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O profissional como praticante reflexivo: a contribuição de Donald Schön para a aprendizagem

2.2 Aprendizagem e aprendizagem organizacional como fator de impulso ao desenvolvimento de uma cultura de

2.2.1 O profissional como praticante reflexivo: a contribuição de Donald Schön para a aprendizagem

O ambiente organizacional está cada vez mais complexo demandando novas formas de gerir os negócios e pessoas. As pessoas por sua vez percebem a si mesmas com preparo insuficiente para enfrentar os novos desafios que lhe são impostos pelas organizações. Em situações de incertezas, conflitos de valores e de singularidade, a esses profissionais são requeridas novas competências que não se encontram nos currículos nas universidades. Friedman (1973; ARGYRIS; SCHÖN, 1974, p.4) afirma que:

As profissões necessitam de planejadores bem sucedidos, pessoas que demonstrem habilidades no manejo de relações interpessoais, de modo a desenvolver autoconhecimento, capacidade de aprender, de desenvolver a empatia mútua, e aptidão para conviver com os conflitos.

Essas competências são aprendidas em situações do dia a dia podendo ser desenvolvidas, entre outras formas, sob a orientação de profissionais mais experientes. A formação se encontra num momento de crise em relação a preparação dos profissionais que estão chegando ao mercado Eles são vistos como não competentes no desempenho de suas funções. Ao mesmo tempo em que isso acontece, acusam as universidades por não prepararem seus futuros profissionais para serem eficientes naquilo para o qual foram formados (SCHÖN, 2000).

Note-se que, os conhecimentos adquiridos não estão sendo suficientes para atender as expectativas e necessidades dos clientes neste contexto globalizado em que as exigências tornam- se cada vez maiores e mais complexas. Esses profissionais carecem não somente do conhecimento técnico do que é e como fazer - pensar técnico - mas também demanda o conhecimento de outras competências como resolução de problemas, negociação, criatividade com inovação, comunicação, relacionamento interpessoal, entre outras que são fundamentais para o novo profissional do mundo do trabalho.

Os sistemas adotados pelas instituições de ensino ainda se encontram numa linha cartesiana quanto ao rigor dos conhecimentos teóricos que devem ser ensinados, teorias, conhecimento sistematizado, não valorizando o que concerne aos conhecimentos práticos, isto é, a ligação com a prática do dia a dia. Há ainda uma distância muito grande entre o que se ensina nas universidades com o que se utiliza nos locais de trabalho.

Donald Schön (2000) busca desconstruir esse processo, da teoria desvinculada da prática, argumentando que dessa forma não permite que se desenvolvam profissionais criativos que possam dar conta das diferentes demandas que a prática lhes impõe. O autor propõe uma

formação profissional que integre teoria com prática, em um ensino reflexivo, baseado no processo de reflexão-na-ação, ou seja, um ensino em que aprender fazendo seja privilegiado; um ensino cuja capacidade de refletir seja estimulada na interação professor-aluno em diferentes situações práticas.

Schön (2000) chama de talento artístico profissional as competências que o profissional precisa desenvolver para atuar com eficiência em situações de incerteza, singularidade e conflitos de valores. Nestes momentos é importante não somente o conhecimento técnico, que atende a resolução de problemas técnicos, mas também é preciso integrar, conciliar e escolher apreciações conflitantes de uma situação. Porém, tais competências requeridas não se encontram nos currículos nas universidades. O talento artístico é demonstrado pelo indivíduo no dia a dia, nos seus comportamentos de reconhecimento, julgamento e performance habilidosa. Entretanto, ao mesmo tempo em que é um tipo de comportamento familiar que se demonstra, ele não depende da capacidade do indivíduo de descrever o que sabe fazer e não tem consciência do conhecimento que apresenta em suas ações.

Esse saber é conhecido como conhecimento tácito, cunhado por Michael Polanyi em seu livro The Tacit Dimension (1967), conforme destaca Schön (2000). O talento artístico é aprendido através da reflexão-na-ação. Ao realizar processos de reconhecimento e apreciação em suas ações, muitas vezes, o indivíduo faz julgamentos normativos imediatos que considera como “certo” ou “errado”. Isso evidencia a forma como se aprende novas habilidades. Barnard (1938/1968; SCHÖN, 2000) refere aos processos não-lógicos através dos quais se realizam julgamentos habilidosos, decisões e ações que se tomam espontaneamente, sem que se possam declarar as regras ou os procedimentos que se seguem. Seria o repensar da educação para a prática reflexiva através da preparação dos estudantes para a sua atuação competente em zonas de incerteza da prática para a busca da competência profissional. Conforme Maturana e Varela (1995, p.67) “refletir é um ato de nos voltarmos para dentro para conhecer como conhecemos, aproveitando a única oportunidade de descobrir nossas cegueiras”.

Schön (2000) usa a expressão conhecer-na-ação para referir-se aos tipos de conhecimento que o indivíduo revela em suas ações inteligentes. O ato de conhecer está na ação, sendo uma característica incapaz de torná-la verbalmente explícita.

Às vezes é possível fazer uma descrição do saber tácito que está implícito na realização das ações realizando descrições de diferentes formas a depender do propósito e da linguagem disponível. Por exemplo, às seqüências de operações e procedimentos que se executam, as regras, valores, estratégias e pressupostos que formam as teorias da ação do indivíduo. Essas descrições precisam ser testadas, pois o processo de conhecer-na-ação é dinâmico, mas os fatos, os

procedimentos e as teorias são estáticos. O conhecer-na-ação é um processo contínuo de detecção e correção de desvios de forma a se converter em conhecimento-na-ação (SCHÖN, 2000).

O autor enfatiza que quando se aprende a fazer algo, a atividade é realizada sem pensar em como se realizar, e ao final, se alcança bons resultados. Mas, nem sempre é assim. Esse ato espontâneo, às vezes, produz um resultado inesperado, um erro teima em resistir à correção, ou há algo que faz vê-la de outra maneira, tornando um elemento surpresa, isto é, algo que está em desacordo com as nossas expectativas.

Em uma tentativa de preservar a constância de padrões de conhecer-na-ação, pode-se responder à ação ignorando os sinais ou responder a ela através da reflexão-sobre-a-ação, através de duas formas: após a realização do ato ou fazer uma pausa no meio da ação, para parar e pensar. Arendt (1971; SCHÖN, 2000, p. 32) diz que “dessa forma, levaria o indivíduo a interferir na situação em desenvolvimento”. O processo de inventar novos procedimentos para resolver o problema, fazer correções com o intuito de levar a diante a ideia e ação em realização, chama-se de tentativa e erro (SCHÖN, 2000). Observe-se que as tentativas não se relacionam entre si, mas, a reflexão sobre cada tentativa e seus resultados prepara o campo para uma próxima.

Para Schön (2000, p. 33) o processo de reflexão-na-ação segue a seguinte sequência de movimentos:

- Para iniciar, existe uma situação de ação para a qual se traz respostas espontâneas e de rotina que apresentam um processo de conhecer-na-ação que pode ser apresentada como estratégias, compreensão de fenômenos e maneiras de criar uma tarefa ou problema adequado a situação.

- As respostas de rotina produzem uma surpresa, um resultado não esperado que pode ser agradável ou desagradável, que não se enquadra nas categorias do conhecer-na-ação, e, por isso, chama à atenção do indivíduo.

- A surpresa, leva à reflexão dentro do presente-da-ação que é de algum modo consciente.

- A reflexão-na-ação tem uma função crítica, questiona a estrutura de pressupostos do ato de conhecer-na-ação e nesse momento, se podem reestruturar as estratégias de ação, as compreensões dos fenômenos, e, as formas de conceber os problemas.

- A reflexão gera o experimento imediato, ao se pensar e experimentar novas maneiras de agir, testar os entendimentos experimentais, ou afirmar as ações que se inventou para mudar as coisas para melhor. Os experimentos imediatos podem atender os resultados almejados ou podem produzir surpresas que venham a exigir uma maior reflexão e experimentação.

Desse modo, para Schön (2000) as pessoas em sua maioria, pensam sobre o que fizeram ou estão fazendo. Ele chama de reflexão-na-ação quando refletimos na ação e de reflexão-sobre- a-ação quando refletimos sobre a ação.

Pensar nos ajuda a dar uma nova forma ao que estamos fazendo. Conhecer-na-ação é um processo tácito, espontâneo, sem deliberação consciente e que funciona propiciando os resultados

que se pretende alcançar. De forma crítica, pensa-se sobre o pensamento que nos levou a uma situação difícil e as oportunidades que se tem de reestruturar e enfrentar a situação ou problema. O conhecimento é construído através da reflexão dos indivíduos durante e após a experimentação prática.

Nessa linha de pensamento há um aumento do aprendizado durante a própria prática. A reflexão presente sobre a reflexão-na-ação anterior dar-se-á através de um diálogo de pensar e fazer através do qual o indivíduo pode tornar-se um profissional habilidoso capaz da geração de novas ideias e formas de atuar mais eficazes, podendo trazer valiosas contribuições para si e para a organização.

Indivíduos que são acostumados a improvisar utilizam desse tipo de aprendizagem para enfrentar novos desafios e novas situações, pois refletir sobre nossa reflexão-na-ação passada pode configurar indiretamente nossa ação futura.

A improvisação compreende a variação, combinação e recombinação de um conjunto de figuras dentro de um esquema que propicia uma estrutura coerente. Pode-se exemplificar uma conversação como uma improvisação verbal coletiva. Em alguns momentos ela aparece em rotinas convencionais e em outros pode haver surpresas, ou mudanças inesperadas, levando os participantes a inventar respostas imediatas.

Logo, pode-se inferir que para o desenvolvimento de profissionais criativos e inovadores é preciso não desvincular a teoria da prática, cujo aprender através do fazer seja privilegiado, um aprender estimulado pela interação e prática da reflexão na ação e sobre a ação contribuindo dessa forma, para resultados mais satisfatórios nas organizações.

A seguir apresenta-se uma teoria que aborda como tornar as ações competentes no dia a dia da organização, com base na aprendizagem.