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PARTE II – CONTEXTUALIZANDO AS COMUNIDADES ESTUDADAS

2.4 Projeto de Assentamento Redenção: breve passeio pela sua história

O Projeto de Assentamento Redenção fica a 7 km da cidade de Pilões, na região da Borborema, na Mesorregião do Agreste e na microrregião do Brejo Paraibano. Este município se distancia 117 km da capital João Pessoa e limita-se com os municípios de Serraria, Alagoinha, Cuitegi, Pilõezinhos e Areia.

Figura 23 - Paisagens do PA Redenção

Fonte: Arquivo Lucileide Paz, 2012.

O Assentamento Redenção, conforme relato dos moradores teve sua origem na história das famílias trabalhadoras rurais da antiga usina Santa Maria fundada em 1931. No ano de 1975, a produção aumentou bastante com o incentivo governamental através do Instituto de Açúcar e Álcool (IAA) e do Programa Nacional do Álcool (PROÁLCOOL) e, consequentemente, a economia nos municípios da região; contudo, cresceram também as tarefas dos agricultores que passaram a trabalhar no mínimo 12 horas por dia para dar conta da demanda de produção e assim aumentar os lucros do patrão.

Os empregados da usina acabaram sendo mais explorados, uma vez que viviam exclusivamente para o trabalho, sem direito ao descanso, lazer e cidadania. Sem falar no pagamento que acontecia em forma de vale que mal dava para pagar a conta da mercearia que era da família do patrão. Segundo o depoimento de uma assentada em entrevista concedida à educadora Maria Joseane Souza em 10 de setembro de 2008 no Assentamento Redenção,

O dono da Usina fazia os homens trabalharem de domingo a domingo, às vezes até tarde da noite, pagava uma miséria, nós não tínhamos tempo nem

de fazer a feira de casa, quando saíamos nos domingos para ir comprar a comida, logo chegava um representante da Usina obrigando os trabalhadores a voltar para trabalhar imediatamente caso seria descontado o dia de serviço ou se não perderiam o emprego.

Nesse depoimento fica evidente a prática de trabalho escravo na Usina Santa Maria e como os empregados estavam sendo mantidos no regime de exploração. Essa situação aponta o desrespeito à pessoa humana refletido na forma de tratamento dos administradores para com seus funcionários. Inconformados com essa situação os moradores começaram a se organizar em busca de seus direitos. A primeira mobilização aconteceu no ano de 1984. Nesse momento eles tiveram o apoio do Sindicato dos Trabalhadores Rurais (STR) do município de Pilões e da Federação dos Trabalhadores Rurais da Agricultura (FETAG), que juntos reivindicavam dos patrões o décimo terceiro salário.

Em resposta a essa mobilização foi dada uma gratificação, todavia os direitos não foram pagos. Mesmo assim, continuaram exercendo suas funções, mas, não desistiram de lutar por seus direitos. Em virtude das manifestações, a Justiça do Trabalho acatou as reivindicações, e como já era de se esperar, os patrões não cumpriram sua parte. Com isso foi designado um delegado de base que era assim chamado o trabalhador que ia representar os demais em eventos e reuniões que aconteciam escondido do patrão, tendo a função de informar ao sindicato tudo que acontecia. Essa foi a única forma que encontraram para se proteger de possíveis ameaças e agressões que viessem a sofrer.

Em cada propriedade da Usina Santa Maria havia um arrendatário. O das comunidades Mercês e Cantinhos, onde atualmente fica o Projeto de Assentamento Redenção, em 1987, entregou a terra para o dono da usina e este assinou a carteira dos operários, todavia não pagava seus direitos.

No Governo de Fernando Collor de Melo, quando foram bloqueados, por dezoito meses, os depósitos das pessoas físicas que tinham acima de 100 cruzados13, a situação da usina ficou complicada, não tinha como pagar os empregados; então, a Usina deu férias coletivas a todos os operários durante um mês e quando retornaram às atividades continuaram sem receber. Essa situação levou o STR de Pilões a orientá-los a entrarem na justiça para cobrar novamente seus direitos, pois, ficaram em uma situação ainda pior, passando fome e sem ter como cultivar a terra. Isso se confirma na fala de uma moradora no trecho de uma entrevista concedida à educadora Joseane em 10 de setembro de 2008, quando diz:

13 Nome dado à moeda brasileira de 28 de fevereiro de 1986 a 15 de janeiro de 1989 quando foi substituída pelo

Quando a usina entrou em falência ficou mais difícil, apesar de ser pouco, o salário ajudava na alimentação, com essa situação de decadência da Usina se trabalhava a semana inteira e não recebia nada pelo serviço, muita gente passou fome, mas, mesmo assim, continuavam trabalhando com esperança de receber.

Em circunstância do que estava acontecendo um agricultor fez uma denúncia através de uma carta enviada à Rádio Rural de Guarabira para o programa “Alerta Trabalhador Rural” e, por isso, sofreu ameaça de morte, e pediu proteção à Igreja Católica na pessoa de Dom Marcelo Carvalheira, bispo da diocese de Guarabira na época, que o encaminhou para o advogado da CPT, que tratou de resolver a situação e o agricultor de posse de uma carta encaminhada pelo bispo ao dono da fazenda se livrou da morte.

Sabendo de todo o sofrimento que aquelas pessoas estavam passando, representantes da Igreja Católica tomaram a iniciativa de fazer uma campanha para arrecadar alimentos para doar aos trabalhadores daquela localidade. A campanha foi importante tanto para amenizar a fome daquelas pessoas como também no sentido de chamar a atenção das autoridades para o que estava acontecendo na Usina Santa Maria.

No ano de 1991 houve uma mudança na administração da usina e esta passou a ser chamada de Agroindústria. Em 06 de janeiro de 1992 foi realizada uma reunião no sindicato porque os moradores estavam sendo ameaçados de serem expulsos das terras, que seriam utilizadas exclusivamente para a criação de gado. Os trabalhadores sofriam constantes ameaças dos capangas armados com espingardas 12 e revólveres calibre 38.

A partir de então, uniram-se aos Movimentos Sociais, resistiram às ameaças e começaram a luta pela terra. Diante dessas questões se mobilizaram e se reuniram no INCRA para reivindicar seus direitos. Na luta puderam contar com o apoio do deputado Luís Couto e do Padre Adelino que organizaram uma sessão especial na Assembleia Legislativa do Estado da Paraíba com a finalidade de os moradores reivindicarem do Estado a desapropriação das terras. Igualmente, aconteceu na cidade de Areia um ato público com o mesmo propósito. Nesse evento tiveram o apoio das seguintes entidades: STR; Serviço de Educação Popular (SEDUP); CPT; UFPB e da Igreja Católica.

Em meio a todas as lutas, em busca da permanência na terra, em 15 de fevereiro de 1993, foi decretada oficialmente a falência da Usina Santa Maria, mas a desapropriação de parte das terras só aconteceu em 1997. Das nove Áreas de Assentamento criadas, uma é o Projeto de Assentamento Redenção. A imissão de posse foi dada no dia 05 de fevereiro de 1997 na sede da comunidade. Na ocasião estavam presentes o Padre Luiz Pescarmona, da diocese de Guarabira, coordenador da CPT-Brejo e o superintendente do INCRA.

Na comunidade tem a igreja católica Nossa Senhora das Dores; a Casa Sede onde reuniões e assembleias dos moradores são realizadas; a Escola Municipal de Ensino Fundamental Roberto de Meneses Lins que atende as crianças da localidade e a Biblioteca Rural Arca das Letras onde as professoras levam os alunos para estudar e as pessoas podem pegar livros emprestados para ler em casa. Este também é um espaço onde ocorrem os encontros do grupo de jovens “Plantando para colher”.

Figura 24 – Igreja Nossa Senhora das Dores Figura 25 – Casa Sede do PA Redenção

Figura 26 - E.M.E.F. Roberto de Meneses Lins Figura 27 – Biblioteca Rural Arca das Letras

Fonte: Arquivo Lucileide Paz, 2012.

Depois da posse foi feita a localização das extremidades da propriedade e o mapa do assentamento para realizar o parcelamento das terras. Em seguida, foi criada a Associação dos Moradores, por exigência do INCRA, pois só através desta viriam os benefícios do Governo

Federal. No momento atual a associação conta com 120 sócios e residem na comunidade 94 famílias de assentados e 23 famílias de agregados14.

Para realizarmos nossa pesquisa fizemos várias visitas ao PA Redenção e já na primeira que aconteceu no dia 30 de março de 2012 conhecemos o presidente da Associação dos Moradores que, prontamente, nos autorizou a realizar o estudo na comunidade. No dia 22 de julho voltamos ao assentamento com o intuito de marcar as entrevistas, mas dessa vez não encontramos a educadora Maria Joseane e sua casa estava fechada; não havia ninguém para nos receber, e então tivemos que voltar. Deixamos um recado e durante a semana conseguimos contato por telefone e marcamos outra visita para o dia 04 de agosto. Nesse dia fizemos cinco entrevistas e andamos bastante pela comunidade.

Na conversa que tivemos com a educadora Maria Joseane ela se emocionou e, por várias vezes, não conseguiu conter as lágrimas ao falar da sua relação com as pessoas, de sua prática docente e ainda da sua trajetória como estudante do Curso de Licenciatura em Pedagogia do PRONERA da UFPB e nós também nos emocionamos ao ouvi-la falar com tanto sentimento, prazer e alegria de poder estar contribuindo de forma tão significativa com o seu povo, sobretudo no aspecto da educação. Diante de tudo isso e da fala dos demais entrevistados podemos dizer que Joseane é uma educadora popular; as pessoas que convivem diariamente com ela e nós também temos muito respeito e admiração pela profissional humana, responsável e comprometida que ela é em tudo o que faz.

A pesquisa de campo nos proporcionou conhecer mais ainda o dia a dia das comunidades visitadas e como se dá a organização das mesmas. Foram momentos de aprendizagens, nos quais os agricultores e agricultoras entrevistados(as), em seus depoimentos, nos falaram da importância e satisfação em ter nos assentamentos profissionais com formação superior e específica dentro da proposta de educação pensada e desenvolvida nos Movimentos Sociais do campo.

Nessa perspectiva é que desenvolvemos a terceira parte deste trabalho na qual refletimos sobre as reivindicações dos Movimentos Sociais, especificamente os do campo, acerca de direitos negados ao longo da história do nosso país, dentre eles, o direito a uma educação pública e de qualidade para todos.

14 São parentes e amigos dos agricultores que moram no assentamento, mas não são beneficiários diretos do

PARTE III - A EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA CONSTRUÇÃO DOS