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PROJETO LITERATURA EM MINHA CASA : O LIVRO COMO PROPRIEDADE DO ALUNO

No documento LITERATURA EM MINHA CASA (páginas 46-74)

Chegando em casa, não comecei a ler. Fingia que não o tinha só para depois ter o susto de o ter. Horas depois abri-o, li algumas linhas maravilhosas, fechei-o de novo, fui passear pela casa, adiei ainda mais indo comer pão com manteiga, fingi que não sabia onde guardara o livro, achava-o, abria-o por alguns instantes. Criava as mais falsas dificuldades para aquela coisa clandestina que era a felicidade. [...] (LISPECTOR, 2002, p. 41-42)

A partir de 2001, como mencionado no primeiro capítulo, o PNBE modificou a sistemática anterior, deixando de enviar livros às bibliotecas escolares como nos anos anteriores, para distribuí-los diretamente aos alunos. O objetivo do projeto foi o de que os alunos tivessem acesso direto às coleções com obras representativas da literatura nacional e estrangeira e que levassem os livros para casa, favorecendo a troca em casa e entre colegas. O projeto, intitulado Literatura em Minha Casa, buscou incentivar os aprendizes a ler colocando-os como proprietários dos livros, permitindo também o contato de suas famílias com a leitura.

Muito se criticou, na época, a questão da posse privada dos livros em detrimento da posse pública, fazendo do livro propriedade do aluno, e não mais da comunidade escolar. É relevante, nessa perspectiva, refletir a respeito da importância de o aluno – leitor em formação – ter o livro em casa e como sua propriedade.

Resultados da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil9 (INSTITUTO PRÓ-LIVRO,

2008) apontam dados importantes no que se refere ao fato de os entrevistados possuírem ou não livros em casa e as práticas de leitura dentro de casa entre a família. Entre os não leitores (quem declarou não ter lido nenhum livro nos últimos três meses) 86% revelaram nunca ter sido presenteado com livros na infância, enquanto, entre os leitores (quem declarou ter lido ao menos um livro nos últimos três meses) esse índice cai para 49% [Figura 3].

9 Pesquisa realizada em duas edições em 2001 e 2008. Tanto a primeira edição da pesquisa, em 2001, quanto a segunda, em 2008 e realizada pelo Instituto Pró-livro (IPL) – fundado em outubro de 2006 –, foram patrocinadas pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), Abrelivros e pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL). O objetivo principal dessa pesquisa é o de estudar o comportamento leitor no país e oferecer ao governo estudos para orientar suas decisões no que diz respeito a programas voltados ao incentivo do hábito da leitura e o acesso aos livros no Brasil.

40 Figura 3: Retratos de Leitura no Brasil – Resultados 1

Fonte: INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 83.

Ainda, entre os não leitores, 68% afirmaram que nunca ou quase nunca viram os pais lendo. No que se refere aos leitores, 60% disseram ver os pais lendo sempre ou de vez em quando [Figura 4].

Figura 4: Retratos de Leitura no Brasil – Resultados 2 Fonte: INSTITUTO PRÓ-LIVRO, 2008, p. 82.

41 No que concerne à posse de livros no Brasil, a pesquisa mostra que 146,4 milhões de brasileiros (85% da população estudada) afirmam possuir pelo menos um livro em casa, com uma média de vinte e cinco livros por residência. Observa-se que três em cada cinco livros pertencem ao entrevistado, enquanto os demais ou são de outras pessoas da família, emprestados ou de programas governamentais.

Diante desses dados estatísticos, podemos concluir que a posse de livros é de grande importância para o leitor durante a infância, período em que ainda está adquirindo o hábito de leitura. Os livros em mãos são motivo de bastante entusiasmo para as crianças, tal como descreve a personagem de Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector (2002). Ter ou não livros a disposição dos aprendizes, seja em casa, seja na escola, é fator determinante para a formação do leitor. Daí se falar na relevância de políticas públicas de leitura, como o PNBE, e também de projetos que incentivam a leitura junto à família, como o Literatura em Minha Casa, que distribuiu livros aos alunos das escolas públicas.

O Ministério da Educação esclarece no edital de convocação para inscrição de coleções de obras de literatura no processo de avaliação e seleção para o PNBE 2002 que:

Levando o livro para casa, espera-se contribuir para o desenvolvimento intelectual e cultura não apenas do aluno, mas também daqueles com quem ele convive. Além disso, possibilita-se a criação de pequenos círculos de leitura, por meio de trocas e intercâmbios de leituras e até mesmo de texto, uma vez que diferentes coleções deverão ser distribuídas equitativamente em cada classe (BRASIL, 2002, p. 14-15).

Sendo assim, a distribuição de livros de literatura – formas de expressão artística e cultural – seriam um meio para disseminação de cultura nas escolas de todo o país, já que o texto literário “é um patrimônio cultural que deve ser protegido e difundido” (BRASIL, 2002, p. 14).

Com início em 2001, o projeto teve seu material de divulgação enviado às escolas na forma de folder [Figura 5], cuja parte visual foi feita pelo escritor e cartunista Ziraldo. Em seu texto, o Ministério da Educação deixa claro seus objetivos:

LIVRO É GÊNERO DE PRIMEIRA NECESSIDADE. Livro é para levar pra casa.

É pra criança ler com a mamãe, o papai, a vovó, a família toda! É um objeto pra ser amado pela criança. Pra ela dormir abraçada, escrever seu nome nele, colorir suas figuras, usufruí-lo...

DEIXE A CRIANÇA VIVER COM O LIVRO! (MEC, folder do projeto Literatura em Minha Casa)

42 .

Figura 5: Ziraldo

Ilustração para divulgação do projeto Literatura em Minha Casa, folder.

No primeiro ano do projeto Literatura em Minha Casa, foram distribuídas obras de literatura infantojuvenil aos matriculados nas 4ª e 5ª séries do ensino fundamental. Nesse ano, o acervo contou com trinta títulos distribuídos em seis coleções de cinco volumes (poesia de autor brasileiro, conto, novela, clássico da literatura universal e texto de tradição popular brasileira ou peça teatral). Com um total de 8,56 milhões de alunos beneficiados para 60,92 milhões livros distribuídos: cada uma das 139.119 escolas contempladas recebeu quatro acervos, com vinte e quatro coleções, totalizando um investimento de R$ 57.638.015,60.

No ano 2002, o programa distribuiu novamente a coletânea Literatura em Minha Casa. Compostas de cinco obras literárias (poesia de autor brasileiro, conto, novela, clássico da literatura universal e texto de tradição popular brasileira ou peça teatral), as oito coletâneas foram distribuídas apenas para aos alunos da 4ª série das escolas públicas do ensino fundamental, em virtude da redução de recursos destinados ao programa. Um total de 21.082.880 livros distribuídos, 3.841.268 alunos beneficiados em 126.692 escolas e um investimento de R$ 19.633.632,00.

43 Em 2003, o programa foi executado em cinco diferentes ações. São elas: 1) Literatura em Minha Casa10; 2) Palavras da gente – Educação de Jovens e Adultos11; 3) Casa da Leitura12; 4) Biblioteca do professor13; 5) Biblioteca Escolar14. Nesse ano, foram 18.010.401 alunos contemplados, em 141.266 escolas beneficiadas, com um total de 49.034.192 livros distribuídos em R$ 110.798.022,00 investidos. O acervo para a 4ª série – que interessa à presente pesquisa – foi, como em 2001 e 2002, composto de dez coleções com cinco volumes (poesia de autor brasileiro, conto, novela, clássico da literatura universal e texto de tradição popular brasileira ou peça teatral).

2.1 Critérios de seleção do projeto Literatura em Minha Casa

Para que se forme um leitor de maneira democrática, é preciso que as instituições contem com estratégias confiáveis de avaliação, compra e distribuição. É essencial, dessa maneira, nos estudos referentes às políticas públicas de leitura e aos programas governamentais de incentivo à leitura escolar no Brasil, que sejam levantados dados a respeito dos critérios levados em consideração pelas instâncias governamentais na escolha dessas obras literárias. No presente trabalho, são focos desta análise os critérios de seleção dos acervos nos três anos do projeto Literatura em Minha Casa, 2001, 2002 e 2003.

2.1.1 Critérios de seleção para o PNBE/2001

Em 2001, os critérios de avaliação e seleção das coleções foram estabelecidos por uma Comissão Técnica, instituída pela portaria nº 1958, de 30 de agosto de 2001. A composição desta Comissão – cujos trabalhos foram presididos pela Secretária de Educação Fundamental e coordenados pela Coordenação Geral do Ensino Fundamental (COMDIPE) – foi a seguinte: a) representante do Conselho Nacional de Secretários de Educação CONSED: Raquel Figueiredo Alessandri Teixeira; b) representante da União

10 Para uso pessoal e propriedade do aluno, com coleções de obras de literatura distribuídas aos alunos na 4ª e 8ª séries.

11 Também para uso pessoal e propriedade dos alunos da EJA.

12 Com distribuição de bibliotecas itinerantes para uso comunitário, contendo 154 livros de 114 títulos diferentes das 24 coleções do acervo das ações Literatura em minha casa, com o objetivo de permitir que parte da população brasileira, excluída do acesso a leitura, tivesse acesso a uma biblioteca itinerante.

13 Com livros distribuídos para cada professor da rede pública das classes de alfabetização e de 1ª a 4ª série, escolhidos pelos professores, a partir de uma lista, disponibilizada na Internet, contendo 144 títulos de livros de ficção e não ficção, com maior enfoque na formação histórica, econômica e política do Brasil.

14 Com a distribuição de acervos com 144 títulos de ficção e não ficção, – com os mesmos títulos distribuídos no PNBE/2003 – para a biblioteca da escola e uso da comunidade escolar.

44 Nacional de Dirigentes Municipais de Educação UNDIME: Adeum Hilário Sauer; c) representante da Associação de Leitura do Brasil ALB: Luiz Percival Leme Brito; d) representante da Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil FNLIJ: Elizabeth d’ Angelo Serra e e) técnicos especialistas na área de leitura, literatura e educação: Antonio Augusto Gomes Batista, Maria da Glória Bordini, Maria José Martins de Nóbrega e Andréa Kluge Pereira.

Em edital específico do dia 29 de agosto de 2001, assinado por Wilson Roberto Trezza e Iara Glória Areias Prado, foram publicados os procedimentos destinados à execução do PNBE/2001 pelo FNDE, em conjunto com a SEF. O edital determina as regras para inscrição de coleções de obras de literatura e ainda incorpora quatro anexos – sendo estes partes indissolúveis. São eles: I) Especificações Técnicas; II) Critérios de Avaliação e Seleção; III) Triagem e IV) Declaração de Titularidade. Aqui interessam os anexos I e II.

No primeiro anexo são normalizadas especificações técnicas relativas ao formato, capa, miolo e acabamento para todos os livros que compõem a coleção. Essas especificações visam produzir uma padronização na materialidade da obra, tais como a utilização de apenas 4/0 cores nas ilustrações da capa e 1/1 cor no miolo da obra.

Os critérios de avaliação e seleção são divulgados pelo anexo II, contendo uma breve introdução, com os princípios gerais; e uma apresentação dos critérios de seleção, sendo eles: tipologia, temática, seleção de títulos e autores, textualidade e, ainda, projeto gráfico e ilustrações. Esses critérios podem ser resumidos em duas exigências básicas: diversidade (de gêneros, assuntos, títulos e autores de diferentes épocas e regiões) e materialidade da obra (projeto gráfico e ilustrações que levem em consideração o público-alvo em questão, tais como tamanho da letra e fonte, ilustrações que levem em conta o destinatário). Para esse ano, as coleções foram organizadas em quatro volumes: poesia, contos, clássico universal, texto de tradição popular e novela.

Merece destaque a repetição no acervo de 2001 de obras presentes nos acervos dos anos anteriores, tais como, Bisa Bia, Bisa Bel, de Ana Maria Machado, A formiguinha e a neve, adaptada por João de Barro, Minhas Memórias de Lobato, que consta como adaptação de Monteiro Lobato no PNBE/1999, embora registrada com a autoria de Luciana Sandroni no PNBE/2001, e A arca de Noé, de Vinicius de Moraes [Figura 6], todas integrantes do acervo do PNBE/1999. Tais repetições – que poderiam ter sido

45 evitadas pelas editoras, caso houvesse alguma recomendação no edital –, é importante destacar, reforçam a canonização desses autores consagrados pela crítica.

Figura 6: Regina Yolanda; Rogério Borges; Laerte; Laurabeatriz.

Ilustrações para Bisa Bia, Bisa Bel; A formiguinha e a neve, Minhas memórias de Lobato, A arca de Noé, capas.

2.1.2 Critérios de seleção para o PNBE/2002

O PNBE continuou a distribuir coleções de obras de literatura para os alunos, em 2002, dando continuidade ao projeto Literatura em Minha Casa. Instituída pela Portaria nº 1440 de 15 de maio de 2002, a Comissão Técnica designada para avaliar e selecionar as

46 coleções de obras de literatura, cujo teor é o mesmo da nº 1958 de 30/08/2001, permanece quase que inalterada. A novidade foram apenas a entrada de Miriam Schlickmann no lugar de Raquel F. A. Teixeira – membro que representa a presidência do CONSED – e o acréscimo de Robert Langlady Lira Rosas e Vera Maria Tietzmann Silva na composição dos técnicos especialistas na área de leitura, literatura e educação.

Foi instituído, no dia seguinte após a designação, um Colegiado, por meio da Portaria n. 1.492, para colaborar com a SEF e o FNDE na execução do PNBE-2002, para realização da avaliação e a seleção das coleções, com base nos critérios determinados e divulgados em edital relativo ao programa. São nomeados para compor o Colegiado: a) um representante do Conselho Nacional de Secretários de Educação CONSED, por Estado; b) um representante da União Nacional de Dirigentes Municipais de Educação UNDIME, por Estado; c) os membros da Comissão Técnica estabelecida pela Portaria n. 1.440 de 15 de maio de 2002 e d) oito representantes do Programa Nacional de Incentivo à Leitura PROLER.

Assinado por Mônica Messenberg Guimarães e Iara Glória Areais Prado, o edital para o PNBE/2002 tem poucas alterações em relação ao conteúdo e forma do edital de 2001, com pequenos acréscimos. No que diz respeito aos critérios de seleção, a principal mudança foi a de privilegiar autores “representativos da produção literária brasileira e universal”, “conhecidos e assumidos como ícones da cultura brasileira” (BRASIL, 2002, p. 15). Outro aspecto é a exclusão das obras que componham as coleções do PNBE/2001, já que a temática deve contribuir para o desenvolvimento ético do leitor, além de favorecer a experiência estética diversificada.

O edital apresenta três anexos: I) triagem – referentes à análise da estrutura editorial (elementos que deveriam estar claramente identificados na capa, quarta, capa, folha de rosto e verso da folha de rosto) – e aos critérios de exclusão – caso as obras não atendam às especificações do edital –; II) critérios de avaliação e seleção – uma breve apresentação, com a finalidade da ação do programa – e critérios de seleção – tipologia (as categorias de textos literários que as coleções deveriam contemplar), temática (que deveriam ser diversificadas), seleção de títulos e autores (autores representativos da produção literária brasileira e universal), textualidade (textos o mais amplamente representativos de diferentes quadros de referência estética diversificada), projeto gráfico e ilustrações (atraentes, com distribuição espacial, tamanho e formato das letras adequados)

47 e projeto editorial (estabelecimento de relações entre os volumes, apresentação dos livros e das coleções, equilíbrio na autoria e no tamanho dos volumes e oferecimento de informações relevantes sobre a obra, autores e ilustradores); III) especificações técnicas mínimas: formato, capa, miolo e acabamento, com a finalidade de criar uma padronização nas obras que compõem as coleções.

Pode ser verificado um aprimoramento nos aspectos e maior clareza na redação em relação ao edital do ano anterior. Para o acervo de 2002, a organização das coleções se deu da seguinte forma: poesia, conto, novela, clássico universal e texto de tradição popular. Destacamos, neste ano, a repetição de obras como A bolsa amarela, de Lygia Bojunga, As aventuras de Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll, e A terra dos meninos pelados, de Graciliano Ramos, distribuídas pelo PNBE/1999 [Figura 7], novamente reforçando a canonização de autores consagrados pela crítica.

Figura 7: Glenda Rubinstein; Alexandre Camanho; Rosinha.

Ilustrações para A bolsa amarela, As aventuras de Alice no País das Maravilhas, A terra dos meninos pelados, capas.

2.1.3 Critérios de seleção para o PNBE/2003

A resolução de nº 008, de 08 de abril de 2003 dispõe sobre o PNBE/2003, determinando a distribuição de coleções de obras de literatura e de informação aos alunos matriculados na 4ª, na 8ª e no último módulo do 2º segmento da Educação de Jovens e Adultos das escolas públicas, sendo a primeira que interessa a esse trabalho. Segundo esta

48 resolução, os alunos matriculados na 4ª série receberiam coleções compostas de: I) uma antologia poética brasileira; II) uma antologia de contos brasileiros; III) uma novela brasileira; IV) uma obra clássica da literatura universal, traduzida ou adaptada; V) uma peça teatral brasileira ou obra ou antologia de textos de tradição popular brasileira.

Instituída pela portaria nº 1.602 de 20 de junho de 2003, a Comissão Técnica com a atribuição de estabelecer critérios de avaliação e de seleção das coleções das obras do PNBE/2003 foi composta por alguns membros do ano anterior: Andréa Kluge Pereira; Antonio Augusto Gomes Batista; Luiz Percival Leme Britto; Maria da Glória Bordini; Maria José Martins de Nóbrega; Vera Maria Tietzmann Silva; e alguns membros novos: Ângela B. Kleiman; Carmen Lúcia B. Bandeira; Cinara Dias Custódio; Cláudia Lemos Vóvio; Heleusa Figueira Câmara; Heliana Maria Brina Brandão; Henrique Silvestre Soares; Jane Paiva; Raquel Lazzari Leite Barbosa; Tânia Mariza Kuchenbecker Rösing.

Foram publicados, no edital de 09 de maio de 2003, assinado por Hermes Ricardo Matias de Paula e Maria José Vieira Féres, os critérios de seleção e avaliação das coleções. Estes apresentam poucas modificações em relação ao edital de 2002, com a ampliação de especificações das coleções para a 8ª série e Educação de Jovens e Adultos – EJA. No que diz respeito à seleção das obras, o edital mantém o critério de representatividade dos autores escolhidos como um fator relevante na escolha do acervo. Da mesma forma, mantém-se privilegiados os títulos e autores de diferentes épocas e regiões. Como nos outros anos, no que concerne às ilustrações, é mantido que estas devem contribuir para uma boa leitura das obras, dialogando com o texto escrito e utilizando linguagem visual coerente e apropriada para o público-alvo em questão. Os anexos são os mesmos do ano anterior.

No edital de 2003, destacamos a apresentação sobre os critérios de avaliação que é significativa, uma vez que que traz um texto mais detalhado, em relação aos outros anos, a respeito do projeto Literatura em Minha Casa.

[...] Há três razões principais sustentando essa iniciativa. A primeira é que a leitura de textos literários e de reflexão sobre a realidade brasileira [para a EJA] é fundamental para o desenvolvimento da percepção estética e das referências culturais e éticas do cidadão. A segunda razão é que a leitura destes textos constitui um importante exercício para a participação na sociedade letrada. A experiência com textos literários, em função da criação artística e das condições de leitura, e com textos sobre a realidade brasileira é essencial para o desenvolvimento intelectual e letramento dos

49 alunos. A terceira razão está no fato de que o texto literário, como forma de expressão artística e cultural, é um patrimônio nacional que deve ser protegido e difundido. Uma iniciativa dessa natureza representa para milhões de brasileiros – crianças, jovens e adultos – a primeira oportunidade de ter contato com obras de literatura e de reflexão sobre a realidade brasileira [esta última referente à EJA] (BRASIL, 2003, p. 10). Assim, por sua relevância no processo de disseminação de cultura, o projeto Literatura em Minha Casa possibilitou a troca e intercâmbio de textos na escola e em casa, reforçando o caráter da escola como agência difusora de cultura e valores.

Ainda nesse edital, o aspecto “Projeto editorial” diz que as coleções devem ser um “projeto orgânico” e “não apenas uma reunião casual de textos”. Estas devem, pois, “apresentar-se como um pequeno retrato da cultura brasileira, convidando e instigando o leitor à experiência estética e à reflexão crítica sobre o mundo que vive” (BRASIL, 2003, p. 12).

No acervo de 2003, ressaltamos dois livros do mesmo autor e com as mesmas personagens. Trata-se dos livros de Mark Twain: Tom Sawyer e Tom Sawyer detetive [Figura 8]. A primeira obra, uma adaptação de Ruth Rocha, faz parte da coleção da editora Objetiva, narrada em terceira pessoa. Já a segunda – adaptada por Carlos Heitor Cony – é integrante da coleção da editora Quinteto Editorial, narrada em primeira pessoa pelo amigo de Tom Sawyer, Huck Finn. A qualidade das obras, sua boa receptividade junto ao público infantojuvenil e representatividade do autor são inquestionáveis, no entanto, a repetição vai contra o critério da diversidade exposto no edital15.

15

Outra repetição constatada foi a da peça teatral Sonho de uma noite de verão, de William Shakespeare, das editoras Global e Melhoramentos, em duas das coleções para a 8ª série – coleções não analisadas no presente trabalho.

50

Figura 8: Pinky Wainer; Patrícia Lima.

Ilustrações para Tom Sawyer e Tom Sawyer detetive, capas.

2.2 Editoras contempladas: o mercado editorial do projeto Literatura em Minha

Casa

Em estudo intitulado “Livros para a educação infantil: a perspectiva editorial”, Magda Soares afirma que

[...] a atividade editorial tem sido pouco contemplada como objeto de

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