• Nenhum resultado encontrado

Apresentamos nesta sec¸c˜ao alguns dos instrumentos mais elementares que podemos utilizar para calcular novos limites a partir de limites j´a conhecidos, sem recorrer `a determina¸c˜ao expl´ıcita dos pares ε− δ referidos na defini¸c˜ao 2.3.3, que ´e com frequˆencia uma alternativa muito pouco pr´atica.

Teorema 2.4.1. (Limite e Opera¸c˜oes Alg´ebricas) Sejam f e g fun¸c˜oes, e suponha-se que a ´e ponto de acumula¸c˜ao do dom´ınio de f + g. Se

f (x)→ b e g(x) → c quando x → a, temos ent˜ao que:

(a) f (x)± g(x) → b ± c quando x → a. (b) f (x)g(x)→ bc quando x → a.

(c) se c6= 0, f(x)/g(x) → b/c quando x → a.

Demonstra¸c˜ao. Para provar (a) no caso da soma, supomos que ε > 0, e recordamos que existem:

δ1 > 0 tal que 0 <|x − a| < δ1=⇒ |f(x) − b| < ε 2, e δ2 > 0 tal que 0 <|x − a| < δ2=⇒ |g(x) − c| < ε 2. Assim, se escolhermos δ = min(δ1, δ2), obtemos:

0 <|x − a| < δ =⇒ |(f + g)(x) − (b + c)| = |(f(x) − b) + (g(x) − c)| ≤ |f(x) − b| + |g(x) − c| < ε

2+ ε 2 = ε. o que mostra que:

lim

x→a(f + g)(x) = limx→af (x) + limx→ag(x) = b + c.

O argumento acima aplica-se sem quaisquer modifica¸c˜oes ao caso da dife- ren¸ca. Os casos do produto e do quociente s˜ao ligeiramente mais elaborados, e come¸camos com o caso especial do produto em que c = 0, provando que nestas condi¸c˜oes f (x)g(x) → 0 quando x → a. Dado ε > 0, notamos que existem δ1, δ2 > 0 tais que

• 0 < |x − a| < δ1=⇒ |f(x) − b| < 1 =⇒ |f(x)| < |b| + 1

Tomando δ = min1, δ2}, temos finalmente que

0 <|x − a| < δ1 =⇒ |f(x)g(x)| = |f(x)||g(x)| < ε

O caso geral do produto segue-se deste e da a), porque f (x)g(x)− bc = f(x)(g(x) − c) + c(f(x) − b)

O caso do quociente fica como exerc´ıcio. Pode por exemplo mostrar-se que se g(x)→ c 6= 0 ent˜ao 1/g(x) → 1/c, e depois aplicar a c). Deve al´em disso usar-se a igualdade 1 g(x) − 1 c = |g(x) − c| |cg(x)|

Observa¸c˜oes 2.4.2. Estabelecemos mais alguns limites ´uteis: 1. limite de xn: Se a

∈ R e n ∈ N ent˜ao lim

x→ax

n= an.

Dem. Quando x→ a ´e evidente de 2.4.1 (b) que x2 → a2. O resultado geral

xn → an segue-se de um simples argumento por indu¸c˜ao.

2. limite de um polin´omio p(x): Se a∈ R e p(x) ´e um polin´omio ent˜ao lim

x→ap(x) = p(a).

Dem. O polin´omio p(x) ´e da forma

p(x) = c0+ c1x + c2x2+· · · + cnxn= n

X

k=1

ckxk

Por outras palavras, o polin´omio ´e uma soma finita de termos, cada um dos quais se reduz ao produto de uma constante por uma potˆencia de x. Sabemos j´a calcular limites de constantes e de potˆencias de x, e segue-se agora de 2.4.1 (b) que

lim

x→ap(x) = limx→a n X k=1 ckxk ! = n X k=1 lim x→a ckx k = n X k=1 ckak= p(a)

3. limite de uma func¸˜ao racional: As fun¸c˜oes racionais s˜ao da forma f (x) = p(x)q(x), onde p(x) e q(x) s˜ao polin´omios. Se q(a)6= 0 temos, do exemplo anterior e de 2.4.1 (c), que

lim

x→af (x) = limx→a

p(x) q(x) = lim x→ap(x) lim x→aq(x) =p(a) q(a) = f (a).

O pr´oximo teorema ´e particularmente simples de compreender e demons- trar mas ´e com frequˆencia muito ´util no c´alculo de limites. Note-se que a desigualdade referida pode aplicar-se apenas numa qualquer vizinhan¸ca pri- vada do ponto onde calculamos o limite em causa.

Teorema 2.4.3(Princ´ıpio da Fun¸c˜ao Enquadrada). Sejam f , g e h fun¸c˜oes definidas em D e tais que

lim

x→af (x) = limx→ah(x) = b e f (x)≤ g(x) ≤ h(x) para x ∈ D ∩ V ′ δ1(a)

Temos ent˜ao que lim

x→ag(x) = b.

Demonstra¸c˜ao. Dado qualquer ε > 0, sabemos que existem δ2, δ3 > 0 tais

que, para x∈ D, temos

• 0 < |x − a| < δ2=⇒ |f(x) − b| < ε ⇐⇒ b − ε < f(x) < b + ε

• 0 < |x − a| < δ3=⇒ |h(x) − b| < ε ⇐⇒ b − ε < h(x) < b + ε

Tomamos δ = min(δ1, δ2, δ3), e notamos que, como g est´a “encaixada” entre

f e h, temos:

0 <|x − a| < δ =⇒ b − ε < f(x) ≤ g(x) ≤ h(x) < b + ε =⇒ |g(x) − b| < ε.

Observa¸c˜oes 2.4.4. Aproveitamos os resultados anteriores para estabele- cer mais alguns limites que devem ser conhecidos.

1. limite de log x quando x→ 1: Para mostrar que log x → 0 quando x → 1, recordamos de 2.2.7 que 1−x1 ≤ log x ≤ x − 1 para x > 0 ´ E claro que lim x→11− 1 x = limx→1x− 1 = 0

Segue-se imediatamente de 2.4.3 que lim

x→1log x = 0, i.e., log x→ log 1 quando x → 1

2. limite de ex quando x

→ 0: Para mostrar que ex

→ 1 quando x → 0, recordamos de 2.2.9 que, para x < 1, temos

1 + x≤ ex 1 1− x Conclu´ımos de 2.4.3 que Como lim x→01+x = limx→0 1 1− x = 1, ent˜ao limx→0e x= 1, i.e., ex → e0 quando x → 0

3. limite de sen xx quando x→ 0: Vimos em 2.2.5.6 que cos x < sen x

x < 1 para 06= |x| < π/2 ´

E agora ´obvio de 2.4.3 e da observa¸c˜ao 2.3.4.4 que Como lim

x→0cos x = cos 0 = 1 = limx→01, temos igualmente limx→0

sen x x = 1

Figura 2.4.1: Gr´afico de sen x

x (a tracejado as curvas y =±1/x).

4. Para um exemplo um pouco mais especial, considere-se a fun¸c˜ao f dada por f (x) = x· sen 1

x 

para x6= 0. Observamos que, se x 6= 0, ent˜ao

−1 ≤ sen 1x  ≤ 1, i.e., sen 1 x  ≤ 1. Temos assim que, se x6= 0,

0≤ x· sen  1 x  =|x| · sen  1 x  ≤ |x| Como 0≤ |f(x)| ≤ |x| e |x| → 0 quando x → 0, ´e claro que temos

lim

x→0|f(x)| = 0 = limx→0f (x) = limx→0x· sen

 1 x



Sempre que uma dada fun¸c˜ao f ´e a composi¸c˜ao de duas ou mais fun¸c˜oes cujos limites sabemos calcular, podemos explorar esse facto para calcular limites da fun¸c˜ao original f . A ideia b´asica ´e f´acil de entender e resume-se ao seguinte:

Se h(x)→ b quando x → a e g(t) → c quando t → b ent˜ao f (x) = g(h(x))→ c quando x → a.

Figura 2.4.2: Gr´afico de f : R\ {0} → R dada por f(x) = x · sen(1/x).

Existem neste contexto algumas dificuldades t´ecnicas que n˜ao s˜ao imedi- atamente ´obvias e que referimos em detalhe mais abaixo (em 2.4.7), mas come¸camos por apresentar diversos resultados ´uteis que podem ser obtidos desta forma:

Exemplos 2.4.5.

1. limite de sen x

2

x2 quando x→ 0: Notamos que

f (x) = sen x

2

x2 = g(t), onde t = h(x) = x

2 e g(t) = sen t

t J´a sabemos que t = x2

→ 0 quando x → 0 e que sen t

t → 1 quando t → 0.

Conclu´ımos que (teorema 2.4.7) lim

x→0

sen(x2)

x2 = 1.

2. Esta t´ecnica pode ser adaptada a outros casos que n˜ao s˜ao t˜ao evidentes: Para calcular o limite de sen(4x)

x quando x→ 0, observamos que: lim x→0 sen(4x) x = limx→04 sen 4x 4x = 4 limx→0 sen 4x 4x = 4 limt→0 sen t t = (4)(1) = 4 3. De forma an´aloga, para calcular o limite de sen(x

2) x , observamos que: sen x2 x = x sen x2 x2 = xg(h(x)), onde t = h(x) = x 2 e g(t) = sen t t Conclu´ımos que lim

x→0

sen(x2)

4. Para uma aplica¸c˜ao ainda menos ´obvia desta t´ecnica, notamos que 1−cos t = 2 sen2(t/2), donde 1− cos t

t2 = 2 sen2(t/2) 4(t/2)2 = 1 2 sen u u 2 , com u = t/2.

Como sen uu → 1 quando u → 0, obtemos um limite interessante, que ´e

1− cos t t2 →

1

2, quando t→ 0

Na realidade, a aproxima¸c˜ao 1−cos tt2 ≈ 12, ou cos t≈ 1 − t2/2 ´e razoavelmente

exacta para valores “pequenos” de t, como a figura 2.4.3 sugere.

y = cos x y = 1−x2

2

Figura 2.4.3: Aproxima¸c˜ao de cos x por 1x22.

5. limite de log x quando x → a: Basta-nos notar que, com t = x/a, e sabendo da observa¸c˜ao 2.4.4.1 que log x→ 0 quando x → 1, temos

lim

x→alog x− log a = limx→alog(x/a) = limt→1log t = 0, ou seja, limx→alog x = log a

6. limite de ex quando x

→ a: Com t = x − a e sabendo da observa¸c˜ao 2.4.4.2 que ex → 1 quando x → 0, obtemos lim x→ae x= lim x→ae aex−a= ealim t→0e t= ea · 1 = ea, i.e., lim x→ae x= ea

7. limites de func¸˜oes da forma f (x) = g(x)h(x): Supondo g(x) > 0,

recorde-se de 2.2.11 que a fun¸c˜ao f ´e dada por f (x) = g(x)h(x)= eh(x) log(g(x))

O c´alculo de limites de f reduz-se por isso ao c´alculo de limites do expoente h(x) log(g(x)). Supondo que

g(x) > 0, lim

x→ag(x) = b > 0 e limx→ah(x) = c,

conclu´ımos sem dificuldades que lim

x→ag(x)

h(x)= lim

x→ae

h(x) log(g(x))= ec log b= bc.

A t´ıtulo de ilustra¸c˜ao, se a > 0 temos lim

x→ax

x= lim

x→ae

Em geral, e supondo que g(x) → b quando x → a e f(t) → c quando t→ b, a dificuldade em garantir que (f ◦ g)(x) → c quando x → a resulta apenas de podermos ter, por um lado, f (b) 6= c e, por outro, podermos ter igualmente g(x) = b em vizinhan¸cas arbir´arias de a, caso em que n˜ao teremos certamente (f ◦ g)(x) → c quando x → a. O pr´oximo exemplo ilustra este tipo de comportamento:

Exemplo 2.4.6.

Consideramos aqui as fun¸c˜oes

g(x) = x· sen(1/x) e f(t) =

( sen t

t , se t6= 0 0, se t = 0

Sendo h(x) = f (g(x)) ´e certo que g(x)→ 0 quando x → 0 (observa¸c˜ao 2.4.4.4), e f (t)→ 1 quando t → 0 (observa¸c˜ao 2.4.4.3), mas n˜ao ´e verdade que h(x) = f (g(x))→ 1 quando x → 0. Para reconhecer este facto, basta notar que em qualquer vizinhan¸ca de 0 existem pontos da forma x = 1

nπ, onde sen(1/x) = 0

e portanto h(x) = f (g(x)) = f (0) = 0.

O pr´oximo teorema indica duas alternativas poss´ıveis para evitar a difi- culdade ilustrada acima.

Teorema 2.4.7 (Limite da Fun¸c˜ao Composta). Sejam f e g duas fun¸c˜oes reais de vari´avel real, e a ∈ R um ponto de acumula¸c˜ao do dom´ınio de f◦g. Se g(x) → b quando x → a e f(t) → c quando t → b temos f(g(x)) → c quando x→ a, sempre que uma das seguintes condi¸c˜oes ´e satisfeita:

(a) f (b) = c, ou

(b) g(x) 6= b quando x 6= a.

Demonstra¸c˜ao. Verificamos este teorema apenas no caso (a) acima. Sendo Df o dom´ınio de f , dado ε > 0, e como f (t)→ c quando t → b, observamos

que existe γ > 0 tal que:

t∈ Df e 0 <|t − b| < γ =⇒ |f(t) − c| < ε.

Temos por hip´otese que f (b) = c e portanto a restri¸c˜ao |t − b| > 0 ´e desne- cess´aria acima, i.e.,

(1) t∈ Df e |t − b| < γ =⇒ |f(t) − c| < ε.

Sabemos tamb´em que g(x)→ b quando x → a, e portanto existe δ > 0 tal que

(2) x∈ D e 0 < |x − a| < δ =⇒ |g(x) − b| < γ. Resulta de (1) e (2) que

x∈ D e 0 < |x − a| < δ =⇒ |g(x) − b| < γ =⇒ |f(g(x)) − c| < ε. Por outras palavras, limx→af (g(x)) = c.

Note-se de passagem que nos exemplos 2.4.5 aplica-se sempre a alterna- tiva (b) acima.

Documentos relacionados