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CAPÍTULO II ÉTICA ORGANIZACIONAL : BUSCA POR UM ENTENDIMENTO

2.1 PROPOSTA HERMENÊUTICA PARA A COMPREENSÃO ÉTICA

É preciso deixar de lado qualquer postura preconcebida e certezas frente a tema tão fugidio. A condição para que se interprete o campo comunicacional incluirá XPROKDUTXH³SURFXUDLQWHUSUHWDUVHXFDPSRGHHVWXGR pelo que consegue enxergar na materialidade e no simbólico, reconhecendo seus limites e os das feUUDPHQWDVTXHVHXWLOL]D´ /23(6S 

É verdade que a hermenêutica por si só não dá conta de, isoladamente, suportar a busca no campo dos estudos comunicacionais, mas acreditamos que possa servir como auxílio na compreensão desses fenômenos.

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Assim, um enfoque transdisciplinar13 parece mais apropriado a uma relação positiva com o método hermenêutico, uma vez que o objeto de estudo desse trabalho necessitará olhares que extrapolam o campo de seus estudos, fazendo-se necessária a apropriação de conhecimentos de outras ciências para o desenvolvimento de uma compreensão mais ampla de seu objeto.

Dessa forma, a Filosofia, a Pragmática e os aspectos sociológicos, discursivos e retóricos que compõem o discurso da empresa, aqui representados pela crescente pluralidade das representações contemporâneas, vêm ao encontro do paradigma transdisciplinar, valorizam as tendências heterogêneas da atualidade para a produção de conhecimento e constroem novos modelos de compreensão que se adaptem ao tempo atual.

É possível por meio da hermenêutica, adotar um sentido no qual a validação da consciência se transforma em referencial para a interpretação do conhecimento.

O presente trabalho, ao analisar a comunicação organizacional, privilegia o estudo dos sentidos da palavra, estuda os subjetivemas14 e busca esclarecer possíveis questões subjetivas em textos supostamente objetivos.

Os estudos de Retórica, em particular de questões ligadas a logos e

pathos servirão de base teórica para a análise do corpus, no sentido de tornar possível verificar a constituição do ethos das organizações e a composição de seus discursos.

Considerando o vasto e diversificado ferramental teórico, o trabalho prevê abordar algumas linhas definidas: filosófica, retórica e discursiva, que serão utilizadas em parte ou na sua totalidade.

O termo hermenêutica deriva do grego KHUPHQHXHLQ (hermeneuein), que significa interpretação. Muitos autores associam o termo a Hermes, deus grego capaz de transformar em linguagem acessível o que a mente humana não

13 (PVHXOLYUR³0DQLIHVWRGD7UDQVGLVFLSOLQDULGDGH´  1LFROHVFXGLVFRUUHVREUHDIDOWDGH

unidade do conhecimento, dizendo que com o crescente avanço da técnica o desenvolvimento dos saberes encontra-se cada vez mais centrado neste objeto, anulando de certa forma o sentido humano, sociowww. bocc.ubi.pt.

14Os subjetivemas são classes de palavras que apresentam nível maior ou menor de

FRPSUHHQGHVVH(PRXWUDVSDODYUDVVHULDXP³GHXVLQWpUSUHWH´QDPHGLGDHP que traduziria o incompreensível.

A visão tradicional vê a Hermenêutica como ciência que busca o estabelecimento dos princípios, métodos e regras de interpretação necessárias à compreensão de textos escritos. Nesse sentido, é a teoria científica da arte de interpretar.

A partir do final do século XVIII, início do século XIX, a hermenêutica é reformulada e passa a fazer parte da filosofia como hermenêutica geral, que pressupõe uma teoria geral da compreensão e interpretação de manifestações linguísticas. Em outras palavras, onde há linguagem, existe a possibilidade de interpretação. Assim, foram delimitadas algumas hermenêuticas, entre as quais, a muito conhecida hermenêutica jurídica. A diferença estaria em que nas Ciências Sociais a hermenêutica é aceita como uma das formas da análise do conteúdo e no Direito ela incorpora o rigor que o marco da lei fornece sem, contudo, possuir caráter determinante.

Apesar dessa indeterminação e considerando que o assunto não está ligado diretamente aos rigores da lei, a hermenêutica geral poderá auxiliar na interpretação, que será aprofundada por meio da análise discursiva e retórica dos enunciados constitutivos do corpus.

Outro ponto a considerar são os estudos de linguagem em seu campo de compreensão textual, que passa a ser domínio da técnica de solução de incompatibilidades, da resolução de conflitos. Seu progresso consiste na elaboração de técnicas - sempre imperfeitas - SDUD FRQFLOLDU RSRVLo}HV ³a

conciliação do irreconciliável, a mescla das antíteses, a síntese das oposições [...]´ 3HUHOPDQ 1999: p. 469). Essas oposições podem ser compreendidas como parte do problema discursivo e, assim, componente do problema da comunicação organizacional entendida em seu aspecto discursivo.

Uma mesma incompatibilidade enseja, às vezes, na sua resolução, vários arranjos de conceitos, ou seja, eles são adaptados, reconstruídos lexicalmente para atender essas necessidades. Em outras palavras, cria-se nova forma de escrever ou se a modifica para resolver um determinado problema.

Nesse aspecto pode-se questionar até que ponto o discurso jurídico, por exemplo, está embasado na verdade. Talvez fosse mais apropriado dizer que este discurso se preocupa com a aplicação correta das leis. Aliás, a verdade jurídica está ligada, na prática, às aparências que apresentam mais pontos comuns e se fundamenta nos elementos mais coerentes. De qualquer forma, não é intenção desse trabalho analisar o contexto jurídico.

O compromisso com a solução de incompatibilidades provoca uma nova estruturação do real, o que exige esforço e necessita justificativas de difícil elaboração. Uma vez resolvido o conflito e as noções dissociadas e reestruturadas, a solução escolhida será considerada inelutável até que nova incompatibilidade venha a surgir.

Partindo-se do pressuposto que todos os aspectos da realidade são compatíveis entre si, o protótipo da dissociação nocional é a dissociação que dá origem ao par aparência-realidade, que nasceu de certas incompatibilidades entre aparências (Perelman, 1999: p. 472), uma vez que não podem ser todas consideradas como expressão da realidade.

³(QTXDQWR DV DSDUrQFLDV SRGHP opor-se, o real é coerente: sua elaboração terá como efeito dissociar, entre as aparências, as que são enganosas das que correspondem ao real´ RSFLWS . Esse é um ponto essencial devido à sua importância argumentativa: se o real é o coerente, o não enganoso, a aparência seria o ilusório, o erro. Na prática não é o que ocorre e nas questões de comunicação organizacional, as provas e as interpretações são o que conta. Em outras palavras, a aparência de verdade.

É preciso, contudo, muito cuidado com as generalizações, pois a realidade como resultado da aparência não enganosa, aquilo que o escrúpulo aceita sem titubear, apresenta um aspecto mais subjetivo do que um critério objetivo de escolha. As filosofias pragmáticas, positivistas, fenomenológicas ou existencialistas afirmam que a única realidade é a das aparências. Assim, as (aparências) que manifestam o existente não são nem interiores, nem exteriores, mas se equivalem.

É justamente sob esse aspecto que a retórica conforme Aristóteles, Perelman, Vignaux, e em seu conceito mais moderno, não define o certo e o

errado, a aparência e a realidade, o bom e o mau, mas observa os diferentes pontos de vista de uma mesma ocorrência. Isso torna as crenças possíveis. Como não há certo ou errado e sim pontos de vista a serem defendidos retoricamente, talvez a própria ética possa ser discutida como aparência ou como motivo de argumentação.

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