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Professor bem sucedido na visão dos alunos e professores entrevistados

CAPÍTULO 3 – IMAGENS DE PROFESSOR DIVULGADAS NA MÍDIA:

3.3 Professor bem sucedido na visão dos alunos e professores entrevistados

Como veremos adiante, foi solicitado aos alunos e aos professores que participaram da pesquisa que descrevessem um professor ou professora nota dez. Esta questão foi formulada com o objetivo de verificar a visão dos entrevistados acerca de um professor bem sucedido, isto é, que consegue fazer com que grande parte de seus alunos aprenda os conteúdos propostos e que, de modo geral, é valorizado e respeitado por seus alunos e pela equipe escolar. Usei a expressão “professor ou professora nota dez” para ajudar os participantes a pensar num excelente profissional, de modo que não tivessem dúvidas quanto ao que eu queria saber, favorecendo assim a coleta de dados. As principais características ou ações de um professor bem sucedido na visão dos alunos entrevistados são: explicar bem a matéria, não brigar, ensinar com brincadeiras e ser legal (esta última expressão explicada por eles como deixar fazer várias coisas, deixar conversar, emprestar livros, etc.).

Os professores entrevistados disseram que um professor bem sucedido “é aquele que consegue transmitir o conteúdo, que os alunos respeitam, que domina a sala, de quem os alunos gostam” (professora Bete). A professora Júlia afirmou que é aquele que “escuta os alunos, interage, escolhe bons livros, bons textos, boas atividades”. A professora Rosa disse que é preciso ter “ponderação, ser maleável, não levar a ferro e fogo, ter jogo de cintura”. Segundo a professora Selma, é “aquele que contribui, que tá sempre aberto à crítica, que vai à luta, luta por seus alunos... é firme e ao mesmo tempo é um amigo”. Segundo o professor Sérgio,

é um professor que planeja as aulas, acompanha os alunos dentro e fora da escola, tem contato com a família. Nunca vamos chegar a ser um professor nota dez porque não temos como nos aproximar mais. O número de alunos por turma é muito grande, dificulta bastante o trabalho.

As respostas dadas parecem elucidar a complexidade e a abrangência do trabalho docente. Alunos e professores mencionaram tanto os aspectos cognitivos quanto os aspectos socioafetivos no desenvolvimento da atuação profissional.

Parece que não há discrepância de conceitos entre os professores e alunos entrevistados. As respostas dos docentes parecem demonstrar intenção e esforço para atender às expectativas dos alunos, tendo em vista a aprendizagem dos estudantes. Os professores entrevistados se mostraram cientes de que

Por lidar com um ser humano e não com uma coisa inerte, o trabalho docente não se pode fundamentar exclusivamente, nem mesmo principalmente, numa ciência; ele mobilizará durante seu exercício um amplo espectro de saberes, recursos e habilidades que cobre, na verdade, várias modalidades de interação humana: afetiva, normativa e instrumental (TARDIF e LESSARD, 2007, p. 267).

De acordo com a professora Simone, regente da turma pesquisada, um professor bem sucedido é aquele que

sabe formar ou transformar seja por meio das letras, dos números, das artes, da história... enfim é aquele que mesmo conhecendo as limitações, acredita que é possível e que aquele aluno é capaz e dá as condições para que a aprendizagem aconteça.

Segundo a professora Cristina, “é aquele que não desiste, que continua acreditando, lutando, apesar de tudo”. Estas duas últimas falas coincidem com as da professora Helena, personagem da novela Carrossel, já citadas acima: “Eu não desisto fácil, pode crer”. De modo geral, parece predominar uma ideia de que os professores não têm o direito de desistir,

nem de fraquejar. Eles precisam fazer um enorme esforço pessoal para vencer todas as dificuldades e fazer com que seu trabalho dê certo. Esta imagem de professor que não desiste se incorpora a outras imagens abordadas por Arroyo:

Somos a imagem que nos legaram, socialmente construída e politicamente explorada [...]. A história das últimas décadas sobretudo se caracteriza por tentar redefinir esse imaginário, não apenas por melhorar as condições de exercer esse ofício. Criar outra cultura, mostrar outro perfil. Uma nova presença com gestos que chocam o imaginário de professora primária, de mulher bondosa, tenra, cuidadosa. Reconhecer esses traços para redefini-los em outros valores e outra cultura é um ponto de partida (ARROYO, 2010, p. 35)

Discorrendo acerca do aprendizado do ofício de mestre, Arroyo afirma que aprendemos a ser professores desde a nossa infância e que as lembranças que temos dos nossos professores fazem parte desse aprendizado. Ele ressalta que os traços de personalidade dos mestres também são incorporados à imagem que temos da docência. Segundo ele,

Assim falávamos quando alunos, e assim falam de nós: “ela é uma ótima

professora”, “ele não é um professor legal”. Esse “ele é” ou “ela é” presente

nestas frases não se refere a apenas se o mestre ensina bem, bons conteúdos, com bons métodos, mas o que ele é como pessoa, como gente, se ele escuta, se ele se dedica, é amigo(a), paciente, legal... É professor(a). Aprendeu a ser (ARROYO, 2010, p. 125).

Para Tardif e Lessard, a personalidade do professor pode ser entendida como uma tecnologia do trabalho. A pedagogia do professor se estabelece na sua relação com os alunos. Sua forma de ser e de agir, seus valores e suas crenças podem promover ou inibir a aprendizagem. Segundo os autores,

Na docência, a pessoa que é o trabalhador constitui o meio fundamental pelo qual se realiza o trabalho em si mesmo. A personalidade do trabalhador se torna, ela mesma, uma tecnologia do trabalho (TARDIF e LESSARD, 2007, p. 268).

Silva e Abud (2007) também afirmam que as características de personalidade do professor podem ser entendidas como tecnologia de trabalho. Em sua pesquisa com alunos que apresentavam bons resultados nos estudos universitários, as autoras constataram que

Quando se trata de promover a aprendizagem, os aspectos afetivos assumem a liderança, embora os aspectos cognitivos também sejam fortemente mencionados. No entanto, quando se trata de fatores que limitam ou desfavorecem a aprendizagem, os aspectos afetivos tornam-se nitidamente relevantes, e os aspectos cognitivos perdem em importância. Pode-se inferir, mediante os resultados, que a personalidade do professor, que é responsável

por gerir a interação nas condições sociais concretas da sala de aula, configura-se como uma verdadeira “tecnologia de trabalho”, uma vez que garante, ou não, a ambiência adequada ao processo de ensino e aprendizagem (SILVA, UYENO, ABUD, 2007, pp. 261, 262).

Para elas, as dimensões cognitivas e afetivas são inseparáveis. No entanto, isso não significa falta de profissionalismo. Ao contrário, evidencia que o trabalho dos professores exige “competências reflexivas de alto nível” (TARDIF e LESSARD, 2007, p. 20), por ser um trabalho interativo, complexo e multifuncional.

Em síntese, ser professor é estar diante de inúmeros desafios. De acordo com os referenciais teóricos que vimos acerca da docência, podemos inferir o que é um professor bem sucedido, isto é, que consegue fazer com que grande parte de seus alunos aprenda os conteúdos propostos e que, de modo geral, é respeitado e valorizado por seus alunos e pela equipe escolar.

Como vimos, os aspectos cognitivos e socioafetivos são determinantes para promover a aprendizagem. Assim, um professor bem sucedido é um profissional que precisa estar bem preparado, isto é, precisa estar a par das principais teorias e conhecimentos pedagógicos; ele precisa ser um perito na arte de ensinar, conhecendo muito bem os conteúdos a serem ensinados e construindo suas próprias teorias através do diálogo com os principais referenciais teóricos de sua área e da reflexão sobre a sua própria prática; também precisa saber lidar com os alunos, respeitando, valorizando e motivando os estudantes. Um professor bem sucedido é aquele que propõe problemas que despertem interesse nos alunos, fazendo com que se sintam motivados a buscar soluções, ou seja, ele consegue preparar “boas situações de aprendizagem para os alunos: atividades que representem possibilidades difíceis, mas coloquem dificuldades possíveis” (WEISZ, 2009, p.67).