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O Uso do Pronome de Primeira Pessoa do Plural no Município de Santo Antônio de Jesus segundo a Faixa Etária

4 FUNDAMENTOS TEÓRICOS

5. A ANÁLISE VARIACIONISTA

5.3 VARIÁVEIS SOCIAIS

5.3.1. O Uso do Pronome de Primeira Pessoa do Plural no Município de Santo Antônio de Jesus segundo a Faixa Etária

A variável faixa etária é crucial na análise sociolingüística dos processos de variação e mudança no que se convencionou chamar de tempo aparente, pois as diferenças entre os falantes de diferentes gerações são tomadas como o reflexo das diferenças na gramática da comunidade ao longo do tempo. Tendo dividido os informantes da amostra em três faixas etárias, que correspondem a três gerações distintas, já caracterizadas no capítulo anterior desta dissertação, foram encontrados os seguintes resultados: Pronome faixa etária a gente Nós Nº de oc. / Total Freq. P.R. Nº de oc. / Total Freq. P.R. 20 a 40 554/606 91% .34 52/606 09% .66 41 a 60 823/844 98% .72 21/844 02% .28 + de 60 450/520 87% .31 70/520 13% .69 TOTAL 1827/1970 93% --- 143/1970 07% ---

TABELA 7: Forma do pronome de primeira pessoa do plural no português popular do Município de

Santo Antônio de Jesus segundo a faixa etária do falante (nível de significância: .022)

Os informantes da segunda faixa, como se pode ver, apresentaram a mais elevada freqüência de uso da forma pronominal a gente (98%), o que corresponde a peso relativo .72, superando a primeira faixa, cujo percentual de freqüência de uso desse pronome é 91%, com peso relativo.34. Já a forma canônica nós revelou-se mais produtiva para expressão da primeira pessoa do discurso no plural entre os falantes com idade mais avançada, quase dobrando a freqüência de sete para treze por cento do total de ocorrências, correspondendo ao peso relativo .69. Portanto, entre os mais velhos, a possibilidade de uso do pronome a gente tem peso relativo de .31, mas sua freqüência é de 87%.

Esses resultados não indicam claramente uma mudança em curso em favor da implementação da forma pronominal a gente, porque foi a segunda faixa que apresentou a maior incidência de uso desse pronome. Nessa variável, tem-se como indicativo de mudança em progresso o fato de os mais jovens usarem a forma inovadora com freqüência e peso relativo mais elevados que os mais velhos.

Nos estudos anteriores concernentes à alternância nós e a gente na fala popular,ou correlacionados a esse tema, Almeida (2005), Seara (2000), Omena (1996), Machado(1995), os dados apontaram para a maior probabilidade de a gente ocorrer entre os falantes mais novos, ou seja, na primeira faixa, indicando fortemente uma mudança em curso em favor da implementação da forma pronominal inovadora a gente. Reforçando a amplitude do fenômeno em diferentes estratos sociais, Lopes (1996), que trabalhou com amostras de falantes de nível universitário, chegou à mesma conclusão em seus estudos.

Almeida (op. cit., 105) confirmou sua expectativa no sentido de os jovens empregarem mais a gente em São Miguel dos Pretos, RS, onde houve quase a duplicação do percentual em favor de a gente se comparado aos resultados apresentados pelos velhos: 59% das ocorrências, enquanto o grupo dos idosos obtém apenas a freqüência de 34%, sendo que os adultos apresentaram 48% de freqüência de uso da forma a gente.

Na variável faixa etária, Seara (op. cit., p. 189), querendo observar uma possível mudança em tempo aparente na fala florianopolitana, notou que a forma a gente foi mais favorecida entre os mais jovens, revelando peso relativo de .69; a classe intermediária, peso relativo de .51; e, acima dos 50 anos, a probabilidade de uso apresentou declínio .40; indicando que a forma nós está cedendo lugar para a gente. Na análise de Seara, na segunda faixa, de 25 a 50 anos, ocorreu um decréscimo do uso de a gente e um aumento de uso de nós, já que a gente é menos prestigiada socialmente e os falantes dessa faixa sofrem maior pressão do mercado de trabalho. Conforme Seara, seus dados se assemelharam aos de Omena (1996) em que os de idade mais avançada (50 a 71) apresentaram uma menor probabilidade de uso da variante a gente: .26; na faixa intermediária, .36; e entre os mais jovens, .67 de probabilidade.

Os informantes mais jovens, segundo Machado (op.cit., p. 20), também mostraram-se mais propensos à utilização da forma a gente e os mais idosos à utilização da forma nós em dialetos populares não-urbanos. A estratificação etária demonstrou nos dialetos norte-fluminenses propensão geral à substituição do pronome nós por a gente. Também nos resultados de Lopes (op. cit., p. 120), confrontando o comportamento lingüístico de falantes do Rio de Janeiro, Salvador e Porto Alegre, prevaleceu o peso relativo de .77 da forma a gente entre os falantes

cultos de 25 a 35 anos e houve ocorrência de peso relativo de .60 da forma nós entre os informantes com mais de 56 anos de idade.

Embora seja comum a distribuição etária em três faixas geracionais, a sua delimitação nem sempre coincide entre os pesquisadores variacionistas. No que concerne a essa variável, houve consonância entre os estudos supracitados e esta análise no sentido de os mais velhos estarem mais propensos ao uso da forma pronominal nós, fazendo ou não a devida concordância (-mos/-mo/). Contudo, apesar de todos os estudos anteriores apresentarem maior freqüência de uso da forma pronominal a gente na primeira faixa, a amostra de fala popular do Município de Santo Antônio de Jesus-BA contrariou, como se vê na tabela acima, as evidências de mudança em curso detectadas em diferentes áreas do país. O elevado peso relativo que se esperava encontrar na faixa um, revelando a probabilidade de uso da variante inovadora, transpareceu na segunda faixa etária. Nesta análise, a preferência pelo pronome a gente é notória pelo seu grau de freqüência em todas as faixas; porém, no que se refere ao peso relativo, constata-se a maior propensão de uso desse pronome pelos falantes da faixa dois. A que se deve esse comportamento lingüístico?

Supõe-se que a prevalência do pronome a gente em detrimento da sua forma variante nós, no segundo grupo etário, deva-se ao fato sociolingüístico de a forma inovadora fazer-se acompanhar de forma verbal não marcada, resultando em uma sentença que não sofre qualquer estigmatização social. Nessa faixa, os indivíduos estão ainda bastante sujeitos à avaliação social e lingüística, às pressões do mercado de trabalho. Um teste de aceitabilidade das formas variantes em estudo, associadas à concordância padrão e não-padrão, seria um caminho para a verificação empírica dessa hipótese.

Outro fato é que alguns informantes, em suas falas, apresentaram freqüentes oscilações, hipercorreções no que diz respeito à harmonização entre o verbo e a forma alternante ideal para a situação comunicativa em se encontravam: frente a um documentador, tendo diante de si um microfone, fato que intimida, às vezes, até os renomados oradores. Por mais que o documentador promova a descontração, tente um nível de fala bastante informal em prol da espontaneidade do informante, este deixa transparecer uma certa preocupação com o destino das informações, o objetivo e a forma de expressão, além do seu grau de comprometimento em relação ao que fala. A depender das características individuais

ou do grau de vivência interativa, alguns fogem ao comportamento descrito anteriormente, mas não se constituem regras, são as chamadas exceções.

Além disso, embora a variável escolaridade não tenha sido selecionada como relevante, os entrevistados têm baixa escolaridade, o limite foi estabelecido: analfabetos ou semi-analfabetos. Portanto, isso não lhes permitiu conteúdo que envolvesse o sistema pronominal, atual e antigo; o sistema verbal, a vivência com os paradigmas, a concordância verbal. Vale ressaltar que todos esses conteúdos gramaticais são vastos e conflituosos até entre os de nível elevado de escolaridade.

Essas seriam considerações impressionísticas, pois não houve qualquer estudo sistemático desses assuntos. Entretanto, os resultados das demais variáveis sociais apontarão, certamente, dados objetivos que levarão a conclusões mais concretas.

5.3.2 O Uso do Pronome de Primeira Pessoa do Plural no Município de Santo