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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.2 Produção de lipase por FES

5.2.1 Caracterização dos resíduos agroindustriais

Os parâmetros físico-químicos dos resíduos agroindustriais têm demonstrado influência no aumento da atividade lipolítica quando empregados como suporte sólido não inerte (KUMAR et al., 2011; GEOFFRY; ACHUR, 2018). Assim, a Tabela 8 demonstra os resultados da caracterização dos resíduos agroindustriais avaliados.

Tabela 8 - Parâmetros utilizados para a caracterização dos resíduos agroindustriais.

Parâmetros Resíduos agroindustriais

Farelo de Trigo Farelo de milho Farelo de soja Casca de arroz

Umidade (%) 12,41 ± 0,05b 10,78 ± 0,04bc 8,67 ± 0,02cd 22,20 ± 0,5a Cinzas (%) 5,37 ± 0,03c 1,17 ± 0,04d 6,27 ± 0,03b 14,36 ± 0,77a Proteínas (%) 13,10 ± 1,27b 5,56 ± 0,23c 41,96 ± 0,11a 4,63 ± 0,77c Lipídios (%) 3,29 ± 0,11b 4,88 ± 0,15a 2,16 ± 0,57c 4,22 ± 0,39ab Fibras (%) 16,15 ± 2,95b 6,06 ± 0,31c 14,87 ± 1,12b 33,76 ± 1,43a Carboidratos (%) 46,68 71,55 26,08 20,83

IAA (g H2O/g resíduo) 3,65 ± 1,16a 1,75 ± 0,56c 3,50 ± 0,73ab 3,37 ± 0,19b Legenda: IAA: Índice de absorção de água. Letras diferentes (a,b,c,d) na mesma linha indicam diferença

estatisticamente significativa (p < 0,05) utilizando one way ANOVA seguido do pós-teste de Tukey. Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Diante dos resultados de umidade, os farelos de trigo, milho e soja podem ser considerados como bons suportes sólidos para o processo de fermentação. Resíduos agroindustriais com baixo valor de umidade são preferidos para os processos industriais,

uma vez que quanto menor sua umidade maior será sua resistência à contaminação microbiana. Dessa forma, resíduos com baixo teor de umidade não necessitam de custos adicionais para o armazenamento sob baixas temperaturas, podendo ser armazenado a temperatura ambiente (JAIN; NAIK, 2018).

Um parâmetro que avalia o impacto da umidade nas propriedades físicas de resíduos sólidos é o índice de absorção da água (IAA), o qual é definido como a quantidade de água que pode ser absorvida por um material. De acordo com os resultados, o farelo de trigo e farelo de soja apresentaram elevado IAA, sem diferença estatisticamente significativa. Resultados semelhantes foram encontrados por López et al. (2018) ao avaliar a casca de soja (3,6 ± 0,7 g H2O/g resíduo). Em contrapartida, o farelo de milho apresentou

um baixo índice (1,75 ± 0,56 g H2O/g resíduo), o que pode estar correlacionado com o

baixo teor de fibras observado (6,06 ± 0,31%).

Para o processo fermentativo, dá-se preferência aos suportes sólidos não inertes que apresentam elevado IAA, uma vez que o teor de umidade pode ser modificado durante a cultura em estado sólido (LÓPEZ et al., 2018). Desta forma, em caso de aumento do teor de umidade, suportes com maiores índices de absorção de água tendem a reduzir a água livre, promover o aumento da porosidade da partícula e a acessibilidade do microrganismo no meio, favorecendo a difusão de oxigênio na camada do suporte (MUKHTAR et al., 2016; OLIVEIRA et al., 2016).

O farelo de soja (41,96 ± 0,11%) apresentou uma concentração de proteínas três vezes maior que o valor encontrado para o farelo de trigo (13,10 ± 1,27%). Estudos têm demonstrado a importância da concentração ideal da fonte de nitrogênio na produção de lipase fúngica (COLLA et al., 2016; JAIN; NAIK, 2018). Ao avaliar o efeito da concentração de nitrogênio frente à atividade lipolítica, PEREIRA et al. (2019) observaram que o aumento da concentração de nitrogênio no meio pode levar a uma menor produção de lipase.

Apesar dos resíduos agroindustriais serem menos adotados como fonte de nitrogênio, sabe-se que o seu uso se torna necessário para reduzir o custo de produção enzimática (GEOFFRY; ACHUR, 2018). Fontes de nitrogênio orgânicas promovem um efeito intensificador, corroborando com a necessidade da presença de vitaminas e aminoácidos, fatores essenciais para a produção de lipase fúngica (WANG et al., 2008; SALIHU et al., 2011).

No que se refere as fontes de carbono, foi encontrada uma concentração de carboidrato próximo a 50% no farelo de trigo (46,68%), o que pode favorecer o crescimento fúngico. Segundo Kumar et al. (2011), a produção de lipase extracelular ocorre apenas sob condições de estresse, onde os microrganismos preferem utilizar os carboidratos como fonte energética nas fases iniciais (lag e log) de crescimento. Observou- se também que o uso apenas de resíduos graxos como substrato apresenta uma produção enzimática muito menor, sendo necessário um equilíbrio entre as fontes de carbono glicídica e oleosa.

O farelo da casca de arroz apresentou 14,36 ± 0,77% de resíduo mineral, valor este significativamente maior que o encontrado para os demais suportes avaliados. Apesar de muitos íons atuarem como indutores enzimáticos, sabe-se que altas concentrações destes podem provocar um efeito inibidor. Pokorny et al. (1994) sugerem que íons ferro podem reduzir a produção de lipase e prolongar o tempo de fermentação.

Bons resultados utilizando o farelo de trigo como suporte sólido não inerte para a produção de lipase fúngica são relatados por diversos autores (MAHADIK et al., 2002; KUMAR et al., 2011; OLIVEIRA et al., 2016). Tais resultados podem ser justificados pelo seu maior índice de absorção da água, combinado com o teor adequado de minerais e excelente concentração de fontes de carbono e nitrogênio. Assim, de acordo com os dados obtidos pela caracterização química dos resíduos agroindustriais e os trabalhos relatados na literatura, o farelo de trigo foi definido como suporte não inerte e utilizado nas etapas seguintes do trabalho.

A análise granulométrica foi realizada no farelo de trigo como o objetivo de caracterizar o tamanho médio de suas partículas. Deste modo, por questões econômicas e ambientais, buscou-se o aproveitamento integral do resíduo, obtendo-se um percentual de aproximadamente 30% da amostra com tamanho de partícula superior a 0,850 mm (20

mesh) de diâmetro de abertura e 70% menor igual a 0,300 mm (48 mesh). Um maior

tamanho de partícula permite uma melhor na troca gasosa e aeração do meio ao passo que partículas menores oferecem maior superfície de contato favorecendo, assim, o crescimento microbiano (HASAN, 2002).

5.2.2 Triagem do indutor lipídico

A avaliação do efeito indutor de diferentes substratos a uma concentração de 10% combinados com o farelo de trigo pode ser observada na Tabela 9.

Tabela 9 – Efeito de diferentes substratos indutores na produção de lipase de A. terreus por FES.

Substrato indutor Atividade lipolítica (U.g-1)

Óleo de cacay 196,62 ± 16,14a

Óleo de coco 223,20 ± 18,72a

Manteiga de cacay 308,14 ± 16,40b

Azeite de oliva 303,86 ± 14,59b

Legenda: Letras diferentes (a,b) na mesma coluna indicam diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) utilizando one way ANOVA seguido do pós-teste de Tukey.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Diante dos resultados, pode-se inferir que o farelo de trigo combinado com a manteiga de cacay apresentou a maior atividade lipolítica (308,14 ± 16,40 U.g-1) para as condições realizadas no presente estudo, sendo significativamente diferente (p < 0,001) dos indutores óleo de cacay e óleo de coco, considerando 95% de confiança.

Tendo em vista que a composição do meio de cultivo pode afetar a produção de lipases e que estas são geralmente produzidas por indução (GEOFFRY; ACHUR, 2018), o uso de lipídio como fonte de carbono pode ser considerado como um dos principais fatores de influência na produção de lipase fúngica (BINDIYA; RAMANA, 2014).

Lipídios vegetais apresentam alta capacidade de induzir o crescimento de fungos do gênero Aspergillus sp., promovendo elevada produção de lipases (DAS et al., 2016; SETHI; NANDA; SAHOO, 2016). Entre os indutores avaliados, o óleo de cacay apresentou um menor efeito indutivo (196,62 ± 16,14 U.g-1), sem diferença estatística (p = 0,182) para o óleo de coco (223,20 ± 18,72 U.g-1). Estes resultados tornam-se importantes, pois preenchem a escassez de dados referentes ao seu efeito indutor. É importante mencionar que o efeito indutivo dos substratos varia consideravelmente de uma espécie fúngica para outra, como também mediante a composição do meio e das condições de cultivo utilizadas no processo biotecnológico (WANG et al., 2008).

Em relação à produção de lipases, não foi observada diferença estatística (p = 0,990) entre a manteiga de cacay e o azeite de oliva, o qual é conhecido como substrato indutor em potencial (WANG et al., 2008). Similarmente ao observado neste estudo, Mahadik et al. (2002), ao avaliarem o efeito de diferentes indutores na produção de lipase

de A. niger NCIM 1207 por FES, observaram a produção máxima de lipase (305 ± 27 U.g-

1) para o farelo de trigo suplementado com 10% de azeite de oliva. Yang et al. (2016)

obtiveram maior efeito indutivo do meio suplementado com azeite de oliva em relação aos meios não suplementados assim como foi observado um maior rendimento de lipase por

Aspergillus sp. quando o azeite foi usado como única fonte de carbono (CIHANGIR;

SARIKAYA, 2004).

A elevada concentração de ácidos graxos saturados presentes na manteiga de cacay (69,08%) pode ter contribuído com a atividade lipolítica encontrada. Estudos revelam que os fungos utilizam os ácidos graxos saturados como fonte de carbono para a produção de lipase. Ao avaliarem a atividade lipolítica nos substratos óleo de víscera e azeite de oliva, Pacheco et al. (2015) observaram uma maior atividade para o primeiro, que apresentou maior concentração de ácidos graxos saturados (30,3% e 20,0%, respectivamente). Isso foi reportado por Burkert et al. (2004) ao estudarem a produção de lipase por Geotrichum candidum e encontrarem maior produção quando o meio foi induzido por óleos que tinham maior percentual de ácidos graxos saturados.

Além disso, a presença de ácido oleico (13,34%) na manteiga de cacay pode justificar a maior produção de lipase, uma vez que o ácido oleico tem sido associado a uma maior atividade lipolítica entre as fontes de carbono avaliadas para a produção de lipase de

Botryosphaeria ribis EC-01 (MESSIAS et al., 2009).

Como não há relatos na literatura sobre o uso da manteiga de cacay como indutor enzimático e tendo em vista os resultados promissores encontrados no presente trabalho, deu-se prosseguimento ao delineamento experimental utilizando a manteiga de cacay como substrato indutor.

5.2.3 Delineamento experimental

Embora numerosos fatores influenciem a produção de lipase fúngica, foram identificados como os mais significativos para os processos de FES a concentração da fonte de carbono (indutor lipídico), temperatura, pH, umidade e tempo de fermentação (TREICHEL et al., 2010). Assim, buscou-se avaliar a influência destas variáveis através de um delineamento fatorial fracionário 25-1 conforme demonstrado na Tabela 10.

Tabela 10 - Matriz do delineamento fatorial fracionário 25-1 com codificação e níveis das variáveis utilizados para o estudo de produção de lipase de A. terreus por FES.

Ensaio

Variáveis independentes

Níveis codificados correspondentes (valor real)

Variável resposta Atividade lipolítica X1 X2 X3 X4 X5 (U.g-1) 1 -1 (1,0) -1 (25,0) -1 (6,0) -1 (60,0) +1 (240,0) 104,48 ± 9,37 2 -1 (1,0) -1 (25,0) -1 (6,0) +1 (80,0) -1 (96,0) 1627,77 ± 35,62 3 -1 (1,0) -1 (25,0) +1 (10,0) -1 (60,0) -1 (96,0) 1973,78 ± 57,95 4 -1 (1,0) -1 (25,0) +1 (10,0) +1 (80,0) +1 (240,0) 357,33 ± 28,98 5 -1 (1,0) +1 (37,0) -1 (6,0) -1 (60,0) -1 (96,0) 601,42 ± 13,61 6 -1 (1,0) +1 (37,0) -1 (6,0) +1 (80,0) +1 (240,0) 74,27 ± 12,51 7 -1 (1,0) +1 (37,0) +1 (10,0) -1 (60,0) +1 (240,0) 104,86 ± 11,91 8 -1 (1,0) +1 (37,0) +1 (10,0) +1 (80,0) -1 (96,0) 245,26 ± 9,33 9 +1 (10,0) -1 (25,0) -1 (6,0) -1 (60,0) -1 (96,0) 501,43 ± 37,82 10 +1 (10,0) -1 (25,0) -1 (6,0) +1 (80,0) +1 (240,0) 330,40 ± 20,01 11 +1 (10,0) -1 (25,0) +1 (10,0) -1 (60,0) +1 (240,0) 754,28 ± 34,41 12 +1 (10,0) -1 (25,0) +1 (10,0) +1 (80,0) -1 (96,0) 640,07 ± 49,18 13 +1 (10,0) +1 (37,0) -1 (6,0) -1 (60,0) +1 (240,0) 152,26 ± 10,52 14 +1 (10,0) +1 (37,0) -1 (6,0) +1 (80,0) -1 (96,0) 937,33 ± 34,23 15 +1 (10,0) +1 (37,0) +1 (10,0) -1 (60,0) -1 (96,0) 435,50 ± 39,02 16 +1 (10,0) +1 (37,0) +1 (10,0) +1 (80,0) +1 (240,0) 52,63 ± 9,51 17* 0 (5,5) 0 (31,0) 0 (8,0) 0 (70,0) 0 (168,0) 749,23 ± 39,72 18* 0 (5,5) 0 (31,0) 0 (8,0) 0 (70,0) 0 (168,0) 357,01 ± 15,87 19* 0 (5,5) 0 (31,0) 0 (8,0) 0 (70,0) 0 (168,0) 593,85 ± 34,62 Legenda: X1: Manteiga de cacay (%); X2: Temperatura (ºC); X3: pH; X4: Umidade (%); X5: Tempo (horas);

*Pontos centrais. Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Segundo os resultados ilustrados acima, a atividade enzimática máxima foi de 1.973,78 ± 57,95 U.g-1 a uma temperatura de 25 ºC durante 96 horas (ensaio 3). Resultados

menos significativos (52,63 ± 9,51 U.g-1 e 74,27 ± 12,51 U.g-1) foram encontrados para os níveis opostos de temperatura (37 ºC) e tempo (240 horas).

O Diagrama de Pareto (Figura 8) apresenta os contrastes dos fatores sobre a atividade enzimática, indicando que o tempo de cultivo (variável com maior efeito na atividade lipolítica) e a temperatura foram estatisticamente significativos, considerando 95% de confiança. Os resultados mostraram ainda que a produção da enzima foi afetada pelos fatores tempo e temperatura de maneira negativa, ou seja, um incremento em ambas variáveis (nível -1 para nível +1) conduziu a um decréscimo na atividade.

Figura 8 - Diagrama de Pareto para o efeito estimado de cada variável do planejamento fracionário 25-1 sobre a resposta da atividade enzimática.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

No que diz respeito as variáveis não significativas, definiu-se o ponto médio para a umidade (70%) e para o pH (8,0) como o de escolha para as próximas etapas. Mahmoud et al. (20015) encontraram que a condição ótima para a produção de lipase por

A. terreus se deu na faixa de pH entre 7,0 e 9,0.

Quanto ao substrato indutor, optou-se por fixar o limite inferior (1%) por razões econômicas. Além disso, trabalhos em condições divergentes do presente estudo apontam que concentrações menores favorecem a produção de lipase (DAMASO et al., 2008). Ao realizar uma abordagem usando superfície de resposta, Kaushik et al. (2006) definiram a concentração de 1% de óleo de girassol como ideal para a produção de lipase extracelular por Aspergillus sp.

Assim, as duas variáveis significativas (tempo e temperatura) foram selecionadas e estudadas através de um delineamento composto central rotacional (DCCR). Devido aos contrastes negativos provocados por estas variáveis no planejamento fracionário, novos níveis de estudo foram definidos para DCCR como ilustrado na Tabela 11.

Tabela 11 - DCCR com codificação e níveis das variáveis para o estudo de produção de lipase de A. terreus por FES.

Ensaio Variável codificada (real)

X1

Variável codificada (real) X2 Atividade lipolítica (U/g) 1 -1,00 (21) -1,00 (72) 63,31 ± 1,26 2 -1,00 (21) +1,00 (120) 380, 43 ± 29,47 3 +1,00 (31) -1,00 (72) 2346,47 ± 25,99 4 +1,00 (31) +1,00 (120) 804,99 ± 31,53 5 -1,41 (19) 0,00 (96) 656,97 ± 12,32 6 +1,41 (33) 0,00 (96) 726,29 ± 17,59 7 0,00 (26) -1,41 (62) 2209,53 ± 64,16 8 0,00 (26) +1,41 (130) 689,66 ± 10,45 9* 0,00 (26) 0,00 (96) 2867,18 ± 19,32 10* 0,00 (26) 0,00 (96) 2193,19 ± 6,37 11* 0,00 (26) 0,00 (96) 2802,94 ± 92,34

Legenda: X1: Temperatura (ºC); X2: Tempo (horas); *: Pontos centrais. Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Os efeitos da temperatura e tempo de fermentação sobre a resposta da atividade enzimática foram avaliados empregando o delineamento composto central rotacional 22 com triplicata no ponto central. Conforme a condição experimental adotada, a atividade enzimática variou entre 63,31 ± 1,26 U.g-1 e 2.867,18 ± 19,32 U.g-1. O menor resultado foi encontrado no ensaio 1, onde foram utilizados os níveis -1 e a maior atividade foi encontrada no ponto central.

Estes resultados sugerem que o farelo de trigo suplementado com manteiga de cacay apresenta enorme potencial para a produção de enzimas lipolíticas com aplicações cosméticas e industriais, obtendo valores de produção de lipase por FES superiores aos relatados por Mahanta et al. (2008), que encontraram uma atividade de 1.084 U.g-1 ao

produzir lipase por Pseudomonas aeruginosa utilizando a torta de semente de Jatropha

curcas como substrato.

Estudos sob condições semelhantes de tempo e temperatura de fermentação são relatos na literatura com resultados inferiores ao obtido no presente estudo após otimização por planejamento experimental. Sethi et al. (2016) encontraram uma atividade máxima de 525 ± 35,35 U.mL-1 utilizando a torta do óleo da mostarda suplementado com o óleo de palma por Aspergillus terreus a 30 ºC durante 96 horas. Mahadik et al. (2002) encontraram a maior atividade (340 ± 24 U.g-1) ao utilizar Aspergillus niger em meio com farelo de trigo combinado com óleo de gergelim a 30 ºC durante 120 horas.

A análise estatística mostrou que a variável temperatura (termo quadrático - Q) foi o único fator significativo (Figura 9), apresentando um efeito negativo.

Figura 9 - Diagrama de Pareto para avaliação do efeito estimado das variáveis do DCCR sobre a resposta da atividade enzimática.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

A temperatura é considerada como um fator fundamental para a produção enzimática visto que a saturação ideal do sítio catalítico ocorre a uma temperatura ótima. Temperaturas mais altas favorecem a produção de proteases que, por sua vez, desnaturam as lipases produzidas ao passo que baixas temperaturas reprimem o crescimento do microrganismo e, subsequentemente, reduzem sua produção (KUMAR et al., 2011; OLIVEIRA et al., 2016).

De acordo com o gráfico de superfície de resposta, em relação a resposta atividade enzimática (U.g-1) (Figura 10), o valor crítico de temperatura encontrado foi de

27,36°C, obtido pelo software Statistica 7.0, o que está de acordo com a temperatura de crescimento de microrganismos mesofílicos (GEOFFRY; ACHUR, 2018).

-2.4983 2.679308 -3.20747 -3.99058 -6.4466 p=.05

Estimativ a dos ef eitos (Valor absoluto) 1Lby 2L

(1)Temperatura(L) (2)Tempo(L) Tempo(Q) Temperatura(Q)

Figura 10 - Superfície de resposta das variáveis temperatura e tempo de fermentação sobre a resposta da atividade enzimática.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

A temperatura afeta fortemente o crescimento microbiano e, consequentemente, a produção de enzimas. Um intervalo de 28 a 32°C pode ser encontrado como ideal para a produção de lipase fúngica (SETHI; NANDA; SAHOO, 2016; SILVA et al., 2005). Pereira et al. (2019) encontraram uma temperatura ótima por volta de 28 ºC após otimização da produção de lipase por planejamento experimental. Porém, numerosos estudos revelam que a temperatura ótima é específica para cada organismo fúngico e que uma ligeira diferença no nível ótimo pode afetar o rendimento negativamente (GEOFFRY; ACHUR, 2018).

Uma análise de variância (ANOVA) foi realizada para o DCCR e um modelo polinomial de segunda ordem foi gerado para descrever a atividade lipolítica (U.g-1) (Equação 2), com os fatores temperatura (X1) e no tempo de fermentação (X2). Os

coeficientes de regressão marcados em negrito representam os termos mais significativos.

Atividade lipolítica (U/g) = 2621,97 + 354,14 X1 – 1024,65 X12 – 421,46 X2- 622,10 X22 – 464,65 X1 X2 (Equação 2)

Desta forma, os testes de análise de variância – ANOVA (Tabela 12) mostraram significância estatística para os modelos de regressão a 95% de confiança (p < 0,05), pois o valor F calculado para o modelo expressando atividade lipolítica (8,51) foi maior que o valor tabelado F1,10 (4,96).

Tabela 12 - Análise de variância (ANOVA) para o modelo estatístico.

Fonte de variação Soma

quadrática Graus de liberdade Média quadrática Valor de F Regressão 5750224 1 5750224 8,51 Resíduo 6755966 10 675597 Total 12506190 11 F tabelado (95%) F1,10= 4,96

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

A avaliação do modelo também foi realizada através da observação do gráfico dos valores preditos versus valores observados na Figura 11.

Figura 11 - Valores preditos versus valores observados para a avaliação do modelo estatístico.

-500 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 3500 Valores observados -500 0 500 1000 1500 2000 2500 3000 V a lo re s p re d it o s

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Assim, salienta-se que o modelo se mostrou satisfatório, uma vez que os valores observados experimentalmente aproximaram-se dos valores preditos pelo modelo.

5.2.4 Caracterização da lipase

O efeito do pH é um importante parâmetro para a determinação da atividade enzimática. Uma pequena variação pode reduzir sua atividade por afetar a conformação do sítio catalítico, como também mudanças extremas podem alterar totalmente a estrutura da enzima (MORAIS JUNIOR et al., 2016).

Desta maneira, ao avaliar o efeito do pH (3,0 - 10,0), foi constatado que a lipase de Aspergillus terreus foi ativa em uma ampla faixa (Figura 12), apresentando atividade máxima para o pH 7,0 (129,66%), sem diferença estatisticamente significativa (p > 0,05) para o pH 6,0 (126,12%). Vale mencionar que uma atividade relativa acima de 100% foi encontrada para os valores de pH 5,0 a 9,0.

Figura 12 - Efeito do pH na atividade da lipase produzida por Aspergillus terreus.

Legenda: Letras diferentes (a,b,c,d,e,f) indicam diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) utilizando one way ANOVA seguido do pós-teste de Tukey.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

Kumar et al. (2011) encontraram pH ótimo de 7,0 para lipase produzida em meio contendo farelo de trigo como suporte sólido não inerte. Semelhantemente, Mahmoud et al. (2015) obtiveram uma faixa ótima (pH 7 – 9) para a produção de lipase por A. terreus. A estabilidade de lipases produzidas por fungos é comumente relatada em pH alcalino e neutro. Assim, a alta atividade da lipase em pH moderadamente ácido merece ser avaliado para uma possível exploração industrial (SETHI; NANDA; SAHOO, 2016).

O efeito da temperatura na atividade enzimática é outro importante parâmetro quando se trata de processos que usam enzimas como biocatalisadores. Ao avaliar a termoestabilidade da lipase entre as temperaturas de 30 – 60 ºC, observou-se que a atividade máxima foi na temperatura de 35 ºC (100%) com diferença estatisticamente significativa (p < 0,001) para as demais temperaturas testadas (Figura 13). Entre o intervalo de 35 a 60 ºC, o aumento da temperatura levou a desnaturação e, consequentemente, perda da atividade enzimática.

Figura 13 - Efeito da temperatura na atividade da lipase produzida por Aspergillus terreus.

Legenda: Letras diferentes (a,b,c,d,e,f) indicam diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) utilizando one way ANOVA seguido do pós-teste de Tukey.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

A temperatura ótima de 37 ºC foi encontrada para a atividade de lipase por

Bacillus sp. e Yersinia enterocolitica (JAVED et al., 2018). Ao caracterizar a lipase

produzidas por Pseudoalteromonas sp., Wang et al (2012) encontraram pH ótimo de 7,0 e temperatura de 37 ºC. Kamini et al. (1998) obtiveram um pH ótimo de 7,0 e temperatura de 35 ºC como ideais para a lipase produzida por A. terreus, resultados esses semelhantes ao encontrado no presente estudo.

Íons metálicos são cofatores inorgânicos que podem participar direta ou indiretamente de reações enzimáticas (MORAIS JUNIOR et al., 2016). A interação entre íons e a carga da superfície da enzima pode afetar marcadamente a ionização de alguns resíduos de aminoácidos, alterando assim a sua conformação e, consequentemente, sua atividade (RAHMAN; BAHARUM; SALLEH, 2006). Por isso, o efeito de diferentes íons metálicos na atividade da lipase produzida por A. terreus foi avaliado.

A Tabela 13 demonstra os efeitos dos íons metálicos, agente quelante e surfactantes na atividade enzimática.

Tabela 13 - Efeito dos íons metálicos, agente quelante e surfactantes na atividade da lipase produzida por Aspergillus terreus.

Legenda: *indica diferença estatisticamente significativa (p < 0,05) do controle utilizando one way ANOVA seguido do pós-teste de Tukey.

Fonte: Dados da pesquisa, 2019.

De acordo com os resultados apresentados, nenhum íon metálico apresentou um aumento significativo na atividade enzimática. Por outro lado, os íons Ca2+, Co2+, Zn2+ e Cu2+ diminuíram significativamente a atividade lipolítica, com destaque para o cobalto e zinco (p < 0,001), que reduziram a atividade para 76,46% e 78,34%, respectivamente. Isso pode ser atribuído a interação entre íons metálicos e a superfície da enzima, o que pode afetar marcadamente a ionização de alguns aminoácidos, alterando a conformação enzimática e, consequentemente, tornando-a menos estável (RAHMAN; BAHARUM; SALLEH, 2006).

Íons metálicos Atividade relativa (%)

Na+ 98,64 ± 2,83 K+ 100,77 ± 3,40 Ca2+ 83,95 ± 1,00* Co2+ 76,46 ± 1,62* Cu2+ 88,47 ± 5,06* Mg2+ 101,29 ± 4,34 Mn2+ 92,34 ± 2,42 Zn2+ 78,34 ± 1,11* Fe2+ 94,03 ± 1,42 Ni2+ 97,04 ± 3,09

Agente quelante Atividade relativa (%)

EDTA 103,21 ± 6,28

Surfactantes Atividade relativa (%)

Triton X-100 1% 115,24 ± 3,98* Triton X-100 0,2% 110,91 ± 3,85* Triton X-100 0,02% 105,85 ± 2,90 SDS 1% 89,57 ± 3,56* SDS 0,2% 91,17 ± 4,33 SDS 0,02% 111,64 ± 2,62* Controle 100 ± 6,64

Lima et al. (2004) relataram o Cu2+ como um forte inibidor da atividade da lipase. Morais Junior et al. (2016) relataram uma inibição de 54,8% e 74,3% na presença do íon Cu2+ na atividade de lipase produzida por Geotrichum candidum e Candida rugosa, respectivamente. Uma inibição menor (11,53%), porém, estatisticamente significativa (p = 0,004) foi encontrada para o íon Cu2+ no presente estudo.

Para o Zn2+, Morais Junior et al. (2016) encontraram uma redução de 20,0% na lipase de G. candidum, semelhante ao observado neste trabalho (21,66%). Gururaj et al. (2016) encontraram uma atividade relativa de 3,81% ao avaliar o efeito dos íons Ca2+ a

10mM para a lipase de Acinetobacter sp. Rahman et al. (2006) observaram que alguns íons metálicos, incluindo Ca2+, Mn2+, Zn2+, Fe2+ e Cu2+ exerceram efeitos inibitórios para a lipase de Pseudomonas aeruginosa S5, similar ao encontrado no presente estudo.

Para o EDTA, a lipase não apresentou sua atividade significativamente afetada (p = 0,999). Lipases obtidas de Streptomyces rimosus e Streptomyces fradiae var. k11 não apresentaram atividade e estabilidade significativamente afetadas frente a presença de EDTA assim como as lipases produzidas por Aspergillus terreus NCFT 4269.10 (ZHANG et al., 2008; SETHI; NANDA; SAHOO, 2016).

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