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Estudos realizados em nosso laboratório demonstraram que animais submetidos à restrição proteica gestacional (grupo low protein – LP, 6% de teor proteico na ração), nascem com peso corpóreo menor, com cerca de 28% menos de nefros (Figura 6) e, a partir da oitava até a 16ª semana de vida, apresentam maiores níveis pressóricos (Figura 4).

Figura 4 - Pressão arterial sistólica em machos de prole cujas mães receberam dieta normal

(17% caseína) ou hipoproteica (6% caseína) somente durante a gestação e durante a gestação e a amamentação (dados não publicados).

Nosso grupo também demonstrou em animais LP, a reduzida expressão dos receptores tipo 1 e 2 (AT1R e AT2R, respectivamente) de angiotensina II e das proteínas envolvidas na sua via de sinalização (Figura 5) (71). Adicionalmente, a hipertensão nos animais LP com 16 semanas de vida esteve associada ao aumento na reabsorção de sódio pelo nefro proximal resultando em retenção de sódio (60,72).

Figura 5 - Representação esquemática dos efeitos renais da restrição proteica gestacional -

Adaptado de Boer, 2017 (2).

No ano de 1988, Brenner e colaboradores (73)sugeriram que a deficiência congênita no número de nefros, predispõe à redução na excreção renal de sódio aumentando a susceptibilidade à hipertensão arterial. Atualmente, temos vários modelos de desenvolvimento programado associando a redução no número de nefros à hipertensão arterial e demonstrando que a perda de nefros gera hipertrofia compensatória dos glomérulos remanescentes (aumentando seu volume) e hiperfiltração (aumento da taxa de filtração glomerular para cada nefro) a fim de sustentar a função renal, o que causa sobrecarga funcional e perda precoce de podócitos (Figura 6) (58,60,74,75).

↑ 50 % reabsorção proximal

↓ 47 % reabsorção pós proximal

↓ 50 % uirnário

↓ AT2R ↓ AT1 e AT2R

14.5 dias

gestacionais

16 semanas

12 dias pós -

natal

Figura 6 - Representação esquemática do corpúsculo renal mostrando sua estrutura em

indivíduos saudáveis e as possíveis alterações provocadas pela redução no número de néfrons (2).

A hipertensão arterial está diretamente associada ao bom funcionamento da bomba de Na+K+ATPase que é uma proteína transmembrana que garante o transporte Na+ - K+ mesmo contra o gradiente de concentração (13,72). Este mecanismo é importante para vários processos fisiológicos, dentre eles a manutenção do equilíbrio hidroeletrolítico e a regulação da pressão arterial. No néfro, esta proteína se localiza principalmente no início do túbulo proximal onde cerca de 70% de Na+ e K+ são reabsorvidos junto com a glicose, Cl- dentre outros

Podócito parietal

Indivíduos

programados com

números de nefros

reduzidos

Célula epitelial parietal parietal Matrix mesangial A redução na área de filtração glomerular e hiperfluxo promovem aumento do diâmetro capilar (1) e descolamento e perda de podócitos (2) As células epiteliais parietais podem aumentar a migração e a diferenciação em novos podócitos (3) ou proliferar produzindo crescentes (4), caracterizada por fibrose

pericapilar (5), esclerose do tufo capilar (6), proliferação de células Podócito visceral

solutos. Essa bomba também é encontrada na porção espessa ascendente da alça de Henle onde aproximadamente 25% de NaCl, K+, Ca2+ são reabsorvidos e no início dos túbulos distais onde pouco mais de 5% de NaCl são reabsorvidos. Logo, alterações na expressão desta proteína poderiam ocasionar um prejuízo nos processos de reabsorção, interferindo no equilíbrio hidroeletrolítico (72).

Outro componente chave envolvido nos mecanismos de controle da pressão arterial é o Sistema Renina – Angiotensina – Aldosterona (SRA). A Angiotensina do tipo II atua preferencialmente via 2 tipos de receptores, o tipo 1 (Angiotensin II receptor type 1 - AT1R) e o tipo 2 (Angiotensin II receptor type 2 - AT2R), a maior parte dos efeitos fisiológicos da Angiotensina II ocorre via receptor do tipo AT1R, que são distribuídos amplamente em todos os órgãos (76). Já a expressão de AT2R diminui após o nascimento, no entanto pode ser induzida por uma situação patológica. Em adultos, este receptor também é expresso no pâncreas, coração, rim, adrenal, miométrio, ovário, cérebro e vasculatura (71,72). Uma vez que a Angiotensina II se liga ao receptor AT1R/AT2R, é ativada uma série de cascatas de sinalização. Uma das vias de sinalização da Angio II é a via JAK (Janus kinases) / STAT(Signal Transducer and Activator of Transcription proteins). Nesta via, a Angio II, ao ligar-se ao AT1R/AT2R ativa a JAK-2 levando a fosforilação de STAT. Ou seja, JAK fosforila STAT que são translocadas para o núcleo, onde ativam a transcrição destes genes. No entanto, temos outras vias paralelas de ativação de JAK e de STAT que independem da ação de angiotensina II.

Temos também as sintases de óxido nítrico (NOSs) que são uma família de enzimas responsáveis por catalisar a produção de óxido nítrico (NO). O NO é uma importante molécula de sinalização celular envolvida diretamente na manutenção do tônus vascular e na regulação da pressão sanguínea(77,78). Também atua na secreção de insulina, no tônus das vias aéreas e no peristaltismo, e ainda está envolvido na angiogênese e no desenvolvimento neural (79–83).

Três genes distintos codificam as diferentes isoenzimas NOS: neuronal (nNOS ou NOS-1), indutora de citocina (iNOS ou NOS-2) e endotelial (eNOS ou NOS-3). iNOS e nNOS são solúveis e encontram-se predominantemente distribuídas no citoplasma, enquanto a eNOS está associada à membrana (80).

Em contrapartida a Superóxido Dismutase (SOD) corresponde a uma família de enzimas que faz parte do sistema enzimático de defesa contra a formação de espécies reativas de oxigênio. Em humanos, existem descritas três isoformas de superóxido dismutase. A SOD1 encontra-se no citoplasma celular, a SOD2 predominante nas mitocôndrias e SOD3 no líquido extracelular (84).

Um evento importante presente no desenvolvimento de diversas doenças renais é a transição epitélio mesenquimal (TEM) onde TGF β (fator de crescimento transformante-β) é tido como principal fator indutor. A TEM é um processo biológico que permite que uma célula epitelial polarizada, sofra inúmeras modificações bioquímicas e morfológicas, assumindo fenótipo de célula mesenquimal, passando a ter maior capacidade migratória, invasiva, resistência à apoptose e produção de componentes da MEC (Matriz Epitélio Mesenquimal)(85). A TEM pode ser classificada em três diferentes subtipos, baseando-se no contexto biológico em que estaria ocorrendo. A TEM tipo I estaria associada com a implantação, embriogênese e desenvolvimento do órgão – as células mesenquimais possuem duas características chave importantes no desenvolvimento embrionário: são capazes de migrar através de uma matriz extracelular e subsequentemente se diferenciar em muitos tipos celulares diferentes da linhagem mesenquimal, incluindo fibroblasto. A TEM tipo II estaria relacionada com a regeneração tecidual e fibrose e a do tipo III ocorreria em células neoplásicas (Figura 7) (86,87).

Figura 7 - Representação esquemática das diferentes transições epitélio-mesenquimais. A) Tipo

I, está associado com a embriogênese e implantação. B) Tipo II, relaciona-se com a regeneração tecidual e fibrose. C) Tipo III, ocorre em células neoplásicas - Adaptado de Scanlon et al, 2013 (88).

Em nosso trabalho abordaremos a TEM do tipo II, que está associada com mudanças na expressão de proteínas que afetarão os componentes das junções intercelulares, as moléculas envolvidas na interação célula - ECM, os componentes do citoesqueleto e reguladores transcricionais. Associado aos eventos citados acima, uma grande variedade de ativadores ou supressores transcricionais são utilizados para gerar as alterações características que ocorrem durante TEM (86).

Um impulsionador da TEM durante a fase fibrogênica da fibrose renal parece envolver vários fatores de crescimento profibróticos, especialmente o TGFβ (87,89,90). TGF-β1 pertence à superfamília de proteínas TGFβ, que são expressas em todos os tipos celulares de mamíferos. TGFβ1 é o mais estudado, tem sido descrito como o mais potente indutor de TEM, tendo a capacidade de iniciar e completar o ciclo completo do processo de TEM (89). O TGF-β1 é uma citocina pró inflamatória e tem como função regular a proliferação celular, apoptose, resposta imune e inflamatória. O TGF-β provoca sinalização através de três receptores diferentes presentes na superfície celular: tipo I (RI), tipo II (RII) e tipo III (RIII) (91). Existem três membros da família TGF-beta, TGF-β1, TGF-β2 e TGF-β3, que são codificados por genes distintos e são expressos de uma forma tecido-específica. As proteínas TGF-β são sintetizadas como proteínas precursoras que são clivadas e remontadas em associação com outras proteínas para formar complexos latentes (92).

O TGF-β provoca o aumento da expressão de Zinc finger E-box-binding homeobox (ZEB) (93). O Zinc finger E-box-binding homeobox 1 (ZEB1) é um fator de transcrição que tem função essencial nas modificações morfológicas durante a transição epitélio-mesenquimal (a superexpressão do ZEB1 no câncer estaria associada à repressão da E-caderina e da EMT; também poderia atuar como um ativador transcricional direcionado em parte aos genes mesenquimais, como colágenos, actina do músculo liso, miosina e vimentina importantes na diferenciação mesenquimal)(94–98). Também já se tem conhecimento que aumento na expressão de ZEB1 leva a um desequilíbrio na retroalimentação negativa dele e pode alterar a expressão de alguns microRNAs, como os da família miR200, que garantem o fenótipo epitelial e resguardam a integridade funcional das estruturas renais(93,99).

Além disso, temos o envolvimento dos hormônios, particularmente os componentes do eixo GH-sistema IGF (hormônio de crescimento – fatores de crescimento insulina-símile ou insulin-like growth factors), somados à herança genética que constituem o grupo de fatores que diretamente influenciam o crescimento (100). O GH exerce suas ações mediante um receptor específico (GHR - Growth hormone receptor), que é membro da família dos receptores de citocinas. O GHR apresenta um domínio extracelular, uma porção transmembrana e um domínio citoplasmático. A transmissão do sinal ocorre mediante a ativação e a fosforilação da enzima JAK2 (Janus kinase 2) e de resíduos do domínio intracelular do GHR, o que resulta no engajamento de diversas proteínas de sinalização intracelular, incluindo as da família STAT, e também componentes da via das MAP (mitogen-activated protein – ERK1/ERK2) quinases (100).

Por fim, a interleucina-6 (IL-6) é uma citocina responsável por regular a resposta imune e inflamatória, no entanto também está envolvida na hematopoiese, no metabolismo e no desenvolvimento de órgãos (55). A IL-6 pode, simultaneamente, desencadear processos fisiopatológicos distintos ou mesmo contraditórios, os quais são provavelmente discriminados pelas cascatas da via de sinalização, denominada clássica e trans-sinalização (101,102). Várias células podem ser produtoras de IL-6 incluindo podócitos, células mesangiais, células endoteliais e células túbulo-epiteliais (103). Entretanto, apenas as células podocitárias apresentam o receptor (IL-6 R) e todas estas células, bem como as células imunitárias e inflamatórias, responderão ativamente à IL-6 através da via clássica e / ou trans-sinalização (104). Além disso, a IL-6 poderia promover a proliferação de podócitos de forma autócrina. A IL-6 também pode ser utilizada como um possível marcador de lesão renal, e seus níveis podem refletir a gravidade da inflamação crônica encontrada na doença renal, bem como associar desfechos clínicos desfavoráveis, como aterosclerose acelerada e doença cardiovascular (103,105,106).

1.7 MECANISMOS DAS ALTERAÇÕES RENAIS PROVOCADAS PELA

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