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5. RESULTADOS

5.2. Desenvolvimento e sustentabilidade em Vila do Abraão

5.2.2. Sustentabilidade Espacial

5.2.2.3. Promoção da paisagem

A paisagem natural é um item fundamental no turismo da Ilha Grande, que se vende através da imagem de “paraíso ecológico”. Neste aspecto existe certa dissonância entre o discurso de caráter publicitário que promove o local, que procura criar uma expectativa relacionada ao ecoturismo, e algumas práticas que se dão no dia-a-dia do turismo da Ilha. Assim, existem turistas que buscam a referida imagem. Porém, não há cuidado com essa imagem na Vila do Abraão. Por exemplo, quando se chega ao Abraão, divisa-se da barca um pequeno grupamento de construções de pequeno porte à beira mar, emoldurado por um monumental exemplar de mata atlântica. Quando se desembarca, porém, o visitante defronta-se de imediato com dois cafés, um em frente ao outro, com uma arquitetura de vidro e aço que produz um sentimento contraditório ao que se teve na vista, a partir da barca. Quando se vai caminhando para a praça central, onde se encontra uma pequena igreja, o caminhante encontra dois edifícios, um mais antigo – com portas e janelas de madeira e apresentando um partido construtivo que mesmo o olhar não especializado identifica como sendo originário do passado da ilha –, ao lado de um outro, de dois andares, com uma fachada ampla, mais arrogante que o primeiro, cujas portas, em número de oito, são de aço, comuns em qualquer loja de subúrbio, como se pode observar na segunda das duas fotos abaixo.

O aspecto que Renato Marques, guia turístico, destaca a seguir resume o problema:

Porque é o seguinte, o atrativo natural ele é esgotado e as pessoas, acho que não só aqui na Ilha, não se dão conta disso. E aqui isso é mais importante ainda, porque o que interessa o turista aqui é o atrativo natural. Olha só o exemplo geral das pousadas. As pousadas se preocuparam muito em requintar o seu ambiente. Só que a Ilha Grande não tem esse perfil. (...) O que funciona aqui é uma pousada mais rústica – que não é sinônimo de sem conforto. E eu digo isso pelo meu contato com o turista em três níveis, porque eu já tive pousada, já tive barco e hoje em dia faço guia em

caminhadas. É importante dizer que é o turista que gosta dessa atividade [ecológica] que é a principal aqui, ele me diz isso. O que (...) se vende da Ilha Grande é uma ilha com noventa e nove vírgula nove por cento de mata atlântica, com cachoeiras, praias belíssimas, caminhadas, trilhas. Aí você chega lá e tem uma pousada igualzinha as que se encontram em todo lugar.

Fotografia nº 1: fachada original da Vila do Abraão

Tal contradição se repete no incentivo ao turismo intensivo, que torna freqüente a presença no Abraão de turistas e de visitantes que são relativamente indiferentes ao ecoturismo. Na opinião de Marco Antônio Barbosa, do projeto Unir e Vencer, há um conceito no material promocional e outro na orientação da prática em geral. Isto não tem, segundo o mesmo entrevistado, uma autoria determinada, ou seja, não são os donos de pousada, ou os donos de restaurante, ou os barqueiros, ou qualquer outro segmento produtivo que geram a contradição, mas um equívoco gerado pela coletividade, incluindo-se aí aqueles grupos recém-chegados à Ilha e que apresentam um aporte mais profissional em relação ao turismo. Cada grupo apresenta motivos diferentes que os leva a contribuírem para tal equívoco, podendo ser sublinhados os seguintes motivos comuns: a visão de curto prazo, a não percepção das implicações de ter como diferencial turístico o patrimônio ambiental, a ausência de uma administração – tanto pública quanto da sociedade civil – que esteja de fato preocupada com a gestão sustentável do turismo na Ilha, principalmente no que diz respeito ao Abraão.

Assim, pode-se dizer que há um descompasso entre a imagem que Ilha Grande vende e parte do público que freqüenta o Abraão. Por exemplo, no carnaval existe um fluxo de turistas que vão para a Ilha para “pular” o carnaval e não se deslocam do centro do Abraão sequer para o menor dos passeios. Segundo Gilson Ribeiro, proprietário do restaurante Casarão e da pousada Porto Abraão, trata-se de “um turista que quer acampar em local impróprio, que suja as ruas, que faz poluição sonora e que não gasta”. Para a quase totalidade dos entrevistados, a solução deve ser análoga à que se dá em Fernando de Noronha: controle de entrada, tanto do quantitativo de turistas quanto do seu qualitativo.

Esse quadro se deve, em parte, ao modo como o turismo foi se desenvolvendo no Abraão e ao tempo de prática turística no local, bem como a certo amadorismo, considerado acima, quando se tratou do turismo como monoproduto. Segundo Luiz Fernando, presidente da AMHIG, ainda é muito próximo na lembrança e na prática do morador do Abraão (alguns que hoje são donos de pousadas ou de pequenos bares e restaurantes), o tempo em que o visitante chegava e não queria nada mais que um espaço qualquer para acampar, ou um quartinho simples onde se alojar, um “prato feito” para a refeição, praia, cerveja acima da temperatura ideal, fogueira na beira da praia, música improvisada e pronto. É a mudança definitiva dessa realidade que ainda é renegada em certas práticas “hospitaleiras”, ou no desejo que muitos moradores manifestam de retorno do presídio para a Ilha Grande.

O Convention and Visitors Bureau (CVB) é hoje a principal entidade que cuida da imagem turística da Ilha grande. As atividades dessa entidade na Ilha serão consideradas mais adiante. Neste ponto, basta ressaltar que a ação do CVB reincide no mesmo tipo de contradição entre imagem e público que acaba de ser configurada e que, como ficou evidente, afeta negativamente a sustentabilidade do turismo no local.