estabelecidos pela Resolução ANEEL nº 456, de 29 de novembro de 2000.

Para melhor conhecimento do processo é oportuno e suficiente verificar apenas um ponto incluído no PRODIST, comparado com a redação atualmente em vigor na Resolução ANEEL nº 456/2000, ou seja, o art. 72 , que dispõe sobre os critérios e procedimentos para tratamento dos casos de irregularidades. A redação atual do referido art. 72 é a seguinte:

“Art. 72. Constatada a ocorrência de qualquer procedimento irregular cuja

responsabilidade não lhe seja atribuível e que tenha provocado faturamento inferior ao correto, ou no caso de não ter havido qualquer faturamento, a concessionária adotará as seguintes providências:

I - emitir o “Termo de Ocorrência de Irregularidade”, em formulário próprio, contemplando as informações necessárias ao registro da irregularidade, tais como:

a) identificação completa do consumidor; b) endereço da unidade consumidora;

c) código de identificação da unidade consumidora; d) atividade desenvolvida;

e) tipo e tensão de fornecimento; f) tipo de medição;

g) identificação e leitura(s) do(s) medidor(es) e demais equipamentos auxiliares de medição;

h) selos e/ou lacres encontrados e deixados; i) descrição detalhada do tipo de irregularidade; j) relação da carga instalada;

l) identificação e assinatura do inspetor da concessionária; e m) outras informações julgadas necessárias;

“II - promover a perícia técnica, a ser realizada por terceiro legalmente habilitado, quando requerida pelo consumidor;”

(Redação dada pela Resolução ANEEL nº 090, de 27.03.2001)

III - implementar outros procedimentos necessários à fiel caracterização da irregularidade;”

A redação proposta no PRODIST é a seguinte:

“9.7 Constatada a ocorrência de procedimento ou situação irregular que não lhe seja atribuível e que tenha provocado registros incorretos na medição, a distribuidora deve emitir termo de ocorrência de irregularidade sempre que desconectar as instalações do acessante, em formulário próprio, contendo a sua identificação e a descrição detalhada do tipo de irregularidade, com as respectivas justificativas, implementando todos os procedimentos necessários à fiel caracterização da irregularidade.”

O texto do PRODIST ignora toda a história das Condições Gerais de Fornecimento, que já completou 50 (cinqüenta) anos de estudos, discussões, ajustes redacionais, consultas a concessionárias, consumidores, pesquisas de verificação de procedimentos, audiências públicas, em 27 de maço de 2007. Reduz, sem maiores cuidados, um texto que foi objeto de criteriosa avaliação pelo corpo técnico da ANEEL, das concessionárias, enfim, de todos os atores do Setor Elétrico Brasileiro.

O Termo de Ocorrência de Irregularidade (TOI) deve ser sempre emitido no caso de constatação de irregularidade e não simplesmente quando desconectada a unidade consumidora. Trata-se do primeiro documento produzido pela concessionária e muitas vezes contestado por Promotores de Justiça sob a alegação de estar “eivado do vício da unilateralidade”. Não obstante, outros Promotores e Juízes validam o TOI com o argumento de que constitui prova inicial e perfeitamente incluso no fundamento da “presunção da veracidade” em face da sua elaboração ser efetuada por Técnico que detém “conhecimento de causa” da ocorrência da irregularidade, inclusive com diploma que lhe confere todas as prerrogativas estabelecidas pela República Federativa do Brasil.

Além desse fato, convém lembrar que o ônus da prova é da concessionária enquanto prestadora do serviço e em estrita obediência ao que dispõe o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8078, de 11 de setembro de 1990. Inviável, portanto, a simplificação pretendida no PRODIST, o que prejudicaria a própria concessionária, se vier a ser aprovada.

O TOI, na versão do PRODIST também não especifica o seu conteúdo mínimo necessário, o que revela desconhecimento da forma de atuação na área comercial. Além desse fato, elimina a possibilidade da perícia (inciso II do texto em vigor) e não especifica quais seriam TODOS os procedimentos necessários à fiel caracterização da irregularidade. Prejudica assim, a própria concessionária, na medida em que o texto duvidoso e excessivamente simplificado da proposta do PRODIST trunca o conjunto probante da irregularidade tão bem detalhado ao longo dos incisos I, II e III do art. 72 da Resolução ANEEL n° 456/2000, o que pode resultar em grave retrocesso em relação ao que prevê a norma atual.

Pelo exposto, conclui-se que a proposta do PRODIST está desfocada da realidade operacional do ambiente da área comercial, demonstra completo desconhecimento do contexto da matéria regulada, da sua história e da sua evolução, e por conseguinte revela a citada inexperiência do relacionamento entre concessionária e consumidor, onde muitos insistem em querer regular, ao seu estilo, mas poucos realmente conhecem o seu contexto.

Assim o PRODIST deve constituir-se em um ótimo manual de operação direcionado exclusivamente à concessionária, não podendo conter critérios e procedimentos aplicáveis ao consumidor, eis que os direitos e deveres deste devem estar regulados em ato normativo específico, nos termos da Lei Complementar nº 95/1998.