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Processos de interação e cooperação entre os diferentes agentes

Nesta seção são demonstrados os principais resultados referentes às relações interorganizacionais de empresas do setor têxtil na microrregião de Campo Belo (MG). São apresentadas as considerações dos entrevistados, tanto dos empresários quanto dos representantes das instituições públicas e de apoio. Deste modo, os empresários argumentam sobre suas percepções quanto às relações que estabelecem com demais empresários do mesmo setor e os representantes das instituições expõem a maneira como sentem tais relações entre os empresários. Novamente, as argumentações dos entrevistados foram organizadas em categorias para posterior análise e interpretação, conforme segue no Quadro 9.

A primeira categoria apresenta argumentos que expressam o baixo nível de relações existentes entre as empresas e quais são os principais fatores que influem para este restrito envolvimento entre elas. Conforme apontado na primeira fala desta categoria, a maior parte dos entrevistados afirma que o nível de envolvimento entre as empresas é muito baixo e esporádico. Como justificativa para validar esta afirmação um dos entrevistados argumenta que esta situação se dá visto que as empresas da aglomeração apresentam focos diferenciados em suas atuações quanto a fornecedores, produtos e atividades e por este motivo não tem necessidade de se envolverem mais intensamente.

QUADRO 9 Repertório Interpretativo - Processos de interação e cooperação entre os diferentes agentes.

Categorias de análise Nº Fragmentos ilustrativos

[...] É muito esporádico as empresas se relacionarem. (E16)

[...] O nível de interação é baixo. Eu acho que as pessoas preferem ficar cada uma no seu canto e aí ficam mais isoladas. Talvez também porque cada um

trabalha com um serviço diferente e isso dificulta, um trabalha com malharia, outros com modinha. (E09)

[...] Olha, eu acho que o problema dos empresários é a

falta de tempo. É um setor que gasta muito tempo, por que geralmente ele trabalha na parte de produção. Tem

interação, de pegar coisas emprestadas, aparelhos, falar para o outro, eu acho que tem. (E06)

[...] Geralmente uma procura a outra para saber se tem serviço, como é que está, preço, se tal firma está tendo serviço se não está. É mesmo só nessa hora, e também

são poucas pessoas. A maioria fica cada um por si.

(E03)

[...] A gente troca informação. Por exemplo, se um fornecedor é ruim a gente abre os olhos dos outros para não errar também. Mas se o fornecedor é bom a gente

fica caladinho. (E15)

[...] Existe, mas não é tanta não. Podia ter uma

proximidade muito maior. (E06)

Baixo nível de interações e relações esporádicas

01

[...] O pessoal deveria gastar um tempo nessa parte de interação. Eu acho que é cada um sofrendo no seu

canto. Eu acho que poderia ter mais interação para

diminuir, por exemplo, se um fez errado, aprender com o erro do outro. (E06)

[...] Se você for procurar no meio do setor, você vai

encontrar pessoas que vão tentar te derrubar, vai achar pessoas que também te ajudam. (E05)

[...] Tem uns aí que é competição, outros é mais

cooperação. Depende da pessoa. (E02)

[...] Eu acho que as duas convivem de mãos dadas. Normalmente num dia você precisa aí está junto, no

outro dia você precisa do funcionário e tira o funcionário do outro. (E08)

Dualidade: Competição e Cooperação

02

[...] Eu acredito que existe as duas. A cooperação

acontece quando emprestamos equipamentos para os outros e a competição é pela mão-de-obra. (E13) Continua...

QUADRO 9 Cont.

Categorias de análise Nº Fragmentos ilustrativos

[...] Tem muitos aqui que compete, para atrair

funcionários. Não em termos de serviço não, porque

cada um já tem a sua firma. (E02) Situações de

competição 03 [...] Tem em relação aos funcionários. Paga dez reais a mais, cinco reais a mais. Se o funcionário for bom ele

tira ele da sua firma por causa de dez reais. (E05)

[...] A gente conversa muito com os outros. Muitos chegam perto de mim para saber como que está.

Sempre que algum está com problema, pega e liga para ter um apoio. (E02)

[...] Tem muita cooperação. Às vezes se eu preciso de uma máquina que outra fábrica tem, eles não importam de me emprestar, se eles também precisam de uma máquina minha eu empresto. (E04)

Situações de

cooperação 04

[...] Quando alguém coopera é emprestando máquinas

e indicando fornecedores. (E15)

[...] Esse ramo é uma máfia. Ninguém passa para o outro. Aqui eu não tenho parceria com ninguém. Aqui a única parceria que eu tenho é que eu dou a terceirização, dou para as pessoas costurarem. (E01) [...] Quando está com dificuldade, tem pouco serviço, é

um querendo engolir o outro. Se tem serviço, se é para

o bem de todos, aí beleza. Se algum deles estiver ruim, estiver com pouco serviço ele vira as costas e vai lá em São Paulo na sua firma para pedir serviço para ele, e

fala até mal da sua. (E05)

Percepções de oportunismo e desconfiança

05

[...] Da parte de quem emprega não, mas entre os

funcionários tem sim. Às vezes eles acham que em

outras empresas vão ficar melhor e começam a exigir as coisas pra continuar com a gente. (E09)

[...] Existe confiança com os fornecedores. Eu tenho o mesmo desde que eu comecei. Eles têm outras fábricas aqui que trabalham para eles. É tudo na conversa mesmo. Não tem contrato. (E02)

[...] Tem mais confiança hoje porque, por exemplo, um pede opinião para os outros e antigamente já não tinha pelo medo talvez de perder, mas hoje já tem confiança. (E03)

Percepções de

confiança nas relações 06

[...] Acredito que rola uma certa ética. Existe uma questão de “deslealdade” do funcionário mesmo, da mão-de-obra. (E08)

QUADRO 9 Cont.

Categorias de análise Nº Fragmentos ilustrativos

[...] Essas trocas de informações se dão mais por

telefone. De acordo com a necessidade da gente. (E04)

[...] Eles divulgam o trabalho da máquina. Se acha bom ou não. Vem divulgar o produto dele e quem tiver condição compra. É pessoalmente. (E05)

[...] Só na hora da necessidade. Não existe, assim, um costume de eu ligar para um outro faccionista aqui para conversar, para marcar reuniões para melhorar o frete ou a roupa, não. (E08)

Fluxo de informações e tecnologia entre os empresários na aglomeração

07

[...] Acontece mais é entre os empresários mais

próximos e de maneira informal. (E13)

Outra entrevistada complementa a justificativa para o baixo nível de envolvimento ressaltando que os empresários deste setor se envolvem muito com o negócio, atuando muitas vezes no processo de produção no interior das fábricas, o que consome muito tempo e impede participar de reuniões, cursos e demais eventos direcionados para o setor. Esta visão também é expressa na fala de um representante de instituição de apoio ao afirmar que: [...] Eu acho que são bastante isoladas. Às vezes se vêem como concorrente. (I02) deste modo, além de perceber o baixo nível de interação, acredita que existe na verdade, concorrência entre os empresários.

Apesar destas justificativas, a maior parte dos entrevistados acredita que o baixo nível de interação é resultado do costume de cada empresário ficar no ‘seu canto’, conforme expressão bastante utilizada por eles. Esta situação pode ser reforçada pela fala de um representante de uma prefeitura municipal, ao argumentar que: [...] Aqui é cada um pra si e Deus pra todos. (P07) Nesta expressão fica exposto que já existe um costume de cada empresário atuar ‘isolado’ do restante do grupo, se relacionando apenas quando há uma real necessidade, conforme aponta a quarta e quinta argumentação desta categoria.

Nas argumentações seguintes, nota-se pela fala de alguns entrevistados que eles percebem o valor da interação e assumem que seria interessante que os

empresários elevassem o nível de relações com os demais, que até nos erros observados de outros agentes poderia ser possível ganharem experiência no mercado e evitar novos fracassos.

A segunda categoria demonstra que boa parte dos entrevistados acredita que situações de competição e cooperação coexistam dentro da aglomeração. Esta visão também é compartilhada por uma das instituições de apoio, conforme fala de seu representante: [...] As duas coexistem. Eu acho que no momento, pelo que a gente percebe, a cooperação prevalece. (P04) A percepção deste entrevistado é de que existe uma dualidade no comportamento dos agentes, mas com predominância de comportamentos cooperativos.

Porém, como se nota na primeira e segunda argumentação da categoria, as entrevistadas creditam os comportamentos de competição e cooperação a certas pessoas e não a situações específicas. Neste caso, já se percebe que existe confiança e desconfiança com relação a agentes específicos, o que será mais bem tratado em outras categorias.

Por outro lado, outros dois entrevistados assumem que as relações de competição e cooperação estão relacionadas, principalmente com situações que demandem determinadas atitudes. Neste caso, afirmam que assumem um comportamento competitivo quando se trata da atração de mão-de-obra especializada para suas empresas, enquanto a cooperação está presente no empréstimo de maquinários e peças que porventura fazem aos empresários que necessitam. Deste modo, procurou-se demonstrar nas próximas categorias os principais fatores envolvidos nas situações de competição e de cooperação.

Na terceira categoria são demonstradas as situações em que, normalmente ocorre competição nas relações entre as empresas. O principal motivo ressaltado pelos entrevistados é exposto nas duas afirmações que formam esta categoria: a competição por mão-de-obra. Contudo, essa competição não acontece entre todos, visto que a mão-de-obra disputada é a especializada. Ou

seja, a competição não se dá entre todos os empresários, mas apenas entre os que confeccionam um mesmo tipo de produto. Visto que cada empresa também se especializa em determinado produto e no trabalho com tecidos específicos, a competição normalmente se dá entre empresas com tais processos semelhantes.

Esta também é a percepção de uma representante de uma das instituições de apoio pesquisadas ao afirmar que: [...] Eu acredito que a competição entre eles ainda é grande. Eu acredito que existe competição por mão-de-obra. (I03)

Contudo, houve um entrevistado que se contrapôs a esta argumentação, afirmando que a competição por funcionários não é tão presente nos dias de hoje, conforme fala expressa a seguir:

[...] Competição, hoje, não existe mais. Hoje, não tem competição nem por funcionário. Funcionário tem demais e antigamente não tinha. Ainda mais agora com essa oficina que fechou é raro o dia que não aparece duas ou três pessoas pedindo emprego. (E03)

De acordo com o explicitado nas argumentações da quarta categoria, a cooperação ocorre, predominantemente, nas situações de empréstimos de peças, maquinários e aviamentos. Porém, ela também está presente quando algum empresário mais próximo está com algum problema ou procura referências sobre fornecedores. Pelo que se observa a busca por referências se dá apenas com relação aos fornecedores dos cortes para as facções, com relação à mão-de-obra isto não se verifica.

Na quinta categoria são expressas as principais citações com relação aos comportamentos oportunísticos dos agentes na aglomeração. O primeiro argumento expressa a total desconfiança e isolamento de um empresário ao afirmar que não se relaciona com nenhum outro empresário da região, a não ser em relações de negócios ao terceirizar parte de sua produção para empresas menores.

Outra entrevistada afirma que quando o momento está ruim para o setor, os empresários agem como ‘predadores’ para se manterem no mercado, se importando apenas com sua empresa sem considerar a coletividade. Talvez neste momento eles deveriam se unir mais para enfrentar em conjunto as adversidades do mercado, conforme uma entrevistada demonstra a redução de oportunismo diante do fortalecimento da união dos mesmo: [...] Reduziu (o oportunismo), as reuniões foram muito boas nesse sentido, a gente passou a olhar mais o lado um do outro sem ficar um querendo comer o outro pela perna. (E04)

Ainda nesta categoria, uma entrevistada ressalta que alguns empresários procuram fornecedores de outros empresários da região, não se detendo nem de fazer comentários maldosos dos demais para ganhar para si as peças para confeccionar. Diferente desta situação uma empresária apresenta ao afirmar que em alguns momentos os trabalhadores são oportunistas com os empregadores tentando obter vantagens, como por exemplo, quando são sondados por concorrentes para se transferirem para suas empresas.

Neste mesmo sentido, procurou-se compreender a percepção de um representante de uma instituição de apoio, que se referiu a esta situação da seguinte maneira:

[...] Não acredito que exista isso, essa intenção de oportunismo. Se por acaso a gente percebe que possa surgir alguma coisa nesse sentido a gente procura imediatamente banir essa idéia da pessoa. A gente não quer nenhum oportunista aqui no nosso grupo, a gente quer que o benefício seja coletivo, seja bom para todo mundo. (I01)

Por outro lado, buscou-se compreender em que situações predominam os comportamentos baseados em confiança entre os empresários, conforme demonstrado na sexta categoria. Deste modo, compreende-se que na grande

maioria dos casos pesquisados existe uma grande confiança entre os empresários da região e os fornecedores das peças. Conforme ressaltado por um dos entrevistados que reflete a percepção da grande maioria, os fornecedores costumam acompanhar as empresas desde a criação das mesmas, chegando em alguns casos, a períodos superiores a dez ou quinze anos.

Esta realidade pode ainda ser entendida diante das citações encontradas quando foram questionados sobre a utilização de formas contratuais para gerir as relações entre eles. Na maior parte dos casos os entrevistados disseram não trabalhar com contratos (ou na base da confiança calculada), mas baseiam suas relações na confiança sistêmica criada na aglomeração pelos próprios agentes. Algumas falas podem ser utilizadas para ilustrar esta realidade, conforme segue adiante:

i. [...] Não, contrato não existe não. Como se diz é no boca-a-boca mesmo. Contrato não existe é só na palavra. Você confia, arrisca. Mas isso ai é com o tempo também, você vai conhecendo a firma. (E03) ii. [...] No inicio é só em cima de contrato, de nota fiscal. Depois que você pega uma confiança já fica mais no boca-a-boca já nem manda mais nota. (E05)

iii. [...] Nada de contrato, nada. É tudo na confiança. (E06)

iv. [...] Funciona tudo de maneira informal, no famoso boca-a-boca. (E16)

Conforme se observa, tanto nos argumentos da categoria apresentados no quadro, quanto nas citações acima, a confiança se dá de maneira sistêmica, crescendo à medida que amadurecem as relações entre os agentes. O único contraponto encontrado novamente está relacionado à desconfiança quanto às atitudes dos funcionários com os empregadores.

Na sétima e última categoria desta seção, procurou-se encontrar informações sobre as condições encontradas na aglomeração para a transferência

de informações, conhecimentos e tecnologias. Deste modo, os dois primeiros trechos demonstram os meios utilizados para estas transferências. O primeiro ressalta, em concordância com a percepção dos demais entrevistados, a grande utilização dos telefonemas para a interação e troca de informações, justificada pela falta de tempo para se deslocarem. O segundo argumento demonstra que os contatos pessoais também são utilizados neste processo, tanto em reuniões agendadas como em encontros informais.

Complementando a análise desta categoria, os últimos argumentos informam que, independentemente do instrumento utilizado para a troca de informações, eles se dão normalmente, entre empresários mais próximos e nos momentos que enfrentam dificuldades nos negócios de maneira informal. Esta realidade também entra em concordância com a percepção de uma representante de uma instituição de apoio, descrita na seguinte citação: [...] Eu acho que a circulação de informações entre as empresas é muito restrita, por que eles não têm organização nenhuma. Então não dissemina, eu acredito que não dissemina. (I03)

A disseminação de informações é um dos principais benefícios da aglomeração de empresas conforme a literatura deste tema apresenta. Conforme observado, este é um dos pontos deficientes desta aglomeração. Contudo, outros benefícios competitivos são percebidos pelos agentes da aglomeração como transbordamentos da concentração e são analisados na próxima seção.

4.5 Benefícios competitivos e dificuldades advindas do processo de