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Produzindo um efeito de fechamento 133 

No documento 2009GrazielaThaisBaggioPivetta (páginas 134-139)

3.2 Adentrando nas análises 96 

3.2.2 Produzindo um efeito de fechamento 133 

Qualquer que seja o produto a ser divulgado, a arma clássica e amplamente explorada nos discursos publicitários é a sedução e a beleza feminina. E, quando os

produtos se referem exclusivamente ao universo feminino, a imagem da mulher é, sem dúvida, presença certa e a preocupação do anúncio estará totalmente voltada para a questão estética, tanto do produto quanto e, principalmente, do “suporte humano” que ajudará a divulgá-lo. Lipovetsky (1989) destaca que a valorização plástica do produto, as fotos altamente produzidas e trabalhadas, o refinamento dos cenários, a beleza dos corpos e dos rostos são alguns dos recursos dos quais a publicidade se utiliza para idealizar a mercadoria.

Observamos, nos quatro anúncios deste recorte, que a(s) estratégia(s) de abordagem da temática e das imagens que compõem os DPs buscam enunciar um mundo distante da rotina e dos conflitos diários vivenciados pela mulher. Não há sofrimento, angústia ou preocupação. A vida no anúncio retrata mulheres sempre tranqüilas, corpos esculturais e produtos “capacitados” a servir para qualquer mulher. É um mundo de fantasia para o qual o sujeito nem percebe que é chamado, mas atende. Atende porque se identifica, através dos mecanismos de persuasão e das formações imaginárias, com o(s) sentido(s) instaurado(s) pela FD mercadológica dominante nos DPs deste primeiro recorte. Como o próprio nome indica, ela (a FD mercadológica) quer vender a mercadoria e, ao mesmo tempo em que o sujeito-mulher se identifica com esta FD, ele constrói sentidos para o discurso com que se depara. A preocupação em vender o produto faz com que o publicitário busque também “vender” uma imagem positiva da mulher que o divulga e, a partir disso, atrair cada vez mais consumidoras. Nessa tentativa, o DP apropria-se de estratégias de marketing para fazer com que o sujeito-leitora mantenha a interpretação (cristalizada) que o próprio anúncio propõe/oferece, lembrando que, nos quatro DPs analisados até então, a FD que (pre)domina é a mesma, ou seja, a FD mercadológica. Logo, a maneira como os dizeres e a materialidade não-verbal se inscrevem nos anúncios produzem sentidos que remetem a leitora à compra da mercadoria.

A forte relação entre mídia, corpo e identidade, a repetição e a multiplicação de imagens como as exibidas neste recorte, seguem orientando o sujeito-leitora a desejar o corpo apresentado no/pelo anúncio como padrão de beleza, além de uma vida sem percalços àqueles que adquirem o produto/mercadoria. Dissimuladamente, é claro, a ideologia desempenha seu papel e a interpretação não se faz necessária, uma vez que o sentido evidente é também transparente para o sujeito-leitora/consumidora. E, na sociedade do espetáculo, o sujeito da falta, que tem a incompletude como constitutiva, é substituído pelo sujeito do excesso, do desejo, ou ainda, o sujeito do consumo. Diferente do sujeito do inconsciente em que o desejo não é atingido, o sujeito onipotente acredita tudo poder, pois

pensa que o dinheiro compra tudo e “vive na concretude dos objetos.” (CORACINI, 2006, p. 149). Eis que comprar ou ter a posse de determinados produtos (e/ou até mesmo de pessoas) se torna solução para tudo. Tudo acontece/ou se realiza em torno do consumo.

O desejo em ser admirada é inerente ao sexo feminino. E, para que os elogios se concretizem, os produtos se apresentam como “fórmulas mágicas” que “arrancarão” suspiros do sexo oposto. Produtos como lingeries e esmaltes sempre foram anúncios que marcaram presença nas revistas, o que mudou, no entanto, foi a forma de seduzir, de encantar, visto que os produtos estão aí, algumas vezes, como meros coadjuvantes, pois, na verdade, nem sempre o destaque (principal) é dado ao produto, mas sim ao corpo da mulher que o divulga. O poder de atração e de provocar a libido do sexo masculino não emana dos produtos, embora o funcionamento ideológico presente nos DPs evidencie isso, isto é, que o poder está no produto, mas constatamos que a sedução se dá ou está “encarnada” na imagem dos corpos, e/ou, para ser mais exata, em partes deles, como é caso dos bumbuns que ilustram o anúncio da Lingerie Lupo. E, através do exemplo da publicidade da Lingerie, “englobamos” neste efeito de fechamento os outros DPs deste recorte para dizer que é através da imagem (do corpo) do sujeito-mulher/modelo que as posições-sujeito se assemelham nos quatro anúncios, isto é, a posição-sujeito de femme

fatale que está relacionada ao processo de sedução, exceto no DP do Absorvente Always, onde, além da posição de sedução, a mulher ocupa a posição-sujeito de fragilidade.

O corpo é um meio tão eficaz e valorizado na divulgação de produtos que ele nem necessita estar desnudo para ilustrar uma publicidade. O corpo é poder, é sentido, é o lugar de marcas, de subjetivação. Tentando finalizar este recorte, trazemos uma citação de Orlandi em que ela menciona que “a publicidade, fora de seu lugar convencional invade, reapropriada por um gesto interpretativo do sujeito, todos os espaços disponíveis, inclusive seu corpo (primeiro a camiseta, depois a pele).” (2006b, p. 27). O simples fato de pessoas conhecidas/ “celebridades” aparecerem no anúncio emprestando seu corpo já forma redes de sentido, presentes na memória discursiva, a qual aciona outros discursos em que essas mesmas famosas aparecem mostrando novamente o corpo. Dizemos isso porque tanto Mariana Ximenes, do DP do absorvente Always Básico, quanto Daniela Cicarelli, do DP do scarpin Via Marte, são conhecidas da maioria das leitoras por cenas em programas de televisão, novelas, desfiles, enfim, por outro tipo de imagens e por usarem outro tipo de roupa. E é devido a essas outras imagens, em que as vestes são poucas, que a leitora sabe ou imagina o quanto tais famosas, literalmente, suam para ter e manter o corpo esbelto que possuem. Para confirmar isso, como não poderia deixar de ser, embora ambas estejam

usando vestidos, as pernas chamam a atenção do sujeito-leitor(a), tanto por estarem bem visíveis e em destaque quanto pela sua aparência estética. Importante também destacar que somente nos dois anúncios em que as (duas) atrizes são famosas o rosto está visível, nos demais, ou nos outros dois anúncios, não se tem a imagem do rosto, o que leva o sujeito- leitor(a) a pensar que o que importa é apenas o corpo. Na visão de Lipovetsky, a sociedade atual “uma beleza funcionalizada a serviço da promoção das marcas e do faturamento das indústrias do imaginário.” (2000, p. 182).

O corpo, no “mundo” dos anúncios, exerce fascínio e atração. Ajuda a convencer o sujeito-leitora rumo ao consumo do produto. O corpo é lugar de poder. Ele consegue mobilizar sentidos e vender os mais diferentes produtos. O DP cria modelos “de corpos” a serem seguidos/imitados, pois o corpo representa uma “arma” poderosa para persuadir, não importando se essa “arma” está ou não em partes, como verificamos no fato do rosto das mulheres aparecem apenas quando quem está protagonizando o DP é alguém famosa, porque na verdade o que está em jogo é o poder que as partes, como por exemplo, o rosto da modelo (re)conhecida, ou o bumbum da modelo desconhecida, efetua perante milhares de leitores(as).

Encerrando este efeito de fechamento, ressaltamos, de acordo com Foucault (1995), que o poder não está num dado lugar ou sob o domínio de um sujeito ou de um grupo social, mas acontece por toda a estrutura social. Ninguém escapa dele, pois o poder funciona através de práticas e o corpo é um meio dessa prática se exercer. Ainda segundo Foucault, “o exercício do poder [...] é um modo de ação de alguns sobre outros” (1995, p. 241), já que viver socialmente é conviver com a ação de uns sobre os outros, e tudo isso se enraizando no conjunto da rede social. E, nessa trama, o corpo do sujeito-mulher serve como elemento privilegiado na exibição de produtos e/ou serviços e ainda influencia outros sujeitos rumo ao desejo dos produtos ou mesmo do corpo apresentado nos DPs. Sinônimo de poder, o corpo feminino produz um discurso dotado de amplitude social, que, a cada dia, ganha/adquire mais visibilidade, tornando-se cada vez mais objeto de difusão e de desejo.

Após estas primeiras considerações, montamos, no quadro abaixo, um esquema resumido das posições-sujeito que a mulher ocupou nos quatro DPs deste primeiro recorte.

Esquema-resumo 2: as posições-sujeito do sujeito-modelo no primeiro recorte

Sentidos

Formação Discursiva

Sentidos

Mercadológica

sedução sedução fragilidade sedução sedução

Os DPs se inscrevem na FD mercadológica, sendo atravessados por sentidos que circulam, também, em outras FDs, como é o caso da FD da beleza, da FD machista, da FD feminista e da FD da ciência. Porém, estes sentidos outros não levam o produtor do DP a romper com os sentidos da FD mercadológica. Por ser heterogênea, na FD mercadológica estão representadas diferentes posições-sujeito, mas ela continua sendo uma só. Em cada discurso publicitário, a imagem da mulher representa uma única posição-sujeito exceto no DP do Absorvente Always Básico, conforme as setas indicam.

Posições-sujeito

em cada DP

DP Esmalte DP Lingerie DP Absorvente e DP Scarpin

Discurso Publicitário - DP

FD da beleza FD feminista FD da ciência FD machista

No documento 2009GrazielaThaisBaggioPivetta (páginas 134-139)