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2. Criação do espetáculo Tambours sur la digue

2.4 Processo de criação

Antes de realizar a viagem descrita, que marcou o início do processo criativo do espetáculo, os atores e a diretora sabiam pouco sobre o que seria a peça criada. Juliana Carneiro da Cunha afirma que Mnouchkine a princípio: “não tinha ideia de nada com relação a que tradição influenciaria a nova criação, ela só sabia que tínhamos que ir para o Oriente”. A atriz também descreve o conhecimento que os atores possuíam da história que seria contada no espetáculo antes de fazerem a viagem à Ásia:

A história, na realidade, estava começando a ser escrita, então ela estava no rascunho do rascunho, mas tinha a ver com uma história de amor entre um jovem e uma jovem, talvez provenientes de duas famílias de teatro, em uma cidade pequena da Ásia. Talvez houvesse uma rivalidade entre essas famílias, enfim, era uma ideia muito vaga. Era um tema clássico de teatro, de literatura e nós estávamos indo procurar a forma antiga e asiática e que também seria clássica.

No primeiro dia de improvisações, após a viagem, a atriz conta que Mnouchkine disse para os atores que eles trabalhariam como marionetes, mas não determinou um tipo específico dessa forma. Assim, as improvisações começaram a acontecer a partir das referências das experiências vividas nas viagens realizadas, como descreve Juliana Carneiro:

reflexões mais abstratas que abarcam o processo criativo como um todo e, além disso, cada dia de ensaio registrado contém fotos das improvisações realizadas que permitem vislumbrar o desenvolvimento passo a passo dos elementos cênicos.

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Nós tínhamos visto marionetes de todos os tipos, de todos os tamanhos, elas estão em todos os países. Taiwan tem marionete, Seul tem marionete, Japão, tem marionete vietnamita, que é a marionete dentro da água... Tem de tudo, em todos esses países, o grande mestre do ator é a marionete. E a marionete tem como alma o marionetista, é uma arte muito antiga e muito mágica ao mesmo tempo. Eu me lembro de que teve um dia em que eu vi uma marionete muito pequena a qual eu pensei que fosse uma pessoa de carne e osso, mas daquele tamanho, era menor do que a minha mão. Foi muito impressionante ver aquele ser.

Vincent Mangado e Dominique Jambert relatam que a diretora optou por começar os ensaios por essa referência, pois ela levava os atores diretamente para um trabalho físico e necessariamente transposto. Assim, durante os primeiros meses de trabalho, segundo entrevistas e a leitura das notas de ensaio, o grande incentivo da diretora era o de abrir portas e caminhos na imaginação dos atores para que estes encontrassem uma forma de transposição dessa referência em seus corpos.

O ator Duccio Bellugi-Vannuccini relatou que assim que a ideia da marionete se estabeleceu como referência para o espetáculo, começaram, imediatamente, a surgir diversas dificuldades na criação. Primeiramente, a questão da fala. Como uma marionete real não fala, no Bunraku, por exemplo, existe a figura do narrador (chamado de tayû) que, acompanhado pela música, conta toda a história representada. O grupo teria que descobrir uma forma de transpor esse elemento. Ou seja, era necessário redescobrir sua representação.

Os atores descrevem que, durante os primeiros meses de ensaios, eles propunham e tentavam de tudo, valendo-se das mais variadas referências que haviam assistido em suas viagens ou que haviam visto em livros. Eles se inspiraram em marionetes fantoches, que são vestidas como luvas; marionetes a fios, manipuladas por varetas; tentaram cenas com a presença de um narrador, ao lado do palco, narrando a história e as marionetes interpretando sem falar; tentaram que os atores que faziam as marionetes apenas balbuciassem e fizessem de conta que falavam, propuseram, inclusive, que a fala fosse proveniente da própria marionete, mas não encontraram resultados imediatos.

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Para que os atores pudessem encontrar a forma buscada, Mnouchkine trabalhou nessa criação com a ideia de marionete imaginada, pois o objetivo, como descreveu o ator da companhia Duccio Bellugi-Vannuccini, em entrevista, não era reproduzir uma tradição, mas se imaginar, dentro desse contexto, como uma criança pode fazer, por exemplo, quando brinca que está andando a cavalo.

Tal abordagem imaginada implicava que os atores, a partir de suas referências, buscassem, em suas improvisações, maneiras de atuar que mostrassem a transposição da marionete para seus corpos sem se prender a um único tipo de referência dessa forma teatral, mas fazendo uma releitura dos conhecimentos que possuíam. Assim, era possível, inclusive, para a concretização de suas proposições, misturar em seus corpos diversos tipos de marionete e de referências. A prioridade desse trabalho era que o ator tornasse orgânico, verdadeiro e teatral - sob o ponto de vista específico da companhia e de Mnouchkine - a transposição sugerida.

Ao trabalhar com a referência da marionete, a diretora estava propondo que os atores embarcassem em um novo código teatral e que abrissem mão, o máximo possível, de seus gestos cotidianos e realistas. Porém, ao sugerir que essa aproximação fosse feita de maneira imaginada e não pela cópia exterior de uma tradição, ela incentivou o encontro dos atores com tais referências, buscando promover descobertas artísticas e não invenções ou criações que se apropriassem das referências orientais de maneira utilitária. Segundo Duccio Bellugi-Vannuccini, encontrar uma forma imaginada é: “Eu tento buscar um exemplo do que é encontrar uma forma imaginaria, não é uma caricatura, não é uma cópia, é encontrar o que nos toca, o que nos transporta dentro dessa forma trabalhada”.

Como relatado em relação ao Kabuki no ciclo de peças de Shakespeare, no qual os elementos específicos dessa tradição eram menos importantes do que o caminho que essa referência fazia o imaginário dos atores percorrer. Ou ainda, da mesma maneira como Stanislavski aborda o termo “se”, trabalhar com uma tradição de maneira imaginada é fazer com que o ator faça de conta que é parte da referência abordada e encontre, assim, liberdade para propor suas transposições. Sendo

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assim, trata-se de um processo que exige uma certa ingenuidade infantil no que diz respeito a crença na fantasia e que é bastante específico e diferente para cada ator.

Tal especificidade é uma das riquezas desse tipo de abordagem, pois gera proposições cênicas bastante diferentes. Por consequência desse trabalho, observamos no espetáculo muitos tipos diferentes de marionetes. Algumas são mais ligadas à tradição coreana, como por exemplo, toda a família do marionetista Baï Ju, outras mais à chinesa como Madame Li e Kisa, e outras mais próximas de traços japoneses. Além disso, mesmo dentro de cada um desses subgrupos, pode- se perceber características especificas de cada personagem-marionete, pois cada um desses personagens foi uma criação de um ator específico com referências e experiências particulares.

Apesar da importância do referido tom lúdico infantil para se relacionar com uma tradição de maneira imaginada, é importante que durante as improvisações os atores não se distanciem completamente de suas referências e que a forma descoberta seja um encontro da referência original com tal abordagem imaginada. Para isso, uma das ferramentas usadas, nesse processo criativo, foi o estabelecimento de algumas regras físicas. Ou seja, a partir da observação de tradições teatrais de marionetes alguns princípios físicos foram, aos poucos, descobertos e tratados como regras mínimas que os artistas deveriam respeitar para dar continuidade à busca pela forma do espetáculo. Tais regras estabeleciam um contato concreto com as tradições referenciadas e direcionavam a busca pela transposição da marionete para o corpo do ator. Dentre essas regras, destaca-se, por exemplo, a noção de que os atores teriam que buscar um desequilíbrio constante em seus corpos, que eles não deveriam se olhar para se escutar e a importância da existência de paradas e de ângulos em suas movimentações.

O ator Serge Nicolaï comenta, na entrevista que realizamos para esta pesquisa, sobre esta maneira de se descobrir uma nova forma a partir da imaginação e de regras-físicas:

É assim que uma forma nasce, não é de um dia para outro, são várias pequenas regras que vão sendo descobertas junto com o trabalho. Essas regras se configuram como condições básicas para o ator trabalhar e, depois de estabelecidas, ele precisa passar sempre por elas, pois é o

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mínimo para poder avançar na busca de uma forma. No Théâtre du Soleil, essas regras são muito concretas, inscrevem-se no corpo, por exemplo, para esta peça, falava-se em: imobilidades, ângulos, as mãos fechadas, respiração.

O uso das regras-físicas criadas pelo grupo pode ser mais detalhadamente explicitado a partir da descrição do workshop realizado pela pesquisadora em abril de 2013, ministrado pelo ator do Théâtre du Soleil Maurice Durozier, no qual se tratava da tradição teatral japonesa Kyogen.

Para esse curso, ministrado no Brasil, em Recife, com duração de dez dias, sugeriu-se aos atores participantes que assistissem filmes dos diretores Akira Kurosawa e Kenji Mizoguchi para que os trabalhos fossem iniciados com uma lembrança viva de algumas das obras desses cineastas. As indicações enviadas antes do início das atividades foram:

Vamos mergulhar com infância e humildade em um dos universos mais formosos que o teatro nos ofereceu. Na verdade, essa oficina será mais uma pesquisa de dez dias sobre o que eu chamo de teatro Japonês. Trabalharemos sobre o Kyogen (as partes cômicas do Teatro Nô) e com duas grandes referências cinematográficas Kurosawa e Mizoguchi. (...) Trabalhamos assim no Théâtre du Soleil. Nosso método é empírico, nosso olhar muito inocente. Não podemos pretender nos aproximar de uma arte que pede tantos anos de trabalho e exigência, mas assim nossa imaginação se fortalece, pois do que precisa a imaginação? De imagens. Quando algum de nós quer realmente se especializar, ele viaja para o Japão.

Eu gosto dessa frase da Ariane: "Às vezes, é quando colocamos a imaginação o mais longe de si, é que melhor conseguimos falar de nós mesmos..."

E sobretudo, espero que juntos, vamos também nos

divertir.

Assim, buscou-se trabalhar a imaginação e para estimulá-la foram oferecidas imagens, fotos, filmes, textos que, de maneira empírica e despretensiosa, levavam os atores ao encontro dessa tradição japonesa. Tais referências foram disponibilizadas porque o objetivo desse trabalho era o de imaginar o Kyogen a partir de uma relação direta com essa tradição, ou seja, o conhecimento do “original” era valorizado. Entretanto, ao mesmo tempo, não se buscou estabelecer aulas ou leituras que levassem os atores a um conhecimento extremamente detalhado dessa tradição, uma vez que o desconhecimento de elementos próprios da história dessa

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referência, ou mais ligados a cultura em que o Kyogen está inserido, não eram impeditivos para a realização do workshop.

A condução do trabalho foi baseada em critérios muito concretos. No primeiro dia, começou-se por estabelecer o espaço em que se trabalharia, criou-se, com bambus e tecidos, um palco análogo ao palco do Teatro Nô (o mesmo em que as apresentações de Kyogen são efetuadas), uma espécie de coxia fechada por cortinas que saía diretamente para uma passarela de acesso ao espaço cênico (análoga ao hashigakari do Teatro Nô) e uma área de atuação, em que o público podia se colocar na frente do palco ou na sua lateral esquerda, do mesmo lado que existia a passarela. Na lateral direita do palco, havia um espaço destinado para os músicos.

Depois de estabelecer-se o espaço, trabalhou-se um tipo específico de andar, no qual, os joelhos deveriam se manter flexionados, o tronco no eixo, os movimentos dos dedos dos pés deveriam ser controlados de uma maneira especifica e deveriam estar em conjunto com o movimento do andar. Além disso, o olhar deveria repousar no horizonte e tinha-se como regra que tais movimentos deveriam ser realizados sem promover nenhuma oscilação vertical do corpo, como se uma linha constante horizontal pudesse ser traçada a partir desse deslocamento.

Em seguida, trabalhou-se com os figurinos que estavam à disposição: quimonos, faixas, adereços de cabelos, maquiagens e os atores observaram algumas imagens para se inspirar. É importante notar que o figurino é um elemento bastante detalhado e valorizado nas manifestações teatrais do oriente-referenciado. Na Ópera chinesa, como em outras manifestações, eles são suntuosos, frequentemente revelam o status e a função social do personagem pela sua cor ou por alguma codificação e, em diversas tradições, buscam, como afirma Françoise Quillet a: “despersonalização total do ator para proveito do personagem” (QUILLET, 1999: 64). Além dessas características, os figurinos do oriente-referenciado, de forma geral, comprimem o corpo do ator e impõem uma nova possibilidade de mobilidade para ele.

Em entrevistas, documentários e cursos oferecidos pelo grupo, como no caso da oficina em questão, fala-se muito da importância das contraintes para o ator. Tal

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palavra francesa, no contexto do trabalho do grupo, pode ser traduzida por empecilho. Ou seja, um determinado figurino, pelas suas formas, peso, volume e textura, impõe uma maneira do ator se deslocar e de se portar que são diferentes da maneira familiar e cotidiana, definindo-se assim como um empecilho à movimentação livre. No grupo, esse empecilho é trabalhado pelo ator não no sentido de tentar se livrar dele ou resolvê-lo, mas de buscar encontrar seu personagem a partir de tais limitações, pois quando respeitadas elas, ao impedir o artista de se mexer de maneira cotidiana, o ajudam a encontrar um novo desenho de movimento, transposições e uma nova forma de atuação.

Nesse workshop, buscou-se respeitar ao máximo os limites de movimentação e até mesmo o tipo de respiração que o uso dos quimonos e das faixas impunha aos atores. Os empecilhos provocados pelo figurino eram observados e percebidos no sentido de descobrir que tipo de movimentação eles sugeriam. Além disso, foi preciso descobrir maneiras de executar ações, que se faziam necessárias nas improvisações, mas que eram impossíveis de serem realizadas sob tais condições de vestimenta. Por exemplo, quando os atores precisavam correr ou lutar com raiva e rapidez, frequentemente pedaços de seus figurinos caiam e se tornava claro que fazer essas ações, de maneira realista, não era possível sob tais condições. Assim, diretamente no trabalho prático, sob a orientação de Maurice, buscaram-se maneiras de transpor tais ações, respeitando as regras estabelecidas, chegando-se a formas orgânicas de se caminhar e de transpor as corridas ou lutas que não se configuravam nem como uma cópia do gestual japonês, nem como gestos cotidianos dos atores.

Para a realização de qualquer improvisação, portanto, tinham-se como ponto de partida os elementos concretos da cena: respeitar o palco com duas frentes para o público, não perder o andar pesquisado e buscar fazê-lo com o máximo de precisão, sem querer imitar o andar japonês, mas buscando respeitar as regras estabelecidas e trabalhar em função das limitações que o figurino nos estabelecia. Todas essas regras-físicas eram tratadas como explicitados com relação ao figurino, ou seja, respeitando-se seus “empecilhos” de maneira que seus limites

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levassem os atores a outros registros de movimento e a uma liberdade dentro dessas regras.

Não podemos afirmar que uma forma foi encontrada nessa oficina, pois os dez dias de trabalho não seriam suficientes para chegar-se a tal estágio, mas apontou-se um caminho a ser percorrido para encontrar-se uma transposição do Kyogen caso esse fosse o objetivo.

A experiência descrita, sucintamente, exemplifica a interessante relação estabelecida entre os atores do workshop e a tradição japonesa Kyogen, que se deu, majoritariamente, por meio dos elementos concretos dessa tradição. Ao se colocarem relativamente nas mesmas condições de cena dos atores de tal tradição e respeitando-se as regras estabelecidas por essas condições, os atores foram, instintivamente, impulsionados a saírem do seu gestual habitual. Assim, a necessidade da busca por uma transposição se estabeleceu concretamente e eles foram impulsionados a abrirem seus imaginários e a atuarem de outras formas, aproximando-se da tradição referenciada sob o ponto de vista de uma reinterpretação e não de uma cópia.

Sobre esse assunto, Maurice Durozier comentou no workshop que se o palco do Teatro Nô mantém sua estrutura há tantos séculos, com certeza ela influencia na maneira dos atores atuarem e na linguagem dessa tradição. Assim, se os artistas não pertencentes a ela se colocam em um palco análogo, em condição de receber as indicações silenciosas que um espaço oferece, é possível conectar-se com alguns princípios dessas referências e desenvolvê-los com o uso da imaginação.

O Théâtre du Soleil, no processo criativo de Tambours sur la digue, trabalhou de forma análoga à descrita no workshop, porém, por haver mais tempo, cada uma das regras-físicas foi descoberta pela companhia. Já nesse curso, elas foram apenas transmitidas a partir da experiência que Maurice Durozier havia tido na criação dos espetáculos de Shakespeare no Théâtre du Soleil e do seu conhecimento acumulado pelos anos de exercício da profissão de ator. Além dessa diferença, é importante notar que, em seu processo de criação, a companhia não se limitou a utilizar regras provenientes de elementos concretos tais como o espaço e o figurino, mas Mnouchkine (como observa-se nas notas de ensaio), em suas

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indicações, estabelecia regras ligadas à qualidade de movimento das marionetes que criavam espécies de pontes imaginárias e, ao mesmo tempo, concretas entre a fisicalidade dos atores e a tradição referida. Dentre tais regras, podemos exemplificar a busca por desequilíbrio e atenção aos ângulos dos movimentos.

Associamos essa ligação entre regras-físicas e a criação a partir de uma referência imaginada com o seguinte pensamento do o ator Yoshi Oida registrado em seu livro intitulado O ator invisível. Ele diz:

Por exemplo, vamos pegar apenas uma das mãos. Mantê-la aberta e depois fechá-la, a sensação não é a mesma. Em seguida, podemos movimentá-la um pouco, voltando a palma para nós e depois afastando-a do corpo. Fechamos a mão, daí começamos a abri-la pelo dedo mínimo. A sensação é diferente da de começar a abrir a partir do polegar. Esses são movimentos mínimos, mas todos eles agem de diferentes modos dentro de nós. Conforme trabalhamos, devemos nos lembrar de que não somos máquinas e de que precisamos descobrir exatamente como cada mudança no corpo age em nosso interior.

Porém, quando falo dessa mudança, em termos de sensações, não estou me referindo a nenhum aspecto emocional ou psicológico, trata-se de algo mais fundamental: a resposta direta do corpo. É importante compreender que atuar não é apenas emoção, ou movimento, ou ações que comumente reconhecemos como “atuação”. Atuar envolve também um nível fundamental o das sensações básicas do corpo (OIDA, 2007: 57).

A partir dessa transcrição de Oida, podemos compreender o funcionamento da relação regra-física e a abordagem imaginada. Primeiramente, o ator no Théâtre du Soleil parte de sua imaginação, mas para improvisar as visões que possui, as regras-físicas são abordadas nos ensaios para que este não se afaste completamente das referências da criação e para que uma espécie de ponte possa ser criada entre o original e o que se busca descobrir. Entretanto, ao colocar em prática em seu corpo tais regras, estas influenciam suas sensações básicas e reconfiguram sua imaginação.

No workshop descrito, pudemos perceber tal mecanismo em diversas improvisações. Citamos, como exemplo, uma proposição que previa um encontro amoroso de um samurai com o espírito da floresta. A princípio, os dois atores entraram em cena vestidos com figurino próprio dos dois personagens e tentaram improvisar a situação. Todas as proposições feitas acabaram desrespeitando o andar antes trabalhado, o figurino e outras regras que haviam sido estabelecidas

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para o samurai. Além disso, percebia-se que havia um descompasso muito grande entre as ações físicas executadas e as figuras que os dois atores representavam. Com a repetição da proposição, aos poucos, foi-se descobrindo, ao respeitar as regras-físicas, a qualidade de movimento que cada um daqueles personagens possuía e a energia que cada ator deveria aplicar em seus corpos. A partir dessas adaptações, os artistas passaram a imaginar a cena de outra maneira e propuseram uma transposição do encontro amoroso em que o contato físico entre os dois

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