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3. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

3.4. Produção de Biodiesel

Dentre os processos investigados na produção de biodiesel, a fim de sobrepor os problemas encontrados na substituição do diesel por óleos vegetais, destacam-se a transesterificação, esterificação, a pirólise (que se refere à mudança química ocasionada por aplicação de energia térmica na presença de gases), o craqueamento catalítico, a decomposição térmica e a microemulsificação (dispersões do óleo e co-surfactante, termodinamicamente estáveis) (MA & HANNA, 1999; SRIVASTAVA & PRASSAD, 2000).

A pirólise constitui uma reação de decomposição por meio do calor (decomposição térmica) a altas temperaturas e na ausência de ar. Na indústria, esse método é chamado de calcinação e, por meio dele, é possível produzir produtos como bio-óleo ou alcatrão pirolítico e o carvão vegetal, que servem como alternativas de combustíveis. O bio-óleo obtido pelo processo de pirólise rápida de biomassa é uma mistura complexa de compostos orgânicos – cinzas, líquidos (óleos oxigenados) e gases (metano, monóxido de carbono e dióxido de carbono) – o qual, embora tenha natureza química diferente do petróleo, pode ser considerado como um petróleo de origem vegetal. O bio-óleo apresenta uma cor marrom e a sua composição elementar é aproximada a da biomassa. A pirólise do óleo vegetal produz diversos compostos que atendem a algumas das exigências para ser utilizado como combustível, porém possuem baixa viscosidade e um alto número de cetano comparados aos óleos vegetais puros. Embora os produtos formados sejam quimicamente semelhantes aos derivados de petróleo, cabe salientar o difícil controle na composição do produto final obtido (MA & HANNA,

1999). A decomposição térmica dos triglicerídeos produz compostos incluindo alcanos, alcenos, alcadienes, aromáticos e ácidos carboxílicos (BALAT & BALAT, 2010).

A microemulsão é um sistema termodinamicamente estável e isotropicamente translúcido, formada normalmente a partir de dois líquidos imiscíveis (por ex. óleo/água), estabilizados por um filme interfacial de tensoativos (SCHWAB et al., 1987). O estudo de sistemas microemulsionados se baseia em três teorias de formação: a solubilidade, a tensão interfacial e a termodinâmica. A estrutura formada é influenciada pelas propriedades físico-químicas dos componentes utilizados e pela razão entre os componentes. As microemulsões surgiram para resolver o problema da elevada viscosidade dos óleos vegetais, sendo formadas com solventes tais como metanol, etanol e 1-butanol. A microemulsão a partir de óleo vegetal com solventes como etanol, metanol e 1- butanol, apesar de apresentar resultados satisfatórios no conteúdo de cinzas, de enxofre e de ácidos graxos livres, possui grande quantidade de depósitos de carbono, aumento da viscosidade do óleo lubrificante e a ocorrência de combustão incompleta, o que inviabiliza a sua utilização (MA & HANNA,1999).

A transesterificação (também chamada alcoólise) é a reação de um óleo ou gordura com um álcool, com ou sem a presença de catalisadores. Os produtos formados são ésteres e glicerol (MA & HANNA, 1999). O glicerol deve ser considerado um coproduto de alto valor agregado, pois ele tem aplicações comerciais importantes nas indústrias química, farmacêutica e de cosméticos (RANESES et. al., 1999; ZHANG et. al., 2003). Reações intermediárias indesejáveis também podem ocorrer durante a reação de transesterificação em meio alcalino, onde o éster é transformado em sal de ácido graxo (sabão) chamada de saponificação, responsável pela redução do rendimento da produção de ésteres e pela formação de emulsões (sabão) o que dificulta a separação do glicerol (SOLOMONS, 1996).

A reação de transesterificação pode ser descrita, de maneira geral, como uma reação em que um éster é transformado em outro pela mudança na porção alcóxi. Esta transformação ocorre em três etapas sequenciais: a primeira etapa da reação é a conversão de triacilgliceróis em diacilgliceróis, que é seguido pela

conversão dos diacilgliceróis em monoacilgliceróis e depois para o glicerol, produzindo três moléculas de éster para cada glicerol formado (FREEDMAN et. al., 1986; FUKUDA et. al., 2001).

Em princípio, a transesterificação é uma reação reversível, embora durante a produção de ésteres alquílicos de óleos vegetais, isto é, biodiesel, a reação reversa não ocorra de forma muito significativa, pois o glicerol formado na reação é muito pouco miscível no produto, levando a formação de um sistema de duas fases (KNOTHE et al., 2006). Além disso, no processo reacional de transesterificação um excesso de álcool é utilizado, deslocando o equilíbrio da reação para o lado do produto (biodiesel) (MA & HANNA, 1999).

O metanol, etanol, propanol, butanol e o álcool amílico estão entre os álcoois que podem ser usados no processo de transesterificação, sendo o metanol (rota metílica) e o etanol (rota etílica) os mais utilizados devido ao seu baixo custo e as suas vantagens químicas e físicas (polaridade e cadeia curta) (MA & HANNA, 1999). A rota metílica é predominantemente utilizada em todo o mundo para a produção de biodiesel, devido principalmente ao seu baixo custo. Em alguns países, como o Brasil, a produção de biodiesel pela rota etílica é um processo em potencial, devido à disponibilidade de matéria-prima e à tecnologia que permite a produção em larga escala de etanol por processos fermentativos (KNOTHE et al., 2006).

A reação de transesterificação pode ocorrer pela simples mistura dos reagentes. Entretanto, a presença de um catalisador, em geral um ácido ou uma base forte, acelera consideravelmente a transformação dos ésteres. Com o objetivo de se conseguir um rendimento elevado de monoésteres alquílicos, o álcool tem que ser usado em excesso (SCHUCHARDT et al., 1998). O esquema geral da reação de transesterificação se encontra reproduzido na Figura 3.1.

Figura 3.1 – Reação de transesterificação. R’, R’’ e R’’’ são cadeias de ácidos graxos.

Na Figura 3.2 é apresentado o mecanismo de transesterificação por catálise básica. Conforme pode ser observado, a primeira etapa da transesterificação (etapa 1) é a reação de uma base com um álcool, produzindo um alcóxido e um catalisador protonado. O ataque nucleofílico do alcóxido ao grupo carbonila do triacilglicerol gera um intermediário tetraédrico (etapa 2), do qual o alquil éster e o correspondente ânion de diacilglicerol são formados (etapa 3). Este último desprotona o catalisador, regenerando-o (etapa 4) e tornando-o capaz de reagir com uma segunda molécula de álcool, começando outro ciclo catalítico. Os diacilgliceróis e os monoacilgliceróis são convertidos pelo mesmo mecanismo até uma mistura de ésteres alquílicos e glicerol (TAFT et al., 1950; GUTHRIE, 1991; SCHUCHARDT et al., 1998).

CH2 C H C H2 O O O C C C O O O CH2 CH2 CH2 R1 R2 R3 C H3 CH2 OH Na OH

+

Na OH+ H C H3 CH2 O-

+

C H3 CH2 O- C H3 CH2 O CH2 C H C H2 O O O C C C O- O O CH2 CH2 CH2 R1 R2 R3 C H3 CH2 O CH2 C H C H2 O O O C C C O- O O CH2 CH2 CH2 R1 R2 R3 CH2 C H C H2 O- O O C C O O CH2 CH2 R2 R3 C O CH2 R1 CH3 CH2 O CH2 C H C H2 O- O O C C O O CH2 CH2 R2 R3 Na OH+ H Na OH

+

+

+

H CH2 C H C H2 O O O C C O O CH2 CH2 R2 R3 (1) (2) (3) (4)

Figura 3.2 – Mecanismo de transesterificação por catálise básica (STREITWIESER et al., 1992).

A estequiometria da reação requer 1 mol de triacilgliceróis para 3 mols do álcool, mas para aumentar o rendimento dos ésteres (biodiesel) e permitir a separação da fase glicerol que é formada, utiliza-se um excesso do álcool (KNOTHE et al., 2006). O tipo de catalisador (alcalino ou ácido), a relação molar álcool/óleo vegetal, a temperatura, a pureza dos reagentes (principalmente o teor de água) e teor de ácidos graxos livres (AGL) têm influência sobre o processo de transesterificação (SCHUCHARDT et al., 1998).

Os álcalis utilizados como catalisador incluem o hidróxido de potássio e de sódio, carbonatos e os correspondentes alcóxidos de potássio e de sódio (como o metóxido de sódio e o etóxido de sódio). Normalmente, são utilizados como catalisadores ácidos, o ácido sulfúrico, o ácido sulfônico e o ácido clorídrico. Em

processos enzimáticos são utilizadas as lipases como biocatalisadores. A transesterificação catalisada por álcalis é muito mais rápida do que a catalisada por ácidos, e por isso é a mais utilizada comercialmente (MA & HANNA, 1999).

A transesterificação em condições supercríticas está sendo estudada como uma alternativa para a produção de biodiesel, no entanto, ainda não é utilizada comercialmente (AYHAN, 2006).

Nos últimos anos, a produção de biodiesel com base em catalisadores heterogêneos tem sido utilizada (BOURNAY et al., 2005) e suas vantagens evidenciadas quando comparada com a catálise homogênea, como rendimentos mais altos devido à ausência de geração de sabão durante a transesterificação (BLOCH et al., 2008), projetos mais simples devido a não necessidade de purificação e à maior facilidade das etapas de separação (DI SERIO et al., 2007), alta pureza da glicerina e baixo teor de água (BLOCH et al., 2008), e sem sais contaminantes (ZHU et al., 2006; DI SERIO et al., 2007). No entanto, este processo possui o inconveniente de requerer um alto consumo de energia, pois a catálise heterogênea utiliza maiores temperaturas de reação devido à menor atividade do catalisador sólido.

A utilização de catalisadores heterogêneos, como zeólitas e resinas de troca iônica, permitem uma redução significativa do número de etapas de purificação do biodiesel, facilitando a reutilização do catalisador e, consequentemente, podendo reduzir o custo do processo de produção. Também facilitam significativamente a purificação da glicerina e a reutilização do álcool empregado em amplo excesso na síntese. Logo, essas rotas tecnológicas apresentam vantagens potenciais sobre a catálise homogênea, mas a viabilidade econômica de cada uma delas ainda se encontra em fase de estudo (CHOUDARY et al., 2000; FUKUDA et al., 2001; ABREU et al., 2004; SUPPES et al., 2004).

Atualmente, a catálise homogênea tem sido a rota tecnológica preferida para a produção de biodiesel. Na transesterificação catalisada por álcalis, os acilgliceróis e o álcool devem ser substancialmente anidros, porque a água faz com que a reação mude parcialmente para a reação de saponificação, produzindo

sabão. O sabão reduz o rendimento dos ésteres e dificulta a separação do éster, glicerol e a lavagem com água. Também é necessário um baixo teor de ácidos graxos livres (AGL), porém se o óleo contém alto teor de AGL e água, a transesterificação catalisada por ácido é a mais adequada. Os triacilgliceróis podem ser purificados (desacidificados) através do processo de saponificação (conhecido como o tratamento alcalino) e, em seguida transesterificados, usando um catalisador alcalino (MA & HANNA, 1999).

Os ácidos de Brönsted-Lowry podem ser utilizados como catalisadores da alcoólise (preferencialmente, os ácidos sulfônico e sulfúrico). Estes catalisadores fornecem alto rendimento em ésteres monoalquílicos, mas a reação é lenta, normalmente requerendo altas temperaturas. Outra desvantagem é a etapa de purificação, que deve eliminar completamente as contaminações com catalisadores ácidos residuais, pois estes podem atacar as partes metálicas do motor, causando corrosão (CANAKCI & VAN GERPEN, 1999). Contudo, a catálise ácida é eficiente para óleos que possuam índices de acidez superiores a 1%, tais como os óleos utilizados em frituras. Estes óleos possuem grande quantidade de ácidos livres que não podem ser transformados em biodiesel via catálise alcalina porque, estando livres, reagem rapidamente com o catalisador, produzindo sabões que inibem a separação entre o éster e a glicerina nas etapas de lavagem com água.

Depois da transesterificação dos triacilgliceróis, os produtos são uma mistura de ésteres, glicerol, álcool, catalisador e tri-, di- e monoacilgliceróis (MA & HANNA, 1998). Os ésteres produzidos através de transesterificação são insumos básicos para uma ampla gama de derivados oleoquímicos com alto valor agregado. Eles podem ser utilizados na produção de lubrificantes, polímeros, plastificantes, produtos de higiene pessoal, papéis, tecidos e alimentos (GIBBONS et al., 1997; ARCOS et al., 1998; YOUSEF et al., 2001).

A Figura 3.3 apresenta um diagrama esquemático do processo de produção de biodiesel metílico a partir de matérias-primas contendo um baixo teor de AGL para a transesterificação alcalina (KNOTHE et al., 2006). Após a reação de transesterificação ocorre a separação das fases por decantação ou centrifugação, onde o glicerol se comporta como a fase mais densa enquanto a

mistura de ésteres é mais leve, o álcool em excesso pode ser recuperado nas duas fases. O glicerol obtido do processo pode ser comercializado, e os ésteres passam para etapa de purificação, que envolve a lavagem, secagem dos mesmos e destilação, resultando enfim no biodiesel (CHRISTOFF, 2006).

Figura 3.3 – Fluxograma esquemático do processo empregado para a produção de biodiesel.

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