METODOLOGIA DA PESQUISA
3.1. PROJETO ATLAS LINGUÍSTICO DO BRASIL: REVELANDO FALARES, DESCORTINANDO A LÍNGUA EM USO
A proposta de um atlas linguístico nacional do português do Brasil foi lançada oficialmente em 20 de março de 1952, quando da publicação do Decreto-Lei 30.643, em que o governo brasileiro determinou, como principal finalidade da Comissão de Filologia da Casa de Rui Barbosa, a elaboração de um Atlas linguístico do Brasil.
Todavia, essa proposta de um atlas nacional foi retomada apenas em 1996, em Salvador, Bahia, por ocasião do Seminário “Caminhos e perspectivas da geolinguística no Brasil”, quando tomou forma não só a proposta do texto legal
quanto a ideia plantada por filólogos e linguistas como Serafim da Silva Neto, Antenor Nascentes, Celso Cunha, que defendiam a proposta de se iniciarem os estudos geolinguísticos no Brasil pelos atlas regionais, o que se concretizou e teve como precursor inicial o trabalho coordenado por Nelson Rossi, que deu origem ao
Atlas Prévio dos Falares Baianos (1963). Outros pesquisadores deram continuidade
à execução de atlas regionais, que contribuíram e contribuem ainda hoje com suas experiências, no que diz respeito à metodologia e especialmente ao viço e à paixão pela pesquisa dialetológica.
Esse intervalo de tempo, de quase cinquenta anos, entre o tema ter sido matéria de lei e a sua execução de fato deve-se a diversos fatores, dentre eles, a escassez de pesquisadores na área da Dialetologia e, especialmente, as dificuldades de se percorrer a vasta extensão territorial do Brasil, principalmente nos idos de 1950.
Então, decorrido esse tempo e tendo também se desenvolvido as pesquisas dialetológicas que deram origem a seis atlas publicados no Brasil28, a proposta de um atlas nacional tomou forma e deu origem ao Projeto Atlas Linguístico do Brasil (Projeto ALiB), que visa a
[...] documentar o país de Norte a Sul, de Leste a Oeste, e lembrando [Antenor] Nascentes, „do Oiapoque ao Chuí‟: são 250 pontos a constituírem a sua rede de localidade que reunirão 1.100 informantes a serem documentados (CARDOSO, 2006, p. 29).
28
Além do Atlas Prévio dos Falares Baianos (1963), foram publicados também o Atlas Linguístico do
Sergipe (1973), o Esboço de um Atlas Linguístico de Minas Gerais (1977), o Atlas Linguístico da Paraíba (1984), o Atlas Linguístico do Paraná (1990) e o Atlas Linguístico-Etnográfico da Região Sul do Brasil (2002) (PROJETO ALIB. ATLAS NACIONAIS. Disponível em:
Isso com o objetivo mais amplo de documentar a variante brasileira do português em uso nas localidades pesquisadas, com vistas a mapear todo o território nacional e a gerar uma fotografia da língua tal qual se realiza. Dessa forma, o produto dessa pesquisa poderá fundamentar outros estudos na área, bem como auxiliar o próprio ensino da língua portuguesa, que poderá ser vista e conhecida em sua feição real.
Esse Projeto é de natureza pluridimensional, é focado na área urbana e é de alcance nacional, com sede na Bahia, coordenado por um comitê interinstitucional composto por 09 integrantes ligados a 09 Instituições de Ensino Superior brasileiras. Há a diretora presidente, Profa. Suzana Alice Marcelino da Silva Cardoso, da Universidade Federal da Bahia, a diretora executiva Profa. Jacyra Andrade Mota, também da UFBA e mais 07 diretores científicos (Abdelhak Razky – Universidade Federal do Pará; Maria do Socorro Silva de Aragão – Universidades Federais do Ceará e da Paraíba; Ana Paula Antunes Rocha – Universidade Federal
de Ouro Preto; Vanderci de Andrade Aguilera – Universidade Estadual de Londrina; Aparecida Negri Isquerdo – Universidade Federal de Mato Grosso do Sul; Felício Wessling Margotti – Universidade Federal de Santa Catarina e Cléo Wilson Altenhofen – Universidade Federal do Rio Grande do Sul).
O Projeto ALiB faz uso de um questionário linguístico para a coleta de dados em uma rede de pontos composta por 250 localidades, tendo como informantes brasileiros naturais dessas localidades de acordo com um perfil previamente estipulado.
Quanto à rede de pontos, foram selecionadas, dentre as 250 localidades, capitais e localidades do interior, definidas de acordo com a proposta inicial de Nascentes, como mencionara Cardoso (2006) e também de acordo com a
importância sócio-histórico-geográfica dessas localidades. Em relação aos informantes, o Comitê de Coordenação Nacional do Projeto ALiB definiu o seguinte perfil: sexos masculino e feminino, de duas faixas etárias (18 a 30 e 50 a 65 anos),
escolaridade: Ensino Fundamental (nas capitais e localidades do interior) e Ensino
Superior (nas capitais), nascidos e criados na localidade pesquisada e de pais
também provenientes dessa mesma região linguística. São inquiridos 04 informantes
em cada localidade do interior e 08 em cada capital, para privilegiar, além dos
aspectos diatópicos, dimensões diagenéricas, diageracionais e diastráticas.
Já em relação ao questionário, o instrumento de coleta contempla realizações fonético-fonológicas (159 perguntas); prosódicas (11 questões); semântico-lexicais – 14 áreas semânticas (202 perguntas); morfossintáticas (49 questões); pragmáticas (04 perguntas) e metalinguísticas (06 perguntas), além de quatro temas para discursos semidirigidos e um texto para leitura.
Segundo dados disponíveis no site do Projeto, já foram concluídos 93,6% das localidades a serem pesquisadas, com entrevistas com 1.036 dos 1.100 informantes, totalizando 80% dos Estados com inquéritos concluídos29. Assim, faltam apenas 16 localidades das 250 do total, a serem visitadas (PROJETO ALIB,
2012. Disponível em http://twiki.ufba.br/twiki/bin/view/Alib/WebHome).
Dessa forma, o projeto vai caminhando para outras fases de sua
execução, como a elaboração do primeiro volume do Atlas, que agregará
informações relativas às capitais dos Estados, bem como evolui para caminhos
antes não percorridos pelos atlas linguísticos produzidos no Brasil, como os estudos
da prosódia, por exemplo.
29
O Projeto ALiB congrega esforços de profissionais de diversas áreas,
como dialetólogos e geolinguistas, mas também de cartógrafos, geógrafos, dentre
outros, para que se torne conhecida e reconhecida a riqueza da variante brasileira
do português, evidenciada pela variedade de usos e particularidades que têm se
tornado visíveis graças aos estudos dos dados documentados pelo Projeto.
Este trabalho também se vincula ao Projeto ALiB, uma vez que tem como
corpus dados inéditos desse Projeto, cuja utilização teve prévia autorização da
presidente do Comitê Nacional de Coordenação do Projeto ALiB, que faculta o uso
desses dados apenas para trabalhos orientados por membros do Comitê de
Coordenação Nacional do ALiB. Dentre as 250 localidades que integram a rede de
pontos do Projeto, este trabalho contempla 25 delas, as capitais brasileiras,
perfazendo um total de 200 informantes (08 por capital). As áreas semânticas
selecionadas para a pesquisa foram escolhidas por representarem aspectos
nacionais, sendo também áreas propícias para registros de cunho regional, afetadas
pelas condições sócio-históricas das localidades pesquisadas e também pelos
contatos entre povos, como as atividades agropastoris, a fauna e a alimentação e
cozinha.
Para melhor visualizar as áreas semânticas selecionadas, seguem três
quadros contendo as perguntas do QSL cujas respostas foram estudadas, de acordo
com a área semântica a que se vinculam: